Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1004/16.7T8STR.E1
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: DECLARAÇÕES DE PARTE
ACTA
ASSENTADA
CONFISSÃO
CAMINHO PÚBLICO
Data do Acordão: 04/12/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
I - É entendimento que cremos pacífico após a entrada em vigor do actual artigo 155.º, n.º 4, do CPC, que decorrido o prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada, sem que seja arguido o vício da sua falta ou deficiência, o mesmo fica sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade ser arguida sequer nas alegações de recurso.
II - Tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, do CPC, continua a impor a redução a escrito do depoimento de parte na sua vertente confessória.
III - A formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento encontra-se reservada para a confissão judicial provocada, a qual, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 356.º do CC, pode ser feita tanto em depoimento de parte como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
IV - Mas, havendo confissão judicial, a força probatória plena contra o depoente depende da sua redução a escrito, isto porque, se o não for, é livremente apreciada pelo tribunal, mesmo que se encontre gravada.
V - De facto, a desconsideração da indicada formalidade da assentada implica que a declaração da parte, mesmo que se encontre gravada, e ainda que seja confessória, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo.
VI - Por isso, as consequências desta omissão não podem qualificar-se como não tendo influência no exame e decisão da causa.
VII - Porém, a parte do depoimento, das declarações, ou dos esclarecimentos do sujeito processual, que não assuma a natureza de confissão, não tem que ser reduzida a escrito por não ser prova tarifada, sendo um meio de prova livremente apreciado pelo tribunal.
VIII - Estando sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova, na formação da convicção pelo julgador no que tange à credibilidade da forma como foram prestadas as declarações de parte e ao peso que revistam na decisão da matéria de facto, não é irrelevante ter presente o âmbito sobre o qual as mesmas podem incidir, porquanto, em face do preceituado no artigo 466.º, n.º 1, a prestação de declarações versa sobre factos em que as partes tenham tido intervenção pessoalmente, ou sobre os quais tenham conhecimento directo.
IX - Assim, ao invés de posições apriorísticas sobre a natureza subsidiária ou supletiva deste meio de prova, diminuindo ou desconsiderando o seu valor probatório por via da mera qualidade de quem produz as declarações, ou por ter ou não estado presente na audiência final, consideramos que as mesmas devem ser apreciadas, tal qual o comando legal prescreve, ou seja, são livremente valoradas pelo juiz, no confronto da demais prova produzida.
X - Resultando da factualidade provada, não só que os caminhos em questão se encontram afectos à utilidade pública - atento o seu uso directo e imediato pelo público em geral que desde há pelo menos 40 ou 50 anos utiliza aqueles caminhos como passagem de pessoas, animais e veículos quer para os terrenos agrícolas da zona, quer para acesso a feiras e a localidades e lugares vizinhos, ali passando sempre que entende, sem pedir autorização a ninguém e na convicção de que o pode fazer -, não tendo um uso limitado à propriedade da autora e às circundantes -; como ainda que, pese embora os caminhos não tenham sido construídos pela autarquia -, pode considerar-se terem sido legitimamente apropriados pela mesma, que há cerca de 40 anos os administra, melhora e conserva; não pode consequentemente duvidar-se que se trata de caminhos públicos, e, por isso, pertencentes àquela entidade pública.
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 1004/16.7T8STR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém[1]
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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. AA, instaurou contra o Município de Salvaterra de Magos, a presente acção com processo comum, pedindo que seja(m):
«- reconhecido o direito de propriedade da autora sobre o prédio identificado nos autos, designadamente sobre as áreas compreendidas nas chamadas Rua das … e Rua …;
- entregues as mesmas áreas à autora, assistindo-lhe o direito de eliminar as mencionadas referências toponímicas Rua das … e Rua … dentro do prédio que lhe pertence, o direito de impedir a passagem de pessoas, veículos e animais estranhos à exploração pelos mencionados caminhos, o direito de eliminar a passagem aberta pelo réu no prédio da autora no prolongamento da Rua das … do aglomerado urbano de Salvaterra de Magos, e o direito de implantar ou de construir ou portões ou outros equipamentos nos limites dos mencionados caminhos particulares, dentro do prédio que lhe pertence;
- o réu ser condenado a pagar à autora, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, a quantia de €50.000,00, acrescida de juros à taxa legal a partir da citação e até efectivo pagamento».
Em fundamento, alegou, em síntese, que:
- a autora é dona e legítima possuidora do prédio denominado Quinta do …, sito na freguesia e concelho de Salvaterra de Magos, inscrito na respectiva matriz cadastral rústica sob o n.º …, Secção … e na urbana sob o artigo …;
- o prédio rústico está descrito na Conservatória do Registo Predial de Salvaterra de Magos sob o n.º … - Salvaterra de Magos, com a área total de 803.280 metros quadrados, dos quais 193,97 são de área coberta e os restantes 803.086 de área descoberta;
- no mencionado prédio rústico existem vários caminhos em terra batida que foram abertos para finalidades relacionadas com a exploração agrícola, para circulação de veículos agrícolas, que foram abertos pelos antepassados da autora;
- o réu apropriou-se indevidamente, por não ter título para isso, da área correspondente aos mencionados caminhos existentes no prédio da autora;
- o réu deu a esses caminhos nomes de rua, não o sendo, manifestamente, pois embora se desconheça a existência de um conceito legal de "rua", ele está ligado à ideia de um espaço público numa povoação de livre circulação de pessoas e/ou veículos, dando acesso a outras artérias, a moradias e outros equipamentos comerciais e de sociabilidade;
- o que não é o caso, estando o que se chama Rua das … e Rua … dentro do prédio da autora, em ambiente rural, fora de qualquer aglomerado urbano/populacional;
- tão pouco o Réu expropriou a mesma área;
- o prédio da autora está cercado por arames em estacas cravadas no solo em todo o seu perímetro, excepto nos mencionados caminhos, em cujos terrenos contíguos têm aparecido lixeiras que a autora vai removendo à medida que aparecem, tendo havido, também, nesses locais contíguos roubo de pinhas e madeira da propriedade;
- a utilização dos caminhos existentes no prédio da autora, por qualquer pessoa, a pé, em automóvel, tractor ou qualquer outro meio ou veículo como se de uma via pública aberta ao tráfego se tratasse traduz-se em devassa do prédio e aumenta os riscos de incêndio;
- e é desnecessária, havendo nos limites do prédio da autora, pelo leste, uma via que corre quase paralela ao caminho que prolonga a chamada Rua das … e que conflui com esta no limite Norte do mesmo prédio;
- tal via paralela é designada por Rua …, passa pelo aglomerado urbano de Salvaterra de Magos, continuando, sem solução de continuidade, por terrenos agrícolas adjacentes;
- quanto à chamada Rua …, a utilização dela pelo público para aceder a Salvaterra de Magos, à Estrada Nacional n.º 118 e, por esta, ou qualquer outra localidade servida por essa via, não é necessária, podendo ser utilizadas outras vias;
- o réu, com o comportamento que assumiu, está a dificultar a exploração agrícola da propriedade, permitindo que a mesma esteja a ser utilizada como via pública aberta ao trânsito de veículos e animais estranhos à exploração, aumentando os riscos de incêndio e a tornar mais onerosa e a perturbar a exploração agrícola dessa mesma área;
- o comportamento ilícito do réu causou e causa prejuízos à autora cujo montante estima 50.000,00€.

2. Regularmente citado, o réu contestou a presente acção, pugnando pela respectiva improcedência, invocando factos tendentes a demonstrar que os caminhos são vicinais e que a autora não é proprietária do leito dos mesmos; e, em reconvenção, deduziu os seguintes pedidos:
«- que se reconheça que o caminho que se inicia na Rua … e termina no entroncamento da Rua das … com a Rua das … é caminho público em toda a sua extensão,
- que se reconheça que o caminho que se inicia na Estrada do … e termina no entroncamento da Rua das … com a Rua … é caminho público em toda a sua extensão;
- que a autora seja condenada a abster-se de praticar qualquer acto que impeça ou dificulte a passagem de quem quer que seja pelas referidas Rua … e Rua das …».

3. Realizada a audiência final, foi proferida sentença julgando totalmente improcedente a acção e totalmente procedente o pedido reconvencional.

4. Inconformada, a Autora apelou, formulando as seguintes conclusões:
«1. O presente recurso versa matéria de facto e de direito.
2. A prova por declarações de parte não poderá ser considerada, porque inaudível em grande parte do registo fornecido e por não ter sido objecto de assentada, como, se julga, imporia o disposto no artigo 463.º do CPC, aplicável ex vi 466.º, n.º 2 do mesmo código.
3. Parecendo que com o meio de prova – declarações de parte – se terá pretendido esclarecer ou completar factos pessoais ou de que se tenha conhecimento directo, emergentes de outros meios de prova e não substitui-los ou serem um sucedâneo deles.
