Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
503/16.5T8STB.E1
Relator: MARIA DOMINGAS
Descritores: DIREITO DE RETENÇÃO
CONSUMIDOR
Data do Acordão: 05/02/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I. A aplicação do segmento uniformizador do AUJ n.º 4/2014, de 20/03 circunscreve-se às situações em que o credor promitente-comprador não obteve cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência;
II. Fora das situações contempladas no AUJ, não distinguindo o legislador, na previsão da al. f) do n.º 1 do art.º 755.º, entre o promitente-comprador consumidor e aquele que não detém tal qualidade e não procedendo as razões que levaram ao entendimento restritivo plasmado no acórdão uniformizador, não cabe ao intérprete fazer tal distinção.
III. O direito de retenção reconhecido, quer ao abrigo do disposto no art.º 754.º (crédito ilíquido), quer do art.º 755.º, é oponível à subadquirente de imóvel que fora objecto de contrato promessa de compra e venda com traditio, o que resulta da sua eficácia erga omnes, uma vez que já se tinha constituído aquando da transmissão do direito de propriedade.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 503/16.5T8STB.E1


I – Relatório:
(…) e (…), instauraram contra Construções (…), Unipessoal, Lda, e Banco (…), SA, que veio a ser incorporada por fusão no Banco (…), SA, acção declarativa de condenação, a seguir a forma única do processo comum, pedindo a final:
a) fossem declarados resolvidos, por definitivamente não cumpridos, os contratos promessa de compra e venda celebrados entre os AA. e a 1.ª R., por motivo exclusivamente imputável a esta;
b) a condenação da 1.ª R. a restituir aos demandantes a quantia de € 120.000,00, correspondente ao dobro dos sinais que deles recebeu, por força do incumprimento dos contratos promessa de compra e venda celebrados entre as partes, acrescida de juros de mora contados à taxa legal até efectivo e integral pagamento;
c) o reconhecimento da posse que vêm exercendo sobre a fracção autónoma designada pela letra “L” (loja n.º 2) do prédio urbano sito na Rua (…), n.º 138, 2910 Setúbal, freguesia de São Sebastião, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), desde o dia 10/01/2007;
d) o reconhecimento do seu direito de retenção sobre a mesma fracção até efectivo e integral pagamento de todos os créditos que lhes são devidos, no valor global de 130.000,00 euros (€ 70.000,00, a título de sinal prestado em dobro e € 60.000,00, a título de despesas efectuadas no imóvel);
e) a condenação da 2.ª Ré a restituir aos AA a posse do imóvel com todos os seus materiais, utensílios e equipamentos, sob pena de incorrer numa penalização de € 250,00 por cada dia de atraso na restituição dos referidos bens (imóvel e/ou imóveis);
f) a condenação da 2.ª Ré no pagamento aos AA de indemnização por privação de imóvel e acesso aos bens e equipamentos que se encontram no seu interior, a liquidar em execução de sentença nos termos do art.º 483.º CC, por forma a ressarcir os danos sofridos e despesas realizadas na fracção traditada.
Para tanto alegaram, em síntese, ter celebrado com a 1.ª Ré dois contratos promessa de compra e venda tendo por objecto as duas fracções que identificaram, no âmbito dos quais procederam à entrega da quantia global de € 60.000,00 a título de sinal, tendo ocorrido a tradição da fracção designada pela letra L.
Mais alegaram que por escritura celebrada em 20 de Outubro de 2007 a promitente vendedora procedeu à venda da totalidade do prédio, com todas as suas fracções autónomas, ao credor hipotecário, o aqui segundo R. Banco (…), incumprindo de forma definitiva os contratos celebrados com os demandantes.
Os AA realizaram entretanto várias obras na dita fracção L e nela instalaram diversos equipamentos tendo em vista a exploração de um estabelecimento de snack-bar e restaurante, no que despenderam cerca de € 94.255,20, a que acresce o seu direito à indemnização correspondente ao dobro do sinal prestado, créditos que gozam de direito de retenção, factos conhecidos do 2.º R. Não obstante, em Novembro de 2015 o Banco (…) procedeu à mudança das fechaduras da aludida fracção, assim violando a posse e o direito de retenção dos demandantes e causando-lhes prejuízos, o que fundamenta a presente demanda.
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Citadas as RR, apresentou contestação o Banco (…) SA, peça na qual se defendeu por excepção, tendo invocado a ineptidão parcial da petição inicial por terem os AA formulado indevidamente pedido genérico no que concerne à entrega dos “materiais, utensílios e equipamentos”, e também no que se refere à pretendida indemnização pela “privação do imóvel e acesso aos bens e equipamentos que se encontram no seu interior”, pretensão que não encontra suporte nos factos alegados, uma vez que em parte alguma foram discriminados os bens e equipamentos de que os demandantes alegadamente se viram privados, apresentando-se ainda como “contraditórios entre si” os pedidos formulados sob as als. C) e E).
Acrescentou que em todo o caso as alegadas benfeitorias realizadas, não integrando o conceito de “despesas feitas por causa da coisa”, não fundamentam o invocado direito de retenção, o qual, a fundar-se em alegada tradição, estaria extinto pelo abandono da fracção por banda dos AA.
Em sede de impugnação alegou desconhecer as relações que se estabeleceram entre os AA e a Ré construtora, sabendo apenas que quando as fracções lhe foram por esta entregues, na sequência do contrato celebrado, se encontravam ambas desocupadas, impondo-se portanto a sua absolvição.
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Verificada a extinção da segunda ré e encerramento da liquidação que se lhe seguiu, foi citado o seu único sócio (…) Unipessoal, para com ele seguir a acção seus termos subsequentes, não tendo este deduzido qualquer oposição.
Após pronúncia dos AA sobre a matéria da excepção teve lugar a audiência prévia e nela, frustrada a conciliação das partes, prosseguiram os autos com prolação de despacho saneador, no âmbito do qual, por se considerar que não se verificava “ininteligibilidade da causa de pedir nem cumulação de causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis” concluiu-se que “a petição inicial não estava ferida de ineptidão”. Não obstante, no entendimento de que não se encontravam especificados, nem as obras executadas na fracção, nem os bens e equipamentos que alegadamente nela instalaram, foram os AA convidados a aperfeiçoar a petição inicial, o que fizeram nos termos do articulado de fls. 169-170.
Após pronúncia por banda do Ré Banco (…), SA, e no prosseguimento da audiência prévia, foi delimitado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, que se fixaram sem reclamação das partes.
Por ter sido entretanto transmitida a terceiro a fracção autónoma designada pela letra L, requereram os AA a intervenção principal da adquirente (…), Consultores de Gestão, Lda, “para intervir nos autos a título principal e como associada da 2.ª Ré”, incidente que veio a ser deferido (cf. despacho de fls. 191-192).
Citada a chamada, declarou aderir aos articulados apresentados pelo Banco (…), SA.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que, na parcial procedência da acção, decretou como segue:
1) declarou resolvidos, por definitivamente não cumpridos, os contratos promessa de compra e venda celebrados entre os AA. e a 1ª R., por motivo exclusivamente imputável a esta;
2) condenou o R. (…) a restituir aos AA. a quantia de € 120.000,00, correspondente ao dobro dos sinais que deles recebeu, por força do incumprimento dos contratos promessa de compra e venda celebrados entre as partes, acrescida de juros de mora contados desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento;
3) reconheceu a posse aos AA. da fracção autónoma designada pela letra “L” (loja n.º 2) do prédio urbano sito na Rua (…), n.º 138, 2910 Setúbal, freguesia de São Sebastião, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal, sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), desde o dia 10/01/2007;
4) reconheceu aos AA. o direito de retenção sobre a fracção autónoma designada sobre a letra “L”, até efectivo e integral pagamento de todos os créditos que lhes são devidos, por força do incumprimento do contrato promessa relativo à venda da referida fracção autónoma que se fixam no valor de € 70.000,00, a título de dobro do sinal prestado em dobro, e no montante das despesas efectuadas no imóvel (a liquidar em execução de sentença);
5) condenou a R. (…) – Consultores de Gestão, Lda. a restituir aos AA a posse do imóvel com todos os seus materiais, utensílios e equipamentos, sob pena de incorrer numa penalização de € 250,00 por cada dia de atraso na restituição dos referidos bens (imóvel e/ou imóveis);
6) condenou o R. Banco (…), SA a pagar uma indemnização aos AA. pelas despesas realizadas no imóvel traditado (obras, bens e equipamentos), fracção autónoma designada pela letra “L” (loja n.º 2) do prédio urbano sito na Rua (…), n.º 138, 2910 Setúbal, freguesia de São Sebastião, a liquidar em execução de sentença.
7) absolveu o R. Banco (…), SA da indemnização peticionada por privação de uso da fracção traditada.

Inconformados, recorreram em peça única os R. Banco (…), SA e a interveniente (…) – consultores de gestão, Lda e, tendo desenvolvido nas alegações as razões da sua discordância com o decidido, formularam a final as seguintes conclusões:
“I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pela 1.ª Instância que julgou a ação parcialmente procedente.
