Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | MATA RIBEIRO | ||
| Descritores: | RECLAMAÇÃO CONTRA A RELAÇÃO DE BENS APRESENTAÇÃO DE PROVA | ||
| Data do Acordão: | 10/20/2011 | ||
| Votação: | DECISÃO SINGULAR | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
| Sumário: | 1 – No processo de inventário, a reclamação contra a relação de bens constitui um verdadeiro incidente do processado ao qual deve ser aplicável, por força do artº 302º do CPC as disposições relativas aos incidentes da instância. 2 – Nesse incidente as provas devem ser indicadas desde logo no requerimento de reclamação, bem como no requerimento de oposição, se esta for deduzida, em conformidade com o disposto no artº 303º n.º 1 do CPC. 3 - Se um interessado pretender efectuar alguma substituição de testemunha que tiver oportunamente indicado, poderá fazê-lo no prazo a que alude o artigo 512-A, nº1 do CPC, preceito este aplicável por analogia. | ||
| Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 245/08.5TBELV-A.E1 (1ª secção cível) ** O recurso é o próprio, sendo de manter o efeito atribuído, nada obstando ao conhecimento do seu objecto. Entendemos que a questão a decidir se apresenta de grande simplicidade, pelo que ao abrigo do disposto no artº 705º do Cód. Proc. Civil, iremos, desde já, proferir decisão sumária. ** Nos autos de inventário para partilha de bens em casos especiais, n.º 245-08.5TBELV-A a correr termos no Tribunal Judicial de Elvas (1º Juízo) em que são interessados A…e J…, ambos residentes em Campo Maior, foi na sequência dum requerimento daquela interessada, com vista a alteração do rol de testemunhas apresentado no âmbito de reclamação apresentada contra a relação de bens, proferido o seguinte despacho: “A reclamante requer a alteração ao rol de testemunhas que apresentou. Tendo em consideração que a reclamação contra a relação de bens apresentada pelo cabeça-de-casal reveste a natureza de incidente, as provas têm que ser apresentadas com os respectivos articulados, não sendo admissíveis alterações ou aditamentos ao rol de testemunhas – cfr. artº 303º n.º 1 do Código de Processo Civil. Assim sendo, indefiro o requerido por inadmissibilidade legal.” ** Não se conformando com esta decisão, veio a interessada interpor o presente recurso e apresentar as respectivas alegações, terminando por formular as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1º Em requerimento de fls. 91-93, a recorrente requer alteração ao rol apresentado, uma vez que, por mero lapso, a testemunha que aí consta é a própria requerida. 2º Tal prova, foi apresentada em sede de reclamação contra a relação de bens. 3º Foi indeferida a alteração pedida, com o fundamento que se transcreve: “…Tendo em consideração que a reclamação contra a relação de bens apresentada pelo cabeça-de-casal reveste a natureza de incidente, as provas têm que ser apresentadas com os respectivos articulados, não sendo admissíveis alterações ou aditamentos ao rol de testemunhas…” 4º Ora, no caso em apreço, estamos perante um processo de inventário para separação de meações, 5º Constituindo a reclamação contra a relação de bens apresentada pelo cabeça-decasal, uma fase processual, prevista como normal em relação ao processo de inventário, e, 6º Para a qual as partes são expressamente notificadas, in casu, veja-se despacho de fls. 52, 7º Não se vislumbra, a qualificação jurídica atribuída à reclamação contra a relação de bens, de que esta, reveste natureza de incidente, uma vez que, 8º Uma das características do incidente, é a sequência anómala de actos processuais com significativa tramitação própria. Não é o caso. 9º Assim, deverá ser revogado o despacho recorrido, por admissibilidade legal face ao artº 512-A do C.P.C. 10º Com efeito, a recorrente, após ter sido notificada da data de inquirição da testemunha, mediante despacho de fls 88, e 11º Ter tomado conhecimento após notificação da data para inquirição da testemunha, do erro material de escrita e identificação da mesma, 12º Procedeu, no prazo fixado pelo artº 512-A do C.P.C., ao pedido de alteração ao rol, pelo que, 13º Deveria o mesmo ter sido admitido. 