4. Na fundamentação da matéria de facto é essencial e obrigatório que se especifiquem os aspectos ou pontos em que as declarações de parte contribuíram para o completamento ou esclarecimento de depoimentos testemunhais, de documentos e de outros quaisquer meios de prova, o que não acontece, pelo contrário, além de não se fazer tal especificação, colocou-se a prova por declarações de parte no mesmo nível dos depoimentos das testemunhas para a formação da convicção quanto à matéria de facto.
5. Com o que se violou o disposto no artigo 607.º, n.º 4, ambos do CPC, com a consequência da nulidade da sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. b) do mesmo código.
6. A douta sentença proferida, em sede de fundamentação, fica-se por declarações vagas e imprecisas, não contendo uma fundamentação específica dos factos considerados provados nem procede a uma análise crítica das provas.
7. Não se pode dar como provado, não existindo aquisições de facto suficiente para isso, que os caminhos em causa são utilizados há 40 ou 50 pela população local.
8. Um desses caminhos – o chamado Rua das … – é a continuação, no prédio da recorrente, de uma rua com o mesmo nome existente em aglomerado urbano e a contiguidade só foi estabelecida com uma abertura no prédio da recorrente, feita aquando da construção de um aterro sanitário, de modo a permitir as passagens de veículos de remoção dos sedimentos dessa construção.
9. A entidade recorrida sabe e tem obrigação de saber quando foi feito o aterro sanitário e a abertura na Rua das …, mas não o invocou, competindo-lhe fazê-lo, sendo impeditivo do direito da recorrente, segundo as regras gerais de repartição do ónus da prova.
10. Não se pode dar como provado, por ausência de prova sobre isso, que os caminhos em causa foram abertos pelos anteriores possuidores do prédio da recorrente há pelo menos 200 anos para permitir a exploração agrícola e florestal de outros prédios confinantes ou próximos daquele outro prédio.
11. Deu-se como provado que nem a recorrente nem os seus antecessores zelam pela conservação dos caminhos, limitando-se a passar como todos os utilizadores, salvo no que diz respeito à limpeza de lixo que vem sendo depositado no prédio.
12. Não se pode aceitar esse facto, que não tem qualquer base factual de apoio, as testemunhas da recorrida não se pronunciaram sobre isso e as da recorrente depuseram em sentido contrário.
13. A falta de fundamentação ou uma fundamentação consubstanciada em fórmulas vagas, imprecisas e genéricas, não especificada e a prova de factos em contradição com a única prova produzida em audiência de discussão e julgamento, constitui violação do artigo 607.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, determinantes da nulidade da sentença [artigo 615.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma].
14. A douta sentença proferida não procedeu à análise jurídica dos factos provados, limitando-se a dizer que preenchiam o conceito de “caminho público”, pela presença do que considerou serem os elementos constitutivos do conceito.
15. Não basta para que um caminho seja classificado como pertencente ao domínio público municipal que satisfaça interesses das populações locais, sendo necessário que a utilidade pública que servem se revista de importância de certo grau ou relevância.
16. Não preenche o conceito de utilidade pública relevante o caminho que apenas encurta distâncias, permitindo um acesso mais curto e rápido, tendo as populações outras vias abertas ao público para chegarem aos seus destinos.
17. A entidade recorrida não quantificou as distâncias que estariam em causa nem indicou outros interesses relevantes justificativos, em termos objectivos e racionais, da utilização dos caminhos em causa e da sua classificação como “caminhos públicos”.
18. Os mesmos caminhos não são usados desde tempos imemoriais.
19. A mera atribuição de nome de rua aos caminhos não significa “apropriação”, que tem, tal como a utilidade pública, de constituir meio necessário para o prosseguimento de interesses com certo grau ou relevância.
20. A douta sentença recorrida, interpretou incorrectamente a lei, violando, além do que já foi mencionado, os artigos 1305.º e 1306.º, ambos do Código Civil e a garantia constitucional da propriedade privada, consagrada no artigo 62.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, que violou, por erro de interpretação.
21. No caso de provimento do recurso e revogação da sentença impugnada, impor-se-á a condenação da entidade recorrida em indemnização a liquidar em execução de sentença, existindo danos resultantes da actuação da entidade recorrida, não concretamente determinados».

5. O Réu não apresentou contra-alegações.

6. No despacho em que admitiu o recurso o Senhor Juiz emitiu pronúncia quanto à invocada nulidade da sentença, que considerou não existir.

7. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II. O objecto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objecto do recurso se limita pelas conclusões das respectivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, vistos os autos, as questões colocadas pela Recorrente e que importa apreciar no presente recurso, atenta a sua ordem lógica, consistem em saber se a sentença enferma de alguma das nulidades arguidas; se deve ser modificada a matéria de facto; se se encontram verificados os fundamentos para reconhecer o seu invocado direito de propriedade sobre os identificados caminhos.
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III – Fundamentos
III.1. – De facto
Na sentença recorrida, foram considerados provados os seguintes factos:
«A autora é dona e possuidora legítima do prédio denominado Quinta do …, sito na freguesia e concelho de Salvaterra de Magos, inscrito na respectiva matriz cadastral rústica sob o n.º …, Secção … e na urbana sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Salvaterra de Magos sob o n.º … - Salvaterra de Magos, com a área total de 803.280 m2, dos quais 193,97 são de área coberta e os restantes 803.086 de área descoberta.
A autora adquiriu o identificado prédio por sucessão hereditária do pai, Carlos …, e da mãe, Maria …, estando a aquisição registada a favor dela pela apresentação n. º 3903, de 20-11-2009.
Carlos … e Maria … haviam adquirido o mesmo prédio por sucessão testamentária de Ernesto …, com a aquisição registada a favor deles pela ap. 16 de 25/3/1968.
A autora faz, pelo menos desde 1968, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, tal como antes dela fizeram os pais e avós que a antecederam no domínio, a exploração agrícola e florestal daquele prédio, semeando, tratando e colhendo searas, cuidando do arvoredo, fazendo os respectivos cortes e outros trabalhos agrícolas, por todos sendo considerada dona e legítima proprietária do identificado prédio.
No mencionado prédio existem dois caminhos em terra batida actualmente com cerca de 4 metros de largura.
Tais caminhos foram abertos pelos anteriores possuidores do imóvel há pelo menos 200 anos para permitir a exploração agrícola e florestal desse prédio e de outros prédios confinantes ou próximos.
Um dos caminhos, a que foi posto o nome Rua das …, inicia-se, pelo Sul, no limite Norte da Rua das … do aglomerado urbano de Salvaterra de Magos, prolongando-se pelo interior do prédio da autora, até ao limite Norte do mesmo prédio, onde se inicia o outro, a que foi posto o nome de Rua … e que dentro do prédio da autora prolonga-se para Oeste para entroncar na Estrada Nacional n.º 118, directamente ou através da Rua ….
Ambos os caminhos situam-se em pleno campo, em espaço rural, fora de aglomerado urbano ou do respectivo limite urbano.
Os dois caminhos vão entroncar a Norte numa única rua pública – a Rua das ….
Em reunião de 28/10/2008 a Câmara Municipal de Salvaterra de Magos deliberou atribuir nome àqueles caminhos.
Foi afixado edital de tal deliberação e não foi apresentada qualquer reclamação.
O réu, em ofício n.º 001607, de 19/5/2015, dirigido à Autora, na sequência de reclamação que esta lhe apresentou, considerou estarem os referidos caminhos "(...) no uso e fruição da população e não confinado à propriedade privada (...)", considerando-os via pública.
E, tendo a autora colocado portões e vedações à entrada do seu prédio, do lado da Rua das … e do lado da Rua …, para impedir a circulação regular e constante de pessoas e veículos pelo seu prédio como se de uma via pública se tratasse, a Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, pelo referido ofício 001607, notificou-a para "(...) no prazo máximo de 10 dias (úteis) proceder à desocupação da via pública, retirando os portões e demais vedações, sob pena dos serviços municipais, e de acordo com o regulamento municipal de ocupação da via pública, retirarem todo e qualquer objecto com carácter de permanência ou amovível que se encontre ilicitamente a ocupar a via publica."
Ordem que a autora cumpriu com receio da ameaça que lhe era feita, na certeza, que comunicou ao réu que o assunto seria dirimido por quem de direito.
Desde há pelo menos 40 ou 50 anos que a população local utiliza aqueles caminhos como passagem de pessoas, animais e veículos quer para os terrenos agrícolas da zona, quer para acesso a feiras e a localidades e lugares vizinhos como, por exemplo, Glória, Paul de Magos e Marinhais, permitindo um acesso mais curto e rápido.
O que sempre foi feito à vista de todos, sem oposição de quem quer que fosse, sem pedir autorização ou licença a ninguém, nomeadamente à autora ou seus antecessores e com a convicção de se tratarem de caminhos públicos.
Os caminhos sempre se encontraram abertos, franqueados às pessoas em geral e sem qualquer embaraço.
O prédio da autora está delimitado em toda a extensão dos caminhos com vedação de arame e/ou sebes vivas.