II. Como decorre da decisão, a Ré (…) foi condenada a restituir aos AA a posse do imóvel com todos os seus materiais, utensílios e equipamentos, sob pena de incorrer numa penalização de € 250,00 por cada dia de atraso na restituição dos referidos bens (imóvel e/ou imóveis);
III. A condenação ínsita naquela alínea decorreu do reconhecimento da posse dos AA sobre a fração autónoma designada pela letra “L” (loja n.º 2) do prédio urbano sito na Rua (…), n.º 138, 2910 Setúbal, freguesia de São Sebastião, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal, sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), desde o dia 10/01/2007 e, bem assim, do direito de retenção sobre o mesmo imóvel até efetivo e integral pagamento de todos os créditos que lhes são devidos, por força do incumprimento do contrato promessa relativo à venda da referida fração autónoma, que se fixaram no valor de € 70.000,00, a título de dobro do sinal prestado e no montante das despesas efetuadas no imóvel (a liquidar em execução de sentença).
IV. Apesar de os Réus não se conformarem com o reconhecimento aos AA da posse sobre a fração autónoma em causa e, inerentemente, com o direito de retenção sobre a mesma pelo valor dos créditos invocados, e nem a determinação de entrega do imóvel, já que o direito de retenção, enquanto direito real de garantia que é, confere ao seu titular um direito de crédito a ser pago pelo produto da venda com preferência sobre os demais créditos que hajam de ser pagos pelo mesmo, e não o direito de reter a coisa,
V. Ainda assim atendendo à condenação ínsita na alínea 5) da sentença proferida pelo Tribunal a quo, e muito embora os ora apelantes se encontrem seguros de que aquela decisão deverá ser revogada por V. Exas. Venerandos Desembargadores, a ora Recorrente (…) não pretende correr o risco de, perante uma confirmação daquela condenação, ver ser-lhe aplicada uma penalização de € 250,00 por cada dia de atraso na restituição da fração em causa e bem assim dos bens móveis que lá se encontram – e cuja entrega aos AA desde sempre os RR se manifestaram disponíveis para fazer, mediante exibição dos comprovativos de propriedade.
VI. A Ré (…) manifesta aos AA a disponibilidade para proceder à entrega da posse do imóvel com todos os seus materiais, utensílios e equipamentos, entrega esta que há de ser devidamente titulada em termo de entrega de Imóvel e bens móveis no seguimento da decisão proferida e do qual deverá decorrer a obrigação de restituição da posse pelos AA à (…) caso a parte da decisão que determina a entrega do imóvel aos AA seja revogada por decisão transitada em julgado.
VII. No que respeita aos motivos de discórdia com a douta sentença da qual se recorre, começam os ora Recorrentes por considerar que a condenação ínsita na sentença emanada do Tribunal de 1ª instância padece de contradição, já que os AA estarão a beneficiar de um enriquecimento ilegítimo face aos direitos que lhes são atribuídos por lei mediante o reconhecimento de um putativo direito de retenção.
VIII. Efetivamente, o direito de retenção do promitente-comprador enquanto direito real de garantia, é invocável pelo promitente-comprador que obteve a traditio, visando a garantia do crédito pelo dobro do sinal prestado, em caso de incumprimento definitivo do contrato pelo promitente-vendedor e logo, contrário ao direito que lhe adviria do cumprimento daquele CPCV – a celebração do contrato prometido e entrega do Imóvel.
IX. Sucede que a sentença em apreço reconhece aos AA tanto o direito de crédito como o direito a ter a posse efetiva do Imóvel, condenando a (…), sua atual proprietária e possuidora, a restituir a posse aos AA.
X. Incorre, portanto, num excesso de tutela atribuído ao direito de retenção que reconheceu aos AA já que, cumprida ou executada a sentença na íntegra, assiste-se, não só a um enriquecimento sem causa dos AA – com direito de reter a coisa e ainda assim receber pelo valor das despesas realizadas na fração que retêm,
XI. E, por outro lado, a um desvirtuar completo do direito de propriedade da (…) sobre o Imóvel, já que apesar deste direito de propriedade não ter sido colocado em causa, mormente, mediante anulação da venda efetuada pela (...) Construções ao Banco … (que posteriormente vendeu à ora Ré …), fica reduzido na sua extensão de ter a posse e fruição da coisa, de sua propriedade, diminuindo o direito de propriedade da (…) em benefício do direito de retenção que reconhece aos AA.
XII. O que, aliás, contraria a fundamentação da sentença, na parte em que diz: In casu, não tendo ocorrido qualquer modificação subjectiva, o terceiro adquirente do prédio (incluindo as lojas 2 e 3) não assumiu qualquer obrigação perante o promitente-comprador, e assim permanece estranho à obrigação emergente do contrato promessa.
XIII. Na verdade, a prestação a cargo do promitente pode ser transmitida a terceiro, mas para isso torna-se necessário um ato de transmissão, via sucessória ou contratual (v.g. cessão da posição contratual), o que aqui não teve lugar.
XIV. Esta asserção contraria pois totalmente a decisão que vem a ser tomada a final na sentença ao determinar que o atual proprietário, apesar de permanecer estranho à obrigação emergente do contrato promessa e não haver sucedido ao anterior promitente vendedor na obrigação de contratar, deva ainda assim ser desconsiderado perante o direito de retenção reconhecido aos promitentes-compradores.
XV. Sendo ainda inteligível como desenrolar o impasse que o cumprimento ou execução desta sentença condenatória originará seguramente, já que a atual proprietária (…) deverá ficar subtraída dos direitos inerentes à sua propriedade sobre o imóvel, a aguardar que os AA cobrem o crédito reconhecido em sentença perante o Réu (…), mantendo os AA, até lá, quiçá, sine die, a posse do imóvel.
XVI. E, correndo o risco de poder vir a assistir-se à aquisição da propriedade daqueles por usucapião, caso decorram os prazos aplicáveis às circunstâncias da posse que é assim reconhecida aos AA
XVII. E, mais uma vez, em total desmerecimento do direito de propriedade da (…), e sem que para tanto a sentença haja fundamentado alguma anulação deste título de propriedade.
XVIII. E não se compare a prevalência do direito de retenção perante a hipoteca da sua prevalência perante um direito de propriedade pleno, de um terceiro de boa-fé, como é o atual proprietário e ora Recorrente, (…), comparação com a qual não pode conformar-se.
XIX. E, se por um lado, a sentença enaltece a prevalência do direito de retenção perante o direito decorrente de garantia real de hipoteca e, igualmente, determina que a atual proprietária é totalmente alheia à obrigação resultante do CPCV, mais não tendo sido transmitida a obrigação de contratar, ainda assim, faz perecer este direito de propriedade perante a sequela reconhecida ao direito de retenção.
XX. Conduzindo à situação de impasse de que o atual proprietário, que não é devedor dos AA, dever ficar subtraído do seu direito de posse até que os AA optem por obter o ressarcimento do seu crédito perante o Co-Réu (…).
XXI. E, portanto, acabe por ser a atual proprietária (…), atual proprietária do imóvel e terceiro de boa-fé perante a relação obrigacional entre os AA e Co-Réu (…), a única prejudicada.
XXII. Por todos os motivos elencados, e salvo o devido respeito, não se alcança, assim, como poderá esta decisão ser cumprida e considera-se, pois que a sentença padece de ambiguidade e obscuridade por intangibilidade da condenação, o que, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea c), última parte, é uma causa de nulidade da sentença.
XXIII. Efetivamente, nas palavras do Ilustre jurisconsulto, Prof. Doutor Lebre de Freitas, a obscuridade verifica-se “quando a sentença ou parte dela, é ininteligível” e a ambiguidade, quando “a sentença ou parte dela se apresenta total ou parcialmente, com um sentido duplo” (Lebre de Freitas, Código de Processo Civil, anotado, II, pg. 672).
XXIV. Podendo, inclusive, considerar-se que a decisão encontra-se em contradição com os seus fundamentos, já que, não sendo colocado em causa o direito de propriedade da Ré (…), ainda assim o mesmo é totalmente postergado na decisão, em face do direito à posse que é reconhecido aos AA.
XXV. O que se subsume na causa de nulidade preceituada na primeira parte da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC ou até na primeira parte da alínea d) daquele mesmo número.
XXVI. Nulidades essas que, requer-se, sejam reconhecidas.
XXVII. A sentença da qual se recorre também peça por incorreta valoração da prova produzida.
XXVIII. Dá a sentença como provado no ponto 8) da factualidade provada que 8) Os AA., no final do ano de 2006, deslocaram-se à agência da 2ª R. na Av. (…), em Setúbal, na qual entregaram as cópias dos contratos celebrados com a 1.ª R e solicitaram uma reunião com o Banco (…).
XXIX. Ora, resultou do depoimento da testemunha (…), que documento nenhum referente a contrato promessa sobre as aludidas frações constava do processo do Banco, afirmando esta testemunha no seu depoimento, cujo suporte áudio encontra-se no ficheiro com o nº 2018307112620_3397205_2871774, 3 min, 30 seg.
XXX. “eu fiquei um bocado espantado pois pensei que ia vender uma loja, que eram as loja que tinha em venda naquele prédio. Face àqueles factos, o que eu disse …olhe, mas isto há prazos legais, portanto, tentei explicar, o banco nestas coisas normalmente tenta cumprir com tudo o que é legalidade, e se nunca apareceu o seu contrato, portanto acho que teria que ter recorrido a um advogado e teria que ter defendido a sua posição”.
