Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MÁRIO COELHO | ||
Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO RENDA ACTUALIZAÇÃO DE RENDA | ||
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Data do Acordão: | 04/07/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | 1. Pretendendo a arrendatária impugnar o procedimento de actualização da renda e transição para o NRAU, por incumprimento das formalidades previstas nos n.ºs 3 e 4 do artigo 10.º do NRAU, não pode alegar apenas que não recebeu as duas cartas – a primeira e a segunda, remetida 30 a 60 dias sobre a data do envio da primeira. 2. Compete-lhe o ónus de alegar e provar que não ocorreu culpa sua no não recebimento de tais cartas. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Sumário: (…) Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Local Cível de Portimão, (…) – Estudos e (…), Lda., demandou (…) e (…), alegando ser locatária, e as Rés locadoras, do prédio urbano sito no Largo do (…), Av. n.º …, freguesia e concelho de Portimão, conforme escritura pública datada de 22.05.1975, estando a renda mensal fixada em € 483,00, mercê de diversas actualizações. Sucede que as Rés instauraram acção executiva (Proc. n.º 666/17.2T8SLV, do Juízo de Execução de Silves), reclamando o pagamento de € 11.545,32, correspondente à diferença entre o valor da renda paga pela Autora (€ 483,00) e o valor da renda alegadamente devida (€ 850,00), por via de actualização da renda efectuada ao abrigo do NRAU. Alegou que o procedimento de actualização da renda não é válido, pois as missivas foram dirigidas para moradas diferentes e nunca recebidas. Mesmo a notificação judicial avulsa que lhe foi dirigida não é válida, pois o legal representante da A. não aceitou receber tal notificação e a procuração do advogado das Rés que promoveu essa notificação é nula por vício de forma, por não constar de instrumento público, documento com reconhecimento de assinatura ou documento autenticado. Em consequência, formulou os seguintes pedidos (já ampliados mercê de requerimento apresentado antes da contestação): «a) ser declarado nulo e ineficaz o processo de transição para o NRAU do Contrato de Arrendamento referido no artigo 3.º e actualização da respectiva renda levadas a cabo pelo Sr. Dr. (…), declarando-se, em consequência que: - o Contrato de Arrendamento mencionado no artigo 3.º se mantém inalterado quanto ao seu tipo e duração, não ficando submetido ao NRAU; - a renda mensal ilíquida respeitante ao contrato de arrendamento mencionado no artigo 3.º é de € 483,00. b) ser declarada nula e ineficaz a resolução do Contrato de Arrendamento identificado no artigo 3.º e titulada pela Notificação Judicial Avulsa referida em 23.º; c) serem as Rés condenadas a tal verem reconhecido nos termos peticionados em a) e b); d) serem as Rés condenadas a pagarem à Autora uma indemnização correspondente: i) à totalidade da quantia exequenda da Execução n.º 666/17.2T8SLV (despesas e honorários de A.E. incluídos), ou, se assim se não entender, ao preço de venda ao público (PVP) praticado por esta dos bens que vierem a ser penhorados e/ou vendidos no âmbito da Execução n.º 666/17.2T8LSV, a correr termos pelo Juízo de Execução de Silves desta Comarca de Faro; ii) ao valor dos honorários do Mandatário da Autora no valor de, pelo menos, € 2.000,00 (acrescido de IVA à taxa legal em vigor); iii) indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 2.500,00; Ou, se assim se não entender, serem as Rés condenadas no pagamento à Autora dos valores referidos em 21.º (indemnização equivalente à totalidade da quantia exequenda na Execução n.º 666/17.2T8SLV (despesas e honorários de A.E. incluídos), ou, se assim se não entender, ao preço de venda ao público (PVP) praticado por esta de todos os bens que vierem a ser penhorados e/ou vendidos no âmbito da Execução n.º 666/17.2T8LSV; e) serem as Rés condenadas no pagamento das custas.» Apenas a Ré (…) apresentou contestação, alegando a regularidade do procedimento de transição para o NRAU e actualização da renda, sendo que as comunicações dirigidas à A. não foram recepcionadas apenas por causa a esta imputável, pelo que produziram todos os seus efeitos legais. A notificação judicial avulsa produziu os seus efeitos, apesar da recusa de recebimento por parte do legal representante da Autora, e o mandato das locadoras estava regularmente constituído. Ademais, a Autora foi citada para os termos da Execução n.