Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ MANUEL BARATA | ||
Descritores: | INSOLVÊNCIA CRÉDITOS LABORAIS COMPETÊNCIA | ||
Data do Acordão: | 09/23/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | I.- Deve distinguir-se entre legitimidade em sentido substantivo e em sentido adjetivo, a primeira dá lugar à absolvição do pedido e a segunda à absolvição da instância. II.- Esta última é a legitimidade processual que confere ao autor o direito de propor a ação – é um dos pressupostos processuais, sendo o autor parte legítima quando tem um interesse direto em demandar (artigo 30.º/1, do CPC) e recorta-se também pela relação material controvertida tal como é configurada pelo autor (n.º 3). III.- A legitimidade em sentido substantivo ou material só se aprecia no momento em que se discute o fundo ou mérito da causa, porque se prende com saber se o direito existe ou não na esfera jurídica do autor. IV.- Os funcionários da requerida têm legitimidade ativa para propor a sua insolvência por dívidas salariais, mesmo que a requerida alegue que ocorreu um despedimento coletivo ilícito. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Integral: | Procº 561/21.0T8BJA-F.E1 Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora Recorrente: (…), Lda. * No Tribunal Judicial da Comarca de Beja, Juízo Local Cível de Beja, Juiz 1, no âmbito do processo de insolvência proposto por (…) e (…), foi proferida a seguinte decisão:Pelo exposto, julga-se procedente a presente acção e, em consequência: a) Declara-se a insolvência de (…), Lda., NIPC (…), matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Beja sob o mesmo número, com Sede na Estrada Nacional (…), Km (…), s/n, (…), 7800-368 Beja, com o capital social de € 254.000,00 (duzentos e cinquenta e quatro mil euros). b) Fixo a residência da gerente da requerida – (…) – na morada supra indicada; c) Nomeio administrador da insolvência o Exmo. Sr. (…), com domicílio profissional constante da lista oficial de Administradores de Insolvência; d) Nos termos do disposto no artigo 66.º, n.º 2, do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, e sem prejuízo do disposto no artigo 67.º, n.º 1, do mesmo diploma, não se procede, neste momento, à nomeação da comissão de credores; e) Determino que a Insolvente entregue, imediatamente, ao Exmo. Sr. Administrador de Insolvência os documentos referidos no n.º 1 do artigo 24.º do CIRE; f) Decreto a apreensão, para imediata entrega ao Exmo. Sr. Administrador de Insolvência, dos elementos de contabilidade da Insolvente e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados, ou por qualquer forma apreendidos ou detidos. g) Fixo em 30 dias o prazo para a reclamação de créditos. h) Ficam os credores advertidos de que devem comunicar prontamente ao Exmo. Sr. Administrador da Insolvência as garantias reais de que beneficiem. i) Ficam os devedores do Insolvente advertidos de que as prestações a que estejam obrigados deverão ser feitas ao Exmo. Sr. Administrador da Insolvência e não ao próprio Insolvente; j) Designo para realização da Assembleia de Apreciação do Relatório, a que alude o artigo 156.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, o próximo dia 26 de Julho de 2021, pela 14.00 horas, neste Tribunal. Ficam suspensas, a partir desta data, as execuções instauradas contra o devedor, nos termos do artigo 88.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, solicitando-se, desde já, a remessa para apensação dos processos executivos pendentes, nos quais exista penhora sobre bens do mesmo. Para tanto, comunique aos processos pendentes neste Tribunal a prolação da presente sentença. * Solicite a avocação de todos os processos de execução fiscal pendentes, nos termos do artigo 180.º, n.º 2, do Código de Processo Tributário.* Custas pela massa insolvente (artigo 304.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).