Os caminhos são ladeados por terrenos rurais e em alguns troços por floresta, não estão urbanizados, nem estão ladeados por quaisquer construções como casas ou quaisquer outros equipamentos urbanos.
Há mais de 40 anos que o réu, através da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, zela pela manutenção dos mesmos, limpando as bermas, cortando as silvas e outra vegetação que possa dificultar a passagem, tapando os buracos que se formam com a erosão e as chuvas e pelo menos uma vez por ano utiliza a motoniveladora para acertar o pavimento dos caminhos em causa, sempre com a convicção de que se tratam de caminhos públicos.
Nem a autora nem os seus antecessores se opuseram a estes trabalhos.
Nem a autora nem os seus antecessores zelam pela conservação dos caminhos, limitando-se a passar como todos os utilizadores, salvo no que diz respeito à limpeza de lixo que vem sendo depositado no prédio.
A apropriação do leito dos caminhos pela autora e subsequente vedação impediria a passagem de pessoas, animais e veículos como se vem fazendo.
Em ofício dirigido à autora de 28 de Julho de 2014, com o n.º 003112, o réu informou que a denominação daqueles caminhos tinha sido deliberada em reunião da Câmara Municipal de 28/10/2008 e que tinha sido aberta uma passagem na Rua das ….
Com essa abertura permitiu-se a continuação da Rua das … pelo prédio da autora, tornando possível que, por dentro dele, no prolongamento dessa rua, circulem a pé ou em veículo quaisquer pessoas estranhas ao prédio e à exploração agrícola do mesmo.
O caminho denominado Rua das … situa-se inteiramente dentro do prédio da autora e o caminho denominado Rua … ocupa parte do mesmo prédio, encontrando-se ambos fora do limite urbano de Salvaterra de Magos.
Há nos limites do prédio da autora, pelo leste, uma via que corre quase paralela ao caminho denominado Rua das … e que conflui com esta no limite norte do mesmo prédio, servindo vários destinos.
Tal via é designada por Rua …, também conhecida por Estrada do …, passa dentro do aglomerado urbano de Salvaterra de Magos, continuando, sem solução de continuidade, por terrenos agrícolas adjacentes.
O acesso a Salvaterra de Magos, à Estrada Nacional n.º 118 e, por esta, ou qualquer outra localidade servida por essa via pode ser feito por outras vias que não pelo caminho denominado Rua …, embora envolva o percurso de maiores distâncias.
Quem, pela Rua das …, no aglomerado urbano de Salvaterra de Magos, queira aceder à Estrada Nacional n.º 118, pode fazê-lo sem invadir o prédio da autora e sem usar o caminho denominado Rua das …, indo pela Estrada do …, tomando depois a Rua … ou a Rua do …, como melhor servir o interesse do utilizador.
O caminho denominado Rua … dá acesso Estrada Nacional n.º 118 pelo ponto designado no documento de fls. 39 pela letra B.
Nesse mesmo local B a autora colocou um portão para impedir o acesso das pessoas estranhas à propriedade e à exploração agrícola que aí se faz.
Portão que a autora retirou em obediência à determinação do réu.
O abandono de inertes e o depósito de lixo na propriedade da autora feita pelos utilizadores dos caminhos estanhos à exploração, facilitada pela abertura dos mesmos caminhos ao público, obriga a autora à remoção constante das lixeiras e a ter de dispor de meios de vigilância para evitar o risco de coimas por violação de normas protectoras do ambiente».
E foram considerados não provados os seguintes factos:
«- que o leito dos caminhos pertence ao prédio da autora;
- que a conduta do réu causou prejuízos à exploração agrícola da autora em montante estimado de €50.000,00;
- que a utilização dos caminhos existentes no prédio da autora por qualquer pessoa, a pé, em automóvel, tractor ou por qualquer outro meio ou veículo, como via pública aberta ao tráfego traduz-se em devassa do prédio, aumenta os riscos de incêndio e impede, perturba ou torna mais onerosa a exploração agrícola dessa mesma área e impede a autora de determinar livremente a exploração, não podendo, por exemplo, eliminar caminhos se entendesse essa eliminação como favorável à exploração, tornando-a mais onerosa, ou mesmo economicamente inviável, pela impossibilidade de eliminação da caminhos ou de troços de caminhos, seccionando parcelas da propriedade;
- que é o que se passa com a impossibilidade de eliminação do trecho da chamada Rua … entre os pontos A e B definidos no documento 16 que secciona do conjunto da propriedade a área acima desses pontos, considerando o sentido Norte/Sul;
- que já ocorreu furto de pinhas e madeira da propriedade».
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III.2. – O mérito do recurso
III.2.1. – Da invocada nulidade da sentença
Começa a Recorrente por assacar à sentença recorrida a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, por em sede de matéria de facto constatar que, em geral, não é aduzida fundamentação específica para os factos que se deram como provados, nem tão pouco se fez uma análise crítica da prova produzida, em violação do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC; e, na vertente da apreciação da questão de direito, verificar a inexistência da fundamentação exigida pelo artigo 607.º, n.º 3, do CPC.
Vejamos.
Atento o preceituado na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Como é entendimento pacífico, este vício da nulidade por falta de fundamentação ocorre quando houver falta absoluta dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão, e já não quando essa fundamentação ou motivação for deficiente, incompleta, não convincente, medíocre ou até errada, porquanto essa situação poderá determinar a sua revogação ou alteração por via de recurso, quando o mesmo for admissível, mas não a respectiva nulidade[4].
Assim, não restam dúvidas de que só a total omissão dos respectivos fundamentos de facto ou de direito, em suma, a completa ausência de motivação da decisão, pode conduzir à nulidade a que alude a alínea b) do artigo 615.º do CPC.
Ora, no caso vertente, da simples leitura da sentença recorrida decorre a observância dos requisitos de elaboração da sentença referidos no n.º 3 do artigo 607.º do CPC, mormente com a existência de fundamentação de facto e de direito. Acresce que, na vertente de facto, o Senhor Juiz observou o disposto no artigo 607.º, n.º 4, declarando quais os factos que considerou provados e não provados, motivando - ainda que de forma muito sucinta, é certo -, os meios de prova em que assentou a sua declarada convicção; e, na vertente jurídica, louvou-se em arestos dos tribunais superiores que citou, para concluir que da factualidade provada resultava a qualificação como públicos dos dois caminhos objecto do litígio.
Portanto, a sentença não enferma da invocada nulidade, cumprindo na oportunidade aquilatar se a mesma não está devidamente fundamentada quanto à decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa[5]; e se padece, ou não, dos invocados erros de julgamento de facto e de direito[6].
A Recorrente referiu também, logo na conclusão 2.ª, que a prova por declarações de parte não pode ser considerada, porque inaudível em grande parte do registo fornecido e por não ter sido objecto de assentada, e objecto de reclamação, nos termos do artigo 463.º do CPC, aplicável ex vi 466.º, n.º 2, do mesmo código, concluindo que tal fulminava igualmente a sentença com a já referida nulidade.
Também a este respeito não assiste razão à recorrente, tanto mais que, os indicados vícios, ainda que se verificassem - e não verificam -, não constituiriam nulidade da sentença, mas sim nulidades processuais, inominadas ou secundárias, as quais, mesmo a existirem, sempre haveriam de considerar-se sanadas.
Na verdade, conforme esta conferência já afirmou[7], em face do disposto no artigo 155.º, n.º 4, do CPC «A falta ou deficiência da gravação deve ser invocada, no prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada».
Não existindo na lei anterior resposta à questão de saber qual o vício decorrente da inaudibilidade do registo áudio «o artigo 155.º, n.º 4 veio resolver as dúvidas, impondo à parte o ónus de invocar a irregularidade no prazo de 10 dias a contar da data em que tenha sido disponibilizada a gravação (disponibilização que deve ocorrer no prazo de dois dias a contar do acto, nos termos do n.º 3) (…)
Tratando-se de uma nulidade processual, terá de ser arguida autonomamente, sendo submetida a posterior decisão do juiz a quo, não sendo admitida a sua inserção imediata nas alegações de recurso»[8].
Assim, é entendimento que cremos pacífico após a entrada em vigor do novo CPC, que decorrido esse prazo sem que seja arguido o vício em causa, fica o mesmo sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade ser arguida sequer nas alegações de recurso.
«Daí afirmar-se que “a omissão ou deficiência das gravações é, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, um problema que deve ficar definitivamente resolvido ao nível da primeira instância, quer pela intervenção oficiosa do juiz que preside ao ato quer mediante arguição dos interessados”[6], deixando de ser admissível que a parte interessada na arguição o possa fazer no prazo de interposição do recurso – 30 ou 40 dias -, nas respetivas alegações»[9].
Acresce que, chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade de interpretação semelhante efectuada a respeito dos correspondentes preceitos do Código de Processo Penal, o Tribunal Constitucional, pronunciou-se concluindo que «a norma segundo a qual a nulidade decorrente da falta ou deficiência da documentação da prova deve ser arguida no prazo de dez dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, não padece de inconstitucionalidade»[10].
