Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
518/14.8PCSTB.E1
Relator: ANTÓNIO JOÃO LATAS
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
ELEMENTOS DA INFRACÇÃO
STALKING
Data do Acordão: 09/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário:
I - Não é elemento do tipo legal de violência doméstica que a ofendida tenha uma posição de relação de “subordinação existencial” ou seja, uma posição de inferioridade e/ou dependência com o recorrente, pois apesar de constituir uma realidade sociológica presente em muitas das situações de violência doméstica previstas no art. 152.º do C. Penal, isso não significa que as esgote ou que constitua elemento típico de cuja demonstração depende a responsabilidade penal do agente.

II - O alargamento da punição prevista no art. 152.º do C. Penal aos casos em que o crime é praticado por agente que tenha mantido com a vítima relação de namoro (independentemente de coabitação), operado pela Lei 19/2013 de 21 de fevereiro, visa a proteção da vítima contra atos de violência contrários à confiança num comportamento de respeito e abstenção de atos violadores da integridade pessoal do ex-parceiro, incluindo as vítimas do chamado stalking em que o ex-namorado assume comportamentos retaliatórios e fortemente perturbadores da paz do ex-parceiro por não se conformar com o fim da relação ou com a assunção de uma relação amorosa com outra pessoa.

Sumariado pelo relator
Decisão Texto Integral:
Em conferência, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório

1. Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correm termos no Juízo Local Criminal de Setúbal (J2) do T. Judicial da Comarca de Setúbal, foi acusado e sujeito a julgamento em processo comum com intervenção do tribunal singular, JP, natural de Angola, nascido em 20.09.1963, divorciado, operador de máquinas, residente em Setúbal, a quem o MP imputara a prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, nº 1, al. b) e nº 4 do Código Penal e, em concurso efetivo, um crime de perturbação da vida privada, previsto e punido pelo artigo 190°, nº 2 do Código Penal.

2. Constituída assistente, C deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, sendo € 2.500 por dano não patrimonial e €4.298,24 por danos patrimoniais, acrescidos dos juros à taxa legal, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

3. Realizada Audiência de Julgamento, o tribunal singular decidiu:

1. Julgar a acusação parcialmente procedente e em consequência:

a) Absolver o arguido, JP, da prática do crime de perturbação da vida privada, p. e p. pelo artigo 190°, nº 2 do Código Penal, por que vinha acusado;

b) Condenar o arguido pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152°, nº 1, al. b) do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 11 (onze) meses de prisão;

c) Suspender a execução da pena única de prisão aplicada ao arguido pelo período de 1 (um) ano e 11 (onze) meses, com sujeição a regime de prova, assente num plano de reinserção social, executado com vigilância e apoio, durante o tempo de duração da suspensão, dos serviços de reinserção social, com especial incidência na prevenção da violência doméstica, sujeito, entre o mais, a frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica (PAVD), aplicado pela DGRS, ao abrigo dos artigos 52°, nº 1, al. b), 53°, nº 1 e 54°, nº 3 do Código Penal;

d) Condenar o arguido na pena acessória de proibição de contactar, por qualquer meio, com a vítima C, com afastamento da residência e do local de trabalho desta, a um raio de distância não inferior a 500 metros, p. e p. pelo artigo 152°, nºs 4 e 5 do Código Penal, pelo período de 1 (um) ano e 11 (onze) meses;

e) Determinar que a fiscalização do cumprimento da pena acessória descrita na alínea precedente seja controlada pela DGRS através dos meios técnicos adequados de controlo à distância, ao abrigo no disposto no artigo 35° da Lei nº 112/2009, de 16.09 e 152°, nº 5 do Código Penal;

2. Julgar o pedido de indemnização civil parcialmente procedente e em consequência:

a) Condenar o demandado, JP, a pagar à demandante, C, a quantia global de € 2.000 (dois mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a presente sentença até efetivo e integral pagamento;

b) Absolver o demandado do demais peticionado pelo demandante;

4. Inconformado, recorreu o arguido extraindo da sua motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem integralmente:

«VI - CONCLUSÕES:

I - O Tribunal a quo omitiu 85 SMS que a ofendida enviou ao arguido no período compreendido entre Junho de 2013 a Julho de 2015. Matéria apreciada em julgamento e que apenas consta que a assistente remeteu alguns SMS ao arguido, na fundamentação da decisão, violando o previsto nos artigos 124º e 127º do Código Processo Penal.

II - O tribunal a quo ao considerar provado que o arguido colocou autocolantes no veículo da ofendida com os dizeres “ Devoradora de homens; Só vejo aldrabões; Cabra gorda; Bitch”, mesmo com as testemunhas e a ofendida dizendo que não viram o arguido colocar qualquer autocolante na viatura, violou o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do Código Processo Penal.

III – O tribunal a quo ao dar como provado o facto ocorrido no dia 16 de Maio de 2014, em que o companheiro da assistente se encontrava no Parque da Bela Vista e o arguido passou por ele ao telemóvel e começou a falar bem alto, de forma a que aquele ouvisse, dizendo: “estás a ouvir, pá? A C é uma puta! Aquela gaja é uma vaca, faz o serviço todo completo. Sabes que a boca não serve só para falar, serve para aquelas coisas que a nós sabemos! Ela faz o prato completo! Se quiseres podes também tentar que consegues porque a ela vai o bairro todo!”, ao considerar provado este facto, que apenas foi descrito de forma contraditória, pela testemunha e companheiro da assistente AS, na versão que consta da fundamentação, violou entre outros, o princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127º do CPP.

IV – O Tribunal ao considerar provado que o arguido em data não determinada, tenha colocado uma fotografia da assistente com a cara riscada, colada na porta do estabelecimento do companheiro da ofendida com a menção “ me liguem.” Não resulta dos depoimentos e da fundamentação que as testemunhas tenham visualizado a fotografia na porta, como também ninguém viu o arguido a colocar a fotografia na porta do estabelecimento. A prova produzida resultou do depoimento da testemunha e da fotografia que o companheiro da assistente AS, tinha em seu poder. Violando entre outros, o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do CPP.

V- O tribunal a quo ao considerar provado que o arguido continuou a ligar para o telemóvel da ofendida fazendo-o de cabines telefónicas públicas da PT. Na verdade os números de telefone de cabines públicas não constam na lista das chamadas rececionadas no telemóvel da ofendida, solicitadas à Vodafone, e do depoimento das testemunhas ninguém visualizou o arguido a telefonar de cabines públicas, com exceção da ofendida. Violou entre outros, o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do CPP.

VI – O tribunal a quo deu como provado que junto ao local de trabalho e da residência da assistente o arguido ter pintado com tinta de spray a menção “ CRIS” sendo que o “ I “ na parte inferior tinha dois círculos, a simular um pénis. Conforme resultou dos depoimentos das testemunhas e da ofendida, que ninguém viu o arguido a pintar e assim como também não trata a ofendida por “CRIS” apesar do tribunal a quo fundamentar em erro na douta sentença, que a testemunha AS “ Garantiu que não conhece ninguém que trata a assistente por “Cris” (à exceção do arguido).” Mais uma vez o tribunal baseou a sua convicção apenas no depoimento da ofendida e erradamente no depoimento do companheiro. Violando o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do CPP.

VII - O facto ocorrido no dia 11 de Abril de 2015, pelas 21:30 horas, D. atravessava a estrada, na Rua Gonçalo Pinheiro, nesta cidade de Setúbal, avistou um carro vir na sua direção acelerando, correu para o passeio e viu que era o arguido que conduzia o carro. Conforme foi descrito pela irmã estavam a jogar à bola no meio da estrada, que tem movimento de carros, porque tem um infantário e uma escola primária na rua, o que é censurável é o facto dos miúdos jogarem futebol na estrada e não facto do arguido passar de carro na estrada. Violando o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127º do CPP.

VIII - Que no dia 9 de julho de 2015, R, estava na baixa de Setúbal, acompanhada com umas amigas quando o arguido se aproximou daquela dizendo “ Olá R” e permaneceu no local onde estava a menor, até que exasperada se dirigiu ao arguido para que o mesmo a deixasse em paz. Resulta deste facto que apesar da testemunha afirmar que nunca esteve sozinha com o arguido, nenhuma testemunha tem conhecimento direto destes factos, que no entendimento do arguido não são ilícitos, atendendo que se limita a cumprimentar a jovem.

IX – Resulta ainda que o arguido no dia 30 de Outubro de 2015 pelas 20:20 horas, a assistente e o companheiro saíram da residência sita na Av. ---, e quando desciam a escada que dá acesso à estrada cruzaram-se aí com o arguido e agrediram o arguido, dizendo que o arguido tinha dito à ofendida “ minha grande puta”.

Desta contenda resultou para o arguido ofensas à integridade física com incapacidade de 12 dias de trabalho. Este facto foi dado como provado na versão reduzida que consta na fundamentação, com base apenas no depoimento dos agressores. Pelo que se considera tal facto incorretamente julgado.

X - O tribunal a quo deu como provado, que no dia 17 de Janeiro de 2016 o arguido tocou à campainha da residência da ofendida C, que se encontrava com amigas na Avenida … e que elas também assistiram, pelo que foi ao terraço com uma delas que a acompanhou. CC, vem dizer que não conhece e que nunca viu a face do arguido e que foram à porta do apartamento e só viu umas pernas de homem a subir a escada para o terraço e que não viu o rosto da pessoa pelo que não pode afirmar que foi o arguido. Este facto foi incorretamente julgado, porque os depoimentos são contraditórios, pelo que violou também o princípio da livre apreciação da prova, artigo 127º do CPP.