* Valor da causa: o valor do ativo da devedora, nos termos do artigo 15.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (artigo 306.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).* Notifique, publicite e registe cumprindo o disposto nos artigos 9.º, 37.º e 38.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.* Considerando que resulta dos autos que a massa insolvente não disporá de liquidez, determino que se proceda ao pagamento da primeira prestação relativa à remuneração (€ 1.000,00) e a provisão para despesas ao Sr. Administrador de Insolvência (duas unidades de conta), respetivamente, nos termos conjugados do disposto nos artigos 23.º, n.º 1 e 29.º n.ºs 1 e 8, da Lei 22/2013, de 26 de Fevereiro, na redação que lhe foi conferida pelo DL n.º 59/2019, de 17.04, tendo por referência o valor da remuneração prevista no artigo 1.º, n.º 1, da Portaria n.º 51/2005, de 20 de Janeiro, quantias a adiantar pelo Instituto de Gestão Financeira de Infraestruturas da Justiça, I.P..* Consigna-se que a prolação da presente sentença ocorreu no dia 7 de junho de 2021, pelas 01.10 horas.* Anote-se na agenda de turno, consignando-se que o mesmo será assegurado pela signatária.* Beja, 7 de junho de 2021*** Não se conformando com o decidido, a insolvente recorreu da sentença, formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC): A) O presente recurso de Apelação vem interposto da decisão final proferida nos autos de Ação De Insolvência de pessoa coletiva (requerida), que correram termos pelo Juiz - 1 do Juízo Local Cível de Beja, sob o processo n.º 561/21.0T8BJA, que julgou procedente a ação, e em consequência, declarou a Insolvência da requerida. B) O relacionamento que o tribunal a quo fez dos factos que considerou como provados; do facto que considerou como não provado e ainda dos factos instrumentais, conduziu à prolação da Sentença de que ora se recorre, decisão com a qual a Recorrente não se pode conformar. C) Entende o ora Recorrente, que a matéria de facto dada como não provada, nos pontos 11, 12 e 23, merecem censura e contrariam os depoimentos prestados em sede de audiência bem como dos documentos juntos aos autos em concreto os documentos números 2 e 3. D) Conforme resulta, dos autos, o sócio da recorrente, (…), foi instrumentalizado por parte de terceiros e decorrentes das ações executivas perpetuadas por empresas cujos créditos, resulta provado que a recorrente nada deve (vide documentos 2 e 3). E) Atenta, o tribunal a quo, da atuação do sócio (…), no dia 31 de março, com a entrega de um documento, que enuncia o despedimento coletivo dos trabalhadores. F) Certo é que a gerência da sociedade é função, dever e inscrita a favor do sócio (…), que à data se encontrava detido, mas não impedido de exercer as suas funções de gerência. G) O que de facto, sucedeu, e alegado e provado, pelo representante legal da sociedade, é que desde a sua detenção no dia 8 de março, e a atos que decorreram até 31 de março de 2021, foram instrumentalizados determinados atos de gerência, previamente encetados por entidades terceiras, na pessoa do sócio (…), e que resultam dos arrestos de equipamentos e remoção dos mesmos das instalações. H) Decorre do depoimento do Sr. (…), requerente nos presentes autos, que para além do dia 31 de março de 2021, ficou o próprio como outros trabalhadores, a laborar nas instalações da empresa, para o terminar determinados trabalhos que estavam em curso, até meados do mês de abril. I) Temos pois, que determinados trabalhadores, ao contrário do referido, não terminaram os seus vínculos no dia 31 de março de 2021, pois estiveram a laborar, até meados de abril, para terminar os referidos trabalhos e sem qualquer intervenção e decisão do sócio (…), pois o mesmo nenhuma intervenção teve nessa decisão, assacando-lhe como única decisão a do despedimento coletivo. J) De Facto, o