XXXI. E, quando questionado se tinha qualquer indicação de existirem contratos promessa sobre os imóveis, respondeu negativamente, min 5 seg. 45.
XXXII. Corrobora ainda, quando questionado novamente sobre se indagando junto do Banco internamente acerca da entrega dos aludidos contratos-promessa no balcão de Setúbal, min. 16, seg 18:
XXXIII. “Nunca se conseguiu, nem eles me trouxeram provas. Nem qualquer troca de correspondência, nem um nome, nem um número de telefone, e dentro dos serviços do banco nunca ninguém me soube dizer…ninguém tinha conhecimento disto”.
XXXIV. Pelo que, existindo uma contradição entre o que resultou da prova mediante declarações de parte da Autora (…) e aquela que decorreu de depoimento testemunhal, não poderia dar-se como provada a entrega ao Banco das cópias dos contratos celebrados entre os AA e 1ª Ré, devendo antes aquele ponto 8) da factualidade provada ter a seguinte redação:
Os AA., no final do ano de 2006, deslocaram-se à agência da 2ª R. na Av. (…), em Setúbal, e solicitaram uma reunião com o Banco (…).
XXXV. A sentença em crise dá ainda como provado, nos pontos 9) e 10) da factualidade provada:
9) (…) que veio a ocorrer uma reunião no início do ano de 2007, na sede da 2ª R. em Lisboa;
10) Nessa reunião o então responsável pela área do imobiliário da 2ª R. informou os AA. que o assunto seria analisado pelo departamento jurídico do Banco, tendo-lhes comunicado qual o nome do advogado com o qual os AA. teriam de reunir, no caso o Dr. (…).
XXXVI. Sucede que do depoimento da testemunha (…), resulta precisamente a impossibilidade de ser dado como provado este ponto da factualidade provada, já que o mesmo afirmou desconhecer por completo o referido advogado, pelo que não poderia ter reencaminhado os AA para reunião com este.
XXXVII. Isso é o que decorre expressamente do seu depoimento gravado sob o ficheiro n.º 20180516094729_3397205_2871774:
9 min 45 seg.
“O único ponto que eu aí, tenho a certeza, é que eu…esse Dr…desculpe?
- resposta do Mandatário dos AA: (…) – epá, não! E eu trabalhei com imensos escritórios de advogados, mais tarde tive, digamos, uma posição onde era eu o responsável, já em 2013, 2014, pelos escritórios, e de facto não diz! E também dir-lhe-ia que não era minha prática eu dizer ao Cliente vá ter com o Advogado “A”, que seria….”
XXXVIII. Afirmando ainda ao logo de todo o seu depoimento não se lembrar de todo da ocorrência da referida reunião com o AA.
XXXIX. Pelo que não poderia a sentença dar como provada aquela asserção, contrária ao que resultou do depoimento da testemunha.
XL. Devia antes ter dado como não provada a ocorrência daquela reunião, atenta a discrepância entre as declarações de parte e o depoimento testemunhal, pelo que os pontos 9) e 10) da factualidade provada haveriam antes que constar dos factos não provados.
XLI. E igualmente dar-se como não provados os pontos 11), 12), 13) e 14) da factualidade provada, devendo estes também passar a constar dos factos não provados, já que os mesmos decorreriam necessariamente da confirmação daquele ponto 10) da factualidade provada que, como se revelou testemunhalmente, não se revela correto.
XLII. Mais considerou a douta sentença como não provado que “Na altura da entrega das lojas aos colaboradores do Banco R por parte do gerente da Construções (…) a loja 2 estava desocupada”.
XLIII. Sucede que do depoimento da testemunha, (…), no ficheiro com o nº 2018307112620_3397205_2871774, resulta que não existia no banco qualquer indicação de os imóveis estarem ocupados, tendo respondido precisamente neste sentido quando questionado pela Mandatária do ora Recorrente, ao min 5, seg. 30.
XLIV. Do depoimento da testemunha (…) decorreu também precisamente o contrário do que resulta daquele facto provado, tendo este respondido no seu depoimento que, aquando da tomada de posse das chaves por parte do Banco, não houve recurso a qualquer diligência de arrombamento, tendo as chaves sido entregues pelo construtor, tal como resulta do depoimento gravado no ficheiro com o n.º 20180307115523_3397205_2871774, min 5, 50 seg. e mais concretamente aos 6 min daquela gravação, afirmando:
“A nota é que tinha sido o construtor a entregar as chaves”.
XLV. E, questionada a mesma testemunha, ao min.7, 33 seg, se a loja tinha evidências de estar ocupada, responde a testemunha “Não, nada.” “Tinha as obras feitas, apenas.”
XLVI. Mais respondendo que desde o momento de receção das chaves até à data em que esta testemunha alterou as suas funções no Banco, a 30 de Outubro de 2013, manteve-se tudo igual no que respeita à posse das chaves pelo Banco e, bem assim, à situação de desocupação da fração.
XLVII. Situação que, aliás, terá derivado na mudança do canhão da fechadura ocorrido em 2015 e que se deveu precisamente à constatação de que, apesar das alterações efetuadas no interior daquela fração, a mesma encontrava-se à data e pelo menos desde 2010, em situação de abandono.
XLVIII. Pelo que aquele mesmo ponto da matéria não provada, deveria antes constar da matéria provada, aditando-se ao ponto 72 da matéria provada, passando este a assumir a seguinte redação:
Na altura da entrega das lojas aos colaboradores do Banco R por parte do gerente da Construções (…) as lojas 2 e 3 estavam desocupadas.
XLIX. A situação de abandono configura uma perda da posse, nos termos do que dispõe o artigo Artigo 1267.º, nº 1, alínea a), do Código Civil, posse essa que é um elemento essencial do direito de retenção.
L. E mais se confirma esta situação de abandono das frações autónomas perante a constatação do facto de que, quando o Banco (…) mudou o canhão das fechaduras, já tinha as chaves dos imóveis há cerca de 5 anos.
LI. E, neste hiato temporal, os AA não exerceram qualquer ato de posse sobre as frações em causa.
LII. Na realidade, a factualidade dada como provada resultou em grande escala das declarações de parte prestadas em audiência pela A. (...),
LIII. E, apesar de o Tribunal considerar que prestou declarações de forma sincera e espontânea, não levou em consideração, precisamente, o interesse direto, que sempre deverá relevar para efeitos de razão de ciência do efeito probatório atribuído a essas mesmas declarações.
LIV. Pelo que, onde resulta contradição entre aquelas declarações e os depoimentos de testemunhas, isentas, que depuseram com credibilidade, e cujo desfecho da ação não afetará, deveria a sentença considerar como provado o que resulta destes depoimentos e não daquelas declarações.
LV. E, até em contrariedade com o que jurisprudência superior determina ao nível da valoração das declarações de parte, mormente o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-12-2014 que é citado na própria sentença «As declarações de parte que não constituam confissão só devem ser valoradas favoravelmente à parte que as produziu se obtiverem suficiente confirmação noutros meios de prova produzidos e/ou constantes dos autos.».
LVI. Consideram por fim os Recorrentes que a douta sentença em crise efetuou uma incorreta apreciação dos pressupostos do direito de retenção, já que a fração sobre a qual incidiu o dito direito de retenção a favor dos AA trata-se de uma fração autónoma designada de “Loja 2”, destinada ao comércio.
LVII. Aliás, decorre dos elementos constantes dos autos e, bem assim, da prova produzida, que os AA intentavam afetar/destinar a mencionada fração autónoma à atividade de snack-bar, a ser explorado pela filha da A, que atestou esse facto em sede de audiência de julgamento.
LVIII. E, na realidade, o acórdão uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça nº 4/2014 veio a fixar jurisprudência no sentido de restringir ao promitente-comprador “consumidor” o direito de retenção conferido pelo art.º 759º, nº 1, al. f), do Código Civil,
LIX. (…) o direito de retenção só tutela o promitente adquirente quando este for um consumidor, sendo que a norma do art.º 755º, nº 1, alínea f), do CC é uma norma material e excecional de proteção do consumidor e deve ser interpretada restritivamente para o beneficiar somente a ele.
LX. E o mesmo Supremo Tribunal de Justiça tem considerado que esta é a qualidade de sujeito final na transação do bem, excluindo os comerciantes e aqueles que destinam o imóvel a revenda para obtenção de lucro.
LXI. Por outro lado, e sustentando a posição seguida pela mais superior jurisprudência, a noção de consumidor segundo o artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 24/96, de 31/7 (com as alterações decorrentes do DL n.º 67/2003, de 08-04 e DL 84/2008, de 08-05), é a seguinte: «Considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios».
LXII. Pelo que não deveria a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo ter reconhecido qualquer direito de retenção a favor dos AA, devendo ser revogada nesta parte.
Com os transcritos fundamentos requereu que, na procedência do recurso, fosse revogada a decisão recorrida.
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Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões a decidir:
i. Indagar da nulidade da sentença;
ii. Determinar se ocorreu erro de julgamento no que se refere aos factos assentes de 8. a 14. e 2.º facto não provado;
iii. Decidir se os AA são titulares do direito de retenção sobre a fracção designada pela letra L.