º 666/17.2T8SLV e não deduziu ali oposição, motivo pelo qual não pode invocar neste processo a defesa que ali deveria ter deduzido. Foi proferida decisão que absolveu as Rés da instância, por inadequação processual, mas, interposto recurso pela Autora, por Acórdão de 11.07.2019 deste Tribunal da Relação de Évora (publicado na página da DGSI), aquela decisão foi revogada e ordenado o prosseguimento dos autos. Regressados os autos à primeira instância, o processo foi instruído com a prova oferecida pelas partes e designada data para julgamento. Após, foi proferida sentença julgando a causa totalmente improcedente. São as seguintes as conclusões do recurso apresentado pela A.: 1) A sentença sob recurso julgou a acção instaurada pela aqui Recorrente improcedente e, em consequência, absolveu as Rés da totalidade dos pedidos; fundamentando tal decisão, essencialmente, no facto de as missivas mencionadas nos pontos 5º e 6º dos factos provados terem sido remetidas pelo advogado das rés para a morada que coincide com a da localização do locado; morada essa que tem, contudo, duas des ignações diferentes, como decorre do próprio contrato de arrendamento: Av. n.º (…) ou Av. (…). 2) Com todo o respeito que é devido, estamos em total desacordo com o decidido pelo Tribunal de Primeira Instância e respectivos fundamentos, considerando que a sentença, para além de ter feito uma errada apreciação da prova produzida (ou padecer de erro material), está ferida do vício da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), parte final, do CPC, pois, para julgar improcedente a acção instaurada pela aqui Recorrente, fundamentou tal decisão em factos que não foram alegados pelas Rés e, por isso, sobre os quais não se podia pronunciar. 3) Atenta a prova documental junta aos autos, o ponto 6º dos Factos Provados, certamente por mero lapso da Mmª. Juiz a quo, encontra-se incorrectamente julgado; pelo que deve ser reapreciada a matéria de facto quanto a esta concreta questão. 4) Do documento 4 junto com a p. i. resulta que, por carta datada de 06/06/2013, enviada para a Ré a 07/06/2013, o Sr. Advogado (…) tornou a remeter à Autora nova carta registada com aviso de recepção, com o mesmo teor da missiva descrita em 3.º dos factos provados, a qual foi endereçada para a Av. D. (…), 8500-505 Portimão, e não para a Av. n.º (…) da Zona do (…), 8500-505 Portimão, como se refere no ponto 6º dos Factos Provados da sentença sob recurso. 5) Assim, deve o Ponto 6º dos Factos Provados ser alterado, passando o mesmo a ter a seguinte redacção: “Por carta datada de 06/06/2013, enviada para a Ré a 07/06/2013, o Sr. Advogado (…), também na supramencionada qualidade de mandatário das rés, tornou a remeter à Autora nova carta registada com aviso de recepção, com o mesmo teor da missiva descrita em 3º dos factos provados, a qual foi endereçada para a Av. (…), 8500-505 Portimão, tendo a mesma sido devolvida com a menção «objecto não reclamado».” 6) Atentos os factos alegados pela Autora, o teor da Contestação deduzida pela Ré … (que se limitou a impugnar os mesmos) e, bem assim, a prova documental junta aos autos, não poderia o Tribunal de Primeira Instância, concluir pela improcedência da acção, fundamentando tal decisão, no facto de «as missivas mencionadas nos pontos 5º e 6º [dos factos provados] foram remetidas, pelo advogado das rés, através de carta registada com aviso de recepção, para a morada que coincide com a da localização do locado; morada essa que tem, contudo, duas designações diferentes, como decorre do próprio contrato de arrendamento: Av. n.º (…), ou Avenida (…)». 7) O facto de a “Av. n.º (...) da Zona do (…)” e a “Av. (…)” constituírem o mesmo local, como invoca a Mmº. Juiz a quo na sentença sob recurso, constitui matéria manifestamente impeditiva, modificativa ou extintiva do efeito jurídico dos factos articulados pela autora e que carecia de ser alegada pelas partes – artigo 576.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. 8) Só às partes cabe alegar os factos principais da causa, isto é, os que integram a causa de pedir e os que fundam as excepções – artigo 5.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. 9) A douta decisão sob recurso viola frontalmente o disposto no artigo 5.