Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
117/08.3TTFAR-C.E1
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: FALTA DE CITAÇÃO
NULIDADE DA CITAÇÃO
RÉU REVEL
TRÂNSITO EM JULGADO
RECURSO DE REVISÃO
Data do Acordão: 11/14/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: TRIBUNAL DO TRABALHO DE FARO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Sumário: I.A lei adjectiva distingue a falta de citação da nulidade da citação. Haverá falta de citação quando; (a) o acto tenha sido completamente omitido; (b) tenha havido erro de identidade do citado; (c) se tenha empregado indevidamente a citação edital; (d) se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade, como decorre do disposto no n.º 1 do art. 195º do Cod. Proc. Civil. Haverá nulidade da citação quando, na sua realização, não hajam sido observadas as formalidades prescritas na lei, como resulta do disposto no n.º 1 do art. 198º do mesmo diploma;
II. Tendo decorrido o trânsito em julgado da sentença que condenou o réu revel, a intervenção do mesmo nos autos para pagamento das custas ou para, através de requerimento, solicitar o pagamento faseado das mesmas, sem que tenha alegado a nulidade da sua citação, não determina a sanação dessa nulidade;
III. No entanto, perante a notificação que recebeu e perante a subsequente prática de um tal acto de pagamento de custas pela ré na acção declarativa, não pode deixar de se considerar que, pelo menos a partir do momento da concretização deste acto, aquela deixou de ser revel para o efeito de poder requerer a revisão da sentença proferida nessa acção, com base na nulidade da sua citação por preterição de formalidades legalmente previstas;
IV. Dispondo a ré de um prazo de 60 dias a contar do aludido momento para interposição de recurso extraordinário de revisão da sentença [art. 772º n.º 2 al. d) do C.P.C.], ao deixar transcorrer esse prazo sem requerer a revisão da mesma com fundamento na nulidade da sua citação para a acção declarativa, como que se conforma inteiramente com essa sentença, desprezando a omissão das formalidades legais que, de algum modo, inquinavam a sua citação para os termos da mencionada acção, circunstância que não pode deixar de levar a que se considere que a nulidade da citação dali decorrente se tenha por totalmente sanada, não podendo, posteriormente, ser invocada enquanto fundamento de oposição à execução dessa sentença.

Sumário do relator
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora
II – Relatório
D…, Ldª, executada nos autos de execução que correm termos no Tribunal do Trabalho de Faro sob o n.º 177/08.3TTFAR-A e em que é exequente J…, ambos melhor identificados naquele processo, através dos presentes autos, deduziu oposição aquela execução, alegando, em síntese e com interesse que a primeira vez que foi confrontada com a pretensão do exequente, foi na data de citação para esta execução, já que só tendo consultado posteriormente o processo judicial naquele tribunal, constatou que fora intentada uma acção declarativa, tendo o mencionado processo decorrido sem que a executada tivesse sido regularmente chamada ao mesmo a fim de exercer o seu direito de defesa.
Na verdade, ao longo do processo declarativo foram sendo preteridas formalidades essenciais prescritas na lei, das quais resultaram prejuízos para a defesa da ora executada, a qual não teve conhecimento da citação na acção declarativa e se viu impedida de comparecer na audiência das partes que aí teve lugar, bem como de ser notificada para contestar essa acção, sendo que, por via disso, foram julgados como provados todos os factos alegados na petição que nela foi deduzida e a ora executada condenada de preceito.
Não tendo sido remetida carta à ré e aqui executada, a informar que havia sido proposta contra si uma acção, ficou esta impedida de apresentar qualquer defesa, situação que viola direitos constitucionalmente garantidos, designadamente pelo art. 20º da Constituição da República Portuguesa.
Para além disso a sentença junta como título executivo à execução, padece de contradições ao começar por afirmar que a ré compareceu na audiência de partes e, posteriormente, afirmar que não compareceu.
Conclui pedindo que a presente oposição seja julgada procedente e que, em consequência, se julgue nula a citação para o processo declarativo, por preterição de formalidades essenciais, determinando-se a anulação de todo o processado posterior à petição inicial, ordenando-se a notificação da ré, aqui executada, nos termos do disposto no art. 198º-A do CPC, para comparecer à audiência das partes, seguindo-se os demais termos até final.