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i. Das nulidades da sentença
Os recorrentes imputam à sentença recorrida o vício extremo da nulidade por, em seu dizer, se apresentar ambígua e obscura, incorrendo ainda em contradição quando considerados os seus fundamentos e a decisão. Tais vícios decorreriam de na decisão ter sido reconhecido aos AA direito de crédito proveniente das despesas realizadas, com a consequente condenação no respectivo pagamento e, por outro, o direito à posse efectiva do imóvel onde foram incorporadas as mais-valias, excesso de tutela que se traduz num injustificado locupletamento à custa da chamada (…); a contradição ocorre porque apesar de na fundamentação da sentença constar expressamente que o terceiro adquirente não assumiu qualquer obrigação perante os AA, promitentes-compradores, permanecendo estranho à obrigação emergente do contrato promessa, acaba por ver absolutamente desconsiderado o seu direito quando condenada na restituição da fracção.
As causas de nulidades da sentença são as taxativamente elencadas no n.º 1 do art.º 615.º do CPC, nelas se incluindo a contradição entre os fundamentos e a decisão ou a existência de “alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível” (cf. al. c).
Começando pelo último vício, resulta do texto legal que eventual ambiguidade ou obscuridade que afectem a sentença só a tornam nula se, por via daquelas, não for possível apreender o seu conteúdo.
Conforme esclarecia o Prof. Alberto dos Reis, escrevendo embora no âmbito de vigência do CPC de 1939, mas com plena actualidade[1], “(…) a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso, não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro, hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade; se determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo qual o pensamento do juiz”.
No mesmo sentido, sublinhou o STJ[2], que “Só existe, com efeito, obscuridade quando o tribunal proferiu decisão cujo sentido um tal destinatário não possa alcançar. A ambiguidade só relevará se vier a redundar em obscuridade, ou seja, se for tal que do respectivo texto ou contexto não se torne possível alcançar o sentido a atribuir ao passo da decisão que se reclama de ambíguo. Se dessa reclamação ressaltar à evidência que o reclamante compreendeu bem os fundamentos da decisão e apenas com os mesmos não concordou, bem como com o sentido decisório final, não ocorre a reclamada obscuridade/ambiguidade (…).”.
No que se refere ao vício consistente na oposição entre os fundamentos e a decisão, vem sendo reiteradamente afirmado pelos nossos Tribunais[3], na esteira do entendimento defendido a propósito da antes vigente alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, com conteúdo idêntico à al. c) do n.º 1 do art.º 615.º em vigor, que o mesmo só ocorre quando se verifique uma real contradição entre a parte dispositiva da sentença ou do acórdão e os respectivos fundamentos.
A nulidade em causa “...pressupõe um erro lógico na ponta final da argumentação jurídica: os fundamentos invocados apontam num sentido, e, inesperadamente, contra a conclusão decisória que dos mesmos, e dentro da linha de raciocínio adoptada, se esperava, veio-se a optar afinal pela solução adversa”[4].
No caso dos autos é certo que os ora apelantes foram condenados a reconhecer a posse dos AA sobre a fracção identificada e, bem assim, o direito de retenção sobre a mesma, em consequência do que foi a chamada condenada a proceder à entrega do imóvel traditado e o R. Banco (…) no pagamento de indemnização pelas despesas nele realizadas. Para assim decidir considerou-se na sentença apelada que o contrato promessa de compra e venda relativo à identificada fracção tinha sido definitivamente incumprido. E foi neste preciso contexto que se deixou explicitado que, sendo o terceiro adquirente estranho ao negócio e não tendo sucedido na posição contratual da promitente vendedora, não estava vinculado à celebração do contrato prometido, donde serem os AA titulares do direito à restituição do sinal em dobro, crédito garantido por direito de retenção, igualmente reconhecido, a par do decorrente do direito à indemnização pelas despesas feitas “por causa da coisa”. Finalmente, tendo concluído que os AA se encontravam na posse da fracção por força da traditio, foi a adquirente condenada na respectiva entrega.
Não procede ainda a invocação de que a sentença não se mostra inexequível, uma vez que, como se sabe, o direito de retenção extingue-se com a extinção do crédito garantido, (podendo ainda cessar pela prestação de caução, conforme prevê a al. d) do art.º 756.º do CC).
Decorre do que vem de se referir que, acertada ou não, a sentença apresenta-se clara, sendo o dispositivo o corolário lógico da fundamentação, sendo certo ainda que, discordando embora claramente do decidido, resulta dos termos competentes das alegações de recurso que o sentido da decisão foi perfeitamente apreendido pelos recorrentes. É quanto baste para que se conclua pela inexistência dos apontados vícios, improcedendo a arguição de nulidade da mesma.
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ii. impugnação da matéria de facto
As recorrentes impugnam a decisão proferida sobre a matéria de facto, indicando terem sido mal julgados, por erro de valoração da prova, os pontos 8. (este apenas no segmento em que se refere a entrega pelos AA de cópias dos contratos) a 14., os quais deveriam ter sido considerados, todos eles, não provados, e ainda o 2.º facto julgado não provado e que pretendem ter resultado demonstrado.
Censuram à decisão recorrida o facto de ter alicerçado a sua convicção, em exclusivo e ao arrepio do entendimento jurisprudencial dominante, nas declarações de parte prestadas pela autora mulher, desconsiderando de forma indevida os testemunhos, que pretendem muito mais credíveis, de (…), (…) e (…), nas passagens que identificam e transcrevem.
Estão em causa os seguintes factos provados:
8. Os AA., no final do ano de 2006, deslocaram-se à agência da 2.ª R. na Av. (…), em Setúbal, na qual entregaram as cópias dos contratos celebrados com a 1ª R e solicitaram uma reunião com o Banco (…),
9. (…) que veio a ocorrer no início do ano de 2007, na sede da 2.ª R. em Lisboa;
10. Nessa reunião o então responsável pela área do imobiliário da 2ª R. informou os AA. que o assunto seria analisado pelo departamento jurídico do Banco, tendo-lhes comunicado qual o nome do advogado com o qual os AA. teriam de reunir, no caso o Dr. (…).
11. Assim, decorridas cerca de 2/3 semanas após a reunião, os AA. reuniram com o Dr. (…) no seu escritório em Lisboa.
12. Nessa reunião os AA. voltaram a relatar o negócio que realizaram com a 1ª R., tendo deixado com o Dr. (…) a cópia dos contratos promessa assinados.
13. Na mesma data os AA. informaram que tinham a posse da Loja n.º 2, bem como que pretendiam realizar obras e benfeitorias no imóvel, com vista à instalação de um snack-bar/restaurante.
14. Em resposta, o Dr. (…) manifestou igualmente a intenção de apresentar uma solução amigável para a situação.
Facto não provado
Na altura da entrega das lojas aos colaboradores do Banco (…), SA por parte do gerente da Construções (…) a Loja 2 estava desocupada;
A este respeito parece oportuno referir que dada a pacífica qualificação do direito de retenção como direito real de garantia, logo, oponível erga omnes, incluindo a terceiro adquirente mesmo que de boa-fé, a factualidade vertida nos pontos 8 a 14 não se reveste, em nosso entender, de relevância para a decisão, o que nos dispensaria da sua apreciação. Dir-se-á, no entanto, prevenindo diverso entendimento, que a prova convocada pelas recorrentes não assume consistência para inverter o decidido; pelo contrário, considerando a sequência lógica dos factos vertidos em 5., 6. e 7., não impugnados, fazendo apelo às regras da experiência e também ao testemunho de (…), mencionado na motivação, razão não se vê para descredibilizar as declarações de parte prestadas pela autora mulher. E para tanto nem sequer relevará aqui discutir se este meio de prova deverá ser reservado, considerado o seu de carácter supletivo, para os factos da esfera restrita do declarante, se as declarações prestadas deverão ser consideradas apenas como princípio de prova, carecendo portanto de corroboração proveniente de outros meios probatórios, ou antes têm valor probatório autónomo, em pé de igualdade com outros meios de prova igualmente submetidos ao princípio da livre apreciação do julgador[5], tendo por assente -ponto em que convergem os diferentes entendimentos- que o juiz deve afrontar com particular cuidado a valoração de tais declarações, por corresponder a uma máxima da experiência que a parte tenderá a fazer dos factos um relato que favoreça a versão que trouxe aos autos e apoie a sua pretensão.
No que respeita ao segmento do ponto 8. impugnado, de escassa ou nula relevância repete-se, observa-se que o facto da testemunha (…) ter declarado que não conseguiu comprovar nos serviços a entrega dos documentos, destacando que os demandantes não tinham nenhum comprovativo da entrega, não assume consistência suficiente para contrariar o facto.
Por outro lado, vistas as declarações da autora, verifica-se que guardava memória dos factos, o que se justifica por se tratar de assunto que naturalmente se reveste para si de grande importância -ao invés do que ocorre com as testemunhas arroladas pelo réu Banco, que trataram deste assunto como ao longo dos anos trataram de muitos outros que lhes passaram pelas mãos no âmbito das funções que exerciam na instituição- e tendo-se os AA deslocado à agência, conforme de resto os impugnantes aceitam, faz todo o sentido, segundo as regras da experiência ou presunções judiciárias autorizadas, que se tenham feito acompanhar dos contratos promessa em ordem a expor a situação. E tendo solicitado reunião com o responsável na sede, parece igualmente natural que tal documentação tenha ficado na agência até para que fosse comunicado “à sede” o objecto da reunião que iria ter lugar. Não se vê assim razão para alterar o decidido, que se adequa ao modo como as coisas de ordinário ocorrem.