14º A considerar-se revestida de natureza incidental a reclamação contra a relação de bens apresentada pelo cabeça-de-casal, 15º A recorrente apresentou no requerimento contra a relação de bens, a prova testemunhal. 16º E só mais tarde veio a verificar, que por mero lapso, a testemunha indicada, era a própria requerida, 17º E por via disso, requereu a sua alteração. 18º Tal alteração só decorreu de mero lapso de identificação, 19º E por isso, de erro material de escrita, o qual deve ser admitida a sua correcção, pois, 20º Bem podia a recorrente ter optado por nada dizer, 21º E na data designada para inquirição, aquando do momento em que fosse perguntado a identificação à testemunha, 22º Fosse invocado o erro de identificação, por lapso, passando a constar o nome correcto e fosse permitida a continuidade da inquirição, e consequente prova ou não dos factos objecto da reclamação. 23º Foi este o sentido do requerimento de fls 91-93, o qual, 24º Mereceu o despacho recorrido, razão pela qual, 25º A Juíz “ a quo “, fez uma incorrecta aplicação do artº 303º do C.P.C. ao considerar a reclamação contra a relação de bens, revestida de natureza de incidente, pois trata-se de uma fase da normal tramitação de um processo de inventário para a qual a parte foi expressamente notificada nos termos e para os efeitos dos artºs 1341-1343 e 1348 do C.P.C. 26º A ser considerada revestida de natureza de incidente a reclamação apresentada, mantém-se a incorrecta aplicação e interpretação do artº 303 do C.P.C, uma vez que, não foi relevado o facto da parte ter apresentado a sua prova em sede de tal reclamação. 27º A considerar-se revestida de natureza de incidente a reclamação contra a relação de bens, sempre deveria a Meretíssima Juíz “ A Quo “ ter aplicado por analogia aos incidentes da instância as regras de alteração ao rol de testemunhas estabelecidas no artº 512-A do C.P.C., não o tendo feito, violou por omissão, este preceito legal. 28º No entanto, porque se tratou de um erro material de identificação de testemunha, deveria ter sido admitida a sua rectificação e ordenada a sua inquirição. 29º Assim, deve ser dado provimento ao presente recurso e ser o despacho recorrido substituído por outro que admita a inquirição da testemunha requerida, pelos motivos invocados. Não consta que tivessem sido apresentadas contra alegações. ** Apreciando e decidindo Como se sabe o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, tendo por base as disposições combinadas dos artºs 660º n.º 2, 661º, 664º, 684º n.º 3 e 685º-A todos do Cód. Proc. Civil. Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar se, no caso concreto era admissível a alteração do rol de testemunhas e, como tal, a pretensão da interessada deveria ter sido deferida. * Para apreciação e decisão da questão há que ter em conta o seguinte circunstancialismo: - No âmbito do processo de inventário em que é interessada a ora recorrente, esta ao ser notificada para se pronunciar sobre a relação de bens, veio deduzir, nos termos do artº 1348º do CPC, reclamação contra a relação de bens apresentada pelo cabeça de casal, acusando, por um lado, falta e, por outro, exclusão de bens, tendo para prova do alegado, indicado como testemunha AC…, residente na Rua …, em Campo Maior; - É designada data para inquirição da testemunha arrolada, cuja inquirição não se chegou a realizar por as partes terem requerido a suspensão da instância, por um período de 30 dias o que lhes foi deferido; - Terminado o período de suspensão da instância, por despacho de 14/09/2010 foi designado o dia 04/11/2010 pelas 11 horas para inquirição da testemunha arrolada; - Por requerimento de 24/09/2010 a interessada, ora recorrente, solicitou a alteração do rol, indicando em substituição da testemunha inicialmente oferecida, T…, que identificou, tendo sobre este requerimento incidido o despacho impugnado. Conhecendo da questão Defende a recorrente que o Julgador a quo fez má aplicação do direito, uma vez que, por um lado, não estamos perante um incidente e, por