Contestou o exequente arguindo, desde logo, a excepção do caso julgado, porquanto a sentença proferida em 3 de Junho de 2008 no processo principal e mediante a qual a executada foi condenada a pagar ao exequente a quantia global de € 17.153,10, sentença que constitui o título executivo, transitou em julgado em 19 de Fevereiro de 2009, conforme consta de certidão de fls. 159 dos autos principais, excepção que é de conhecimento oficioso e cuja verificação impede que o tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância.
Por impugnação, alega que a executada foi devidamente citada para os termos da acção declarativa, pois, pese embora todos os esforços efectuados, quer por parte da agente de execução, quer por parte do tribunal, a executada, ao longo desse processo, sempre se furtou à sua citação e/ou notificação, à excepção da conta final de custas, a qual, estranhamente, a ré recepcionou e liquidou.
Como resulta do processo principal, a executada, então ré, teve conhecimento, quer do processo, quer da sentença, tanto mais que liquidou a aludida conta de custas.
Considerando a conduta da ré/executada, que, de forma reiterada e abusiva, obstou a qualquer citação e/ou notificação, à excepção da aludida conta de custas, impedindo o normal decurso e funcionamento da justiça, ao deduzir, agora, a presente oposição, cuja falta de fundamento não ignora, litiga com manifesta má fé.
Conclui que:
- Deve a excepção dilatória invocada ser julgada procedente, absolvendo-se o exequente da instância;
- Deve ser julgada improcedente por não provada a presente oposição, condenando-se a mesma nas custas e procuradoria.
As partes foram convocadas para uma audiência preliminar, no âmbito da qual tendo-se frustrado a tentativa de conciliação das mesmas, foi proferida decisão que, embora tivesse julgado improcedente a invocada excepção do caso julgado, julgou improcedente a oposição à execução deduzida pela executada/oponente, não considerando existir litigância de má fé por parte desta.
Inconformada com esta decisão, dela veio a executada/oponente interpor recurso de apelação para esta Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes conclusões:
1.º Os factos dados como provados, nomeadamente os factos 7), 8), 9), 10) e 11), são suficientes para provar que existiram várias preterições de formalidades essenciais que impediram a Recorrente de exercer os seus direitos.
2.º O próprio Tribunal a quo entende que ficou provado que existiram nulidades de citação por inobservância do disposto no art.º 237.º e 241.º ambos do CPC.
3.º Contudo, não obstante não ter sido citado da acção, veio a secretaria, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, notificar a Recorrente da conta de custas, ao que a mesmo reagiu, efectuando o pagamento, tendo o tribunal a quo entendido com base nesse acto praticado pela Recorrente, ter de considerar sanado o vício de nulidade de citação.
4.º Ora, no entendimento do Recorrente, tal violou o seu direito de defesa, porquanto a intervenção do réu deve permitir-lhe tomar conhecimento do processo, nos termos em que a citação o faria, ou seja, informá-lo dos termos do processo e permitir-lhe a defesa, pugnando pelo seu direito.
5.º O facto da Recorrente ter pago a conta de custas não pode ser entendido como intervenção do processo para efeitos de arguição da nulidade de citação (Cfr. Acórdão da Relação do Porto de 17-12-2008, no Processo n.º 0835621, disponível in www.trp.pt, “(…) O pagamento das custas, pelo R., no final da acção declarativa, sem arguir a falta da sua citação, não constitui “intervenção no processo” para, através dela, se considerar sanada a correspondente nulidade.(…)).
6.º Na data de pagamento da conta de custas pela recorrente (30/10/2009), já a sentença tinha transitado em julgado e, consequentemente, se tinha esgotado o poder jurisdicional, pelo que após o trânsito em julgado da sentença, a nulidade pode ainda ser invocada, mas apenas na oposição à execução da sentença ou como fundamento de revisão da sentença transitada.
7.º Ora, no caso em apreço, a Recorrente apenas interveio no processo n.º 117/08.3TTFAR, no Tribunal do Trabalho de Faro, já muito após o trânsito em julgado da mesma, sendo que, nessa fase processual, já a dita nulidade não poderia ser sanada através da sua intervenção, pois apesar de arguível em qualquer estado do processo, este não o permitia por já não se encontrar pendente.
8.º Sendo que, a Recorrente invocou o vício da falta de citação na primeira oportunidade em que lhe foi processualmente possível fazê-lo, ou seja, em sede de oposição à execução.