despedimento foi considerado ilícito, pela própria Segurança Social, que informou e notificou os trabalhadores, in casu, o Sr. (…), que o despedimento foi considerado ilícito por incumprimento dos pressupostos formais constantes e inscritos no Código do Trabalho, para efeitos de atribuição do subsídio de desemprego. K) Como demonstrado e alegado pela Recorrente, os recorridos, não tem legitimidade processual para intentar a presente ação de insolvência, pois não existem créditos laborais que alegam e serem detentores, e a existir créditos laborais, devem os mesmos serem peticionados no competente tribunal de Trabalho. L) Os recorridos são parte ilegítima nos presentes autos, sendo esta uma exceção dilatória, que importa a absolvição da instância da requerida. M) Bem como o tribunal a quo é incompetente em razão da matéria para o julgamento de créditos laborais, por despedimento coletivo ilícito, por pessoa jurídica sem poderes para o ato. N) Pelo que, em consequência da Matéria de Facto Dada Como Provada, impõe-se a alteração da presente decisão e a sua substituição por outra que, aplicando corretamente as normas jurídicas violadas, conclua pela improcedência da ação. O) Da Matéria de Facto Dada Como Não Provada, in casu, o Ponto 31., da qual entende o Tribunal a quo que não se deu como provado que “O imóvel onde se localiza a sede da requerida tem o valor comercial de € 3.000.000,00”, merece censura e alteração. P) Do referido ponto factual, resultou claro que o tribunal a quo se cingiu aos depoimentos dos recorridos, das quais retirou que o valor do imóvel teria que ser o correspondente ao valor do seu ativo matricial, pela razão, de que o mesmo valor tem em conta a aquisição do imóvel pelo valor de € 800.000,00 conforme resulta do ponto 29 dos factos dados como provados. Q) Os equipamentos, as máquinas retiradas, per si, satisfaziam e satisfazem o pagamento “quase integral dos valores efetivos que existem em pagamento e em dívida pela recorrente”. R) Mas resulta ainda das declarações de (…) que a solvibilidade da recorrente é possível e requerida, pois os trabalhos desenvolvidos pela própria, estão adjacentes à realização de trabalhos com recurso à sua mão de obra especializada e neste item, foi referido pelo próprio. S) O valor do imóvel fundamentando pelo legal representante da recorrente (…), esta fundamentada, na sua articulação comercial, pela localização da empresa, pelos trabalhos em curso e a desenvolver bem como dos metros quadrados aprovados pelas entidades oficiais, para a implementação do seu projeto de expansão. T) A recorrente, era e é uma empesa apetecível aos “abutres” da sociedade, mas é acima de tudo e factualmente viável a sua recuperação financeira, sendo que, o valor do mercado do imóvel alegado de € 3.000.000,00 corresponde à realidade e não foi posta em causa por qualquer outra prova nos autos. U) Pelo que, em consequência com a alteração do ponto 31., da Matéria de Facto Dada Como Não Provada, para, Matéria de Facto dado como Provada, impõe-se a alteração da presente decisão e a sua substituição por outra que, aplicando corretamente as normas jurídicas violadas, conclua pela improcedência da ação. Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o Mui Douto suprimento de Vossas Excelências, a decisão sub judice ser anulada e substituída por outra que determine a improcedência da ação. * Foram dispensados os vistos. * 1.- A incompetência material do tribunal a quo. 2.- A ilegitimidade dos requerentes da insolvência. 3.- A impugnação da matéria de facto. * A matéria de facto fixada na 1ª instância é a seguinte:A) FACTOS PROVADOS 1. A requerida tem por objeto social a indústria metalomecânica e fabricação de estruturas metálicas variáveis; construção, reparação e manutenção naval; compra, venda e locação de bens móveis e imóveis, direta ou indiretamente conexos com aquelas atividades; fabricação de tubos, condutas, perfis ocos e respetivos acessórios de aço; construção de embarcações, metálicas e estruturas flutuantes, reparação e manutenção de produtos metálicos, aluguer de máquinas e equipamentos para construção e engenharia civil, consultoria, engenharia, projetos e investimentos. 