E que a reunião teve lugar, apesar da testemunha (…) – compreensivelmente, refira-se – dela não ter memória dado o tempo entretanto decorrido, resulta corroborado pelo testemunho perfeitamente isento prestado pela já mencionada (…), contabilista da filha da autora que se propunha explorar o estabelecimento que os apelados pretendiam instalar na fracção, a quem a ocorrência da mesma foi, ao tempo, referida, tendo ainda assistido a conversa telefónica entre a autora e o advogado do Banco sobre a temática em questão.
Mas as declarações prestadas pela autora resultam ainda corroboradas quando se considere o encadeado lógico e cronológico de factualidade dada como assente e não impugnada, fazendo mais uma vez apelo às regras da experiência comum,
Sem impugnação, encontra-se provado que a tradição da fracção ocorreu em 10 de Janeiro de 2007 (cf. declaração da promitente vendedora de fls. 49 dos autos), após o pagamento dos sinais que, conforme resulta do documento de fls. 43 dos autos, junto pelos demandantes, ocorreu em 27 de Dezembro de 2006 (cf. os pontos 5. e 6.). Ou seja, apesar da ordenação da matéria de facto não observar a ordem cronológica dos acontecimentos, a entrega da loja (se não também o pagamento do sinal) ocorreu seguramente depois dos AA terem tomado conhecimento das dificuldades económicas da construtora e da sua intenção de proceder à entrega do prédio ao banco financiador -que veio a acontecer, recorda-se, em abril de 2007-, mas antes da reunião com o dito advogado, na qual os AA lhe terão prestado tal informação. Tal referência explicará a afirmação da declarante no sentido daquele ter mencionado que a promessa tinha eficácia real, o que não era o caso mas se coaduna com a existência da traditio. Daí que a Mm.ª juíza tenha dado como provado, desviando-se do teor das declarações prestadas pela autora, que o Sr. Advogado foi informado da entrega na dita reunião, a qual, tendo ocorrido duas ou três semanas depois da deslocação à agência que teve lugar nos finais de Dezembro, aconteceu seguramente em data posterior ao referido dia 10 de Janeiro, data aposta na declaração emitida pela promitente vendedora.
Quanto ao ponto 14., afigura-se não oferecer dúvida que o Sr. Advogado terá efectivamente manifestado tal intenção, de resto do interesse de todos, sem o que os AA com certeza não teriam efectuado na fracção os avultados investimentos que se verifica terem efectuado.
No que se reporta ao facto não provado, que os apelantes pretendem ter ficado demonstrado por apelo aos testemunhos de (…) e (…), também não lhes assiste razão. Assim, a circunstância de, segundo referiu o primeiro, não haver notícia no banco de que a fracção estava ocupada não quer dizer que não estivesse; do mesmo modo, a circunstância de não terem recorrido ao arrombamento, tendo-se servido da chave entregue pelo construtor para aceder ao seu interior não significa que os AA não tivessem idêntico acesso. Por outro lado, e decisivamente, tal como a testemunha (…) reconheceu, tinham sido feitas obras -de adaptação a um estabelecimento de snack-bar/restaurante – sabendo-se ainda que ali se encontrava diverso equipamento não se vendo pois como defender que a fracção estava desocupada. Se com isso se quer dizer que o estabelecimento não se encontrava em funcionamento, tal corresponde à verdade, mas tal não tem o significado de desocupação ou abandono, conforme as recorrentes pretendem. É aliás a este respeito sintomático que, tal como a testemunha confirmou, tendo sido mudadas as fechaduras das restantes fracções do prédio, só anos mais tarde foi tomada a iniciativa de mudar a desta fracção, do que os AA deram prontamente conta, sinal evidente de que se deslocavam à loja.
Atento o exposto, e na improcedência da impugnação, mantém-se a decisão proferida sobre a matéria de facto.
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II. Fundamentação
De facto
Imodificada a decisão proferida sobre os factos, é a seguinte a factualidade relevante para a decisão, agora lógica e cronologicamente ordenada:
1. Os AA. contraíram matrimónio em 14/04/2000, sob o regime de comunhão de bens adquiridos.
2. Em 01/06/2006 e 22/08/2006, o A., (…), e a 1.ª R., Construções (…), Unip., Lda, outorgaram dois contratos promessa de compra e venda tendo por objecto a futura transação de dois imóveis de um edifício sito na Rua (…), n.º 138, em Setúbal,
3. Objectos dos contratos foram duas fracções autónomas (Lojas nºs 2 e 3), actualmente designadas pelas letras “L” (Loja nº 2) e “M” (Loja nº 3), com entrada, respectivamente, pelo n.º 138 C e pelo n.º 138 B do prédio urbano sito na Rua (…), em Setúbal, freguesia de São Sebastião, descrito na Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o nº (…) e inscrito na matriz sob o art. (…).
4. Os contraentes acordaram na cláusula 5.ª dos contratos que «A escritura respeitante a este contrato será feita assim que toda a documentação esteja em ordem”.
5. Tendo tido conhecimento de que a 1.ª R. estaria com dificuldades económicas para terminar as obras de construção do edifício, estando prestes a “entregar” o prédio ao credor hipotecário, ora 2.º R.,
6. Os AA., no final do ano de 2006, deslocaram-se à agência da 2.ª R. na Av. (…), em Setúbal, na qual entregaram as cópias dos contratos celebrados com a 1ª R e solicitaram uma reunião com o Banco (…).
7. Os AA. pagaram a totalidade dos sinais acordados nos contratos promessa, que importaram no valor global de € 60.000,00 (€ 35.000,00 + € 25.000,00 = € 60.000,00), que a promitente compradora declarou ter recebido em 27 de Dezembro de 2006 (doc. de fls. 43).
8. Tendo de seguida ocorrido a tradição do imóvel referente à Loja n.º 2 (fracção “L”), tendo os AA. recebido as chaves da 1.ª R. e tomado a posse imediata do imóvel.
9. Os AA reuniram com responsável do réu Banco (…) no início do ano de 2007, na sede da 2.ª R. em Lisboa;
10. Nessa reunião o então responsável pela área do imobiliário da 2ª R. informou os AA. que o assunto seria analisado pelo departamento jurídico do Banco, tendo-lhes comunicado qual o nome do advogado com o qual os AA. teriam de reunir, no caso o Dr. (…).
11. Assim, decorridas cerca de 2/3 semanas após a reunião, os AA. reuniram com o Dr. (…) no seu escritório em Lisboa.
12. Nessa reunião os AA. voltaram a relatar o negócio que realizaram com a 1ª R., tendo deixado com o Dr. (…) a cópia dos contratos promessa assinados.
13. Na mesma data os AA. informaram que tinham a posse da Loja nº 2, bem como que pretendiam realizar obras e benfeitorias no imóvel, com vista à instalação de um snack-bar/restaurante.
14. Em resposta, o Dr. (…) manifestou igualmente a intenção de apresentar uma solução amigável para a situação.
15. Em 30/04/2007 – a 1.ª R., Construções (…), Unip., Lda, vendeu a totalidade do prédio supra identificado, com todas as suas fracções autónomas, ao então credor hipotecário, R. Banco (…), SA, anteriormente designado por “(…) – Banco Nacional de (…), SA”, (conforme escritura de compra e venda junta a fls. 47).
16. Não existiu por parte das RR. qualquer informação/comunicação anterior ou posterior aos AA., relativamente ao negócio referido em 15.
17. A 1ª R. tendo sido interpelada e confrontada pelos AA. alguns meses após a venda do prédio na pessoa do seu legal representante, (…), informou que lamentava o sucedido, mas que não tinha capacidade e meios financeiros para os ressarcir.
18. Não obstante a compra e venda realizada entre as RR., os AA. continuaram a ter a posse da fracção “L” (Loja 2), decorrente da tradição do imóvel.