9.º Veja-se o Acórdão da Relação do Porto de 03-05-2010, no Processo n.º 4501/08.4TBMAI-A.P1, disponível in www.trp.pt, Mas para além do argumento formal do esgotamento do poder jurisdicional do juiz, não se podem descurar as razões de fundo e que estão relacionadas com o direito de defesa, que as partes devem exercer em condições de igualdade, sendo para o efeito imprescindível um real cumprimento do princípio do contraditório, ínsito no direito ao acesso aos tribunais com consagração constitucional no artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e vertido na lei ordinária, mormente nos artigos 3.º e 3.º-A do CPC. Ou seja, um juízo de constitucionalidade sobre a admissão da sanação da nulidade da citação por intervenção do réu no processo sem a arguir, conforme prescreve o artigo 196.º do CPC, só pode ter acolhimento no nosso sistema judicial.
10.º Tal entendimento já foi decidido pelo Tribunal Constitucional, n.º 678/98, de 02.12.1998, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. (…) se da intervenção posterior do réu nos autos, resultar que, de harmonia com um juízo de razoabilidade, o mesmo, não obstante o vício da falta de citação, fique, ciente, nos seus precisos termos, das razões de facto e de direito que são avançadas pelo autor para fundarem a pretensão contra ele deduzida.”(…).
11.º Face aos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa, “Só assim, na verdade, se pode perspectivar que o princípio do contraditório foi observado e que ao réu foi, na prática, dada a possibilidade de uma actuação na lide em condições idênticas à do autor, princípio e possibilidade essas que que defluem dos aludidos normativos constitucionais.”.
12.º O pagamento da conta de custas efectuado pela Recorrente nunca poderá ser entendido como intervenção no processo para efeitos de contagem de prazo para arguição da nulidade prevista no artigo 198.º do CPC.
13.º Assim, tendo a Recorrente arguido o vício em sede própria, deveria o Tribunal a quo, contrariamente ao decidido, considerar não sanado o vício da falta de citação, reconhecendo-lhe os efeitos que legalmente lhe estão associados e assim julgar improcedente o pedido executivo, absolvendo em consequência o Recorrente da instância executiva ordenando-se a notificação da Ré, aqui executada, nos termos do disposto no artigo 198º-A do CPC, para, comparecer à audiência de partes.
14.º Ao não decidir neste sentido, violou o tribunal a quo o direito de defesa do Recorrente e mais precisamente o n.º 1 e 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e o n.º 1 do artigo 3.º e 3.º-A do CPC.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve a presente Apelação ser julgada procedente revogando-se a sentença do Tribunal de 1.ª Instância, absolvendo em consequência o Recorrente da instância executiva ordenando-se a notificação da Ré, aqui executada, nos termos do disposto no artigo 198º-A do CPC, para, comparecer à audiência de partes assim se fazendo e é timbre deste Venerando Tribunal da Relação de Évora, JUSTIÇA.
Contra-alegou o exequente, formulando as seguintes conclusões:
A. Em 26 de Fevereiro de 2008 o Recorrido, intentou acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, à qual foi atribuído o Proc. n.º 117/ 08.3 TT FAR,
B. A Recorrente foi regularmente citada no seu estabelecimento, sito na Av. Tivoli… Quarteira .
C. Através de Solicitador de Execução nos termos do disposto no art. 240.º do Código de Processo Civil, aplicável e vigente à data – Maio de 2008 – conforme consta de fls. 64 a 69 dos Autos Principais.
D. O tribunal a quo, ordenou a notificação da Recorrente para contestar a acção declarativa e no seu estabelecimento sito Av. Tivoli… Quarteira, tendo sido concretizada, veio a mesma devolvida com a menção de “pediu aviso” e “não reclamada”.
E. A sentença final no âmbito da acção declarativa, veio a Recorrente a ser condenada a reconhecer a ilicitude do seu despedimento, a reintegrar o autor no seu posto de trabalho e a pagar-lhe a quantia de 17.153,10 € acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos, tendo a sentença já transitado em julgado.
F. A Recorrente notificada da conta de custas, recebeu e liquidou a mesma.
G. O Recorrido apresentou Requerimento Executivo, reclamando o pagamento do valor – 19.793,39 €, acrescido de todos os juros de mora vencidos até efectivo e integral pagamento, bem como, valor dos honorários e despesas com intervenção de Solicitador de Execução e custas judiciais;
H. Nesse âmbito, veio a Recorrente deduzir Oposição à Execução, com fundamento na nulidade de citação para a acção declarativa.
I. Realizada a audiência preliminar e na qual foi exercido o contraditório, decidiu tribunal a quo, dando como provados os factos descritos nos n.º 1 a 25 , III – Fundamentação alínea A – Factos Provados da douta sentença, cujo teor se reproduz para os devidos efeitos legais.