Ora, conforme se concluiu no já citado Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, «[n]ão tendo este Tribunal acesso a um depoimento que estriba a impugnação da matéria de facto, fica o mesmo impossibilitado de efetuar a reapreciação da prova pretendida pelo apelante. Conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28.10.2014, Cristina Coelho, 250/09, «Se é certo que, com o NCPC, a Relação se assume como um verdadeiro tribunal de instância, procedendo à reavaliação da prova e expressando a sua própria convicção com total autonomia, não menos certo é que tal reapreciação terá de ser feita com os mesmos elementos com que o tribunal recorrido se defrontou.»
Pelo exposto, conclui-se não poder este tribunal reapreciar a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto impugnada pelo apelante, por carecer dos elementos necessários para tal, improcedendo a apelação nesta parte».
No caso vertente, não sendo tão gravosa a consequência da imperceptibilidade parcial da gravação das declarações de parte, aplicar-se, com as necessárias adaptações aquela consequência, já que este tribunal não tem condições para firmar na parte indicada a respectiva convicção, devendo a Relação estar nas mesmas condições em que se encontrou a primeira instância.
Mas, mesmo que a nulidade processual decorrente da inaudibilidade parcial das declarações de parte não estivesse sanada, nunca teria as consequências pretendidas pela Recorrente já que tal prova, sendo inaudível, não pode efectivamente ser considerada nessa parte, mas apenas pelo tribunal superior, por estar inviabilizada a reapreciação do depoimento ou declarações prestadas. Significa isto que, tal limitação apenas ocorre quanto à pretendida reapreciação da matéria de facto mas não belisca a sua relevância na formação da convicção do julgador em primeira instância, conforme a Recorrente parece entender. Ao contrário, fixa a convicção do juiz tal como vem formada, precisamente porque impede que a mesma seja, nessa parte, reapreciada pela Relação.
O que vimos de dizer no tocante à arguição de qualquer nulidade processual, aplica-se de pleno no caso vertente a eventual irregularidade que haja sido cometida no decurso das declarações de parte, a qual se encontra inelutavelmente sanada porquanto, para além do já referido quanto à necessidade de ser suscitada em primeira instância, a audiência final na qual foram prestadas as declarações de parte teve lugar no dia 21.06.2017 e as alegações do presente recurso ocorreram em 20.10.2017.
Acresce que, diversamente do que a Recorrente considera, não tendo tido dimensão confessória (a recorrente nunca o refere), as declarações de parte nestes autos não têm que constar em assentada, sendo, juntamente com os demais meios de prova não vinculada, livremente apreciadas pelo Tribunal.
De facto, tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, do CPC, continua a impor a redução a escrito do depoimento de parte na sua vertente confessória. Porém, a lei apenas exige a redução a escrito do depoimento de parte, nas circunstâncias descritas no indicado normativo: o depoimento é sempre reduzido a escrito, na parte em que houver confissão do depoente ou quando este narrar factos ou circunstâncias que impliquem indivisibilidade da declaração confessória.
Assim, verificada a natureza confessória do depoimento ou declarações da parte, a redacção dos termos da confissão incumbe ao juiz, podendo as partes ou seus advogados fazerem as reclamações que entendam, e, concluída a assentada, é lida ao depoente, que confirma ou faz as rectificações necessárias (n.ºs 2 e 3 do artigo 463.º do CPC).
Deste modo, compaginando o que vimos de referir, o segmento normativo acima sublinhado em itálico não pode deixar de significar, a contrario, que a parte do depoimento, ou dos esclarecimentos do sujeito processual, que não assuma a natureza de confissão, com a amplitude referida, não tem que ser reduzida a escrito por não ser prova tarifada, sendo um meio de prova livremente apreciado pelo tribunal. De harmonia com o referido, o artigo 466.º, n.º 3 do CPC, estabelece precisamente que as declarações serão livremente apreciadas pelo tribunal na parte em que não representem confissão.
Na verdade, a formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento encontra-se reservada para a confissão judicial provocada, a qual, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 356.º do Código Civil[11], pode ser feita tanto em depoimento de parte como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal. Assim, só o reconhecimento que a parte faça em declarações de parte, de um facto que lhe seja desfavorável e favoreça a parte contrária, tem o valor de confissão, conforme a noção plasmada no artigo 352.º daquele código. Mas, havendo confissão judicial, a força probatória plena contra o depoente depende da sua redução a escrito, isto porque, se o não for, é livremente apreciada pelo tribunal, mesmo que se encontre gravada. É o que, a nosso ver, inequivocamente decorre da leitura conjugada do preceituado nos n.ºs 1 e 4 do artigo 358.º do CC.
Por isso que, não desconhecendo a posição expressa no Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora, de 09.03.2017[12], no sentido de que «a falta de redução a escrito do depoimento de parte confessório só constituiria nulidade caso tivesse influência no exame e na decisão da causa, o que não sucede quando este é integralmente gravado», e com todo o respeito devido - que é muito -, entendemos com o Conselheiro URBANO DIAS[13], que a gravação do depoimento de parte não é razão suficiente para afastar a exigência da redução a escrito que o legislador processual obriga, em perfeita sintonia com os normativos citados do CC.
De facto, a desconsideração da indicada formalidade da assentada implica que a declaração da parte, mesmo que se encontre gravada, e ainda que seja confessória, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo. Ora, as consequências desta omissão não podem qualificar-se como não tendo influência no exame e decisão da causa. Basta atentar no disposto no artigo 347.º do CC quanto ao modo de contrariar a prova plena, ou nas consequências da desconsideração de prova tarifada que constituem precisamente uma excepção relativamente à admissibilidade do recurso de revista quanto ao erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, sublinhadas no indicado Post, uma vez que, em face do n.º 3 do artigo 674.º do CPC, havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meios de prova é admissível recurso de revista.
Revertendo o que vimos de referir ao caso em apreço, como a Recorrente não invocou que tenha havido qualquer declaração confessória no decurso das declarações de parte que não tenha sido sujeita a assentada, nem sequer na perspectiva que antecede, a sua pretensão anulatória poderia proceder.
Finalmente, aduz ainda a Recorrente que «com o meio de prova – declarações de parte – se terá pretendido esclarecer ou completar factos pessoais ou de que se tenha conhecimento directo, emergentes de outros meios de prova e não substitui-los ou serem um sucedâneo deles». Assim, em seu entender, «na fundamentação da matéria de facto é essencial e obrigatório que se especifiquem os aspectos ou pontos em que as declarações de parte contribuíram para o completamento ou esclarecimento de depoimentos testemunhais, de documentos e de outros quaisquer meios de prova, o que não acontece, pelo contrário, além de não se fazer tal especificação, colocou-se a prova por declarações de parte no mesmo nível dos depoimentos das testemunhas para a formação da convicção quanto à matéria de facto, com o que se violou o disposto no artigo 607.º, n.º 4».
Sabido é que as declarações de parte são um novo meio de prova introduzido no Código de Processo Civil pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, cujo artigo 466.º, n.º 1, estabelece que «[a]s partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento direto».
Embora nestas vestes sejam um meio de prova inovatório, tal como anunciado na Exposição de Motivos da Proposta de Lei 113/XII, onde se afirma que «[p]revê-se a possibilidade de prestarem declarações em audiência as próprias partes, quando face à natureza pessoal dos factos a averiguar tal diligência se justifique, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão», o certo é que, em boa verdade, o referido preceito constitui a consagração legal do entendimento que ainda na vigência do codificação processual civil revogada foi preconizado por uma significativa corrente jurisprudencial, que já então vinha entendendo - estribando-se no disposto no artigo 361.º do CC, e ainda no facto de com a reforma de 95/96 o legislador ter vindo introduzir a possibilidade de o juiz solicitar esclarecimentos às partes -, que era possível valorar livremente o depoimento de parte, no segmento que excedesse a confissão de factos, por natureza desfavoráveis ao depoente.
«Ou seja, embora configurado processualmente no sentido da obtenção da confissão, foram reconhecidas ao depoimento de parte virtualidades probatórias irrecusáveis perante um sistema misto de valoração da prova em que a par de prova tarifada existem meios de prova sujeitos a livre apreciação»[14].
Estando sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova, na formação da convicção pelo julgador no que tange à credibilidade da forma como foram prestadas e ao peso que revistam na decisão da matéria de facto, não é irrelevante ter presente o âmbito sobre o qual as mesmas podem incidir, porquanto, em face do preceituado no artigo 466.º, n.º 1, a prestação de declarações versa sobre factos em que as partes tenham tido intervenção pessoalmente, ou sobre os quais tenham conhecimento direto, ou seja, no dizer do citado Autor «sobre factos pessoais, os quais abrangem: (i)o ato praticado pela parte ou com a sua intervenção; (ii)o ato de terceiro praticado perante a parte em que se inclui a declaração escrita dirigida à parte; (iii) o facto ocorrido na presença da parte e (iv)o conhecimento do facto ocorrido na sua ausência». Significa isto que ao interesse no desfecho da acção que a parte, pela sua qualidade não pode deixar de ter, contrapõe-se o seu especial conhecimento sobre a matéria a que é ouvido.