2. Foi constituída em 28/08/2013, com o capital social de € 150.000,00, repartido pela seguinte forma: • (…) – uma quota de € 75.000,00; • (…) – uma quota de € 75.000,00. 3. A sociedade obriga-se com a assinatura de um gerente. 4. (…) foi instituído como gerente desde a data de constituição da requerida. 5. Por menção de depósito …/2014-8-13, foi inscrita no registo comercial a cessão de quotas de (…) a (…). 6. Por menção de depósito …/2019-3-26 foi inscrita no registo comercial a cessão da quota de € 75.000,00, de (…) a (…). 7. Pela AP (…), de 2019/03/28, foi averbada no registo comercial a cessação de funções como gerente do sócio (…), tendo como causa renúncia à gerência, datada de 14.03.2019. 8. Pela AP (…), de 21/10/2019, foi averbado no registo comercial o aumento de capital de € 104.000,00, sendo o capital após aumento de € 254.000,00, realizado em dinheiro e subscrito pelos sócios na proporção das suas quotas, repartido pela seguinte forma: • (…) – uma quota de € 127.000,00; • (…) – uma quota de € 127.000,00. 9. O sócio gerente da requerida, (…), encontrou-se sob detenção judicial entre 7 de março e meados de abril de 2021. 10. Os requerentes da insolvência foram trabalhadores da requerida, tendo a requerente (…) funções na área administrativa e financeira e o requerente (…) na chefia de produção. 11. No dia 31 de março de 2021, o sócio da requerida (…) reuniu em Beja com todos os trabalhadores e informou que a empresa não tinha condições para continuar a laborar e que ia encerrar, sendo esse o último dia de trabalho de todos os trabalhadores. 12. Em confirmação da comunicação, o sócio (…) subscreveu e entregou uma carta aos trabalhadores, datada de 31/03/2021, referindo: “expressamente declaro que nesta data procedi ao despedimento de todos os funcionários daquela sociedade, em função da mesma não dispor em carteira de contratos que lhe permitam manter a laboração, o que provocou a total ausência de fundos para cumprir com as obrigações salariais perante os trabalhadores.” 13. (…) auferiu no mês de março de 2021 o salário líquido de € 1.140,50, sendo € 1.150,00 de vencimento base, € 167,86 de subsídio de refeição, € 250,00 de ajudas de custo. 14. A requerida não pagou à requerente (…) os valores referentes a 11 dias de férias não gozadas, proporcionais de férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e indemnização pela cessação do contrato de trabalho, tendo em conta a sua antiguidade reportada a 07/06/2016, no valor total de € 6.689,64, sendo o valor referente a férias não gozadas € 700,00, proporcionais de férias de 2021, no valor de € 345,21, subsídio de férias de 2021, no mesmo valor e subsídio de natal, no valor de € 283,56. 15. (…) auferiu no mês de março de 2021 o salário líquido de € 1.303,70, sendo € 1.830,00, de vencimento base e € 187,85 de subsídio de refeição. 16. A requerida não pagou ao requerente (…) os valores referentes a 10 dias de férias não gozadas, proporcionais de férias, subsídio de férias, subsídio de Natal e indemnização pela cessação do contrato de trabalho, tendo em conta a sua antiguidade reportada a 03/03/2015, no valor total de € 9.464,56, sendo o valor referente a férias não gozadas € 610,00, proporcionais de férias de 2021, no valor de € 451,23, subsídios de férias e de Natal de 2021, respetivamente, no mesmo valor. 17. Desde o dia 31 de março de 2021, a requerida não efetuou qualquer comunicação a qualquer dos requerentes ou dos demais trabalhadores despedidos relativamente à sua situação laboral, no total de vinte. 