J. Em face da matéria de facto doutamente dada como provada, resulta igualmente da douta sentença e na sua fundamentação de Direito que, dos factos e da alegação do Recorrente, não se verifica a sua falta de citação.
L. Com crucial importância para a apreciação do presente Recurso, considerou o tribunal a quo que, o acto em causa, foi de facto realizado no estabelecimento da Recorrente, por Solicitadora de Execução, com indicação de hora certa e não existindo erro na identidade do citando.
M. O Recorrente não alegou factos que permitisse ao tribunal a quo, concluir que não tivesse conhecimento da citação por facto que não lhe era imputável.
N. Tanto mais que, a respectiva citação foi concretizada no estabelecimento da Recorrente, encontrando-se o mesmo a funcionar e em horário laboral com funcionário, facto que a Recorrente não contestou.
O. Salvo devido respeito e melhor entendimento, bem julgou e decidiu o tribunal a quo, considerando a regular citação do Recorrente na acção declarativa, bem como, a sua intervenção no processo aquando do recebimento da conta de custas e concretização do seu pagamento.
P. Considerando sanadas todas as nulidades por falta de reclamação e / ou arguição atempada por parte da ora Recorrente, atento o disposto nos arts. 196.º, 198.º e 202.º todos do Código de Processo Civil e na versão vigente à data da acção declarativa.
Q. Pelo que deverá o Recurso de Apelação interposto pela Recorrente – D…, Lda. improceder, o que desde já se requer.
TERMOS EM QUE,
Deverá presente recurso de Apelação ser julgado improcedente por não provado, e em consequência, ser mantida a decisão recorrida com as respectivas consequências legais, assim se fazendo JUSTIÇA !

Admitido o recurso e subindo os autos a este 2ª instância, mantida a admissibilidade daquele, foi dado cumprimento ao disposto no art. 87º n.º 3 do Cod. Proc. Trabalho, tendo a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitido o parecer de fls. 98 a 100 no sentido da improcedência do recurso interposto, parecer que não foi objecto de resposta.
Colhidos os vistos, cabe, agora, apreciar e decidir.

Questões a apreciar
Tendo em consideração as conclusões do recurso que, como se sabe, delimitam o seu objecto [art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.º 1 do C.P.C., aqui aplicáveis por força do art. 87º, n.º 1 do C.P.T.], sem prejuízo da análise de questões de natureza oficiosa, colocam-se à apreciação desta Relação as seguintes questões:
§ Nulidade por falta de citação da ré, ora executada, na acção declarativa, decorrente da preterição de formalidades essenciais e não sanação dessa nulidade não obstante o pagamento das custas dessa acção por parte daquela;
§ Oposição à execução enquanto momento adequado para a arguição da referida nulidade;
§ Violação do direito de defesa consagrado nos n.ºs 1 e 4 do art. 20º da Constituição e n.º 1 do art. 3º e 3º-A do C.P.C.

II – Fundamentação

De Facto
Em 1ª instância considerou-se resultar da prova documental junta aos autos declarativos que:
1. Em 26 de Fevereiro de 2008 J… intentou acção declarativa de condenação contra D…, Lda., com sede na Estrada Nacional… Sesimbra e estabelecimento comercial sito na Av. Tivoli… Quarteira, pedindo que se reconhecesse a ilicitude do despedimento e, consequentemente, se determinasse a sua reintegração no seu posto de trabalho, ou em opção desta, no pagamento da quantia global à A. a titulo indemnizatório, no valor – 4.500,00 € (quatro mil e quinhentos), a condenação da R. a pagar-lhe o valor de € 4 469,50 a título de diferenças de retribuições vencidas, 5.674,40 € a título de trabalho suplementar, 7.009,20 € a título de créditos vencidos, referentes a retribuição de subsídios de ferias e de natal, bem como, o correspondente a ferias não gozadas, anos 2005, 2006 e 2007, €10.126,55 € referente a descontos para a segurança social e nos juros de mora vencidos e vincendos.
2. Em 27 de Fevereiro de 2008 designou-se data para a realização da audiência de partes e determinou-se a citação da R. e a notificação do A..
3. Em 28 de Fevereiro de 2008 expediu-se, via postal, citação da R., para a Estrada Nacional… Sesimbra.
4. Tal missiva veio devolvida com a menção de “ não reclamado”.
5. Em 09 de Abril de 2008 expediu-se, via postal, citação da R., dirigida Av. Tivoli, … Quarteira.
6. Tal missiva veio devolvida com a menção de “ não reclamado”.
7. Em 23 de Abril de 2008 foi proferido despacho judicial determinando a citação da R. através de solicitador de execução.