Assim, ao invés de posições apriorísticas sobre a natureza subsidiária ou supletiva deste meio de prova, diminuindo ou desconsiderando o seu valor probatório por via da mera qualidade de quem produz as declarações[15], ou por ter ou não estado presente na audiência final[16], consideramos que as mesmas devem ser apreciadas, tal qual o comando legal prescreve, ou seja, são livremente valoradas pelo juiz, no confronto da demais prova produzida. A título de mero exemplo, devidamente sopesadas, as declarações de parte podem reforçar ou infirmar designadamente a prova testemunhal produzida, de acordo com o que venha a ser a avaliação pelo julgador da respectiva credibilidade revelada nomeadamente pela espontaneidade e isenção que transpareça do depoimento prestado, em face das regras da experiência comum e do normal acontecer, o mesmo é dizer, de harmonia com o exame crítico de toda a prova produzida.
Revertendo ao caso em apreço, diz a Recorrente que «entende dever criticar, em nome da objectividade, da transparência e da igualdade das partes, colocarem-se, na fundamentação aduzida para a formação da convicção do Tribunal, as declarações prestadas pelo Presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos (aliás, em grandes parte inaudíveis, pelo menos do registo dado à recorrente), como legal representante da recorrida, ao mesmo nível dos depoimentos das testemunhas». Ou seja, a Recorrente coloca em questão o valor probatório atribuído às declarações de parte pelo julgador por ter sido sopesado ao mesmo nível do depoimento das testemunhas, mas não a sua substância, nem sequer colocando em causa a credibilidade das declarações prestadas. Ora, como antedito, sendo admissíveis quer as declarações prestadas pelo legal representante do Município quer a idêntica valoração que das mesmas foi efectuada no confronto da prova testemunhal produzida, não foi violado qualquer um dos indicados preceitos, nem o princípio da igualdade, porquanto a Autora, à semelhança do que fez o Réu, podia igualmente ter requerido a prestação de declarações, o que não fez.
Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, improcede igualmente a nulidade que a este respeito a Recorrente arguira, por violação do disposto nos artigos 466.º e 607.º, n.º 4, do CPC.
*****
III.2.2. – Da impugnação da matéria de facto
Pretende a Recorrente que seja modificada a decisão sobre a matéria de facto aduzindo que «Não se pode dar como provado, não existindo aquisições de facto suficiente para isso, que os caminhos em causa são utilizados há 40 ou 50 pela população local»; «Não se pode dar como provado, por ausência de prova sobre isso, que os caminhos em causa foram abertos pelos anteriores possuidores do prédio da recorrente há pelo menos 200 anos para permitir a exploração agrícola e florestal de outros prédios confinantes ou próximos daquele outro prédio»; «Deu-se como provado que nem a recorrente nem os seus antecessores zelam pela conservação dos caminhos, limitando-se a passar como todos os utilizadores, salvo no que diz respeito à limpeza de lixo que vem sendo depositado no prédio. Não se pode aceitar esse facto, que não tem qualquer base factual de apoio, as testemunhas da recorrida não se pronunciaram sobre isso e as da recorrente depuseram em sentido contrário».
Conforme decorre do preceituado no artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), e n.º 2, alínea a), do CPC, quando impugna a matéria de facto, o recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição.
De tal artigo resulta que a lei exige o cumprimento pelo Recorrente dos seguintes requisitos cumulativos:
i) a indicação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
ii) a indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados;
iii) a indicação da decisão que, no seu entender, deve ser proferida quanto aos indicados pontos da matéria de facto;
iv) a indicação, com exactidão, das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, isto quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sem prejuízo da faculdade que a lei concede ao Recorrente de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Acresce ainda que, nos termos do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, sendo ainda que nos termos do n.º 2, alínea d) do indicado preceito, a Relação deve, mesmo oficiosamente, determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Começamos por desde já afirmar que, ao invés do habitual figurino, a sentença recorrida não ordenou os factos por números ou letras mas tal não impedia que a Recorrente identificasse rigorosamente qual o concreto facto a que se referia por referência à sua formulação na fundamentação de facto da decisão recorrida. Porém, a Recorrente não o fez, podendo assim considerar-se que a mesma não cumpriu cabalmente desde logo o ónus de indicar os concretos pontos de facto que no seu entender se encontram incorrectamente julgados, nem de indicar a decisão que deve ser proferida, o que, em bom rigor, podia determinar a imediata rejeição do recurso nesta parte.
Acontece, porém, que estão apenas em causa 3 questões de facto, cujo alcance se julga compreender, bem como o pretendido: quanto aos três indicados segmentos dos factos provados a Recorrente entende que os dois primeiros devem ser considerados não provados, e, o último, que não podia ter sido dado como provado nos termos em que se encontra. Ou seja, concatenando as conclusões com o corpo das alegações, entende-se suficientemente cumpridos os indicados ónus, pelo que, iremos proceder à impetrada reapreciação dos indicados pontos de facto ou dos concretos segmentos dos mesmos factos.
Importa começar por sublinhar que tanto a fundamentação da decisão de facto pelo julgador como a motivação apresentada pela Recorrente, não tiveram em conta a dificuldade da tarefa cometida a este Tribunal, especialmente em acções com natureza semelhante à presente em que amiúde as testemunhas se referem - especialmente quando estão a ser confrontadas com documentos ou fotografias -, às indicações «aqui» ou «ali», não tendo este tribunal a capacidade de «visualizar», como tiveram o julgador e os mandatários das partes, concretamente o que indicam. Esta diferença, para menos, da nossa possibilidade de adequada percepção de todo o acervo probatório que tais indicações também constituem, impõe desde logo um especial cuidado na reapreciação porque no caso dos autos manifestamente não nos encontramos nas mesmas condições da primeira instância, porquanto ninguém teve o cuidado de acautelar a eventualidade do recurso em matéria de facto.
Acresce que, relativamente à reapreciação do julgamento de facto pela Relação, cumpre ter presente destinar-se a mesma primordialmente a corrigir invocados erros de julgamento que - atento o preceituado no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, que rege sobre a modificabilidade da decisão de facto -, se evidenciem a partir dos factos tidos como assentes, da prova produzida ou de um documento superveniente, por forma a imporem decisão diversa. Significa esta formulação legal que não basta que a prova produzida nos autos permita decisão diversa, necessário é que a imponha. Por isso se exige ao Recorrente que motive as alegações de recurso, dizendo as razões que determinam, em seu entender, diverso juízo probatório, para que a Relação possa aquilatar se os meios de prova por aquele indicados impõem ou não decisão diversa da recorrida quanto aos concretos pontos de facto impugnados.
Vejamos, então, o que disse o Senhor Juiz:
«Em primeiro lugar, urge referir a prova testemunhal que foi produzida em audiência de julgamento. Na verdade, a todos os depoimentos prestados (testemunhas Rui …, Aníbal …, José … e Maria … e declarante Hélder …) foi comum a referência à existência de dois caminhos em terra batida que passam pelo prédio da autora e que são usados nomeadamente por habitantes locais para aceder a prédios agrícolas e a várias localidades da zona, permitindo um aceso mais curto e rápido.
As testemunhas José … e Maria … e o declarante Hélder … referiram ainda o sentimento e convicção dos habitantes locais e do próprio réu no sentido de considerarem tais caminhos como caminhos públicos e que como tal vêm sendo cuidados e tratados.
A testemunha Aníbal …, casado com a autora, descreveu os caminhos e o uso que lhes vem sendo dado e referiu que existem na propriedade há bastante tempo, mais concretamente há 200 anos, tendo sido abertos pelos anteriores possuidores. Também mencionou os prejuízos que decorre do seu uso pelo público e que se prendem com a colocação de lixo no prédio da autora.
Da prova produzida, mormente dos depoimentos das testemunhas Aníbal …, José …, Maria … e das declarações prestadas pelo legal representante do réu, Hélder …, resultou de forma inequívoca que o acesso a vários prédios e localidades da zona pode ser feito por outras vias que não os caminhos mencionados nos autos, o que implica percorrer maiores distâncias.
Para os factos provados foram também determinantes os documentos juntos aos autos a fls. 16 a 21 (caderneta predial), 22 a 26 (certidão da descrição e inscrição predial), 27 a 32, 37 e 38 (fotografias), 33 a 36, 39 e 52 a 54 (documentos camarários) e 60 a 64 (fotografias)».
E o que disse a Recorrente:
«Como se pode dar como provado, sem uma análise crítica dos elementos probatórios em presença, que o trânsito na chamada “Rua das …”, no prédio da recorrente, se dá há, pelo menos, 40 ou 50 anos, se esse trânsito só seria possível, em toda a sua extensão, depois da abertura feita no limite da rua, no povoado, com o caminho no prédio da recorrente, sem dizer quando foi feito, podendo a recorrida tê-lo feito?