18. Os requerentes já se encontram a trabalhar para entidade diversa da requerida. 19. Não subsistem salários em atraso dos trabalhadores da requerida. 20. Entre 30.04.202 e 31.03.2021 a requerente (…) emprestou à requeria a quantia total de € 164.808,92, que a requerida lhe devolveu. 21. Todas as máquinas e equipamentos da requerida foram arrestados e removidos das instalações durante o mês de abril, no âmbito de processo judicial promovido pela fornecedora (…) – Empreendimentos Industriais, Lda.. 22. A Requerida não está em funcionamento, encontrando-se a sede da mesma encerrada e sem qualquer trabalhador. 23. A requerida deve a fornecedores o montante de € 400.000,00 a € 500.000,00. 24. Encontram-se pendentes contra a requerida as seguintes ações: - Ação executiva proposta pelo Banco (…), S.A., a correr termos sob o n.º 1315/20.7T8BJA, no Juízo Central Cível e Criminal de Beja – Juiz 4 - do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, com a quantia exequenda de € 1.185.621,59 (um milhão e cento e oitenta e cinco mil e seiscentos e vinte e um euros e cinquenta e nove cêntimos), encontrando-se penhorado o Prédio urbano sito na Estrada Nacional (…), ao KM (…) Beja, descrito na conservatória do Registo Predial de Beja sob o número (…), da freguesia de Beja, Santiago Maior, e inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de Beja (Santiago Maior e São João Baptista), sob o artigo (…). - Ação executiva proposta por (…) – Empreendimentos Industriais, Lda., a correr termos sob o n.º 451/21.7T8BJA, no Juízo Central Cível e Criminal de Beja – Juiz 1 - do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, com a quantia exequenda de € 178.000,00 (cento e setenta e oito mil euros), sem bens penhorados. - Ação executiva proposta pelo (…), Unipessoal, Lda., a correr termos sob o n.º 1478/20.1T8BJA, no Juízo Local Cível de Beja – Juiz 1 - do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, com a quantia exequenda de € 38.830,33 (trinta e oito mil, oitocentos e trinta euros e trinta e três cêntimos). - Ação executiva proposta por (…) – Empreendimentos Industriais, Lda., a correr termos sob o n.º 448/21.7T8BJA, no Juízo Local Cível de Beja – Juiz 1 - do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, com a quantia exequenda de € 9.900,00 (nove mil e novecentos euros), encontrando-se penhorado bem móvel, com atribuição do valor patrimonial de € 6.800,00. - Ação executiva proposta por apenso à ação comum que condenou a requerida no pagamento da quantia de € 44.290,00 ao Autor (…), a correr termos sob o n.º 1714/19.7T8BJA.1, no Juízo Local Cível – J1, do Tribunal da Comarca de Beja. 25. A requerida deduziu oposição mediante embargos de executado ao processo a correr termos sob o n.º 1315/20.7T8BJA, no Juízo Central Cível e Criminal de Beja – Juiz 4 - do Tribunal Judicial da Comarca de Beja. 26. No mesmo processo, a Segurança Social reclamou créditos devidos pela requerida na qualidade de Entidade Empregadora, das contribuições relativas ao período Dezembro de 2020, Janeiro de 2021, Fevereiro de 2021 e Março de 2021, no valor de € 31.353,79 (trinta e um mil, trezentos e cinquenta e três euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros no valor de € 317,40; como contribuinte do regime geral, as contribuições e referentes ao período contributivo de Abril de 2020 a Outubro de 2020, no valor € 55.054,68 (cinquenta e cinco mil e cinquenta e quatro euros e sessenta e oito cêntimos); dívida essa que se encontra garantida com hipoteca voluntária, registada sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo predial de Beja sob o n.º …/20041105, freguesia de Santiago Maior, e a ser paga no âmbito do Plano Prestacional n.º 1…/2020. 