8. Em 05 de Maio de 2008 a srª SE afixou na Av. Tivoli…Quarteira “ nota de marcação de c itação com dia e hora certa” exarando o seguinte:“ Nos termos do art. 240º do Código de Processo civil, por não ter sido possível encontrar hoje, 05/05/2008, pelas 17 horas e 10 minutos, e no dia 02/05/2008, pelas 15 horas, o representante legal da sociedade, para citação por contacto pessoal, apesar do escritório se encontrar a funcionar em horário laboral, e a funcionário não aceitar qualquer tipo de documentação, sito na Avenida Tivoli… Quarteira fica avisado que a diligência terá lugar neste mesmo local no próximo dia 07 de Maio de 2008, pelas 10horas.”
9. A fls. 69 dos autos da acção declarativa a srª SE certificou que o legal representante da R. não compareceu no dia 07 de Maio de 2008, pelas 10h, exarando que segundo informações da funcionária “ o representante recusa-se a receber ou a assinar a certidão de citação.”
10. No dia 09 de Maio de 2008, pelas 18h a srª SE afixou na Av. Tivoli… Quarteira nota de citação com o teor de fls. 66 a 68 dos autos declarativos, cujo teor se dá por reproduzido, informando, além do mais, que a audiência de partes estava designada para o dia 15 de Maio de 2008, pelas 11h.
11. A secretaria não remeteu à R. a notificação a que aludia o disposto no art. 241º do C.P.C.
12. No dia 15 de Maio de 2008, pelas 11h realizou-se audiência de partes à qual a R. não compareceu pelo que o Mmo. Juiz que a ela presidiu determinou a respectiva notificação para contestar a acção no prazo de dez dias, sob pena de se considerarem confessados os factos.
13. Em 15 de Maio de 2008 foi expedida, via postal, notificação à R. para contestar tendo-se dirigido a mesma para a Av. Tivoli… Quarteira.
14. Tal carta veio devolvida com a menção de “ pediu aviso” e “não reclamada”.
15. Em 03 de Junho de foi proferida sentença absolvendo a R. da instância quanto ao pedido de condenação a pagar as retribuições e cotizações à segurança social e condenando-a a reconhecer a ilicitude do despedimento, a reintegrar o A. no seu posto e a pagar-lhe a quantia de € 17 153,10 acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos.
16. Em 06 de Junho de 2008, via postal, foi expedida notificação da sentença à R., dirigindo-se a mesma à Av. Tivoli… Quarteira.
17. Tal carta veio devolvida com a menção de “ encerrada”.
18. Interposto recurso da sentença, em 10 de Julho de 2008, remeteu-se notificação à R. dando-lhe conhecimento do requerimento de interposição do recurso.
19. Tal carta veio devolvida com a menção de “pediu aviso” e “não reclamada”.
20. Em 29 de Setembro de 2008 expediu-se notificação á R., dirigida à Av. Tivoli… Quarteira, dando-lhe conta da admissão do recuso.
21. Tal carta veio devolvida com a menção de “pediu aviso” e “não reclamada.
22. Em 04 de Fevereiro de 2009 o Tribunal decidiu não conhecer do recurso o que foi notificado à R., por ofício dirigido à Av. Tivoli… Quarteira.
23. Tal carta veio devolvida com a menção de “ encerrado ” e “não reclamada.
24. Elaborada a conta foi a mesma notificada à R. por ofício dirigido à Av. Tivoli… Quarteira.
25. Em 30 de Outubro de 2009 a R. efectuou o pagamento da conta.

Dado que esta matéria de facto não vem impugnada nem se vêem razões de ordem legal para a sua alteração, considera-se a mesma como definitivamente assente.

De Direito
§ Da invocada nulidade por falta de citação da ré, ora executada, na acção declarativa, decorrente da preterição de formalidades essenciais e não sanação dessa nulidade não obstante o pagamento das custas dessa acção por parte daquela.
Alega, em síntese, a executada ora oponente/apelante que os factos dados como provados, designadamente os que constam dos pontos 7., 8., 9., 10. e 11., são suficientes para demonstrar que existiram várias preterições de formalidades essenciais que a impediram de exercer os seus direitos de defesa na acção declarativa e que, não obstante não ter sido citada nessa acção, após o trânsito em julgado da sentença condenatória nela proferida, a secretaria notificou-a da conta de custas, o que a levou a efectuar o pagamento das mesmas, tendo o Tribunal a quo, por via disso, entendido que, embora se demonstrasse terem existido nulidades de citação por inobservância do disposto nos artigos 237º e 241º, ambos do Código de Processo Civil, as mesmas se deveriam considerar sanadas.