º do CPC pondo, assim, em crise, o princípio do dispositivo, o princípio da auto-responsabilidade das partes e o princípio da eventualidade ou da preclusão. 10) Para a hipótese de assim se não entender, o que apenas por dever de patrocínio se admite, certo é que, da prova produzida em julgamento não resulta que as moradas constantes das duas comunicações referidas pela Autora nos artigos 20º a 22º da p.i. constituam ambas, como refere a Mm.ª Juiz a quo, a morada do locado. 11) Enquanto que no Contrato de Arrendamento junto com a p. i., verificamos que foi declarado pelo então Senhorio (…) dar «de arrendamento à Sociedade mandante do segundo outorgante, parte do rés do chão do dito prédio, com entrada própria pela Av. n.º (…) ou Avenida D. (…), sem número de polícia, (…)», os endereços feitos constar pelo Sr. Dr. (…) nas comunicações datadas de 30/04/2013 e 06/06/2013 são Av. n.º (…) da Zona do Dique, 8500-505 Portimão e Av. (…), 8500-505 Portimão, respectivamente. 12) «Avenida número (…)» referida no Contrato de Arrendamento não é o mesmo que «Avenida n.º … da Zona do …» constante na missiva das Rés de 30/04/2013. 13) Acresce que, a morada de localização do locado constante da respectiva certidão do registo predial (junta à p. i. como documento 1) não é nenhuma daquelas feitas constar pelo Mandatário das Senhorias nas comunicações por si remetidas à Autora, nem aquelas referidas pelo então senhorio no Contrato de Arrendamento, mas sim uma outra: Largo do (…) – Avenida n.º (…). 14) Dos factos provados resulta que o mandatário das Rés remeteu à Autora a comunicação prevista no artigo 50.º do NRAU para três endereços diferentes, não sendo possível determinar, com suficiente grau de certeza, que os endereços constantes das últimas duas missivas dizem respeito à mesma morada e/ou à morada do locado. 15) Tendo as missivas enviadas para a aqui Recorrente o sido para três moradas diferentes, não foram cumpridas as formalidades previstas no artigo 10.º, nºs. 3 e 4, do NRAU (na redacção da Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto – com início de vigência a 12 de Novembro de 2012). 16) Assim sendo, o processo de actualização de rendas iniciado pelas Rés não foi validamente concluído e, em consequência, nem o Contrato de Arrendamento identificado no ponto 3º dos Factos Provados se convolou em Contrato de Arrendamento com Prazo Certo de Cinco Anos, nem o valor da renda devida pela Autora às Rés se actualizou, a partir de Setembro de 2013, para € 850,00 mensais. 17) A douta sentença sob recurso violou, por erro de interpretação e/ou de aplicação, os artigos 5.º, 412.º, 576.º, n.º 2, 579.º (a contrario), 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil e artigos 9.º, 10.º e 50.º do NRAU (na redacção da Lei nº 31/2012, de 14 de Agosto – com início de vigência a 12 de Novembro de 2012). Não foi oferecida resposta. Dispensados os vistos, cumpre-nos decidir. Da impugnação da matéria de facto Não foi produzida prova testemunhal, baseando-se a convicção apenas no acordo das partes ou em documentos apresentados aos autos e não impugnados. A A. impugna o ponto 6.º do elenco fáctico, argumentando que a carta remetida a 06.06.2013 foi endereçada para a Av. (…), e não para a Av. n.º (…) da Zona do (…), e que tal facto resulta do documento n.º 4 anexo à petição inicial. De facto, a referida carta foi endereçada para a Av. D. (…), pois tal resulta da leitura da cópia anexa à petição inicial, confirmada pela Ré (…), que apresentou cópia idêntica com o seu requerimento de 29.09.2021. Em consequência, usando dos poderes conferidos pelo art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, cumpre corrigir nesta parte o referido ponto 6.º do elenco fáctico, fazendo constar a morada tal como consta do respectivo documento. Nesta medida, a impugnação fáctica procede. A matéria de facto é assim fixada: 1.º O prédio urbano sito no Largo do (…), Av. n.º …, freguesia e concelho de Portimão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão sob o n.º (…), encontra-se registado, na sequência de partilha efectuada por óbito de J(…), a favor das Rés, sendo cada uma titular de ½ do direito de propriedade incidente sobre o referido bem imóvel. 2.