19. Os AA. realizaram várias obras no imóvel, bem como adquiriram e instalaram na Loja diversos artigos e equipamentos com vista à criação de um snack-bar/restaurante que seria explorado pela filha da Autora, (…), entre os quais:
20. Montagem (de raiz) da instalação eléctrica do imóvel, com vista à exploração de um snack-bar/restaurante;
21. Montagem (de raiz) da instalação gás do imóvel, com vista à exploração do snack-bar/ restaurante;
22. Montagem e instalação de um sistema automático de detecção e protecção de incêndio na Loja;
23. Montagem e colocação de novos pisos (mosaico) no imóvel;
24. Montagem e colocação de novos tectos no imóvel;
25. Edificação e adaptação (tendo em conta as dimensões específicas e o fim do imóvel) das paredes do salão, zona de apoio, cozinha, casas de banho e dispensa da Loja;
26. Pintura de todas as paredes e tectos do imóvel;
27. Fornecimento e montagem de um sistema de climatização de bomba de calor com evaporadores murais incluindo interligações electromecânicas;
28. Bens, utensílios e equipamentos adquiridos e instalados (à medida) no imóvel, com vista à exploração do snack-bar/restaurante:
29. Tubagem da instalação eléctrica existente no imóvel: 20 projectores “Ducto PL 2x26w”, 36 projectores “Ducto PL 2x18w”, 9 “Aplique Muro Embutir Inox SL02030IN” e 18 lâmpadas “Eco Genie 11W/865 E-27 Philips”; 60 lâmpadas “Megamen 9W Daylight GU10”, 13 projectores fixos “Zamak 113 NM” e 30 suportes “GU10 c/ Distanciador”;
30. 2 aparelhos de ar condicionado, marca LG, Mod. UU24W + UT24, potência 24000 btu/h;
31. 1 cortina de ar de 1,2 metros;
32. 1 conjunto/extractor de extracção de fumos;
33. 1 bancada p/ forno aço inox c/ Cal Has, p/ Tabuleiros, Forra Topo Esq. 670x700x900;
34. 1 bancada cafetaria aço inox lav. 340 x 340;
35. 1 máquina de lavar copos Mod. Steel 31;
36. 1 bancada aço inox T/Borras de café c/ 2 pratos 1500 x 600 x 900;
37. 1 bancada aço inox aberta c/ 2 prateleiras 1400 x 600 x 900;
38. 1 torradeira simples Mod. AT-370, marca Cosmos;
39. 1 hote aço inox c/ filtros gordura 1600 x 900 x 800;
40. 1 bancada aço inox F.T.D. 1200 x 700 x 900;
41. 1 fritadeira eléctrica bancada 8L GF-8SC;
42. 1 fogão gás bancadas c/ 2 queimadores Mod. FTGLT740;
43. 1 bancada de aço p/ preparar alimentos;
44. 1 vitrine refrigerado c/ grupo A, portas acrílico mod. 105 (vd. doc. nº 16);
45. 1 canto exterior neutro, dec. Ikarus laminado, portas acrílico mod. 45 (vd. doc. n.º 16);
46. 1 vitrine refrigerado c/ grupo A, portas acrílico mod. 150 (vd. doc. nº 16);
47. 1 caixa de saída Dec. Ikarus laminado c/ tampo de vidro, mod. 65 (vd. doc. nº 16);
48. 1 vitrine padaria c/ grupo A, portas acrílico mod. 105 (vd. doc. nº 16);
49. 2 grupos compressores (vd. doc. nº 16);
50. 1 rectro balcão Starnight (vd. doc. nº 16);
51. 1 máquina registradora (vd. doc. nº 16);
52. 1 bancada inox lavadouro duplo (vd. doc. nº 16);
53. 1 comando de pedal c/ 1100 x 500 x 900 (vd. doc. nº 16);
54. 1 bancada inox fechada c/ 2100 x 600 x 900 (vd. doc. nº 16);
55. 1 máquina lavar pratos Steel 41H (vd. doc. nº 16);
56. 1 máquina cortadora de carnes HBS 250 kosmo (vd. doc. nº 16);
57. 1 grelhador de placas GR 4.2 (vd. doc. nº 16);
58. 1 espremedor de citrinos marca Cunnil (vd. doc. nº 16);
59. Os AA. gastaram no imóvel a quantia de € 40.544,86 em bens, utensílios e equipamentos adquiridos com vista à exploração do snack-bar/restaurante.
Na presente data, o valor patrimonial dos imóveis objecto dos contratos promessa está fixado em € 123.480,00, no caso da fracção autónoma “L” (Loja nº 2) e em € 122.020,00, no caso da fracção autónoma “M” (Loja nº 3),
60) Em meados do mês de Novembro de 2015, ao deslocarem-se à Loja numa visita de rotina, os AA. foram confrontados com a mudança da fechadura do imóvel, facto que os impediu de aceder ao seu interior.
61. Tendo questionado alguns trabalhadores que se encontravam no prédio a executar obras de reparação a mando da 2.ª R., os AA. foram informados que a fechadura da Loja nº 2 tinha sido efectivamente mudada por ordem da 2.ª R., Banco (…), SA.
62. De imediato, os AA. deslocaram-se à agência da 2ª R. na Av. (…), em Setúbal, tendo sido agendada uma reunião com o responsável da área do imobiliário, Dr. (…), para o dia 30/11/2015.
63. Realizada a reunião na data agendada e exposta a situação, o Dr. (…) manifestou o seu total desconhecimento.
64. Ao longo dos últimos 9 (nove) anos, os AA. insistiram junto da 2.ª R. para que se obtivesse uma resposta com vista à resolução da situação supra exposta, tendo sido informados que se teria de aguardar mais algum tempo, tendo em conta os vários processos judiciais entretanto intentados contras as RR. relacionados com a venda do prédio.
65. (…) e as exigências urbanísticas promovidas pela autoridade administrativa (Câmara Municipal de Setúbal), que só veio a emitir a licença de utilização do edifício em 07/12/2010 (alvará nº 6/11).
66. Até à presente data, os AA. nunca foram contactados pelos representantes da 2ª R., para resolver a situação.
67. Presentemente, os AA. não têm acesso ao imóvel, desconhecendo qual o estado e destino dado aos equipamentos que se encontravam no seu interior.
68. Tendo interpelado formalmente o Banco (…), SA, assim como o Dr. (…), com vista à restituição imediata da posse do imóvel e à resolução extrajudicial da situação;
69. (…) até à presente data os AA. não receberam qualquer resposta formal por parte da 2.ª R., com excepção de um email do Dr. (…) dirigido ao mandatário dos AA., a dar conta que “o assunto foi remetido para o departamento jurídico do Banco”.
70. Em 27 de Dezembro de 2017 ocorreu a operação de fusão por incorporação do Banco (…) SA no Banco S… (…), SA.
71. As chaves do prédio foram entregues pelo gerente da Sociedade Construções e (…) Unipessoal, Lda. ao R. Banco (…) na sequência da venda outorgada em 2007.
72. Na altura da entrega das lojas aos colaboradores do Banco R por parte do gerente da Construções (…) a loja 3 estava desocupada.
73. A R. Construções (…) Unipessoal, Lda foi objecto de dissolução e encerramento da liquidação, datado de 31.10.2014.
74. Em 26.09.2016 Banco (…) SA vendeu à (…) – Consultores de Gestão Lda a loja n.º 2.
75. A (…) – Consultores de Gestão Limitada tem por objeto social: «A prestação de serviços de consultoria para a aquisição e gestão de carteiras de crédito ou quaisquer direitos reais e na aquisição e gestão de carteiras de crédito, da titularidade de instituições de crédito. A sociedade poderá ainda proceder à compra e venda de imóveis, incluindo a revenda dos adquiridos para esse fim, à gestão e administração de bens imóveis pertencentes à sociedade ou a terceiros, bem como à realização de projectos, avaliações, inspecções e, em geral, todo o tipo de prestação de serviços de consultadoria, relacionados com as actividades atrás referidas e ainda a prestação de serviços de consultoria nos domínios da gestão, da realização de estudos técnicos, económicos, financeiros, comerciais, de organização administrativa, revisão de contas e formação profissional.
Factos não provados:
- Os AA gastaram na loja 2, a título de mão-de-obra e materiais utilizados, a quantia de € 19.455,14;
- Na altura da entrega das lojas aos colaboradores do Banco (…), SA por parte do gerente da Construções (…) a Loja 2 estava desocupada;
- Os AA. abandonaram o projecto de instalar um snack bar na loja 2;
- Os AA. nunca tentaram junto da promitente vendedora a realização dos contratos definitivos.
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De Direito
Do direito de retenção
As apelantes contestam a existência do direito de retenção reconhecido aos AA, considerando que não têm a qualidade de consumidor. Trata-se de questão não suscitada em momento anterior, nada se dizendo a respeito na sentença apelada. Todavia, porque se trata de questão atinente à interpretação e aplicação do direito, dela se conhecerá.
Mostra-se consolidado nos autos que os AA celebraram com a 1.ª Ré – entretanto liquidada, tendo os autos prosseguido contra o seu único sócio – contrato-promessa de compra e venda tendo por objecto mediato a fracção autónoma designada pela letra L (dita loja n.º 2, apenas esta relevando para efeitos de apreciação dos fundamentos do recurso, o qual se mostra definitivamente cumprido, tendo os promitentes compradores direito a haver da contraente infiel o dobro do sinal entregue, no valor de € 70.000,00 (n.º 2 do art.º 442.º do Código Civil[6]). Assente está ainda, sem contestação, que a fracção foi traditada após o recebimento do sinal[7] e antes da transmissão, primeiro para o banco réu e, subsequentemente, para a chamada (…).
A propósito, dir-se-á preliminarmente que, conforme é sabido, o “contrato promessa é um acordo preliminar que tem por objecto uma convenção futura, o contrato prometido. (…) Reveste, em princípio, a natureza de puro contrato obrigacional, ainda que diversa seja a índole do contrato definitivo. Gera uma obrigação de prestação de facto, que tem de particular consistir na emissão de uma declaração negocial. Trata-se de um pactum de contrahendo.”[8].