outro, mesmo que se reconheça o carácter incidental, não foi tido em conta o que a lei prevê relativamente à possibilidade de substituição de testemunhas. No que respeita à vertente incidental diremos que apesar da reclamação contra a relação de bens seguir um processado imposto pela tramitação normal prevista no processo de inventário, não sendo reconhecido pelo legislador como um incidente especial e regulado especificamente, conforme decorre do preceituado nos artºs 1399º e seg do CPC, ela não deixa de caracterizar um verdadeiro incidente do processado,[1] o que obsta a que os termos deste não prossigam, enquanto não se der solução à reclamação, donde, embora não lhe sendo aplicáveis as normas relativas aos incidentes do inventário especialmente regulados no CPC, não poderão deixar de ter aplicabilidade as normas e regras que disciplinam os incidentes da causa em geral,[2] designadamente as disposições gerais referentes ao incidentes da instância. Assim, bem andou o Julgador a quo em defender que a reclamação de bens “reveste de natureza incidental”, o mesmo não podemos dizer da conclusão a que chegou de não ser “admissível alterações ou aditamentos ao rol de testemunhas” apresentado com o respectivo articulado, invocando o disposto no artº 303º n,º 1 do CPC. Embora o normativo inserto no artigo 303º, nº1 do CPC seja de carácter injuntivo, quando refere que as provas são indicadas, desde logo no requerimento em que é suscitado o incidente. Tal, quanto a nós, não impede ou impossibilita que posteriormente possa haver alteração do rol, dentro dos condicionalismos previstos na lei processual, uma vez que há que aplicar aos incidentes da instância, por analogia, as regras de alteração e aditamento do rol de testemunhas em acção declarativa prevenidas no artigo 512º-A do CPC. Dispõe este normativo epigrafado de “alteração do rol de testemunhas” que “o rol de testemunhas pode ser alterado ou aditado até 20 dias antes da data em que se realiza a audiência de julgamento, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de 5 dias”. No caso em apreço, a alteração ao rol solicitada pela interessada foi efectuada dentro do limite temporal previsto na aludida norma, uma vez que foi solicitada em 24/09/2010, quando a diligência de inquirição estava agendada para o dia 04/11/2010, ou seja, para daí a 40 dias. Assim, atento o lapso temporal, é manifesto que deveria ter sido admitida a alteração do rol de testemunhas, requerida pela ora recorrente. Nestes termos, merece procedência o recurso. * Para efeitos do n.º 7 do artº 713º do Cód. Processo Civil, em conclusão: 1 – No processo de inventário, a reclamação contra a relação de bens constitui um verdadeiro incidente do processado ao qual deve ser aplicável, por força do artº 302º do CPC as disposições relativas aos incidentes da instância. 2 – Nesse incidente as provas devem ser indicadas desde logo no requerimento de reclamação, bem como no requerimento de oposição, se esta for deduzida, em conformidade com o disposto no artº 303º n.º 1 do CPC. 3 - Se um interessado pretender efectuar alguma substituição de testemunha que tiver oportunamente indicado, poderá fazê-lo no prazo a que alude o artigo 512-A, nº1 do CPC, preceito este aplicável por analogia. * DECISÂO Pelo exposto, decide-se julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que, e em consonância com o que se deixou dito, possibilite a normal tramitação do incidente de reclamação da relação de bens, dando possibilidade de inquirir a testemunha arrolada, pela ora recorrente, em substituição da primitiva. Sem custas. Évora, 20 de Outubro de 2011 __________________________________________________________ Mata Ribeiro __________________________________________________ [1] - v. nomeadamente, Ac. do TRC de 11/07/1000 no agravo 1567/2000, 1ª secção, in www.trc.pt; Ac. do TRL de 08/02/2007 no processo 9011/06-2 in www.dgsi.pt; ac. do STJ de 22/03/2007 no processo 07B086 in www.dgsi.pt. [2] - v. Lopes Cardoso in Partilhas Judiciais, vol. I, 4º edição, 543; França Pitão in Processo de Inventário, 1996, 124. |