27. A requerida é proprietária do imóvel onde se encontra sediada, onerado com hipotecas registadas a favor do Banco (…) SA até ao montante máximo de € 596.500,00 e € 402.000,00 e ainda penhoras no âmbito dos processos de execução 315/20.7T8BJA e 1714/19.7T8BJA.1, a correr termos respetivamente no Juízo Central Cível e Criminal de Beja – Juiz 4 – e no Juízo Local Cível de Beja – J1, do Tribunal Judicial da Comarca de Beja. 28. O gerente da requerida é vogal do conselho de administração da sociedade (…) Invest, SA, constituída em 14.05.2020, tendo exercido o cargo de Presidente até 08/06/2020. 29. O imóvel em que se localiza a sede da requerida foi adquirido pelo valor de € 800.000,00. * B) FACTOS NÃO PROVADOS30. A requerente (…), em comunicação com o ilustre mandatário à data da requerida, o Sr. Dr. (…), em data que não se apura a certo, mas que ocorreu entre o dia 8 e 27 de março de 2021, comunicou a este, que se despedia da empresa, tendo inclusive mencionado que iria trabalhar para outra empresa. 31. O imóvel onde se localiza a sede da requerida tem o valor comercial de € 3.000.000,00. *** Conhecendo.1.- A incompetência material do tribunal a quo. Alega a recorrente que o tribunal a quo é incompetente em razão da matéria para o julgamento de créditos laborais por despedimento coletivo ilícito, por pessoa jurídica sem poderes para o ato, não indicando, contudo, qual a jurisdição que seria competente, presumindo-se que seria a jurisdição laboral. O artigo 40.º/1, da atual LOSJ, aprovada pelo 62/2013, de 26-08, dispõe que Os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional, pelo que a competência dos tribunais comuns é residual, abrange apenas a que não for atribuída a outra ordem de tribunais. * 2.- A legitimidade dos requerentes da insolvência.Alega a recorrente que os autores não têm legitimidade para requerer a sua insolvência por serem seus funcionários e, ao terem sido objeto de um despedimento ilícito que foi revertido pelo gerente da empresa, com pagamento do que lhes era devido, inexistem salários em atraso, pelo que não são credores da sociedade insolvente requerida. Em primeiro lugar há que distinguir entre legitimidade em sentido substantivo e em sentido adjetivo, a primeira dá lugar à absolvição do pedido e a segunda à absolvição da instância. Esta última é a legitimidade processual, que confere ao autor o direito de propor a ação – é um dos pressupostos processuais, sendo o autor parte legítima quando tem um interesse direto em demandar (artigo 30.º/1, do CPC) e, na falta de indicação de lei em contrário, recorta-se também pela relação material controvertida tal como é configurada pelo autor (n.º 3). A legitimidade em sentido substantivo ou material só se aprecia no momento em que se discute o fundo ou mérito da causa, porque se prende com saber se o direito existe ou não na esfera jurídica do autor. É este o entendimento de Castro Mendes in Direito Processual Civil, Vol. II, FDL, Lisboa, 1987, págs. 215 quem não é proprietário da coisa é parte ilegítima para pedir em juízo indemnização pela sua destruição; etc.). Esta legitimidade, porém, é figura diferente daquela que temos vindo estudando. Assim, se o tribunal conclui pela ilegitimidade, entra no mérito da causa (tal pessoa não tem o direito de anular o contrato; tal pessoa não é credora de perdas e danos; etc. …) e profere uma absolvição do pedido. Quanto à legitimidade para propor a ação estipula o artigo 20.º/1, do CIRE: 1 - A declaração de insolvência de um devedor pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados (…). Ora, os autores propuseram a ação de insolvência configurando a ação como credores de dívidas salariais da requerente, pelo que são considerados titulares do interesse relevante para efeitos de legitimidade – têm um interesse direito na causa –, e são sujeitos da relação material controvertida tal como por eles foi configurada. Mas isso não significa que tenham legitimidade em sentido material porque esta só é aferida no momento em que se decide a ação – se a ação é procedente, confirma-se a legitimidade ativa para propor a ação e a legitimidade substantiva, que confirma ou integra o direito invocado na esfera jurídica do autor. Se a ação é improcedente, ainda que os autores sejam titulares de legitimidade processual, não se confirma a legitimidade material e o réu é absolvido do pedido. No caso dos autos, os autores tinham legitimidade processual para propor a ação e, após discussão da causa, demonstrou-se que também têm legitimidade substantiva porque lhes foi reconhecido o direito de crédito invocado. Assim sendo, improcedem as conclusões, nesta parte. * 3.