Resulta do que vem de se dizer que a entrega da coisa prometida vender não constitui um efeito típico do contrato promessa de compra e venda (cf. art.º 410.º). Todavia, casos há em que as partes convencionam a “traditio” da coisa objecto do contrato prometido, o que pressupõe a sua entrega material e a correspondente detenção por banda do promitente-comprador. Tal acordo vem sendo caracterizado como um contrato atípico ou inominado, diferenciado do contrato promessa, constitutivo de um direito pessoal de gozo, traduzido na antecipação de um dos efeitos do contrato definitivo, no pressuposto da realização desse contrato[9], sem aptidão portanto para conferir posse. E assim ocorreu no caso que nos ocupa, devendo ter-se na devida consideração o facto de a promitente vendedora ter conservado as chaves da fracção, de que fez entrega ao banco adquirente apesar de ter traditado o imóvel aos AA em momento anterior (cf. ponto 71), assim denunciando inequivocamente que não transmitiu uma verdadeira posse para efeitos do disposto nos art.ºs 1251.º e seguintes.
Defluência do que acaba de se referir, a alusão a posse que consta dos pontos de facto a que correspondem agora os n.ºs 8 e 15 terá que se entender por referência à situação de detenção material e legítima. Não se subscreve assim a afirmação constante da sentença apelada, salvo o devido respeito sem suporte bastante na factualidade apurada, de que os AA “mantiveram a posse pública, titulada, contínua e pacífica do imóvel correspondente à fracção autónoma “L” (Loja nº 2) do prédio urbano sito na Rua (…), nº 138 C, em Setúbal, detendo e usufruindo do bem (corpus) e praticando todos os actos no imóvel como se fosse seu (animus), correspondente ao exercício de um direito real (cfr. arts. 1251º e 751º, nº 1, al. f) do CC)”. Tal divergência não assume, todavia, relevância, desde logo e decisivamente porque, tal como consta da decisão impugnada, a mera detenção material da coisa é bastante para o reconhecimento do direito de retenção, ao que acresce o facto de a lei facultar ao retentor o uso das acções possessórias previstas no art.º 1276.º e seguintes, conforme prevê expressamente o art.º 670, al. a), aplicável por força da remissão do n.º 3 do art.º 759.º.
Não questionando a existência da traditio, defendem agora as recorrentes, em sede do recurso interposto, que os AA não gozam de direito de retenção por não deterem a necessária qualidade de consumidores.
Pacificamente qualificado de direito real de garantia, o direito de retenção confere ao credor que tem em seu poder certa coisa pertencente ao devedor, não só a faculdade de se recusar a entregá-la enquanto o devedor não cumprir, como ainda a de executar a coisa e pagar-se à custa dela com preferência sobre os demais credores[10]. Numa outra formulação, é a “faculdade conferida por lei ao credor de continuar a detenção de uma coisa pertencente a outrem, para além do momento em que deveria satisfazer a respectiva entrega se o crédito não existisse e até à extinção desse crédito”[11]. Tal é o que resulta do disposto nos artigos 754.º, 758.º e 759.º.
No que respeita ao caso em apreço, cumpre esclarecer que foi reconhecida aos AA a titularidade de dois créditos, de origem diversa, ambos garantidos pelo direito de retenção. Com efeito, enquanto o crédito de € 70.000,00 correspondente ao dobro do sinal prestado goza do direito de retenção especial previsto na al. f) do n.º 1 do art.º 755.º, a indemnização pelas despesas realizadas no imóvel traditado, a liquidar, encontra-se garantida pelo direito de retenção genericamente previsto no art.º 754.º, não prejudicado pela iliquidez (cf. art.º 757.º, n.º 2).
Quanto ao direito de retenção conferido aos promitentes-compradores, só com a entrada em vigor do DL 236/80, de 18 de Julho, passaram a beneficiar desta garantia, dispondo o n.º 3 do art.º 442.º, na redacção que emergiu daquele diploma, que no caso de ter havido tradição da coisa objecto do contrato-promessa, o promitente-comprador gozava, nos termos gerais, do direito de retenção sobre ela pelo crédito resultante do incumprimento pelo promitente-vendedor.
Ponderou-se então que “1. O contrato-promessa tem sido a via através da qual os interessados em habitação própria têm procurado garantir a aquisição da desejada unidade habitacional, nos casos em que, por qualquer motivo (…) não é possível a imediata celebração do contrato de compra e venda.
Sucede, porém, que, por efeito do regime legal do contrato-promessa - adequado a épocas de estabilidade social e económica mas que não responde na justa medida a situações de rápida mutação da conjuntura económica e financeira em que avulta, como factor preponderante, a desvalorização da moeda -, inúmeros promitentes-compradores encontram-se em situação que justifica diversa tutela normativa. Com efeito, ou vêem frustradas as suas aspirações face à resolução do contrato pelo outro outorgante, com uma indemnização (o dobro do sinal passado) que nem sequer equivale já à importância inicialmente desembolsada, não cobrindo o dano emergente da resolução, ou acham-se coagidos, pela força das circunstâncias e para alcançarem o direito de propriedade da casa que, muitas vezes, já habitam e pagaram integralmente, a satisfazer exigências inesperadas que incomportavelmente agravam o preço inicialmente fixado” (do respectivo Preâmbulo).
Ciente da apontada realidade, e com o declarado intuito de “reajustar o regime legal do contrato-promessa, por forma a adequá-lo às realidades actuais, estabelecendo verdadeiro equilíbrio entre os outorgantes (o que passa pela mais eficiente tutela do promitente-comprador) e desmotivando a sua resolução com intuitos meramente especulativos”, o legislador estabeleceu que “no caso de ter havido tradição da coisa para o promitente-comprador, em que se criou forte expectativa de estabilização do negócio e uma situação de facto socialmente atendível, a indemnização devida por causa da resolução do contrato pelo promitente-vendedor, seja o valor que a coisa tiver ao tempo do incumprimento – medida do dano efectivamente sofrido –, conferindo-se ao promitente-comprador o direito de retenção da mesma coisa por tal crédito” (idem).
O regime jurídico do contrato promessa veio a ser alvo de alterações através do DL 379/86, de 11 de Novembro que, todavia, manteve as soluções introduzidas pelo DL 236/80, cujo objectivo precípuo, conforme destacou, “foi acautelar a posição do promitente-comprador de edifícios, ou de fracções autónomas destes, sobretudo quando destinados a fins habitacionais”, intervenção justificada por manifestas anomalias que a prática revelava (cf. Preâmbulo do diploma em causa).
Mais se deixou aí referido que, tendo “o legislador de 1980, para o caso de tradição antecipada da coisa objecto do contrato definitivo, concedido ao beneficiário da promessa o direito de retenção sobre a mesma, pelo crédito resultante do não cumprimento (artigo 442.º, n.º 3), pensou-se directamente no contrato-promessa de compra e venda de edifícios ou de fracções autónomas deles”. Sob ponderação que nada justificava que o instituto ficasse confinado a tão estreitos limites, e assinalando que em diversas previsões do artigo 755.º, n.º 1, do Código Civil desaparece ou dilui-se a conexão objectiva que o precedente artigo 754.º pressupõe, em termos gerais, entre a coisa e o crédito, alargou-se a concessão de tal direito ao beneficiário de qualquer promessa com “traditio rei”.
Finalmente, e reconhecendo embora que o problema levantava “particulares motivos de reflexão, precisamente em face da realidade que levou a conceder essa garantia: a da promessa de venda de edifícios ou de fracções autónomas destes, sobretudo destinados a habitação, por empresas construtoras, que, via de regra, recorrem a empréstimos, maxime tomados de instituições de crédito”, dado que o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, ainda que anteriormente registada (artigo 759.º, n.º 2, do Código Civil)”, expressou o legislador de 1986 com meridiana clareza que “Neste conflito de interesses, afigura-se razoável atribuir prioridade à tutela dos particulares. Vem na lógica da defesa do consumidor. Não que se desconheçam ou esqueçam a protecção devida aos legítimos direitos das instituições de crédito e o estímulo que merecem como elementos de enorme importância na dinamização da actividade económico-financeira. Porém, no caso, estas instituições, como profissionais, podem precaver-se, por exemplo, através de critérios ponderados de selectividade do crédito, mais facilmente do que o comum dos particulares a respeito das deficiências e da solvência das empresas construtoras.
Persiste, em suma, o direito de retenção que funciona desde 1980.”
Pois bem, subsistindo desde 1980 o direito de retenção conferido ao promitente-comprador tradiciário, não se tem furtado a críticas de vários quadrantes, nomeadamente no que se refere à prevalência legal de que goza sobre a hipoteca, apontando-se ainda a incongruência que resulta de se encontrar mais protegido quem não celebrou o contrato do que o comprador de coisa onerada, não faltando mesmo quem defenda a eliminação do regime consagrado no n.º 2 do art.º 759.º[12].
De todo o modo, assente que nos termos da al. f) do n.º 1 do art.º 755.º goza de direito de retenção “O beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do art.º 442.º”, a aplicação do assim preceituado no âmbito do processo insolvencial suscitou diversos e delicados problemas, culminando com a prolação do AUJ 4/2014, de 20 de Março de 2014, publicado no DR I-Série de 19 de Maio de 2014, agora convocado pelas recorrentes, e que fixou a seguinte doutrina: “No âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos estatuídos no art.º 755.º, n.º 1, al. f) do Código Civil”.