XI - Sem prescindir do supra alegado e admitindo por hipótese académica como provados os factos em que assentou a sentença objeto do recurso constatamos, claramente, que o recorrente não praticou o crime de violência doméstica, p.p. pelo artigo 152º do C.P. porquanto não resulta que a ofendida tenha uma posição de relação de “subordinação existencial” ou seja, numa posição de inferioridade e/ou dependência com o recorrente elemento fundamental do preenchimento daquele tipo de crime, as injúrias foram recíprocas e proferidas num contexto de troca de sms, sem violência física ou ofensiva do ponto de vista da dignidade da pessoa humana.

XII - - O crime de violência doméstica não pode ser cometido com reciprocidade e sobretudo, quando a única vitima da agressão física é o Recorrente.

XIII – Pelo exposto o tribunal não interpretou, nem aplicou corretamente o artigo 152.º, n.º 1 alínea b) e nº 4 do Código Penal, à subsunção daqueles factos.

XIV – Em suma não restam dúvidas que o recorrente não praticou o crime em que foi condenado.

XV – Nos termos do supra alegado e não tendo o recorrente praticado o crime em que foi condenado, deve o mesmo ser absolvido do pedido de indemnização civil.

TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, POR VIA DELE, SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA E, EM CONSEQUÊNCIA, SER O RECORRENTE ABSOLVIDO DO CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM QUE FOI CONDENADO, BEM COMO DO RESPETIVO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL.»

5. Regularmente notificados, pronunciaram-se em 1ª instância o MP e a assistente no sentido da improcedência do recurso.

6. Nesta Relação, o senhor Procurador – geral adjunto pronunciou-se no mesmo sentido.

7. Cumprido o disposto no art. 417º nº1 do CPP, o recorrente nada mais acrescentou.

8. A sentença recorrida (transcrição parcial, ipsis verbis):

« (…)

2.1 Factos provados
Discutida a causa e produzida a prova, resultaram assentes os seguintes factos:

da acusação pública

a) o arguido jp e a assistente c, mantiveram uma relação de namoro, um com o outro, sem existência de coabitação, que durou cerca de cinco anos e terminou em abril/maio de 2012, por iniciativa da ofendida.

b) em outubro de 2012, a assistente começou a relacionar-se com outra pessoa e deu conhecimento desse facto ao arguido.

c) o arguido não aceitou bem este novo relacionamento da assistente e desde então tem assumido um comportamento persecutório em relação à mesma.

d) desde então, o arguido começou a telefonar para a ofendida quase diariamente e inúmeras vezes ao longo do dia e durante a noite.

e) Designadamente, no período compreendido entre 02 de dezembro de 2013 e 27 de abril de 2014, o arguido dos números de telemóvel 936--- e 933--- efetuou 82 chamadas telefónicas, de voz e/ou sms, para o telemóvel da ofendida com o número 918---, sendo que não raras vezes a apelidava de "puta" ou dirigindo-lhe expressões como" agora estás com a cona cheia! agora estás com a boca cheia! os teus filhos devem é ter vergonha da mãe que têm, que troca de cama com tanta facilidade".

d) também se tornou recorrente o arguido enviar mensagens escritas para o telemóvel da ofendida.

g) assim, do número de telemóvel 9337---- o arguido enviou para o telemóvel da ofendida as seguintes mensagens:

- no dia 13.05.2014 pelas 09:02

"obrigada pelo dia lindo de ontem. és enorme. caso a história fosse inversa tb ficariam feliz, acredito. se estiveres com a ora. ana da-lhe cumprimentos pois nunca me cheguei a despedir dela. espero que contigo o tratamento tb resulte. do "tratamento psiquiátrico compulsivo" ... "

no dia 16.05.2014 pelas 20:03.
"como resp. ao teu bom senso de não teres aparecido no parque esta manha tb não te esperei junto ao parque do teu trab. ele é que não tem correção. dorme bem"

- no dia 30.05.2014 pelas 19:01
"olá aguardo-te junto à porta da garagem"

- no dia 14.06.2014 pelas 10:03:16
" um bom dia. não deixes o carro tão longe de casa, senão vandalizao-no. talvez um dia saibas quem é e ficaras surpreendida!!!!".

h) paralelamente a estes comportamentos tornou-se recorrente o arguido passar de carro junto à residência da ofendida sita em av. ----, nesta cidade.

i) bem como ficar na rua a observar e ver as rotinas da assistente.

j) no dia 24 de abril de 2014 a assistente fazia uma caminhada, acompanhada do seu parceiro, no parque verde da bela vista quando o arguido passou por si várias vezes, de bicicleta, e exibiu à mesma o dedo médio da mão, introduzindo o mesmo na boca e chupando-o. situação que voltou a suceder nos dias 28 e 29 de abril.

k) chegou a suceder o arguido passar pela assistente e pelo seu companheiro, quando iam na rua, e o arguido cuspir de forma violenta para o chão na direção daqueles, situações que ocorreram em número indeterminado de vezes.

i) no dia 10 de maio de 2014, pelas 21 h30, quando a assistente circulava de carro em direção à casa dos aos seus pais, sita na rua ---, o arguido seguiu-a ao volante do seu veículo, e após aquela ter entrado para casa dos seus pais, o arguido passou diversas vezes de carro junto àquela habitação.

m) no dia 12 de maio de 2014 voltou a segui-la quando aquela circulava pela cidade de setúbal e no dia 13 enviou-lhe o sms nos termos descritos na alínea g).

n) No dia 16 de maio de 2014 o companheiro da ofendida estava a treinar no jardim da bela vista e o arguido passou por si. nesta altura, o arguido agarrou no telemóvel e começou a falar bem alto, de forma a que aquele ouvisse, dizendo "estás a ouvir, pá? a c.. é uma puta! aquela gaja é uma vaca, faz o serviço todo completo. sabes que a boca não serve só para falar, serve para aquelas coisas que nós sabemos! ela faz o prato completo! se quiseres podes também tentar que consegues porque a ela vai o bairro todo!".

o) Para além destes comportamentos o arguido deixou um autocolante na parte traseira do veículo da ofendida com os dizeres "devoradora de homens".

p) em consequência da conduta do arguido, a assistente cancelou o número de rede fixa que tinha na sua residência.

q) porém, o arguido continuou a ligar-lhe para o seu número de telemóvel fazendo-o de cabines telefónicas fixas da pt, através dos números 26571---; 26570---;26572---;265702---;26573---;2655---;26555---;26552---;26522---;265721---; 265525--- e 265----
.
r) Chamadas efetuadas a qualquer hora do dia ou da noite, em que o arguido durante os telefonemas efetuados ri, ou remete-se ao silêncio ora efetua ruídos.

s) em data não concretamente determinada, o arguido colocou uma fotografia da assistente com a cara riscada, colada na montra do estabelecimento do companheiro da mesma, com a menção "me liguem ... ".

t) Junto ao local de trabalho e da residência da assistente o arguido pintou em tinta spray encarnada a menção "cris", sendo que o "i" tem na parte inferior dois círculos, a simular um pénis - conforme teor de fls.82 e 83.

u) No veículo da assistente com a matrícula -ip---, o arguido colou os autocolantes com os dizeres "só vejo aldrabões... " e "cabra gorda".

v) a partir de determinada altura o arguido começou, também, a efetuar telefonemas para o telemóvel do companheiro c, as.

w) é recorrente o arguido a passar em frente da residência da assistente fazendo-se transportar de carro ou de bicicleta, e não raras vezes exibe o dedo médio da mão, enfiando o mesmo na boca e chupando-o, quer na direção da assistente ou do seu companheiro, quer na direção dos filhos daquela se estiverem presentes.

x) aos fins de semana é usual a assistente, o companheiro e os filhos irem almoçar a casa dos pais daquela, sendo que o arguido passa de carro na rua onde os mesmos residem e efetua inúmeros telefonemas para o telemóvel da assistente e do seu companheiro.

y) a assistente tem três filhos: dm, nascido em 10.03.2003; r, nascida em 11.08.1999 e p, nascido em 26.10.1995, sendo que o arguido não se coíbe de, também, os perseguir.

z) No dia 11 de abril de 2015, pelas 21 h30, DM atravessava a estrada, na rua Gonçalo Pinheiro, nesta cidade de setúbal, quando avistou um carro a vir na sua direção acelerando, correu para o passeio e viu que era o arguido que conduzia o veículo.

aa) na última semana de junho de 2015, já em período de férias escolares, como os filhos da ofendida passavam muito tempo na rua com os amigos ou a jogar à bola, o arguido passava naquela rua inúmeras vezes e seguia-os de bicicleta para onde se deslocassem.

bb) no dia 9 de julho de 2015, r. estava na baixa de setúbal, acompanhada com umas amigas quando o arguido se aproximou daquela dizendo "olá, r" e permaneceu no local onde estava a menor, até esta exasperada se dirigir ao arguido dizendo para que o mesmo a deixasse em paz.

cc) no dia 30 de outubro de 2015, pelas 20h20, a ofendida e o companheiro saíram da residência, sita na av. …., e quando desciam a escada que dá acesso à estrada cruzaram-se aí com o arguido o qual se dirigiu à assistente e lhe disse "ah! minha grande puta!".