º Através de escritura pública, outorgada no dia 22 de Maio de 1975, no Cartório Notarial de Portimão, (…), cedeu à Autora (…) – Estudos e (…) Hoteleiros, Lda., pelo período de três meses renováveis, com início em 01 de Janeiro de 1974, para a instalação de um stand de equipamento hoteleiro, mediante o pagamento da contraprestação mensal de 12.000$00 (doze mil escudos) o uso e a fruição de parte do rés-do-chão do prédio urbano referido em 1.º, que consta de um armazém, instalações sanitárias e uma arrecadação, com entrada própria pela Av. n.º (…) ou Av. (…), sem número de polícia. 3.º No dia 12 de Março de 2013, o Sr. Advogado (…), na qualidade de mandatário das Rés (…) e (…), remeteu à Autora, para a morada sita na Rua dos (…), n.º 24, (…), em Leiria, carta registada com aviso de recepção, datada de 30 de Março de 2013, da qual constam os seguintes dizeres: «Na qualidade de mandatário das senhoras (…) e (…), proprietárias do prédio sito nas Avs. n.º (…) e (…) da Zona do Porto de Portimão, freguesia e concelho de Portimão, de que a sociedade (…) – Estudos e (…) Hoteleiros, Lda., é arrendatária da loja correspondente ao r/ch, com entrada pela Av. n.º (…) da Zona do (…) de Portimão, o qual se encontra descrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo (…), venho comunicar a V. Ex.ª a intenção das minhas constituintes procederem à actualização da renda para o valor de € 850,00 (oitocentos e cinquenta euros), bem como alteração do tipo de contrato e respectiva duração. O contrato de arrendamento é de prazo certo de 5 anos, podendo renovar-se por períodos de 1 ano, desde que não haja oposição de qualquer das partes a sua renovação, tudo conforme art.º 50.º da Lei supra-referida. Tem V.ª Ex.ª o prazo de 30 (trinta) dias para responder nos termos do artigo 51.º da referida lei. Anexo: a) Duas procurações; b) Cópia da caderneta predial urbana, da qual o valor do locado é de 84.452,50 (oitenta e quatro mil quatrocentos e cinquenta e dois euros e cinquenta cêntimos), avaliado nos termos do artigo 38.º e seguintes do CIMI, no ano de 2012.» 4.º A referida missiva foi devolvida com menção «objecto não reclamado». 5.º Em 30 de Abril de 2013, o Sr. Advogado tornou a remeter, na supramencionada qualidade, à A. nova carta registada com aviso de recepção, com o mesmo teor da missiva transcrita em 3, a qual foi endereçada para a Av. n.º (…) da Zona do (…), 8500-505 Portimão, tendo a mesma sido devolvida com as menções «não atendeu» e «objecto não reclamado». 6.º Em 06 de Junho de 2013, o Sr. Advogado tornou a remeter, também na supramencionada qualidade de mandatário das Rés, à A. nova carta registada com aviso de recepção, com o mesmo teor da missiva transcrita em 3, a qual foi endereçada para a Av. (…), 8500-505 Portimão, tendo a mesma sido devolvida com a menção «objecto não reclamado». 7.º As procurações que foram juntas às comunicações referidas em 3.º, 5.º e 6.º, datam ambas de 01 de Março de 2013, e por via de tais procurações as Rés constituíram seu bastante procurador o Sr. Dr. (…), advogado, com escritório na Av. (…), n.º 30, 3.º, 1150-018, Lisboa, a quem declararam conferir “os mais amplos poderes gerais forenses, em direito permitidos, bem como poderes especiais para resolver contratos de arrendamento urbano, habitacionais, ou para outros fins, por quaisquer fundamentos legais e designadamente por falta de pagamento de rendas, proceder as respectivas comunicações dos arrendatários e ainda proceder a notificação dos arrendatários para a transição para o Novo RAU e actualização da renda nos termos da Lei n.º 6/2006 de 27 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, requerendo e assinando tudo para os indicados fins, podendo substabelecer.” 8.º Em 03 de Outubro de 2014, as Rés requereram a notificação judicial avulsa da autora, com vista a dar conhecimento à notificanda: 1. da resolução do contrato mencionado em 2.º, com fundamento na falta de pagamento da renda; 2. da possibilidade da notificanda pôr termo à mora no prazo de um mês contado da data da notificação, nos termos do n.º 3 do artigo 1084.º do Código Civil, devendo no referido prazo, proceder ao pagamento às notificantes do montante de € 7.899,75 (sete mil e oitocentos e noventa e nove euros e setenta e cinco cêntimos), com retenção do montante de € 2.633,25 (dois mil e seiscentos e trinta e três euros e vinte e cinco cêntimos). 9.º Para fundamentar, na notificação referida em 8.º, o exercício do direito de resolução, as ora Rés alegaram que, com as notificações mencionadas nos pontos 5.º e 6.