Tal abertura foi feita quando houve a necessidade de escoar os sedimentos resultantes da construção de um aterro sanitário, como disse a testemunha Aníbal …, no depoimento que prestou em 23-11-2016. À pergunta se o caminho chamado “Rua das …” teve sempre a mesma configuração disse “Não”, resultando a actual de “…quando foi feito o aterro sanitário … abriu-se uma ligação à Rua das …” (24.34/24.50).
Sabendo, e não podendo a entidade recorrida desconhecer, quando foi feito o aterro sanitário, teria o ónus de indicar a data em que foi feito, que é a data da abertura da Rua das … no aglomerado urbano permitindo a circulação de pessoas dentro do prédio da recorrente por caminho a que, posteriormente, foi dado o mesmo nome de rua.
A mesma abertura foi feita para “… circular o carro do lixo… “ (referido depoimento 27.19) e para permitir o escoamento de terras e outros materiais resultantes da instalação do aterro sanitário.
Deu-se, também, como provado que “Nem a autora nem os seus antecessores zelam pela conservação dos caminhos, limitando-se a passar como todos os utilizadores, salvo no que diz respeito à limpeza de lixo que vem sendo depositado no prédio.”
Tal omissão não pode ser aceite, não sendo verdade.
Nenhuma outra testemunha foi ouvida sobre essa matéria, a única produzida foi a indicada, parecendo assim infundamentada e sem razão de ser a resposta dada.
Não se pode, também, aceitar do facto dado como provado - “Tais caminhos foram abertos pelos anteriores possuidores do imóvel há pelo menos 200 anos para permitir a exploração agrícola e florestal desse prédio e de outros prédios confinantes ou próximos” - o segmento final, ou seja, que a abertura dos caminhos tenha sido feita para permitir a exploração agrícola de prédios confinantes ou próximos. Nenhuma testemunha o disse».
Ouvidos os depoimentos das testemunhas que fundaram a convicção do Senhor Juiz e ainda as declarações de parte - as quais, diga-se em abono da verdade, são perfeitamente audíveis até cerca de metade do tempo em que foram prestadas, e compreensíveis na sua maioria -, não podemos desde já deixar de referir que não assiste razão à Recorrente na deduzida impugnação da matéria de facto, porquanto se mostra acertado o que se pretende transmitir, e a Recorrente nem sequer indica modo diverso de expressar o que resultou da prova produzida. E vamos ser igualmente sucintos na fundamentação desta afirmação.
Assim, é inequívoco dos depoimentos auditados que, pelo menos, desde há mais de 40/50 anos as populações da zona utilizam os dois caminhos, e que o fazem com a convicção de que são caminhos públicos, nada havendo a alterar a esse respeito.
Na verdade, a própria testemunha Rui …, cujo depoimento a Recorrente aponta na parte que entende sufragar o seu entendimento, tendo efectivamente referido que o caminho chamado “Rua das …” não tinha a configuração actual e que esteve lá a trabalhar no seu alargamento, referiu igualmente que, sendo vizinho da autora há 46 anos, sempre por lá passou, sempre existiram ainda que mais estreitos, mas foram sendo alargados ao longo dos anos dizendo até “quando eu comecei a circular já esses caminhos lá existiam; a maior parte, são caminhos que nós passamos, e servem também para máquinas agrícolas”.
Aproveita-se desde já para referir, a respeito de quem cuidou dos caminhos, que igualmente esta testemunha referiu que quando fez o alargamento andava lá por conta da empresa do Porto Alto para a qual trabalhava, mas não sabia se foi por conta da autora, isto para significar que, pese embora a autora tenha alegado, na réplica, que foi sempre ela quem cuidou dos caminhos, pagando para o efeito, o certo é que não juntou um único documento para comprovar o que alegou, sendo que esta testemunha não sabia sequer quem contratou a empresa para a qual trabalhava. Ao invés, o Réu produziu prova exuberante, mormente com o depoimento conhecedor e circunstanciado da testemunha Maria … e, nessa parte, igualmente corroborado pelas declarações de parte, credíveis, circunstanciadas e isentas, do actual Presidente do Município que, desde após o 25 de Abril ali foi exercendo funções diversas, afirmando que sempre foi a Junta ou a Câmara quem cuidou destes caminhos, como cuida dos muitos que existem sem alcatrão na área do Município. Note-se que este foi um dos argumentos usados pela testemunha Aníbal …, marido da Autora, - que igualmente confirmou a utilização dos caminhos indistintamente pelas pessoas, ainda que mais especificamente para irem para a feira mensal de Marinhais, mas salientou essa questão. Ora bem. Tivemos o cuidado de verificar - tanto quanto nos foi possível, naturalmente -, nas imagens de satélite disponibilizadas pela Google, confirmando que efectivamente existem inúmeros caminhos nas redondezas, com nome de Rua e que não se encontram alcatroados. Portanto, não colhe a argumentação nesse sentido efectuada, quanto a tratar-se de caminho privado e, por isso, não ter sido alcatroado pelo Município.
Finalmente, uma nota a respeito do segmento que se refere à utilização dos caminhos por explorações circundantes. Ao invés do aduzido pela Recorrente, houve várias referências à Companhia das Lezírias, dentro de cuja propriedade inclusivamente e no dizer da testemunha Aníbal …, passa o caminho denominado «Rua …». Ademais, e ainda de acordo com o depoimento da testemunha Aníbal …, os caminhos eram usados, essencialmente, “por todos os rendeiros da Companhia e pelos nossos”.
Conclui-se, pois, sem necessidade de maiores considerações, que improcede igualmente a pretendida alteração da matéria de facto, mantendo-se consequentemente intocada a matéria de facto tal como vem fixada da primeira instância.
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III.2.2. – Do enquadramento jurídico
O litígio entre as partes assenta na dominialidade dos identificados caminhos que a Autora considera pertencerem à sua propriedade, e o Réu Município entende serem caminhos públicos.
Na sentença recorrida o Senhor Juiz, socorrendo-se da jurisprudência dos Tribunais Superiores citada e aplicando o que foi transcrevendo à matéria de facto provada, concluiu «que estamos perante dois caminhos públicos que satisfazem interesses das populações locais e cujo uso é imemorial porque data de há pelo menos 200 anos e, por outro lado, que ocorreu um acto apropriação por pessoa colectiva de direito público (Município de Salvaterra de Magos) na estrita medida em que os afectou à satisfação do interesse público (acesso a vários locais de forma mais expedita) e deles vem cuidando há mais de 40 anos. Caso pois se entenda que não se verifica o uso imemorial, sempre se pode dizer que o réu se apropriou dos dois caminhos e afectou-os ao interesse público permitindo a passagem de pessoas e veículos. E ao apropriar-se deu-se, como se referiu no Acórdão Tribunal da Relação de Coimbra de 7/3/2017 supra citado, a aquisição dominial desses caminhos».
A Recorrente dissente deste entendimento, invocando designadamente que «Não preenche o conceito de utilidade pública relevante o caminho que apenas encurta distâncias, permitindo um acesso mais curto e rápido, tendo as populações outras vias abertas ao público para chegarem aos seus destinos.
Os mesmos caminhos não são usados desde tempos imemoriais.
A mera atribuição de nome de rua aos caminhos não significa “apropriação”, que tem, tal como a utilidade pública, de constituir meio necessário para o prosseguimento de interesses com certo grau ou relevância».
Vejamos.
A divergência expressa pelas partes no caso em presença é relativamente recorrente e tem sido, desde há longo tempo, objecto de atenção pela doutrina e de decisão pelos tribunais que, debruçando-se sobre as situações concretas levadas a juízo quanto à qualificação de alguns caminhos, têm tentado densificar as distinções entre a qualificação dos percursos usados para passagem entre sítios, que podem designadamente constituir caminhos públicos, servidões e atravessadouros.
No caso vertente, atento o objecto do recurso, está agora em questão apenas saber se a materialidade demonstrada permite ou não qualificar como públicos os caminhos em questão, que atravessam o prédio pertencente à Autora.
Conforme se referiu no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20-11-2014[17], em síntese da evolução legislativa pertinente ali citada, «são caminhos públicos aqueles cuja propriedade pertence ao Estado ou às autarquias locais (em virtude de terem procedido à sua construção ou deles se terem apropriado desde tempos imemoriais), mantidos sob a sua administração, afetos ao uso público, sem oposição de ninguém, sendo a todos lícito fazerem a sua utilização e tendo como únicas restrições as impostas por lei, ou pelos regulamentos administrativos. Os caminhos públicos vicinais são caminhos de mero interesse rural e não se destinam, regra geral e por essas razões, ao trânsito automóvel, estando vocacionados para o trânsito rural e por isso sendo denominados como "caminhos rurais".» Por regra, «são caminhos trilhados no terreno, de terra batida, sem quaisquer infraestruturas, nem serviço de conservação, de acesso a propriedades rústicas»[18].