dd) ato contínuo o arguido dirigiu-se ao companheiro da assistente caindo ambos na escada.

ee) no dia 31 de outubro de 2015, próximo das 13h00, a assistente estacionou o seu veículo, enquanto esperava que o seu companheiro fechasse a loja sita na av. 5 de outubro nesta cidade, sendo que o arguido aguardava, também naquele local, no interior do seu veículo, tendo estacionado uns metros mais atrás do local onde estava a estacionada a assistente.

ff) após o companheiro da assistente entrar no veículo, onde esta o aguardava, o arguido iniciou a marcha da sua viatura e ao passar junto do veículo da assistente exibiu o dedo médio da mão, introduzindo-o na boca e chupando o mesmo.

gg) o comportamento de perseguir a assistente e agregado familiar, bem como efetuar chamadas telefónicas persistiu durante os meses de novembro e dezembro de 2015.

hh) assim sucedeu no dia 10 de dezembro de 2015, em que pelas 19h20 o arguido passou de carro à porta da residência da ofendida, sita na rua ---.

ii) o mesmo sucedeu no dia seguinte pelas 19h55; no dia 15 pelas 09h 13 e pelas 11 h26; no dia 18 pelas 15h10; no dia 23 pelas 19h50; no dia 26 pelas 14h38.

jj) no dia 17 de janeiro de 2016, pelas 18h30 o arguido tocou três vezes à campainha da residência da ofendida sita em av. .

kk) pelas 21 h1 o desse mesmo dia quando a assistente passeava o cão junto à rua pedro fernandes sardinha, o arguido passou de carro.

ii) no dia 26 de janeiro de 2016, pelas 17h30, quando a ofendida se encontrava à porta da sua residência na rua ----, o arguido passou junto a si, de carro.

mm) no dia 13 de fevereiro de 2016, pelas 16h50 quando a ofendida circulava de carro, acompanhada pela mãe e se dirigia para o seu escritório para aí deixar uns móveis, o arguido passou por si de carro.

nn) pelas 17h07, quando a assistente ia levar mais objetos para o seu escritório o arguido tornou a passar de carro novamente.

00) quando a assistente chegou junto do seu escritório o arguido estacionou perto, esperando que aquela voltasse a sair e quando esta saiu seguiu-a de carro, sendo que a assistente seguiu na direção da av. francisco xavier e o arguido seguiu na direção da av. luísa todi.

pp) pelas 19h12 desse mesmo dia 13, quando a assistente estacionou junto à sua residência na rua ----, o arguido voltou a passar junto à mesma de carro.

qq) no dia 17 de março de 2016, pelas 20h48 quando a assistente estava a chegar a casa, na rua ---, o arguido estava estacionado naquela rua e iniciou a marcha do veículo passando junto da assistente de carro, levando as luzes apagadas.

rr) no dia 25 de março de 2016, pelas 14hoo, a assistente saiu de casa, com o seu companheiro e quando se dirigiam a pé ao pingo doce, junto à rua moinho do frade, o arguido apareceu, de bicicleta, passou junto aos mesmos e exibiu o dedo médio da mão, pondo-o na boca e chupando o mesmo.

ss) paralelamente a estes comportamentos o arguido continua a efetuar chamadas telefónicas para a residência e telemóvel da assistente, bem como do seu companheiro.

tt) o arguido atuou em todas as ocasiões com o propósito concretizado de maltratar psicologicamente a assistente, bem como de a ofender na sua honra e consideração.

uu) conhecedor das rotinas da assistente, o arguido quis persegui-la e abordá-la na via pública, bem como aos seus filhos, sempre com o propósito de a atingir psicologicamente, atemorizando-a, perturbando-a e humilhando-a, ofendendo dessa forma a sua dignidade enquanto ser humano, o que previu e logrou atingir.

vv) ao telefonar sistematicamente para a assistente quis o arguido perturbar a paz, a tranquilidade e sossego daquela, o que previu e logrou atingir.

ww) agiu sempre o arguido de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

do pedido de indemnização civil

xx) a assistente é tida pelas pessoas com quem priva como idónea, honesta, respeitada e considerada.

yy) em consequência das condutas do arguido, a assistente sentiu vergonha, nervosismo, medo, inquietação e ansiedade.

zz) em consequência das condutas do arguido, a assistente teve situações de stress com episódios vertiginosos, alterações de sono, sentido um grande desgaste emocional.

aaa) em consequência das condutas do arguido, os filhos da assistente vivem com ansiedade e medo do arguido, o que causa enorme sofrimento e desgaste na assistente.

da contestação

bbb) o arguido, no seguimento do seu divórcio, iniciou consultas clínicas de apoio psicológico com a assistente, psicóloga, o que teve a duração de 6 meses.

ccc) arguido e assistente iniciaram relacionamento amoroso após a assistente ter dado como finda a sua intervenção no acompanhamento psicológico ao arguido.

ddd) em consequência das condutas do arguido, e já num estado de saturação, revolta e impotência, a assistente ainda chegou a responder a algumas mensagens do arguido, de forma mais severa e unicamente com o intuito de o fazer cessar os seus comportamentos.

Mais se provou que

eee) o arguido exerce a atividade profissional de operador de máquinas, na portucel, desde 1988.

ffd o arguido vive sozinho, em casa própria

ggg) o arguido tem dois filhos atualmente com 21 e 18 anos de idade, fruto do seu anterior casamento, que terminou no ano de 2005.

hhh) a assistente tomou a iniciativa de terminar a relação terapêutica com o arguido por considerar não existirem condições para manter a neutralidade em termos afetivos e emocionais, encaminhado o arguido para outros colegas.

iii) a rutura relacional entre o arguido e assistente assumiu um momento crítico e difícil para o arguido, que ainda não o ultrapassou.

jjj) o arguido não aceita o novo relacionamento da assistente.

kkk) o arguido, desde a separação com assistente, que não estabeleceu nova relação amorosa.

iii) o arguido apresenta fragilidades pessoais, ao nível da impulsividade, da gestão das emoções (raiva e frustração),da mediação das cognições e da antecipação de consequências, que limitam a sua capacidade para lidar com situações problemáticas/conflituosas ou que contrariam as suas expectativas.

mmm)o arguido apresenta um estado psicológico revelador de elevada tensão e sofrimento, bem como alguma ideação persecutória situação que dificulta um posicionamento adequado e estabelecimento de relações pessoais e sociais adequadas.

nnn) o arguido subestima a sua responsabilidade pessoal e o impacto das suas condutas em terceiros e imputando a outrem os obstáculos vivenciados, o que limita a sua orientação para a mudança pessoal.

000) o arguido apresenta visão com estereotipias relativamente aos papéis e funções de género.

ppp) o arguido apresenta uma personalidade instável e pautada pelos traços depressivos e impulsivos, no âmbito de uma estrutura de personalidade de tipo borderline (estado limite).

qqq) a personalidade do arguido é caracterizada por rigidez funcional e baixa capacidade de tolerância face ao stress.

rrr) a assistente vive em permanente medo, temendo que o arguido atinja a sua integridade física, dos seus filhos e do seu companheiro.

sss) ao arguido não são conhecidos antecedentes criminais.

2.2 factos não provados com relevância para a decisão da causa, além dos que se encontram em oposição com a factual idade dada como assente, não resultou provado que:

Do pedido de indemnização civil

1.a relação entre a assistente e o seu companheiro ficou dominada por um ambiente de suspeição.

2. a assistente despendeu a quantia de € 100 a título de aquisição de tintas, para apagar o que foi escrito pelo arguido em muros e paredes.

da contestação

3. as sessões de tratamento psicológico prestadas ao arguido pela assistente, na qualidade de psicóloga, terminaram quando aquele foi seduzido pela assistente.

4. as consequências psicológicas do fim da relação causaram ao arguido grande choque emocional em consequência da assistente e o seu companheiro frequentarem regularmente o parque urbano da bela vista, onde habitualmente efetua os seus treinos de atletismo e ciclismo.

5. o arguido e a assistente sempre trocaram mensagens entre si com um conteúdo dito normal para dois adultos que terminaram unilateralmente uma relação amorosa.

6. o arguido quando mostrava o dedo médio da mão, o metia na boca e chupava, fazia-o a conselho da assistente.

7. a assistente utiliza os registos clínicos das consultas e com objetivo de debilitar o arguido ainda mais a nível psicológico.

8. o arguido é assediado e perseguido pela assistente.

2.3 motivação da decisão de facto

para formar a sua decisão sobre a matéria de facto provada e não provada, o tribunal alicerçou-se na prova produzida na audiência de discussão e julgamento, mais precisamente nas declarações da assistente, em confronto com a prova testemunhal, conjugada com o teor da prova documental - designadamente, auto de transcrição de mensagens de fls. 29, 30; extrato da conta de telemóvel da ofendida de fls. 55 a 61; informação bancária em nome de cujos titulares da conta está associada aos carregamentos do telemóvel no 9362…, de fls. 71; fotografias de fls. 81, 82, 83, 84, 85; documentos de fls. 100, 101, 102; assentos de nascimento de fls. 152 a 154; relatório social da dgrsp de fls. 499 e ss. -, tudo apreciado à luz das regras de experiência comum e atento o princípio da livre apreciação da prova, nos termos do artigo 127° do código de processo penal; bem como o relatório pericial de fls. 461 e ss., tendo presente o disposto no artigo 163° do código de processo penal.