- A impugnação da matéria de facto.Alega a recorrente que “a matéria de facto dada como não provada, nos pontos 11, 12 e 23, merecem censura e contrariam os depoimentos prestados em sede de audiência bem como dos documentos juntos aos autos em concreto os documentos números 2 e 3. “ Ora, compulsados os autos, verifica-se que os pontos dados como não provados constituem os nºs 30 e 31, pelo que se mostra inviável apreciar as conclusões atinentes. Mesmo considerando que os pontos que se pretende impugnar sãos os 11, 12 e 13 da matéria de facto dada como provada (e não da matéria dada como não provada) a recorrente não deu cumprimento ao que dispõe o artigo 640.º/1, b) e c), do CPC, uma vez que não indicou com a precisão exigida legalmente os meios probatórios constantes do processo, designadamente os registos de gravação de onde retira conclusão diversa do decidido. Para além disso e mesmo que assim não fosse, da análise dos documentos nºs 2 e 3 juntos com a contestação não se pode concluir como a recorrente, uma vez que um mero registo contabilístico onde consta que foi tudo pago à credora Pemar, Lda., não é suficiente para retirar poder probatório à existência de várias ações executivas que se encontram pendentes, em que a referida empresa é exequente, designadamente Procºs 451/21.7T8BJ e 448/21.7T8BJA, para além de execução de outras empresas e das dívidas à Segurança Social. Assim, sendo, improcedem as conclusões nesta parte. * Impugna ainda a recorrente a matéria constante do ponto 31 da matéria de facto não provada, alegando que deve ser dada como provada, matéria que tem a seguinte redação:O imóvel onde se localiza a sede da requerida tem o valor comercial de € 3.000.000,00. Fundamenta a sua pretensão nas declarações da testemunha (…), tendo este referido, quanto a esta matéria, que: “Os trabalhadores, não foram despedidos por mim, e já falei com alguns para que em breve voltem a trabalhar, pois temos muitos trabalhos para realizar”. Referindo ainda “…que existem e tem investidores interessados na operacionalidade da empresa, tendo dinheiro para investir e colocar na empresa, para pagamento das dívidas e injeção de capital na empresa”. Como resulta deste depoimento, ele é insuficiente para dar como provado que o imóvel onde a insolvente tem a sua sede tem o valor de mercado de 3 milhões de euros, uma vez que a testemunha não se referiu ao valor do imóvel. Para além disso, incidem sobre o imóvel duas hipotecas no valor de € 596.500,00 e € 402.000,00 e ainda penhoras no âmbito dos processos de execução n.º 315/20.7T8BJA e 1714/19.7T8BJA.1, a que acrescem os valores em dívida a fornecedores, no montante de € 400.000,00 a € 500.000,00 (ponto 23 da matéria de facto provada). Assim sendo, deve concluir-se que não se demonstrou que o imóvel onde se localiza a sede da requerida tem o valor comercial de € 3.000.000,00, pelo que são também improcedentes as conclusões da recorrente nesta parte. A apelação é, pois, improcedente in totum, pelo que se confirma a decisão recorrida. *** Sumário: (…) *** DECISÃO. Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma a sentença recorrida. Custas pela recorrente – artigo 527.º CPC. *** Évora, 23-09-2021 José Manuel Barata (relator) Conceição Ferreira (não assina, mas tem voto de conformidade) Emília Ramos Costa |