º, a renda devida pela A., que em Março de 2013 se fixava em € 483,00 (quatrocentos e oitenta e três euros), foi actualizada, em 01 de Setembro de 2013, para o montante de € 850,00 (oitocentos e cinquenta euros) e o contrato alterado para contrato com prazo certo de cinco anos, sendo que, com referência ao referido mês de Setembro de 2013, foi apenas paga pela ora A. a quantia líquida de € 362,00 (trezentos e sessenta e dois euros), com retenção de € 120,75 (cento e vinte euros e setenta e cinco cêntimos), o que perfaz € 483,00 (quatrocentos e oitenta e três euros), situação essa que se manteve até Setembro de 2014, período esse durante o qual a autora/notificada pagou, a título de rendas, a quantia global de € 6.279,00 (seis mil duzentos e setenta e nove euros), tendo feito entrega às requerentes (ora Rés) da quantia líquida de € 4.709,25 (quatro mil setecentos e nove euros e vinte e cinco cêntimos) e retido IRS no montante global de € 1.569,75 (mil quinhentos e sessenta e nove euros e setenta e cinco cêntimos). Pelo que declararam as notificantes que imputaram as quantias recebidas nas rendas vencidas desde Setembro de 2013 e na indemnização de 50% devida por falta de pagamento da renda no prazo legal, considerando pagas as rendas e indemnização devida com referência aos meses de Setembro a Dezembro de 2013 e em falta o pagamento da quantia de € 333,00 (trezentos e trinta e três euros), relativa à renda devida com referência ao mês de Janeiro de 2014 e as rendas referentes aos meses de Fevereiro a Setembro de 2014, no montante de € 6.800,00 (seis mil e oitocentos euros) e a indemnização de 50% no valor de € 3.400,00 (três mil e quatrocentos euros), perfazendo o débito total a quantia de € 10.533,00 (dez mil quinhentos e trinta e três euros), correspondendo a parte líquida ao montante de € 7.899,75 (sete mil oitocentos e noventa e nove euros e setenta e cinco cêntimos) e a retenção a efectuar ao montante de € 2.633,25 (dois mil seiscentos e trinta e três euros e vinte e cinco cêntimos). 10.º Em 28.10.2014, foi tentada a concretização da notificação referida em 8.º, na pessoa do legal representante da autora, o qual recusou receber a referida notificação; recusa essa que foi certificada pela Sr.ª Agente de Execução, que certificou ter igualmente informado o citando de que a nota de notificação e os documentos ficavam à sua disposição na secretaria judicial. 11.º Para cobrança da referida quantia de € 10.533,00 (dez mil quinhentos e trinta e três euros), as Rés instauraram acção executiva no Tribunal da Comarca de Faro – Juízo de Execução de Silves, a que coube o n.º 666/17.2T8SLV, os quais foram declarados extintos por deserção (artigo 281.º do Código de Processo Civil). Aplicando o Direito. Da eficácia da declaração negocial Argumenta a Recorrente que a sentença é nula por excesso de pronúncia (artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil), ao considerar que as moradas mencionadas nas missivas dos pontos 5.º e 6.º coincidem com a localização do locado, por este possuir duas designações diferentes. No entender da Recorrente, tal constituiria matéria impeditiva, modificativa ou extintiva do efeito jurídico dos factos articulados na petição inicial, e carecia de ser articulado pelas Rés. Porém, com a propositura da acção foi a A. quem pretendeu impugnar o efeito jurídico decorrente de tais comunicações e, lendo a sua petição inicial, em especial os respectivos arts. 17.º, 20.º e 22.º, o que esta argumenta é que as cartas de 12.03.2013, 30.04.2013 e 06.06.2013, não teriam produzidos quaisquer efeitos jurídicos simplesmente porque não foram recebidas. Não argumenta – e tal facto era constitutivo do direito que pretendeu fazer na acção, face aos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil – que as cartas nomeadamente as de 30.04.2013 e 06.06.2013, não foram remetidas para o local arrendado, em violação ao que dispunha o artigo 9.º, n.º 2, do NRAU (Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, na versão então em vigor, conferida pela Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto). Pretendendo a Autora impugnar a eficácia da declaração de actualização da renda e alteração do tipo e duração do contrato de arrendamento, competia-lhe alegar e provar factos aptos à formulação de um juízo de inexistência de qualquer culpa no não conhecimento da declaração – em especial, na situação específica dos autos, em que pretendia obter a declaração de ineficácia do procedimento de transição para o NRAU e repetir o indevido por não ter deduzido atempadamente oposição na execução que lhe foi movida. Mesmo para os que argumentam que, face ao artigo 224.