O arguido exerceu o direito ao silêncio.

Tomadas declarações à assistente C, a mesma depôs de modo espontâneo, coerente e genuíno, revelando conhecimento direto dos factos em apreciação, por os ter vivenciado.

Concretizou o período do relacionamento (de namoro) que manteve com o aqui arguido, momento em que surgiram os problemas denunciados já após a separação e após o conhecimento do arguido que a assistente tinha iniciado novo relacionamento - que mantém presentemente) e quando é que os mesmos se intensificaram (em 2014).

Declarou ter acompanhado o arguido como psicóloga durante 6 meses, afirmando perentoriamente só ter iniciado o relacionamento amoroso após ter dado como finda a sua intervenção no acompanhamento psicológico ao arguido.

De modo bastante pormenorizado, a assistente descreveu os comportamentos persecutórios do arguido à sua pessoa e das demais que a rodeavam (como os seus filhos, atual companheiro) - designadamente, as esperas que lhe fazia nos locais que bem sabia que faziam parte da rotina da assistente (como o seu local de trabalho, junto à escola dos filhos da declarante, das suas residências, da residência dos seus pais - e cujas rotinas não eram as mesmas do arguido) -, especificando a assistente, dias e horas (do mesmo dia) em que tal acontecia -, as inúmeras vezes que lhe exibia o dedo médio da mão (recolhendo os demais) e chupava, bem como chegou a cuspir para o chão, à sua passagem.

A assistente minuciou as várias chamadas telefónicas que recebia (designadamente, à noite, sendo verbalizados "ruídos estranhos", risos, "piadas" - nestas afirmou reconhecer, sem dúvida, a voz do arguido -, e várias vezes nada era dito), de número não identificado, e que face ao elevado número de chamadas que recebia, a perturbação que lhe causava, acabou por, em dezembro de 2013, pedir à comissão de dados a identificação do número de telefone - que a assistente indicou e identificou como pertencente ao aqui arguido.

Mais disse que chegou a visualizar o arguido em cabines telefónicas e em simultâneo a telefonar-lhe.

Concretizou a assistente algumas das mensagens remetidas pelo arguido e que se mostram integralmente transcritas no auto de fls. 29/30.

Descreveu o episódio relativamente ao dia 30.10.2015, afirmando que o mesmo, entre o mais, lhe apelidou "grande puta".

Afirmou que, no período aqui em apreciação, apareceram pinturas nas paredes, autocolantes com vários dizeres colocados no seu veículo - cujas expressões pormenorizou e que se mostram em consonância com o descrito na acusação -, acrescentando que aquando da colagem do autocolante com os dizeres "só vejo aldrabões... ", no seu veículo, visualizou que o arguido estava no local - indiciando, assim, que teria sido o próprio a ali o colocar, à semelhança dos demais.

Relativamente aos dizeres escritos com o nome "cris" - cfr. fls. 82/83/84, com os quais foi confrontada -, a assistente atribui a autoria dos mesmos ao aqui arguido, por ser o único que a tratava pelo diminutivo de c.

No que respeita ao imputado no artigo 16° da acusação, a assistente afirmou que tal fotografia (de fls. 81) se encontrava em poder do arguido, por ter sido a própria a assistente a lhe entregar no tempo de namoro de ambos - pelo que a autoria dos dizeres aí apostos "me liguem") e colada na montra do estabelecimento comercial (do companheiro da assistente) só poderia ser, uma vez mais, da autoria do aqui arguido.

Confrontada com os escritos de fls. 104 e ss., 167 e ss e 190 e ss., a assistente reconheceu-os, afirmando terem sido por si redigidos, para se relembrar das (inúmeras) situações - e cujo teor aqui se dá por reproduzido, e que se mostram em consonância com teor do libelo acusatório.

Descreveu a assistente as situações inerentes aos seus filhos, praticadas pelo arguido - nos termos descritos na acusação -, em que aqueles ficavam assustados, com muito medo do arguido, acrescentando que tais condutas do arguido tinham como propósito a atingir psicologicamente (o que conseguiu).

Declarou que todos estes comportamentos do arguido a afetam, sentindo, designadamente, picos de stress com episódios de vertigem, alterações do sono, níveis de alerta constantes, inquietação permanente, desgaste/cansaço muito grande, vivendo em permanente medo, em relação à sua integridade física, dos seus filhos e do seu companheiro.

Confirmou a assistente ter remetido algumas sms ao arguido, em resposta às por este envidas, explicando que o fez num momento já de saturação e revolta, quando percebeu que o arguido já não iria cessar a sua conduta perante si - achando que se fosse mais brusca, que o arguido iria cessar os seus comportamentos, o que acabou por não acontecer - tendo a assistente optado de deixar de lhe responder.

A testemunha AS, companheiro da assistente (cujo relacionamento se iniciou em outubro de 2012), depôs de modo calmo, sereno e sincero, demonstrando ter conhecimento direto de alguns dos factos por os ter presenciado.

A testemunha descreveu pormenorizadamente e em estrita consonância com o imputado no artigo 13° da acusação, afirmando que ouviu o arguido a verbalizar tais expressões, fazendo-o (propositadamente) ao lado da testemunha.

Descreveu as várias chamadas que eram feitas para a assistente e depoente, as horas (noturnas) em que eram realizadas, bem como o que era verbalizado, provenientes de número anónimo.

Concretizou as condutas persecutórias do arguido à assistente e inclusivamente à testemunha, as diversas vezes que o arguido levantava o dedo médio da mão e chupava-o - por referência à assistente.

Confrontado com a fotografia (da assistente, com os dizeres apostos "me liguem") de fls. 81, reconheceu como sendo a que tinha sido colocada na fachada da sua loja; bem como o escrito de fls. 102 ("putas adoro-as") colado no vidro do seu carro.

Em consonância com o descrito pela assistente, o depoente relatou a factualidade inerente ao dia 30.10.2015 (do artigo 26° da acusação), afirmando perentoriamente, entre o mais, que o arguido começou apelidou a assistente de "puta".

Relatou as expressões "cris puta" foram escritas na parede junto à horta da assistente, que eram sistematicamente pintadas, por um vizinho, por cima (apagando-as), mas voltavam a ser escritos iguais dizeres. afirmou ter visto o arguido, por diversas vezes, nas imediações naquele local.

Garantiu que ninguém trata a assistente por cris (à exceção do arguido).

Confrontado com os escritos de fls. 82 a 84, pormenorizou onde haviam sido apostos

Mais disse que o arguido reside longe da assistente, nem tem família ou amigos que ali residam.

Igualmente concretizou condutas do arguido perante os filhos da assistente, que teriam como objetivo atingir a própria a assistente.

Relatou que quando o arguido via o depoente e a assistente juntos, aquele não se controlava e fazia sempre na direção destes o gesto do dedo médio e a chupar, e muitas vezes cuspia para o chão, como expressão de "nojo".

O depoente afiançou que as situações vivenciadas pela assistente e causadas pelo arguido afetaram e muito a assistente, cujo stress lhe causava vertigens, ficando preocupada, em permanente estado de alerta, vendo-se obrigados a alterar as suas rotinas.

A testemunha MR, mãe da assistente, prestou um depoimento marcadamente emocionado e genuíno, revelando conhecimento direto de alguma da factual idade por a ter presenciado.

Afirmou que a partir de 2013 (após a assistente ter iniciado um novo relacionamento), a vida da filha e da família passou a ser um "inferno" (sic).

Declarou a testemunha visualizar, inúmeras vezes, o arguido a passar na rua ---, onde a depoente e a assistente residem. Visualizou numa dessas ocasiões o arguido a passar de carro na rua, colocando o braço fora da janela e a fazer um gesto obsceno (exibindo o dedo médio) para os netos mais novos da depoente (R e D).

Asseverou que o arguido não mora, não trabalha, nem os seus familiares diretos moram naquele local.

Confirmou que o arguido efetuava várias chamadas telefónicas para a assistente, tendo a depoente chegado a atender (quando a filha conduzia), especificando o teor das conversas e afiançando ser o arguido, por lhe reconhecer a voz.

Igualmente visualizou junto às casas da assistente e na horta de palmela os escritos "cris puta" - afiançando que somente o arguido tratava assim a assistente como "cris", sendo que as pessoas da família e amigos tratam-na por "tina" ou "tininha".

Relatou o que seu neto D (que teria, à data, uns 10 anos) lhe transmitiu que o arguido num ocasião acelerou na direção do menor - tendo a assistente a convicção que seria para criar medo e com o objeto de destabilizar a assistente - sendo um meio para atingir um fim.

Mais disse que os filhos da assistente têm medo do arguido - não querem estar sozinhos, nem fazem a sua vida de forma normal - sendo que a sua neta tem "pavor" (sic) do arguido.

A testemunha pm, filho da assistente, depôs com objetividade e isenção, embora em várias partes do seu depoimento, visivelmente emocionado e afetado com o teor do que relatava.

Referiu que após a sua mãe ter iniciado novo relacionamento (com o atual companheiro) apercebeu-se da presença do arguido na sua rua ( ---) - sendo que o arguido não mora ali, nem perto.