Em face da posição jurisprudencial assim uniformizada, vem sendo entendido que “muito embora tal não conste expressamente do texto (…) irrecusável é que, tomada em atenção a respectiva fundamentação e, mesmo, o teor de alguns dos votos de vencido apostos em tal acórdão, não pode deixar de entender-se que a uniformização estabelecida se reporta, exclusivamente, ao promitente-comprador que detenha, simultaneamente, a qualidade de consumidor. Como, em caso similar, se pondera, doutamente, no Ac. deste Supremo, de 09.07.14[3], de que foi relator o Ex.mº Cons. Nuno Cameira, trata-se de “entendimento que, muito embora não integre o segmento de uniformização, encerra o valor de premissa lógica necessária que o antecede e, nessa medida, deverá assumir o mesmo carácter vinculativo[13].
É contudo pacífico que o conceito de consumidor não foi objecto de uniformização, o que propiciou a abertura de nova discussão, dando origem a decisões díspares consoante o entendimento, mais ou menos restritivo, que se perfilhe. Mas antes de se tomar posição sobre o conceito de consumidor pressuposto, em nosso entender, na doutrina fixada, importa previamente determinar se o precedente fixado vale para situações que não aquelas tidas em consideração no acórdão uniformizador.
Como se sabe, os acórdãos uniformizadores, não sendo estritamente vinculativos, constituem certamente um “precedente persuasivo”[14], revestindo natural e reforçada autoridade, considerando a sua qualificada proveniência e o seu processo formativo[15].
No entanto, conforme vem sendo reiterada e uniformemente entendido pelo STJ, “a aplicação do segmento uniformizador do AUJ n.º 4/2014, de 20-03, circunscreve-se às situações em que o credor promitente-comprador não obteve cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência”, confinamento que deixa de fora todas as demais situações, designadamente, e como ocorre nos presentes autos, o reconhecimento de direito de retenção fora do processo insolvencial[16], vindo ainda a considerar que não distinguindo o legislador, na previsão da al. f) do n.º 1 do art.º 755.º, entre o promitente-comprador consumidor e aquele que não detém tal qualidade e não procedendo as razões que levaram ao entendimento restritivo plasmado no AUJ, não cabe ao intérprete fazer tal distinção[17].
Acolhendo-se aqui esse reiterado entendimento, do qual não se vê razões para divergir, não é relevante discutir se aos AA deve ser reconhecida a qualidade de consumidores (questão que, em todo o caso, atendendo à destinação da fracção, se afigura merecer resposta negativa).
Nestes termos, verificando-se os demais requisitos do direito de retenção, o que não vem questionado nesta via de recurso, impõe-se reconhecer que o crédito de € 70.000,00 de que os AA/apelados são titulares, correspondente à sanção pelo incumprimento definitivo do contrato promessa, se encontra garantido ao abrigo da previsão do citado art.º 755.º, n.º 1, al. f).
Esclarece-se, finalmente, que o direito de retenção reconhecido, quer ao abrigo do disposto no art.º 754.º (crédito ilíquido), quer do citado art.º 755.º, é oponível à subadquirente, o que resulta da sua eficácia erga omnes, uma vez que já se tinha constituído aquando da transmissão do direito de propriedade[18].
Improcedendo nos termos expostos os fundamentos do recurso, importa manter a sentença apelada.
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III. Decisão
Acordam os juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar improcedente o recurso, mantendo a sentença recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes.
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Sumário:
(…)
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Évora, 02 de Maio de 2019
Maria Domingas Alves Simões
Vítor Sequinho dos Santos
José Manuel Lopes Barata
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[1] Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, 1984, reimpressão, pág. 151.
[2] Acórdão de 13/11/2002, proferido no processo n.º 02B2381,acessível em www.dgsi.pt
[3] Jurisprudência que não tem, claramente, merecido a atenção de muitos dos Ils. Mandatários, dada a frequência com que são, sem fundamento, invocadas nulidades da sentença.
[4] Acórdão do STJ de 26/4/95, citado no aresto do mesmo STJ de 21/11/2002, processo 02B3271, acessível em www.dgsi.pt.
[5] V. sobre o ponto, Des. Pires de Sousa, “As declarações de parte. Uma síntese.”, Blog do IPPC, entrada de 22 de Abril de 2017. [6] Diploma a que pertencerão as demais disposições legais que vierem a ser citadas sem menção da sua origem.
[7] Os factos dão conta que a tradição ocorreu depois da sociedade construtora se encontrar em dificuldades, tencionando mesmo “entregar” o prédio ao Banco réu, financiador, como ocorreu escassos 3 meses de pois. Mais se provou que tais dificuldades e intenção eram conhecidas dos AA, o que poderia suscitar dúvida a respeito da finalidade, eventualmente fraudulenta, com que foi celebrado o acordo tradiciário, perigo para que sempre advertem os muitos críticos da solução legal plasmada nos art.ºs 755.º, n.º 1, al. f) e 759.º, n.º2. Trata-se, contudo, de questão não suscitada nos autos e portanto subtraída aos poderes de cognição deste Tribunal.
[8] Inocêncio Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, 6.ª ed., Coimbra.
[9] Cf. Ana Prata, “O Contrato Promessa e o seu Regime Legal”, pág. 839.
[10] Pires de Lima/A. Varela, CC anotado, vol. I, comentário ao artigo 754.º.
[11] Cláudia Madaleno, “A vulnearabilidade das garantias reais (a hipoteca voluntária face ao direito de retenção e ao direito de arrendamento)”, pág. 79.
[12] Cf. Maria da Conceição Rocha Coelho, “O crédito hipotecário face ao direito de retenção”, pág. 48, dissertação de mestrado em Direito Privado sob a orientação de Brandão Proença, 2011, acessível on-line, tendo-se acompanhado na exposição quanto se referiu a propósito do tema no acórdão do TRC de 8/9/2015, relatado pela ora relatora, proferido no processo 3592/13.0TBVIS.C1, acessível em www.dgsi.pt.
[13] Ac. STJ de 25/11/2014, processo 7617/11.6TBBRG-C.G1.S1, em www.dgsi.pt
[14] Ribeiro Mendes, “Os recursos no Código do Processo Civil revisto”, 1998, pág. 108.
[15] Como se refere no aresto do STJ. de 27/4/2017, processo 44/14.5T8VIS, em www.dgsi.pt, “Não basta, pois, não concordar com o entendimento adoptado no acórdão uniformizador, sob pena de a uniformização se revelar um instituto sem utilidade, por subsistir, nos mesmos termos, a controvérsia jurisprudencial. A desconsideração desse acórdão tem de resultar de fundadas razões ou de argumentos jurídicos novos ou que não foram aí "convincentemente rebatidos".
[16] Em sentido que se afigura diverso, o ac. TRC de 2/2/2016, no processo 1526/14.7TBCLD.B.C1, como se extrai da seguinte passagem “Refira-se, por outro lado, que, ainda que aquela jurisprudência uniformizada apenas se reporte à graduação de créditos em insolvência – mais especificamente no âmbito do CIRE – ela assenta, indiscutivelmente – como se depreende da respectiva fundamentação – numa interpretação restritiva do art. 755º, nº 1, al. f), do CC (no sentido de que esta norma apenas se reporta e apenas abrange o promitente-comprador que seja consumidor). Com efeito, ali se considerou – por força da leitura e interpretação das normas do CIRE aplicáveis ao contrato promessa – que, mesmo no âmbito dos processos de insolvência, o citado art. 755º, nº 1, f) seria aplicável, conferindo aos promitentes-compradores, no âmbito de contratos-promessa meramente obrigacionais em que houve tradição da coisa, um direito de retenção pelo crédito emergente do não cumprimento do contrato por decisão do administrador judicial. Ali se considerou, todavia, que a norma supra citada deveria ser interpretada de forma restritiva, escrevendo-se, a dado passo e com base naquele que se entendeu corresponder ao pensamento do legislador, o seguinte: “Assim se compreende que a alínea f) do artigo 755º nº 1 seja entendida restritamente de molde a que se encontre a coberto da prevalência conferida pelo “direito de retenção” o promissário da transmissão de imóvel que obtendo a tradição da coisa seja simultaneamente um consumidor”. E, como emerge da respectiva fundamentação, ainda que a jurisprudência uniformizada apenas se reporte a reclamações de créditos na insolvência, a interpretação restritiva do citado art. 755º que ali foi adoptada tem carácter genérico e não se reporta exclusivamente à insolvência.
[17] Cfr. Acórdãos de 29/7/2016, processo 6193713.0TBBRG-H.G1.S1; 27/4/2017, processo 44/14.5TbbVIS-B.C1.S1; 9/1/2018, processo 212/14.0T8OLH-AB.E1.S1 e 25621/711.6t2SNT-D.L1.S2.
[18] Assim, Acórdão do STJ de 14/12/2016, 662/09.3TVPRT.)1.S1., em www.dgsi.pt., entendimento que mereceu a concordância de Ana Tavares da Fonseca, in “A oponibilidade do direito de retenção”, texto da intervenção apresentada no II Colóquio sobre o Código Civil” no âmbito das comemorações do seu cinquentenário organizadas pelo STJ, acessível em www.stj.pt/wp-content/uploads/2017/05/int_oponibilidadedireitoretencaoo_anataveiradafonseca.pdf