Por seu turno, a respeito da dominialidade pública, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, considerou-se que:
«1) O domínio público é constituído pelo acervo de bens destinados ao uso de todos, cujo regime é regulado pelo Direito público, dele só podendo ser titulares pessoas coletivas públicas e cujo aproveitamento e defesa direta decorre, respetivamente, de forma a corresponder a interesses públicos e no uso do "jus imperii",
2) O elenco dos bens de domínio público consta da lei, mas a Constituição da República e o DL nº 477/80 fazem-no de forma não taxativa,
3) São ainda públicos os terrenos que desde tempos imemoriais estão no uso direto e imediato do público em geral para satisfação de relevantes fins de utilidade pública cuja relevância é de apreciar casuisticamente no cotejo com as circunstâncias e o "modus vivendi" local,
4) Tempo imemorial é um período tão antigo que já não está na memória direta, ou indireta - por tradição oral dos seus antecessores - dos homens, que, por isso, não podem situar a sua origem»[19].
Na situação dos autos, o Município Réu/Reconvinte não juntou aos autos qualquer prova documental de aquisição da dominialidade sobre os caminhos em questão, por exemplo, o respectivo registo ou documentos comprovativos da sua construção, que, aliás se demonstrou ter sido efectuada pelos antepassados da Autora, mas provou que há mais de 40 anos, através da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, zela pela manutenção dos mesmos, limpando as bermas, cortando as silvas e outra vegetação que possa dificultar a passagem, tapando os buracos que se formam com a erosão e as chuvas e pelo menos uma vez por ano utiliza a motoniveladora para acertar o pavimento dos caminhos em causa, sempre com a convicção de que se trata de caminhos públicos, sendo que, nem a autora nem os seus antecessores se opuseram a estes trabalhos. Portanto, o Réu demonstrou que, desde o indicado período temporal tem mantido os indicados caminhos sob a sua administração.
Acresce que, não sendo o caminho em causa classificado por lei como pertencente ao domínio público, o pretendido reconhecimento pelo Réu de se tratar de um caminho público fundou-se ainda na presunção decorrente da sua afectação à utilidade pública.
Ensinava o Professor Marcelo Caetano que «a afectação é o acto ou a prática que consagra a coisa à produção efectiva de utilidade pública». Ora, a «enumeração legal compreende bens cuja utilidade pública se conhece através de índices, o índice mais evidente, cuja existência logo denota publicidade, é o uso directo e imediato do público. Só quando exista este índice evidente é que a lei permite que o intérprete considere públicas coisas não enumeradas categoricamente por disposição legal. (…) Há uso directo quando cada indivíduo pode tirar proveito pessoal de tal coisa pública e o uso imediato faz-se quando os indivíduos se aproveitam dos bens sem intermédio dos agentes de um serviço público»[20].
Com a presunção da dominialidade pública de um determinado caminho por via da verificação deste índice de utilização e publicidade que faz presumir a titularidade pública, visa-se obstar à apropriação por particulares de coisas públicas.
Vejamos, pois, quais os requisitos necessários para a dominialidade pública, por presunção, de um caminho de interesse essencialmente local.
Conforme já afirmámos no Acórdão deste mesmo colectivo de 23.02.2017[21], relativamente aos requisitos necessários para «a caracterização de um caminho como público, desde há muito se dividiu a jurisprudência: a) para uns, seria sempre necessário demonstrar que o caminho foi construído ou apropriado por uma pessoa colectiva de direito público; b) para outros, bastaria provar-se o uso directo e imediato pelo público em geral, desde que imemorial; c) finalmente, para uma terceira corrente, seria de aceitar o critério da construção ou apropriação do caminho pela entidade pública, mas o uso imemorial (directo e imediato) pelo público em geral constituiria uma presunção (ilidível) da dominialidade, prescindindo-se, nestes casos, da prova directa da construção ou apropriação pela entidade pública.
No sentido de pôr termo à referida divergência jurisprudencial, o Assento do STJ, de 19-04-1989, hoje com valor de jurisprudência uniformizada, firmou a seguinte jurisprudência: “São públicos os caminhos que, desde tempos imemoriais, estão no uso directo e imediato do público”.
Nesse aresto ponderou-se designadamente que: «quando a dominialidade de certas coisas não está definida na lei, como sucede com as estradas municipais e os caminhos, essas coisas serão públicas se estiverem afectadas de forma directa e imediata ao fim de utilidade pública que lhes está inerente.
É suficiente, para que uma coisa seja pública, o seu uso directo e imediato pelo público, não sendo necessária a sua apropriação, produção, administração ou jurisdição por pessoa colectiva de direito público.
Assim, um caminho é público desde que seja utilizado livremente por todas as pessoas, sendo irrelevante a qualidade da pessoa que o construiu e prove a sua manutenção.»
Não obstante, em acórdãos subsequentes e perante os casos concretos em presença, a jurisprudência, designadamente do nosso mais Alto Tribunal, tem vindo a fazer uma interpretação restritiva deste Acórdão.
Assim, tem-se entendido, por um lado, que «não pode interpretar-se aquele Assento no sentido de excluir a dominialidade de um caminho que, tendo sido construído ou legitimamente apropriado, em data recente por pessoa colectiva de direito público, foi por ela afectado ao uso público, servindo o interesse colectivo que lhe é inerente. Nestes casos, desde que se prove que o caminho foi construído ou foi legitimamente apropriado por uma autarquia, que exerce sobre ele jurisdição, administrando-o, melhorando-o e conservando-o, não pode duvidar-se que se trata de um caminho público pertencente àquela entidade pública.
A suficiência do uso imemorial a que se refere o Assento, de modo algum exclui outras vias de aquisição da dominialidade, como acontecerá quando a lei directamente integra determinada coisa na categoria do domínio público, ou quando uma pessoa de direito público, depois de a construir, produzir ou dela se apropriar, a afecta à utilidade pública»[22].
E, por outro lado - o que releva para o caso vertente -, tem-se considerado que:
«O Assento do S.T.J. de 19-4-89 carece de uma interpretação restritiva, sob pena do art. 1383 do C.C. ficar sem campo de aplicação e de todos os atravessadouros de uso imemorial terem de qualificar-se como caminhos públicos.
Tal interpretação restritiva deve ser feita no sentido da publicidade dos caminhos exigir ainda afectação à utilidade pública.
A referida afectação à utilidade pública deverá consistir no facto do uso do caminho visar a satisfação de interesses colectivos de certo grau ou relevância»[23].
Por seu turno, quanto à noção de “imemorialidade”, o entendimento mais recentemente formulado pelo Supremo Tribunal de Justiça tem considerado que «o tempo de memória útil das pessoas – isto é, de memória que pode fundamentar um juízo de prova, em tribunal – não coincide manifestamente com o tempo médio de vida do ser humano, sendo que é o tempo de memória útil que deve relevar para determinar se a memória das pessoas vivas recorda o início da utilização directa ou indirectamente»[24].
Assim, sendo dois os requisitos caracterizadores da dominialidade de um caminho: o uso directo e imediato pelo público e a imemorialidade daquele uso, pensamos ser pacífico considerar que este último requisito se verifica posto que a existência dos caminhos em causa, ainda que não com a actual largura, perde-se na memória das pessoas, situando-se a sua construção pelos antecessores da autora há cerca de 200 anos, sendo certo que, como referido no citado aresto do STJ, irreleva para o efeito quem o construiu.
A questão controvertida é a relativa a um uso generalizado do caminho do qual possa concluir-se que aquele visa a satisfação de interesses colectivos de certo grau de relevância.
Com interesse a este respeito, e para além daquela utilização imemorial, provou-se que «desde há pelo menos 40 ou 50 anos a população local utiliza aqueles caminhos como passagem de pessoas, animais e veículos quer para os terrenos agrícolas da zona, quer para acesso a feiras e a localidades e lugares vizinhos como, por exemplo, Glória, Paul de Magos e Marinhais, permitindo um acesso mais curto e rápido, o que sempre foi feito à vista de todos, sem oposição de quem quer que fosse, sem pedir autorização ou licença a ninguém, nomeadamente à autora ou seus antecessores e com a convicção de se tratarem de caminhos públicos, que sempre se encontraram abertos, franqueados às pessoas em geral e sem qualquer embaraço».
Portanto, da factualidade provada resulta, não só que os caminhos em questão se encontram afectos à utilidade pública - atento o seu uso directo e imediato pelo público em geral que desde há pelo menos 40 ou 50 anos utiliza aqueles caminhos como passagem de pessoas, animais e veículos quer para os terrenos agrícolas da zona, quer para acesso a feiras e a localidades e lugares vizinhos, ali passando sempre que entende, sem pedir autorização a ninguém e na convicção de que o pode fazer -, não tendo um uso limitado à propriedade da autora e às circundantes -; como ainda que, pese embora os caminhos não tenham sido construídos pela autarquia -, pode considerar-se terem sido legitimamente apropriados pela mesma, que há cerca de 40 anos os administra, melhora e conserva; não pode consequentemente duvidar-se que se trata de caminhos públicos, e, por isso, pertencentes àquela entidade pública.