A avó dos filhos do arguido reside na avenida do Dufa, sendo que para se dirigir a essa avenida não precisa de entrar no bairro Santos Nicolau, muito menos na rua da sua residência, que é uma rua secundária.

descreveu situações que o arguido deliberadamente avançou com o carro na sua direção, quando o depoente quando seguia apeado no passeio", bem como concretizou as expressões a si dirigidas e sempre provocador.

declarou sentir medo do arguido, se estiver sozinho, receando que este atente contra a sua vida e da sua mãe.

referiu que a mãe e seus irmãos (r e d) lhe contaram que também eram perseguidos pelo arguido - embora a testemunha nunca tenha presenciado.

confirmou a testemunha que eram efetuadas as chamadas para os telefones da mãe, de modo muito persistente e durante a noite, o que era muito incomodativo - tendo sido a depoente que incentivou a mãe a dirigir-se junto da operadora para saber a identificação do número de telefone, o que aquela acabou por fazer.

mais disse que a mãe é tratada por alguns amigos e familiares por "tininha" ou por c - por "cris" desconhece se alguém o faça, nunca ouviu.

a testemunha r, não obstante a sua idade jovem (17 anos) e ser filha da assistente, prestou um depoimento marcado pela clareza e emocionado, tendo trespassado de forma nítida o seu sofrimento.

confirmou as várias chamadas de número de anonimo para o telefone da mãe e posteriormente para o telefone do atual namorado da mãe - o que acontecia por várias vezes, ao longo do mesmo dia e durante a noite.

declarou ter vivenciado ser perseguida de carro, juntamente com a sua mãe, pelo aqui arguido, que enquanto exercia a condução, este ía simultaneamente fazendo gestos obscenos (levantava o dedo médio e punha na boca). acrescentou que tais gestos lhe foram dirigidos várias vezes pelo arguido, o que chegou a acontecer quando estava com o seu irmão mais novo, o d. afiançou que há cerca de 1 a 2 anos, arguido tentou atropelar-lhe a si e ao irmão d quando estes estavam na rua, tendo o arguido acelerado o veículo que conduzia e guinando na sua direção, tendo a testemunha empurrado o irmão e a própria saltou de modo a não ser colhida - acrescentando que o seu irmão d também lhe relatou que o arguido numa outra ocasião acelerou o veículo na direção daquele.

igualmente a testemunha visualizou as tais inscrições com "cris" à porta da sua casa, na outra casa da av. --- e num muro junto à horta da baixa de palmela.

mais disse que os comportamentos do arguido causam-lhe muito medo, sentimento que se mantém, assim como o seu irmão d que igualmente sente muito medo.

mais disse que evitou contar à mãe todos os episódios por si sofridos, para a proteger, porque sabia que a mesma se ia sentir afetada.

a testemunha ol, não obstante ser amiga da assistente, prestou um depoimento isento, relatando que, em data que em concreto não se recorda, mas que situa no início do ano de 2015, e no final do dia, visualizou o aqui arguido (que não tem dúvidas que era o próprio) a passar de carrinha (azul escura), por duas vezes, na rua da assistente e fazendo um gesto obsceno (exibindo o dedo médio da mão).

referiu em consequência das várias chamadas que a assistente recebia (relatado por esta), apercebeu-se que a assistente ficava perturbada.

afiançou que assistente está muito abalada, vive num estado de alerta permanente, preocupação constante quanto a si e aos seus filhos.

igualmente viu a inscrição "cris" com o "i" e as "bolinhas" (sic) - afirmando não conhecer ninguém que trate a assistente por "cris".

a testemunha cc, que pese embora seja amiga da assistente, depôs com imparcialidade e objetividade, descrevendo pormenorizadamente as alterações comportamentais que tem notado na assistente, nos últimos 3 anos.

Presenciou uma situação de telefonemas insistentes de número anónimo, em que a assistente atendia e ninguém respondia - tendo nessa altura sido relatado pela assistente que isso acontecia com muita frequência. mais tarde esta disse-lhe que as chamadas passaram a ser de cabine telefónica.

Numa outra ocasião, na av. ---, visualizou uma carrinha azul escura a passar perto da residência da assistente, atravessando-se à sua frente, tendo esta lhe dito que era o seu ex-namorado, o aqui arguido, e que a perseguia.

Mais relatou que numa outra situação, quando se encontrava na residência da assistente, na av. .. alguém tocava insistentemente.

Em decorrência do que presenciou e do que lhe era relatado pela assistente, passou a telefonar mais à assistente, com preocupação por ela e pelos seus filhos

Por último, foi inquirida a testemunha LC - que foi companheiro da assistente até 13 anos atrás e é pai dos dois filhos mais velhos da assistente - que prestou um depoimento espontâneo, claro e rigoroso, revelando ter conhecimento de vários factos aqui em discussão, por os ter presenciado, tal como as várias chamadas consecutivas para o telefone da assistente (num espaço de meio de hora, seriam 3 a 4 chamadas), durante as refeições aos fins de semana (sendo usual nesses dias almoçar em casa dos ex-sogros, com estes, a assistente e os filhos comuns) apercebendo-se que tal situação causava transtorno à assistente e quem a rodeava (pais e filhos), ficando a mesma visivelmente perturbada.

Declarou que quando o arguido passava pelo depoente não fazia assinalar a sua presença, contrariamente quando este estava com os seus filhos (e da assistente), o arguido fazia-se sempre notar, designadamente, acelerando o seu veículo na rua - descrevendo as características da via, o que assistiu "n" vezes (sic).

Descreveu a testemunha outros episódios de perseguição encetada pelo arguido ao depoente quando se encontrava com os filhos, bem como uma situação de o arguido ter exibido o dedo médio da mão (simulando um pénis) ao menor d (ao mesmo tempo que gritava a expressão: "ó d, d, toma"),

Afiançou que os filhos mudaram comportamento, principalmente a filha r. (que tem manifesto receio do arguido, não tem concentração na escola, comportamentos de rebeldia, intranquilidade, ataques de pânico - que exterioriza junto do depoente - tendo passado a tomar medicação para controlar os níveis de ansiedade).

Declarou que os comportamentos do arguido junto dos filhos da assistente, visam atingir e perturbar a assistente - "eles são os danos colaterais" (sic).

Como consequência das condutas do arguido, a assistente tem estado muito mais ansiosa, os níveis de tolerância diminuíram e algumas das suas rotinas tiveram que alterar, concretizando-as.

Descreveu as características do veículo do arguido (carrinha, marca opel, de cor azul escura) - em consonância com o relatado por anteriores testemunhas.
*
Do confronto dos elementos probatórios carreados para os autos, resulta que as declarações da assistente c não só foram prestadas de modo credível, como se mostram corroboradas, em diversas vertentes, pelos descritos testemunhos (que presenciaram e vivenciaram alguns dos factos, bem como lhes foram sendo relatados pela vítima), como se viu - reforçando a credibilidade das suas declarações, em toda a sua extensão.

Acresce que do teor do auto de transcrição de mensagens de fls. 29/30 30, do extrato da conta de telemóvel da assistente de fls. 55 a 61, da informação bancária da identificação dos titulares da conta bancária associada aos carregamentos do telemóvel no 9362---, de fls. 71 (identificando o aqui arguido), em cotejo com as declarações da assistente e os enunciados depoimentos testemunhais, dúvidas não há que o autor das imputadas chamadas telefónicas e envio de srnss foram da autoria do arguido.

Quanto ao elemento subjetivo, o tribunal formou a sua convicção com base nas regras da experiência comum, pois faz parte da consciência generalizada dos cidadãos normalmente socializados que agredir psicologicamente, perturbar no dia-a-dia e no seu descanso, perseguir, humilhar, ofender a honra e consideração e amedrontar a ofendida, sua ex-namorada, bem sabendo que lhe devia um especial respeito bem como saberia, como qualquer cidadão sabe que tais condutas, com elevada reprovação social, constituem crime.

Pertencendo as intenções à esfera íntima de cada pessoa, o tribunal só as pode apreender de forma indireta, através da submissão de atos de natureza externa, empiricamente observáveis, ao crivo das regras da experiência e da ordem natural das coisas. assim, do comportamento do arguido, é possível, com o auxílio das regras de experiência, inferir a intencionalidade que lhe esteve subjacente, bem como o conhecimento pelo arguido do carácter censurável da sua conduta.

No mais, designadamente, quanto aos factos referentes à personalidade, situação pessoal, profissional e económica do arguido, nos termos dados como assentes nas alíneas eee) a qqq), teve-se em conta o relatório pericial de fls. 461 e ss. e o teor do relatório social da dgrs, de fls. 499 e ss.

A ausência de antecedentes criminais mostra-se certificada nos autos, a fls. 505.
*
No que respeita à factual idade descrita nos artigos 1. e 8., a mesma não resultou assente por total ausência de prova nesse sentido e/ou por se ter demonstrado a versão inversa.

2.4 enquadramento jurídico-penal dos factos

Estabelecido o quadro factual, importa efetuar o respetivo enquadramento jurídico.

O arguido vem acusado da prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, no 1, ai. b) e no 4 do código penal, e um crime de perturbação da vida privada, previsto e punido pelo artigo 190°, no 2 do código penal.

Do crime de violência doméstica

Dispõe o citado artigo 152°, no 1 que:
"quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais:

a) ao cônjuge ou ex-cônjuge;
b) a pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação;
c) a progenitor de descendente comum em 1.° grau; ou
d) a pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite;

é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legai".