º, n.º 2, do Código Civil, ao declarante cabe o ónus de alegar e provar que a declaração foi colocada ao alcance do destinatário em condições de, segundo a normalidade das circunstâncias, ser conhecida, e ao declaratário o ónus de alegar e provar factos que coloquem em dúvida ou demonstrem a inexistência de qualquer culpa no não conhecimento da declaração (artigos 346.º e 342.º, n.º 2, do Código Civil)[1], a conclusão que se obtém é a mesma: tendo as cartas sido remetidas pelas Rés, era a Autora, enquanto declaratária, que deveria ter alegado a inexistência de culpa no seu não recebimento, assim obstando aos efeitos que decorrem do artigo 224.º, n.º 2, do Código Civil. De todo o modo, lendo a escritura pública que formalizou o contrato de arrendamento, o que se observa é que o locado é ali designado pela seguinte forma: “parte do rés-do-chão do dito prédio com entrada própria pela Avenida número (…) ou Avenida (…), sem número de polícia”, pelo que a conclusão traçada na sentença, das moradas constantes das cartas de 30.04.2013 e 06.06.2013, serem designações diferentes do mesmo local, é absolutamente legítima e suportada nos elementos documentais juntos aos autos. Insiste a Recorrente que “Avenida número (…)” referida no contrato de arrendamento, não é o mesmo que “Avenida n.º (…) da Zona do (…)”, constante da missiva de 30.04.2013, mas olvida que o endereço é ainda completado pelo código postal – 8500-505 Portimão – idêntico ao da carta de 06.06.2013 e que identifica uma artéria específica da localidade. Como olvida que as cartas não foram recebidas por a destinatária ser desconhecida na morada, ou a morada estar incompleta: as menções que o agente postal colocou nas cartas foi que o destinatário foi avisado e o objecto devolvido por não reclamado. Acresce, como já referido, que competia à Autora o ónus de alegar e provar que não ocorreu culpa sua no não recebimento das cartas, e não apresentou tal argumento no seu articulado – o argumento no qual fundou a sua pretensão foi, apenas, que as cartas não foram recebidas, não foi que estas estavam mal endereçadas e que, portanto, não tinha culpa no seu não recebimento. Considera-se, pois, plenamente ajustado o que a propósito se afirmou na sentença: “(…) as missivas mencionadas nos pontos 5.º e 6.º foram remetidas, pelo advogado das rés, através de carta registada com aviso de recepção, para a morada que coincide com a da localização do locado; morada essa que tem, contudo, duas designações diferentes, como decorre do próprio contrato de arrendamento: Av. n.º (…) ou Av. (…). Ao que acresce que a primeira carta foi remetida em 30 de Abril de 2013 e a segunda em 07 de Junho de 2016, tendo assim sido respeitado o hiato temporal definido no n.º 3 do artigo 10.º do RAU. Pelo que o facto de a ré não ter providenciado pelo levantamento de nenhuma das missivas, consubstancia uma omissão irrelevante para efeito da afirmação da ineficácia da comunicação que lhe foi dirigida.” As conclusões 15.ª a 17.ª formuladas pela Autora assentam no pressuposto de ter sido incumprido o que se dispõe nos n.ºs 3 e 4 do artigo 10.º do NRAU, por as comunicações não terem sido enviadas para a morada do locado – porém, esse não foi o argumento no qual a A. fundou a pretensão que formulou na petição inicial, e já vimos que as cartas de 30.04.2013 e de 06.06.2013 foram endereçadas para a morada do locado, pelo que o procedimento previsto naquelas normas foi efectivamente respeitado. Improcedendo, pois, quer a alegação de nulidade da sentença por excesso de pronúncia, quer a alegação de irregularidade no procedimento de actualização da renda e transição para o NRAU, e não sendo apresentados outros argumentos pela Recorrente, resta confirmar a bem elaborada sentença recorrida. Decisão. Destarte, nega-se provimento ao recurso. ustas pela Recorrente. Évora, 7 de Abril de 2022 Mário Branco Coelho (relator) sabel de Matos Peixoto Imaginário Maria Domingas Simões ________________________________________________ [1] É o caso do Acórdão da Relação de Lisboa de 16.01.2007 (Proc. 8929/2006-1), disponível em www.dgsi.pt. |