Assim, quer por via da apropriação quer por se verificarem os requisitos para se presumir que um certo caminho é público, no caso vertente ambos os pressupostos se preenchem, pelo que a pretensão da autora/Recorrente não pode deixar de improceder.
Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, improcede o presente o recurso.
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III.2.3. - Síntese conclusiva:
I - É entendimento que cremos pacífico após a entrada em vigor do actual artigo 155.º, n.º 4, do CPC, que decorrido o prazo de dez dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada, sem que seja arguido o vício da sua falta ou deficiência, o mesmo fica sanado, não podendo oficiosamente ser conhecido pela Relação, nem podendo tal nulidade ser arguida sequer nas alegações de recurso.
II - Tal como já resultava do disposto no artigo 563.º, n.º 1, do regime pretérito, o actual artigo 463.º, n.º 1, do CPC, continua a impor a redução a escrito do depoimento de parte na sua vertente confessória.
III - A formalidade da assentada na acta da audiência de discussão e julgamento encontra-se reservada para a confissão judicial provocada, a qual, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 356.º do CC, pode ser feita tanto em depoimento de parte como em prestação de informações ou esclarecimentos ao tribunal.
IV - Mas, havendo confissão judicial, a força probatória plena contra o depoente depende da sua redução a escrito, isto porque, se o não for, é livremente apreciada pelo tribunal, mesmo que se encontre gravada.
V - De facto, a desconsideração da indicada formalidade da assentada implica que a declaração da parte, mesmo que se encontre gravada, e ainda que seja confessória, ao invés de ter o valor probatório de prova plena contra o confitente, que lhe atribui o n.º 1 do artigo 358.º do CC, passa a ser livremente apreciada pelo tribunal, nos termos do n.º 4 do mesmo normativo.
VI - Por isso, as consequências desta omissão não podem qualificar-se como não tendo influência no exame e decisão da causa.
VII - Porém, a parte do depoimento, das declarações, ou dos esclarecimentos do sujeito processual, que não assuma a natureza de confissão, não tem que ser reduzida a escrito por não ser prova tarifada, sendo um meio de prova livremente apreciado pelo tribunal.
VIII - Estando sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova, na formação da convicção pelo julgador no que tange à credibilidade da forma como foram prestadas as declarações de parte e ao peso que revistam na decisão da matéria de facto, não é irrelevante ter presente o âmbito sobre o qual as mesmas podem incidir, porquanto, em face do preceituado no artigo 466.º, n.º 1, a prestação de declarações versa sobre factos em que as partes tenham tido intervenção pessoalmente, ou sobre os quais tenham conhecimento directo.
IX - Assim, ao invés de posições apriorísticas sobre a natureza subsidiária ou supletiva deste meio de prova, diminuindo ou desconsiderando o seu valor probatório por via da mera qualidade de quem produz as declarações, ou por ter ou não estado presente na audiência final, consideramos que as mesmas devem ser apreciadas, tal qual o comando legal prescreve, ou seja, são livremente valoradas pelo juiz, no confronto da demais prova produzida.
X - Resultando da factualidade provada, não só que os caminhos em questão se encontram afectos à utilidade pública - atento o seu uso directo e imediato pelo público em geral que desde há pelo menos 40 ou 50 anos utiliza aqueles caminhos como passagem de pessoas, animais e veículos quer para os terrenos agrícolas da zona, quer para acesso a feiras e a localidades e lugares vizinhos, ali passando sempre que entende, sem pedir autorização a ninguém e na convicção de que o pode fazer -, não tendo um uso limitado à propriedade da autora e às circundantes -; como ainda que, pese embora os caminhos não tenham sido construídos pela autarquia -, pode considerar-se terem sido legitimamente apropriados pela mesma, que há cerca de 40 anos os administra, melhora e conserva; não pode consequentemente duvidar-se que se trata de caminhos públicos, e, por isso, pertencentes àquela entidade pública.
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IV - Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a presente apelação, e consequentemente, em confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente - artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
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Évora, 12 de Abril de 2018
Albertina Pedroso [25]
Tomé Ramião
Francisco Xavier

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[1] Juízo Central Cível de Santarém, Juiz 1.
[2] Relatora: Albertina Pedroso;
1.º Adjunto: Tomé Ramião;
2.º Adjunto: Francisco Xavier.
[3] Doravante abreviadamente designado CPC, na redacção aprovada pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.
[4] Cfr. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 2.ª edição,1985, págs. 669 a 672; Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 140, e abundante jurisprudência proferida nesse sentido pelos tribunais superiores, citando-se a título meramente exemplificativo o Acórdão STJ de 14-02-2013, proferido no processo n.º 806/07.0TBTND.C1.S1, e disponível em www.dgsi.pt.
[5] Caso em que ao Tribunal da Relação é agora conferida pelo artigo 662.º, n.º 2, alínea d), do CPC, a possibilidade de oficiosamente determinar que o tribunal de primeira instância fundamente a sua decisão sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, isto naturalmente, e por contraponto com as situações de nulidade, quando não exista um mínimo de fundamentação que permita a compreensão do “itinerário cognoscitivo” (cfr. Ac. STJ de 13.03.2003, acessível em www.dgsi.pt) do julgador.
[6] Pois como se refere no Ac. STJ de 21.05.2009, acessível em www.dgsi.pt “Se a questão é abordada, mas existe uma divergência entre o afirmado e a verdade jurídica ou fáctica, há erro de julgamento, não “error in procedendo”.
[7] No Acórdão proferido em 11.01.2018, no processo n.º 18/11.8T8LLE.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[8] Cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina 2017, 4.ª edição, pág. 167.
[9] Cfr. por todos o recente Ac. TRL de 30.05.2017, processo n.º 298/13.4TBSCR.L1-7, citando extensamente o Ac. TRP de 17.12.2014 e indicando no mesmo sentido outros Acórdãos que ali identifica, explicando ainda os fundamentos e vantagens desta alteração legislativa.
[10] Cfr. Acórdão n.º 118/2017 de 15.03.2017, Processo n.º 636/2016, Relator: Teles Pereira, disponível em JusNet 1474/2017.
[11] Doravante abreviadamente designado CC.
[12] Proferido no processo n.º 234/11.2TBVNO.E1, na esteira dos Acórdãos da Relação de Coimbra de 10.11.2009, proferido no Proc. 126/07.0TBPNH.C1, e da Relação de Guimarães de 15.09.2014, proferido no Proc. 1190/12.5TBGMR.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[13] Cfr. Post publicado em 11.07.2017, no Blog do IPPC, em comentário ao citado Acórdão do TRE.
[14] Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, in “AS MALQUISTAS DECLARAÇÕES DE PARTE - "Não acredito na parte porque é parte", Julho de 2015, Julgar Online, com abundantes citações de doutrina e jurisprudência a respeito do tema.
[15] Cfr. os exemplos tirados da jurisprudência citada no Estudo que antecede.
[16] A respeito da presença ou não da parte em audiência e da ligação entre esta e o valor probatório a atribuir às respectivas declarações, a propósito de um Paper do mesmo Autor publicado no Blog do IPPC, em 22.04.2017, com o título “As declarações de parte. Uma síntese”, contrapõe no mesmo local MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, que «a circunstância de a parte ter assistido à audiência final pode constituir um factor relevante para a valoração das declarações realizadas pela parte; isso justifica que o juiz pondere essa circunstância no momento da apreciação da prova, mas não que o juiz assuma, a priori, que a presença da parte declarante na audiência final diminui o valor probatório das suas declarações. Por isso, não se justifica nenhuma advertência das partes quanto a uma desvalorização probatória das suas declarações se as mesmas forem realizadas quando a parte declarante tenha assistido à audiência final».
[17] Proferido no processo n.º 04921/09, disponível em www.dgsi.pt.
[18] Cfr. Ac. do TRC de 15-12-1983, in Col. Jurisp., 1983, V, pág 275, citado no aresto do TCAS.
[19] Proferido no Processo n.º 07A981, de 08-05-2007, igualmente citado pelo TCAS, e disponível em www.dgsi.pt.
[20] In Manual de Direito Administrativo, vol. 2.º, 9.ª edição, pág. 921.
[21] Proferido no processo n.º 1954/15.8T8STR-A.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[22] Cfr. Acórdão STJ, de 21-01-2014, processo n.º 6662/09.6TBVFR.P1.S2, disponível em www.dgsi.pt.
[23] Cfr. Acórdão STJ, de 14-02-2012, processo n.º 295/04.OTBOFR.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[24] Cfr. Acórdão STJ, de 18-09-2014, processo n.º 44/1999.E2.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[25] Texto elaborado e revisto pela Relatora.