Esta norma visa prevenir as formas de violência que tantas vezes ocorrem no seio da família e/ou do namoro, punindo não só as agressões físicas, mas todas as ofensas à dignidade da pessoa humana, visando a proteção da pessoa individual.

Como ensina Madalena Alarcão, "a violência doméstica constitui sempre uma forma de exercício do poder, mediante o uso da força (física, psicológica, económica, política), pelo que define inevitavelmente papéis complementares: assim surge o vitimador e a vítima. O recurso à força constitui-se como um método possível de resolução de conflitos interpessoais, procurando o vitimador que a vítima faça o que ele pretende, que concorde com ele ou, pura e simplesmente, que se anule e lhe reforce a sua posição/identidade. No entanto, e contrariamente ao comportamento agressivo, o comportamento violento não tem a intenção de fazer mal à outra pessoa, ainda que habitualmente isso aconteça. O objectivo final do comportamento violento é submeter o outro mediante o uso da força." - in (des)equílíbrios familiares, quarteto, 2000, pág. 296).

Constitui pois a saúde física e mental, o bem jurídico protegido pelo crime de maus-tratos/violência doméstica ao cônjuge ou a pessoa vivendo em condições análogas a essas, ou seja, é a própria pessoa individual e a sua dignidade humana que se visa proteger com o citado preceito legal.

Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.11.1997 (proferido no processo no 1225/97 - 3a secção - ao que sabemos impublicado) "o art. 152, do CP, no seu número 2, pune a actuação de quem infligir ao cônjuge maus tratos físicos ou morais, e a sua redacção teve como propósito a eliminação de algumas dúvidas que doutrinariamente tinham surgido na interpretação do art.º 153, do cp de 1982, e que conduziram a ter-se discutido se, no crime de maus tratos a cônjuge, fazia ou não parte do tipo uma certa habitualidade ou repetição de condutas ofensivas da integridade física ou moral do consorte ofendido, embora, a final, se tivesse fixado a jurisprudência no sentido de que, mesmo com a redacção de 1982, a referida figura criminal se poderia verificar com única agressão, desde que a sua gravidade intrínseca a pudesse fazer qualificar como tal.

A actual redacção, por consequência, mais não significa, no caso concreto, do que a incriminação, decorrente da lei penal, de condutas agressivas, mesmo que praticadas uma só vez, que se revistam de gravidade suficiente para poderem ser enquadradas na figura dos maus tratos".

Ou seja, para o cometimento deste crime basta que existam entre agente/vítima condutas agressivas revestidas de especial gravidade.

Constituem, assim, elementos objetivos deste tipo legal de crime:

- a existência de uma relação entre o agente e o sujeito passivo, a vítima, elencada nas ais. a) a d) do no 1 do citado artigo 152° (in casu, de ex-namoro);

- a atuação do arguido de forma adequada a molestar física ou psiquicamente a vítima (incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais); e

- a reiteração das condutas (que se traduz na repetição ao longo do tempo de comportamentos adequados a lesar o bem jurídico tutelado pela norma) ou uma conduta agressiva que se revista de especial gravidade.

é elemento subjetivo do tipo, o dolo, em qualquer das suas modalidades (direto, necessário ou eventual).

Do acervo probatório assente, resulta que o arguido JP e a assistente C mantiveram uma relação de namoro, um com o outro, sem existência de coabitação, que durou cerca de cinco anos e terminou em abril/maio de 2012 - estando, assim, verificada a relação entre o agente/arguido e o sujeito passivo/vítima, estatuída na al. b) do no 1 do citado artigo 152°.

Mais se provou que, em outubro de 2012, a assistente começou a relacionar-se com outra pessoa e deu conhecimento desse facto ao arguido, o que não foi bem aceite por este e desde então tem assumido um comportamento persecutório em relação à mesma.

O arguido começou a telefonar para a assistente quase diariamente e inúmeras vezes ao longo do dia e durante a noite.

Designadamente, no período compreendido entre 02 de dezembro de 2013 e 27 de abril de 2014, o arguido dos números de telemóvel 9363--- e 9337--- efetuou 82 chamadas telefónicas, de voz e/ou sms, para o telemóvel da ofendida com o número 91821--, sendo que não raras vezes a apelidava de "puta" ou dirigindo-lhe expressões como" agora estás com a cana cheia! agora estás com a boca cheia! os teus filhos devem é ter vergonha da mãe que têm, que troca de cama com tanta facilidade".

Também se tornou recorrente o arguido enviar mensagens escritas para o telemóvel da ofendida.

Assim, do número de telemóvel 93371--- o arguido enviou para o telemóvel da ofendida as seguintes mensagens:

- no dia 13.05.2014 pelas 09:02
"obrigada pelo dia lindo de ontem. és enorme. caso a história fosse inversa tb ficariam feliz, acredito. se estiveres com a dr. ana da-lhe cumprimentos pois nunca me cheguei a despedir dela. espero que contigo o tratamento tb resulte. do 'tratamento psiquiátrico compulsivo" ... "

no dia 16.05.2014 pelas 20:03.
"como resp. ao teu bom senso de não teres aparecido no parque esta manha tb não te esperei junto ao parque do teu trab. ele é que não tem correção. dorme bem"

- no dia 30.05.2014 pelas 19:01
"olá aguardo-te junto à porta da garagem"

- no dia 14.06.2014 pelas 10:03:16
"um bom dia. não deixes o carro tão longe de casa, senão vandalizao-no. talvez um dia saibas quem é e ficaras surpreendida!!!!".

paralelamente a estes comportamentos tornou-se recorrente o arguido passar de carro junto à residência da ofendida sita em av. ---, nesta cidade.

Bem como ficar na rua a observar e ver as rotinas da assistente.

No dia 24 de abril de 2014 a assistente fazia uma caminhada, acompanhada do seu parceiro, no parque verde da bela vista quando o arguido passou por si várias vezes, de bicicleta, e exibiu à mesma o dedo médio da mão, introduzindo o mesmo na boca e chupando-o. situação que voltou a suceder nos dias 28 e 29 de abril.

Chegou a suceder o arguido passar pela assistente e pelo seu companheiro, quando iam na rua, e o arguido cuspir de forma violenta para o chão na direção daqueles, situações que ocorreram em número indeterminado de vezes.

No dia 10 de maio de 2014, pelas 21h30, quando a assistente circulava de carro em direção à casa dos aos seus pais, sita na rua ----, o arguido seguiu-a ao volante do seu veículo, e após aquela ter entrado para casa dos seus pais, o arguido passou diversas vezes de carro junto àquela habitação.

No dia 12 de maio de 2014 voltou a segui-la quando aquela circulava pela cidade de setúbal e no dia 13 enviou-lhe novo sms.

No dia 16 de maio de 2014 o companheiro da ofendida estava a treinar no jardim da bela vista e o arguido passou por si. nesta altura, o arguido agarrou no telemóvel e começou a falar bem alto, de forma a que aquele ouvisse, dizendo "estás a ouvir, pá? a c. é uma puta! aquela gaja é uma vaca, faz o serviço todo completo. sabes que a boca não serve só para falar, serve para aquelas coisas que nós sabemos! ela faz o prato completo! se quiseres podes também tentar que consegues porque a ela vai o bairro todo!".

Para além destes comportamentos o arguido deixou um autocolante na parte traseira do veículo da ofendida com os dizeres "devoradora de homens".

Em consequência da conduta do arguido, a assistente cancelou o número de rede fixa que tinha na sua residência.

Porém, o arguido continuou a ligar-lhe para o seu número de telemóvel fazendo-o de cabines telefónicas fixas da pt, através dos números 26571---; 26570---; 26572--; 26570---; 26573---; 2655---; 26555---; 26552---; 265220---; 26572---; 26552--- e 26575--.

Chamadas efetuadas a qualquer hora do dia ou da noite, em que o arguido durante os telefonemas efetuados ri, ou remete-se ao silêncio ora efetua ruídos.

Em data não concretamente determinada, o arguido colocou uma fotografia da assistente com a cara riscada, colada na montra do estabelecimento do companheiro da mesma, com a menção "me liguem ... ".

Junto ao local de trabalho e da residência da assistente o arguido pintou em tinta spray encarnada a menção "cris", sendo que o 't' tem na parte inferior dois círculos, a simular um pénis - conforme teor de fls.82 e 83.

No veículo da assistente com a matrícula --ip--, o arguido colou os autocolantes com os dizeres "só vejo aldrabões ... " e "cabra gorda".

A partir de determinada altura o arguido começou, também, a efetuar telefonemas para o telemóvel do companheiro C., AS.

É recorrente o arguido a passar em frente da residência da assistente fazendo-se transportar de carro ou de bicicleta, e não raras vezes exibe o dedo médio da mão, enfiando o mesmo na boca e chupando-o, quer na direção da assistente ou do seu companheiro, quer na direção dos filhos daquela se estiverem presentes.

Aos fins de semana é usual a assistente, o companheiro e os filhos irem almoçar a casa dos pais daquela, sendo que o arguido passa de carro na rua onde os mesmos residem e efetua inúmeros telefonemas para o telemóvel da assistente e do seu companheiro.

A assistente tem três filhos: D, nascido em 10.03.2003; r., nascida em 11.08.1999 e p., nascido em 26.10.1995, sendo que o arguido não se coíbe de, também, os perseguir.