Este entendimento do Tribunal a quo viola, no entanto, o direito de defesa da recorrente, porquanto, a intervenção do réu deve permitir-lhe tomar conhecimento do processo nos termos em que a citação o faria e o facto de ter pago a conta de custas na acção declarativa não pode ser entendido como intervenção no processo para efeitos de arguição da nulidade da citação, já que com o trânsito da sentença aí proferida se esgotara o poder jurisdicional do juiz.
Vejamos se a razão está do lado da apelante!
Antes de mais, importa referir que a lei adjectiva distingue falta de citação e nulidade da citação, sendo que:
Nos termos do n.º 1 do art. 195º do Cod. Proc. Civil – na redacção dada pelo DL n.º 38/2003 de 08-03 – haverá falta de citação quando (a) o acto tenha sido completamente omitido; (b) tenha havido erro de identidade do citado; (c) se tenha empregado indevidamente a citação edital; (d) se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade.
Por seu turno, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 198º do mesmo diploma – na redacção que lhe foi dada pelo DL n.º 180/96 de 25-09 – haverá nulidade da citação quando, na sua realização, não hajam sido observadas as formalidades prescritas na lei.
Verifiquemos, pois, se a matéria de facto tida por demonstrada, permite concluir pela falta ou pela nulidade da citação levada a efeito na acção declarativa donde emerge a sentença que constitui o título executivo dos autos de execução e que a executada/oponente invoca nos presentes autos como fundamento de oposição a essa execução.
Ora, tendo em consideração a matéria de facto provada que consta dos supra mencionados pontos 1. a 10. e que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, não se pode concluir estarmos perante qualquer das situações definidas como constituindo falta de citação previstas no n.º 1 do aludido art. 195º do Cod. Proc. Civil. Com efeito, nem se pode afirmar que o acto de citação da ré para a acção declarativa tenha sido completamente omitido, bem pelo contrário, ou que tenha havido qualquer erro na identidade da mesma, enquanto pessoa a citar, assim como não ocorreu a extinção da ré nem foi empregue a sua citação por via edital.
Já o mesmo se não poderá dizer em relação à nulidade da citação da ré, aqui executada/oponente, para os termos da referida acção declarativa, uma vez que se verifica terem sido omitidas algumas formalidades que, para o efeito, se encontravam legalmente previstas.
Na verdade, resulta da mesma matéria de facto provada haver-se enveredado, numa fase inicial e bem, pela citação pessoal da ré por via postal, primeiramente para o local da sua sede sita na Estrada Nacional … em Sesimbra e, posteriormente, em face da devolução da carta que para ali fora dirigida contendo a menção de “não reclamado”, para o seu estabelecimento comercial sito na Av.ª Tivoli… em Quarteira, carta que também foi devolvida com a menção de “não reclamado”.
Em face destas devoluções, optou-se pela citação pessoal da ré através de solicitador de execução, o qual – por não ter encontrado o representante da ré nos dias 2 e 5 de Maio de 2008, apesar do escritório da mesma se encontrar a funcionar em horário laboral e uma vez que a funcionária que ali se encontrava não aceitara qualquer tipo de documentação – afixou “nota de marcação de citação com dia e hora certa”, certificando no marcado dia 7 de Maio de 2008 que o legal representante da ré não comparecera, exarando, também, que a referida funcionária o informara que “o representante recusa-se a receber ou a assinar a certidão de citação”, circunstâncias que levaram o solicitador de execução a afixar, no dia 9 de Maio de 2008, pelas 18 horas, no mencionado estabelecimento comercial, a nota de citação a que se alude no ponto 10. dos factos provados, cumprindo, desse modo, o estabelecido no n.º 3 do art. 240º do Cod. Proc Civil.
Perante esta situação, deveria a secretaria do Tribunal a quo ter remetido à ré a notificação a que se alude no art. 241º do mesmo diploma. Contudo, não o fez (cfr. ponto 11.).