No dia 11 de abril de 2015, pelas 21h30, D. atravessava a estrada, na rua D. Gonçalo Pinheiro, nesta cidade de setúbal, quando avistou um carro a vir na sua direção acelerando, correu para o passeio e viu que era o arguido que conduzia o veículo.

Na última semana de junho de 2015, já em período de férias escolares, como os filhos da ofendida passavam muito tempo na rua com os amigos ou a jogar à bola, o arguido passava naquela rua inúmeras vezes e seguia-os de bicicleta para onde se deslocassem.

No dia 9 de julho de 2015, R. estava na baixa de setúbal, acompanhada com umas amigas quando o arguido se aproximou daquela dizendo "olá, r." e permaneceu no local onde estava a menor, até esta exasperada se dirigir ao arguido dizendo para que o mesmo a deixasse em paz.

No dia 30 de outubro de 2015, pelas 20h20, a ofendida e o companheiro saíram da residência, sita na av. ---, e quando desciam a escada que dá acesso à estrada cruzaram-se aí com o arguido o qual se dirigiu à assistente e lhe disse "ah! minha grande puta!".

Ato contínuo o arguido dirigiu-se ao companheiro da assistente caindo ambos na escada.

No dia 31 de outubro de 2015, próximo das 13h00, a assistente estacionou o seu veículo, enquanto esperava que o seu companheiro fechasse a loja sita na av. 5 de outubro nesta cidade, sendo que o arguido aguardava, também naquele local, no interior do seu veículo, tendo estacionado uns metros mais atrás do local onde estava a estacionada a assistente.

Após o companheiro da assistente entrar no veículo, onde esta o aguardava, o arguido iniciou a marcha da sua viatura e ao passar junto do veículo da assistente exibiu o dedo médio da mão, introduzindo-o na boca e chupando o mesmo.

O comportamento de perseguir a assistente e agregado familiar, bem como efetuar chamadas telefónicas persistiu durante os meses de novembro e dezembro de 2015.

Assim sucedeu no dia 10 de dezembro de 2015, em que pelas 19h20 o arguido passou de carro à porta da residência da ofendida, sita na rua---.

O mesmo sucedeu no dia seguinte pelas 19h55; no dia 15 pelas 09h13 e pelas 11h26; no dia 18 pelas 15h10; no dia 23 pelas 19h50; no dia 26 pelas 14h38.

No dia 17 de janeiro de 2016, pelas 18h30 o arguido tocou três vezes à campainha da residência da ofendida sita em Av.---.

Pelas 21h10 desse mesmo dia quando a assistente passeava o cão junto à rua pedro Fernandes Sardinha, o arguido passou de carro.

No dia 26 de janeiro de 2016, pelas 17h30, quando a ofendida se encontrava à porta da sua residência na rua ---, o arguido passou junto a si, de carro.

No dia 13 de fevereiro de 2016, pelas 16h50 quando a ofendida circulava de carro, acompanhada pela mãe e se dirigia para o seu escritório para aí deixar uns móveis, o arguido passou por si de carro.

Pelas 17h07, quando a assistente ia levar mais objetos para o seu escritório o arguido tornou a passar de carro novamente.

Quando a assistente chegou junto do seu escritório o arguido estacionou perto, esperando que aquela voltasse a sair e quando esta saiu seguiu-a de carro, sendo que a assistente seguiu na direção da Av. francisco xavier e o arguido seguiu na direção da av. luísa todi.

Pelas 19h12 desse mesmo dia 13, quando a assistente estacionou junto à sua residência na rua ---, o arguido voltou a passar junto à mesma de carro.

No dia 17 de março de 2016, pelas 20h48 quando a assistente estava a chegar a casa, na rua --, o arguido estava estacionado naquela rua e iniciou a marcha do veículo passando junto da assistente de carro, levando as luzes apagadas.

No dia 25 de março de 2016, pelas 14h00, a assistente saiu de casa, com o seu companheiro e quando se dirigiam a pé ao pingo doce, junto à rua moinho do frade, o arguido apareceu, de bicicleta, passou junto aos mesmos e exibiu o dedo médio da mão, pondo-o na boca e chupando o mesmo.

Paralelamente a estes comportamentos o arguido continua a efetuar chamadas telefónicas para a residência e telemóvel da assistente, bem como do seu companheiro.

O arguido atuou em todas as ocasiões com o propósito concretizado de maltratar psicologicamente a assistente, bem como de a ofender na sua honra e consideração.

Conhecedor das rotinas da assistente, o arguido quis persegui-la e abordá-la na via pública, bem como aos seus filhos, sempre com o propósito de a atingir psicologicamente, atemorizando-a, perturbando-a e humilhando-a, ofendendo dessa forma a sua dignidade enquanto ser humano, o que previu e logrou atingir.

Ao telefonar sistematicamente para a assistente quis o arguido perturbar a paz, a tranquilidade e sossego daquela, o que previu e logrou atingir.

Agiu sempre o arguido de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Perante este quadro fáctico, resulta que o arguido, de modo reiterado, no descrito período temporal, não só ofendeu a honra e consideração da assistente, sua ex-namorada (dirigindo-se diretamente a si, ou junto de terceiros, apelidando-a de "puta", "cabra", "devoradora de homens", como de outros comportamentos libidinosos impróprios; exibindo-lhe, em público, o dedo médio da mão, introduzindo o mesmo na boca e chupando-o - simulando a prática de sexo oral - felatio; bem como cuspindo de forma violenta para o chão na sua direção - como expressão de nojo), perturbando-lhe o seu dia-a-dia, a paz de espírito, sossego e o seu descanso, (telefonando-lhe continuamente, várias vezes ao dia, só com o intuito de a perturbar), bem como diariamente a perseguia, afetando-lhe a sua liberdade, causando-lhe sentimentos de insegurança e medo e afetando naturalmente a paz individual da vítima, que é condição de liberdade; bem como tinha os descritos comportamentos para com os filhos da assistente, com o objetivo de a perturbar ainda mais - e cujas condutas além de serem manifestamente censuráveis se revestem de especial gravidade.

Do que ficou exposto, dúvidas não nos assistem, que o arguido intencionalmente molestou psiquicamente a vítima, sua ex-namorada, e de modo reiterado, após a cessão do relacionamento amoroso e por causa dele.

Não se apuraram causas que excluíssem a ilicitude ou a culpa.

Pelo exposto, com a sua conduta, o arguido praticou o crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152°, no 1, ai. b) do código penal.»

Cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objeto do recurso.
a) É pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.

O arguido e recorrente vem impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto relativamente aos pontos n), o), q) s), t) u), z) bb), cc) e jj) da factualidade provada, nos termos do art. 412º nº3 do CPP, por considerar que os mesmos devem ser julgados não provados.

O arguido recorre ainda em matéria de direito, por entender que a factualidade provada não preenche todos os elementos típicos do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, nº 1, al. b) do Código Penal, pelo qual vem condenado.

São, pois, estas as questões a decidir.

O recorrente pretende ainda que seja julgado provado que a assistente lhe enviou as 85 SMS de que juntou cópias de fls 332 a 334 e 338 a 347, pois «… o tribunal a quo apenas considerou na fundamentação “que a ofendida enviou SMS ao arguido em respostas às por este enviadas”, omitindo as injúrias e ameaças que foram proferidas pela assistente contra o arguido o que certamente impunha decisão diversa da recorrida». Porém, conforme resulta dos termos da motivação de recurso, apesar de não o incluir na enumeração dos factos provados o tribunal a quo não deixou de considerar assente na fundamentação que a assistente enviou ao arguido aquelas mensagens, pelo que a discordância do arguido não se situa ao nível da matéria de facto. Todavia o arguido não concretiza em que termos o teor das mensagens que lhe foram enviadas pela assistente alteraria o sentido ou conteúdo da decisão sobre a matéria da culpabilidade e/ou da determinação da sanção, o que seria essencial para que o tribunal pudesse atribuir-lhe qualquer relevância a favor do arguido, pois as mensagens em si mesmas não têm que interferir na decisão do tribunal a quo sobre a responsabilidade do arguido. Como se diz na apreciação crítica da prova, o tribunal a quo considerou a explicação da assistente sobre tais mensagens, segundo a qual esta enviou as mensagens num momento de saturação e revolta, quando percebeu que o arguido já não iria cessar a sua conduta perante si – achando que se fosse mais brusca, que o arguido iria cessar os seus comportamentos, o que acabou por não acontecer – tendo a assistente optado por deixar de lhe responder.». Face à motivação do recorrente nada há, pois, a censurar à decisão recorrida relativamente às mensagens enviadas ao arguido pela assistente.

2. Decidindo.
Como referido, o arguido afirma impugnar a decisão que julgou provados os pontos n), o), q) s), t), u), z) bb), cc) e jj), da factualidade provada, nos termos do art. 412º nº3 do CPP.

2.1. – Todavia, relativamente aos pontos z) e bb) da factualidade provada o arguido não vem pôr em causa a decisão que julgou provados aqueles factos, mas antes a sua relevância jurídico-penal. Com efeito, quanto ao ponto z) , diz “VII – … o que é censurável é o facto dos miúdos jogarem futebol na estrada e não facto do arguido passar de carro na estrada. (…)« e afirma quanto ao ponto «VIII …. que no entendimento do arguido não são ilícitos, atendendo que se limita a cumprimentar a jovem” ». Nada há, pois, a decidir a este respeito em sede de impugnação da matéria de facto, tal como em matéria de direito, uma vez que o arguido não retira qualquer conclusão direta da afirmada irrelevância nem nós vislumbramos que alguma das questões da culpabilidade ou da determinação da sanção pudesse ser decidida de modo diferente caso concluíssemos pela mencionada irrelevância daquela factualidade.

2.2.Quanto aos pontos o) e u) o arguido põe em causa que o tribunal a quo tenha julgado provados aqueles factos sem prova direta, pois ninguém o viu colar autocolantes no veículo da assistente. Sem razão, porém, pois como é sabido o nosso processo penal não exclui a prova indireta dos factos, ou seja, a prova assente em inferências lógicas retiradas de factos indiretos ou instrumentais e das regras da experiência, tal como se verifica no caso presente. Como pode ler-se da apreciação crítica da prova, a assistente «Afirmou que, no período aqui em apreciação, apareceram pinturas nas paredes, autocolantes com vários dizeres colocados no seu veículo - cujas expressões pormenorizou e que se mostram em consonância com o descrito na acusação -, acrescentando que aquando da colagem do autocolante com os dizeres "só vejo aldrabões... ", no seu veículo, visualizou que o arguido estava no local - indiciando, assim, que teria sido o próprio a ali o colocar, à semelhança dos demais. ».

2.3. No que concerne à alínea n) o arguido alega que o depoimento do companheiro da assistente, AS, com quem se deu a interação ali descrita (16.05.2014), foi contraditório, mas dos artigos 16º a 19º, do texto da motivação não resulta qualquer contradição. Apenas pequenas diferenças entre dois momentos do seu depoimento e, por outro lado, não vem fundamentada pelo arguido a alegação conclusiva de que aquele depoimento foi pouco claro, impreciso e incoerente, pelo que improcede o recurso também nesta parte, pois não se demonstra qualquer vício ou erro de decisão mas, antes, mera discordância do arguido com a apreciação e valoração que o tribunal a quo fez daquele depoimento.

2.4. Quanto à al. s) dos factos provados, o tribunal julgou provado tal facto com base no depoimento da testemunha AS que, confrontado com a fotografia da assistente, com os dizeres apostos "me liguem" de fls. 81, reconheceu como sendo a que tinha sido colocada na fachada da sua loja, mas também com base nas declarações da assistente, que, além do mais, afirmou que foi ela quem ofereceu ao arguido a fotografia em causa que, assim, a tinha em seu poder à data dos factos.

Assim sendo, a testemunha AS disse ter visto a fotografia no local, contrariando a afirmação do arguido de que ninguém aí a vira, e a prova indireta de que foi o arguido quem a colou na montra do estabelecimento comercial (do companheiro da assistente) assenta em inferência lógica a partir da posse da fotografia por parte do arguido, do conjunto da factualidade provada de onde resulta a prática de diversos atos semelhantes de ofensa à assistente e das regras da experiência, pelo que é patente a falta de razão do arguido.

2.5. No que respeita à al. q), pode ler-se da apreciação crítica da prova que a assistente disse que chegou a visualizar o arguido em cabines telefónicas e em simultâneo a telefonar-lhe e que reconheceu, sem dúvida, a voz do arguido, pelo que não se compreende a alegada violação do princípio da livre apreciação da prova.

2.6. O arguido assenta a sua impugnação relativamente às alíneas t) e cc) na circunstância de a factualidade respetiva (pinturas com tinta de spray junto da residência e local de trabalho e agressões ao companheiro da assistente)) ter sido julgada provada apenas com base nas declarações da assistente e da testemunha AS, mas sem razão. Por um lado, a assistente não padece de qualquer capitis diminutio pelo facto de o ser face ao nosso código de processo penal, pelo que nada obsta a que a convicção do tribunal de julgamento assente neles; por outro, apesar de ninguém ter visto o arguido a pintar, nada obsta, como referido anteriormente, a que a prova desse facto assente em prova indireta, como sucedeu, a partir de declarações da assistente e depoimento da testemunha AS, conforme se explica na apreciação crítica da prova. Improcede, pois, a impugnação também nesta parte.

2.7. No que concerne à al. jj), é manifesta a falta de razão do arguido pois não se compreende em que assentaria a contradição que assinala na conclusão X, uma vez nada impedir que a assistente veja o rosto do arguido, reconhecendo-o, e que a amiga – testemunha CC – não tenha visto o rosto do arguido mas apenas as pernas de um homem a subir a escada para o terraço, pois apesar de estarem juntas bastam pequenas diferenças no momento e/ou ângulo de visualização do arguido, para explicarem a diferença verificada.

Nada há, pois, a censurar à decisão do tribunal recorrido em matéria de facto, revelando-se infundada a impugnação da decisão nos termos do art. 412º nº3 do CPP.

2.8. Em matéria de direito, pretende o recorrente que mesmo a considerar-se a factualidade julgada provada pelo tribunal a quo, o arguido não praticou o crime de violência doméstica, p.p. pelo artigo 152º do C.P. porquanto não resulta que a ofendida tenha uma posição de relação de “subordinação existencial” ou seja, numa posição de inferioridade e/ou dependência com o recorrente elemento fundamental do preenchimento daquele tipo de crime; as injúrias foram recíprocas e proferidas num contexto de troca de sms, sem violência física ou ofensiva do ponto de vista da dignidade da pessoa humana, alegando ainda que a única vítima da agressão física é o Recorrente.

Sem razão, porém.

Em primeiro lugar, a alegação de que foi vítima de agressão física por parte da assistente não tem o mínimo de suporte na factualidade provada.

Por outro lado, a sentença recorrida não acolheu a tese do arguido quanto à reciprocidade das injúrias, que segundo aquele teriam sido proferidas num contexto de troca de sms, pois conforme referimos na delimitação do objeto do recurso, o tribunal a quo considerou que a assistente enviou mensagens ao arguido num momento de saturação e revolta, quando percebeu que o arguido já não iria cessar a sua conduta perante si – achando que se fosse mais brusca, que o arguido iria cessar os seus comportamentos, o que acabou por não acontecer – tendo a assistente optado por deixar de lhe responder.”. Longe, pois, de um quadro de reciprocidade, gerador de responsabilidade mútua.

Por último, contrariamente ao que afirma o recorrente, não é elemento do tipo legal de violência doméstica que a ofendida tenha uma posição de relação de “subordinação existencial” ou seja, uma posição de inferioridade e/ou dependência com o recorrente, pois apesar de constituir uma realidade sociológica presente em muitas das situações de violência doméstica previstas no art. 152º do C. Penal, isso não significa que as esgote ou que constitua elemento típico de cuja demonstração depende a responsabilidade penal do agente.

O alargamento da punição prevista no art. 152º do C. Penal operado pela Lei 19/2013 de 21 de fevereiro, aos casos em que o crime é praticado por agente que tenha mantido com a vítima relação de namoro (independentemente de coabitação), como se verifica no caso presente, visa antes a proteção da vítima contra atos de violência contrários à confiança num comportamento de respeito e abstenção de atos violadores da integridade pessoal do ex-parceiro, incluindo as vítimas do chamado stalking em que o ex-namorado assume comportamentos retaliatórios e fortemente perturbadores da paz do ex-parceiro por não se conformar com o fim da relação ou com a assunção de uma relação amorosa com outra pessoa[1] - vd, os pontos a) a d) da factualidade provada.

Não está, nem tem que estar, em causa qualquer relação de “subordinação existencial” entre agente e vítima que enquadrasse o comportamento ilícito daquele, mas antes uma relação que a assistente quer ver efetivamente terminada mas que o arguido não quer deixar terminar, forçando o seu prolongamento através de atos que colocam em perigo a saúde física e mental da vítima que, entendida em sentido amplo, constitui o bem jurídico protegido pelo crime de perigo previsto no art. 152º nº1 do C. Penal – assim Nuno Brandão, A tutela penal especial reforçada da violência doméstica, Julgar nº 12 pp. 15 a 18 e Comentário Conimbricense do C.Penal, Vol. I 2ªed., p. 515 /A. Taipa de Carvalho).

Demonstrada exuberantemente a prática de maus tratos psíquicos à assistente por parte do arguido desde, pelo menos, dezembro de 2013, conforme detalhadamente explicado na sentença recorrida, nada há, pois, a censurar a esta decisão por considerar preenchido o tipo de violência doméstica previsto no art. 152º nº 1 b) do C. Penal, pelo que o recurso do arguido improcede igualmente em matéria de direito.

Dispositivo

Nesta conformidade, acordam os juízes da 2ª Subsecção criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, JP, mantendo-se integralmente a sentença condenatória recorrida.

Custas pelo arguido, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça devida – cfr arts. 513 nº1 b) do CPP e art 8º nº5 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) aprovado pelo citado Dec-lei 34/2008, conjugado com a tabela III a que se refere este último preceito.

Évora, 26 de setembro de 2017

(Processado em computador. Revisto pelo relator.)

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(António João Latas)

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(Carlos Jorge Berguete)

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[1] Podem ver-se alguns desenvolvimentos em António Latas, “As alterações ao Código Penal introduzidas pela Lei 19/2013 de 21 de fevereiro”, Revista do CEJ 2104-I pp 74 e elementos bibliográficos aí citados.