Por outro lado, as mencionadas circunstâncias aconselhariam a que, antes de se terem por concluídas as diligências de citação da ré, se desse cumprimento ao disposto no art. 237º do Cod. Proc. Civil ao dispor que «[n]ão podendo efectuar-se a citação por via postal registada na sede da pessoa colectiva ou sociedade, ou no local onde funciona normalmente a administração, por aí não se encontrar nem o legal representante, nem qualquer empregado ao seu serviço, procede-se à citação do representante, mediante carta registada com aviso de recepção, remetida para a sua residência ou local de trabalho, nos termos do disposto no artigo 236º» e o que é certo é que nada se demonstrou nesse sentido.
Estamos, pois, perante a omissão de actos ou formalidades legalmente estabelecidas tendo em vista a citação da ré para os termos da acção declarativa, omissão que, embora, a nosso ver, não incida sobre aspectos essenciais, acarreta, ainda assim, a nulidade da citação, já que, como refere o Prof. Alberto dos Reis no seu “Código de Processo Civil anotado”, volume VI (reimpressão), pag.ª 364, «[c]laro que a falta absoluta de citação é, em abstracto, muito mais grave do que a nulidade de citação; mas a lei equipara-as quando o réu tenha sido revel, por esta consideração: é que a revelia pode ser consequência directa e imediata da nulidade cometida. O réu foi citado, mas em termos irregulares; quem pode garantir que na origem da revelia não está precisamente a irregularidade cometida no acto de citação?
Pode realmente suceder que se a citação houvesse sido bem feita, o réu teria acudido ao processo e exercido nele o seu direito de defesa. Por outras palavras, quando a citação é defeituosa, quando nela não se observaram todas as formalidades legais, não pode afirmar-se com segurança que se o réu não se defendeu, foi porque não quis. É sempre legítima esta dúvida: talvez se não defendesse, porque não pôde, isto é, porque a preterição da formalidade ou formalidades de que está afectada a citação, o colocou em condições e circunstâncias de não poder intervir no processo».
É certo que, no caso vertente, se demonstrou que a funcionária do escritório do estabelecimento comercial da ré sito em Quarteira, nos dias 5 e 7 de Maio de 2008, quando aí se deslocou o solicitador de execução a fim de proceder à citação da ré para os termos da acção declarativa, a última das referidas datas em dia e hora marcados para esse efeito, para além de não ter aceite o recebimento de qualquer documentação de citação, transmitiu ao senhor solicitador de execução que o representante (da ré entenda-se) se recusava a receber ou a assinar a certidão de citação. No entanto, esta informada posição de recusa, não justificava a omissão, por parte da secretaria do Tribunal a quo quanto ao cumprimento do disposto no art. 241º do Cod. Proc. Civil, para além de se não compreender porque é que, em face dessas circunstâncias, se não tenha dado cumprimento ao disposto no art. 237º do mesmo diploma, aspectos que, ainda assim, levam a que permaneça a dúvida a que alude o Prof. Alberto dos Reis no mencionado excerto e a não se poder ter por dissipada a nulidade decorrente da omissão de tais formalidades.
Refere a apelante que, contrariamente ao que foi o entendimento do Tribunal a quo, a circunstância de, após o trânsito em julgado da sentença proferida na referida acção declarativa, ter efectuado o pagamento das custas sem haver arguido a nulidade da sua citação para essa acção, não conduz à sanação de uma tal nulidade, uma vez que não era o momento adequado para o ter feito já que se mostrava esgotado o poder jurisdicional do Sr. Juiz decorrente da prolação da sentença com trânsito em julgado.
Ora, quanto a este concreto aspecto, sem dúvida que não se pode deixar de reconhecer razão à apelante, já que também se perfilha o entendimento jurisprudencial de que, tendo decorrido o trânsito em julgado da sentença que condenou o réu revel, a intervenção do mesmo nos autos para pagamento das custas ou para, através de requerimento, solicitar o seu pagamento faseado, sem que tenha alegado a nulidade da sua citação, não determina a sanação dessa nulidade. A arguição da nulidade nessa fase do processo seria, aliás, extemporânea por se encontrar esgotado o poder de jurisdição do tribunal com a prolação da sentença e, por outro lado, pelo facto da notificação feita ao réu para pagamento das custas não se apresentar de molde a dar-lhe conhecimento das razões de facto e de direito que justificaram o pedido do autor, de forma a possibilitar-lhe o seu direito de defesa (ver Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 17-12-2008 e de 03-05-2010, proferidos, respectivamente, nos processos 0835621 e 4501/08.4TBMAI-A.P1 e acessíveis em www.dgsi.pt). Em tais circunstâncias, restaria ao réu revel que pretendesse arguir a nulidade da citação, enveredar pelo recurso extraordinário de revisão da sentença [art. 771º n.º 1 al. e) do C.P.C] ou por invocá-la em sede de oposição à execução fundada nessa sentença [art. 814º n.º 1 al. d) do C.P.C.].
Todavia e ainda assim, não poderemos permanecer insensíveis ou ficar completamente alheios à circunstância da ré ter procedido ao acto de pagamento das custas em dívida na aludida acção declarativa, sendo legitimo pensar-se que se o fez sem, demonstradamente, ter posto minimamente em causa esse pagamento, foi porque reconheceu, de algum modo, a sua responsabilidade pelo pagamento das mesmas e esta só se compreende em função do conhecimento que a ré tenha tido sobre as razões justificativas da assunção dessa sua responsabilidade.
Deste modo, perante a notificação que recebeu e perante a subsequente prática de um tal acto de pagamento de custas pela ré na acção declarativa, não poderemos deixar de considerar que, pelo menos a partir do momento da concretização deste acto, aquela deixou de ser revel para o efeito de poder requerer a revisão da sentença proferida nessa acção, com base na nulidade da sua citação por preterição de formalidades legalmente previstas. Cfr. neste sentido Jacinto Rodrigues Bastos em “Notas ao Código de Processo Civil” Vol. III, pagª 429 ao afirmar – em anotação à alínea f) do art. 771º do C.P.C. e que equivale à alínea e) do mesmo normativo do referido Código, na versão que é aqui aplicável – que «[s]e o réu, embora não tendo contestado a acção, interveio posteriormente no processo, praticando nele qualquer acto, já não é considerado revel para o efeito de poder requerer a revisão».
Assim sendo, como se nos afigura que é, dispondo a ré de um prazo de 60 dias a contar do aludido momento para interposição de recurso extraordinário de revisão da sentença [art. 772º n.º 2 al. d) do C.P.C.], ao deixar transcorrer esse prazo sem requerer a revisão da mesma com fundamento na nulidade da sua citação para a acção declarativa, como que se conforma inteiramente com essa sentença, desprezando a omissão das formalidades legais que, de algum modo, inquinavam a sua citação para os termos da mencionada acção. Isto é e dito de outro modo, tendo a ré tido oportunidade, em termos processuais, de invocar a nulidade da sua citação na acção declarativa e de, com base nesse fundamento, pedir a revisão da sentença ali proferida, prescindiu dessa oportunidade aceitando a sentença nos seus precisos termos, circunstância que não pode deixar de levar a que se considere que a nulidade da citação dali decorrente se tenha por totalmente sanada, não podendo, posteriormente, ser invocada enquanto fundamento de oposição à execução dessa sentença.
Coisa bem diferente sucederia se a ré, agora executada/oponente, não tivesse praticado qualquer acto no processo declarativo posteriormente à sentença ali proferida – mormente o pagamento da custas desse processo na sequência de notificação que lhe foi feita nesse sentido – e se visse, posteriormente, confrontada com uma execução tendo por título executivo essa sentença. Aí sim, teria toda a oportunidade a dedução de oposição a essa execução fundada na nulidade da citação no processo declarativo ao abrigo do disposto na al. d) do art. 814º do Cod. Proc. Civil.

§ Violação do direito de defesa consagrado nos n.ºs 1 e 4 do art. 20º da Constituição e n.º 1 do art. 3º e 3º-A do C.P.C.
Perante as razões acabadas de expor, atinentes à apreciação da anterior questão de recurso e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas, de modo algum se poderá concluir mostrar-se violado o acesso ao direito e à efectiva tutela jurisdicional por parte da ré, agora executada/oponente, direito com consagração constitucional no art. 20º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e vertido na lei ordinária, designadamente através do princípio do contraditório e de igualdade das partes consignados, respectivamente, nos artigos 3º e 3º-A do Cod. Proc. Civil.
Na verdade, as diligências encetadas no âmbito da acção declarativa tendentes à efectiva citação da ré para os termos da mesma, a postura desta perante essas diligências e, posteriormente, a sua não atempada reacção na sequência da prolação de sentença nessa acção e em face da constatada omissão de algumas das formalidades legais no âmbito daquela citação, levam a que se não possa considerar violado aquele direito constitucionalmente consagrado.

III – DECISÃO
Nestes termos e com base nas razões anteriormente expostas, acordam os juízes da Secção Social deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente e, embora por razões de algum modo diversas, confirmam a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante.
Évora, 14.11.2013
José António Santos Feteira
Paula Maria Videira do Paço
Acácio André Proença