Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1104/19.1T8PTG.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: BENFEITORIAS ÚTEIS
LEVANTAMENTO DE BENFEITORIAS
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Data do Acordão: 01/25/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1-Uma piscina construída no terreno de um prédio misto, assim como a edificação nele de um poço e, bem assim, a construção no mesmo de socalcos para fazer face a erosão hídrica e melhorar o aproveitamento da plantação de árvores, em face do contexto em que se integrem, são susceptíveis de consubstanciar benfeitorias úteis.
2-Aplicando-se o regime previsto no artigo 1273.º do Código Civil tais benfeitorias poderão ser levantadas e removidas do solo do prédio em que foram construídas desde que tal remoção não cause detrimento no mesmo; constatando-se que tal levantamento poderá causar detrimento apenas no tocante aos socalcos e a fim de evitar o mesmo a sua remoção não terá lugar assistindo aos benfeitoriantes direito a serem ressarcidos por tal melhoramento segundo as regras do enriquecimento sem causa.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 1104/19.1T8PTG.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre
Juízo Central Cível e Criminal de Portalegre - Juiz 2
Apelantes: (…) e (…)
Apelados: (…), (…) e (…)
Apelante: (…)
Apelados: (…) e (…)
***
Sumário do Acórdão
(Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
(…)
*
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:
I – RELATÓRIO
(…) e sua esposa, (…), ambos residentes na Rua D. (…), (…), em (…), instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (…), residente no (…), Caixa n.º (…), (…), (…), (…), residente no (…), Caixa n.º (…), (…) e (…), igualmente residente em (…), Caixa n.º (…), (…), (…), pedindo que os Réus sejam condenados no pagamento do valor de benfeitorias que realizaram no prédio que identificam, da propriedade dos RR., no valor global de € 149.150,00 que discriminaram da seguinte forma:
a) € 20.000,00 (vinte mil euros), pelo valor atual da plantação das árvores;
b) € 10.000,00 (dez mil euros), relativos à importância despendida com o sistema de rega gota a gota;
c) € 7.000,00 (sete mil euros), a título das despesas para construção dos socalcos;
d) € 30.000,00 (trinta mil euros) relativos à construção dos muros de sustação de terras;
e) € 15.000,00 (quinze mil euros), pelo benefício obtido com a reparação da barragem;
f) € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), relativos às despesas com a reparação e reconstrução do moinho;
g) € 15.000,00 (quinze mil euros), a título das despesas suportadas com a construção da piscina;
h) € 6.000,00 (seis mil euros) relativos à despesa suportada com os arranjos exteriores;
i) € 7.000,00 (sete mil euros) relativos à aquisição e instalação de três fontes;
j) € 12.000,00 (doze mil euros), pela construção e instalação do depósito de água;
k) € 4.000,00 (quatro mil euros) relativos à construção do poço e respetiva canalização para o ribeiro;
l) € 11.000,00 (onze mil euros), relativos às despesas suportadas com a construção do anexo;
m) € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros), a título de despesas com a abertura de uma entrada na parte inferior do prédio, e instalação de um portão na mesma;
n) € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), relativos às despesas suportadas com a aquisição e instalação do portão na parte superior do prédio;
o) € 6.000,00 (seis mil euros), a título das despesas suportadas com a vedação da propriedade que confronta com um caminho público, bem como da vinha.
Para tanto alegaram os Autores que por sentença, proferida no processo que correu os seus termos sob o n.º …/…TBPTG, 1º Juízo de Portalegre, datada de 19 de outubro de 2011 e transitada em julgado a 15 de Março de 2012, foram condenados a reconhecer a (…), (…) e (…), na qualidade de legais sucessores de (…), o direito a haverem para si, em substituição de (…) e mulher, (…), pelo preço de € 99.759,58 (noventa e nove mil e setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos), metade do prédio sito na freguesia de (…), concelho de Portalegre, descrito na Conservatória do Registo Predial de Portalegre sob o n.º (…), a cuja parte rústica foi atribuído o valor patrimonial de € 89.789,62 (oitenta e nove mil e setecentos e oitenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos), e à parte urbana, no que diz respeito ao artigo (…), o valor de € 4.987,98 (quatro mil, novecentos e oitenta e sete euros e noventa e oito cêntimos), e ao artigo (…), o valor de € 2.159,23 (dois mil e cento e cinquenta e nove euros e vinte e três cêntimos); bem como o direito a haverem para si, naquela mesma qualidade, em substituição de (…) e pelo preço de € 97.500,00 (noventa e sete mil e quinhentos euros), a outra metade do mesmo prédio, a que foram atribuídos os seguintes valores patrimoniais: à parte rústica, o valor de € 90.000,00 (noventa mil euros); à parte urbana, artigo (…), o valor de € 5.000,00 (cinco mil euros); artigo (…), o valor de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros)”.
Alegaram, ainda, que nos termos da mesma sentença foram ao aqui RR. igualmente condenados nos termos seguintes:
“D) Condeno os autores/reconvindos (na qualidade de sucessores de (…) a pagarem a título de indemnização por benfeitorias úteis (reconstrução de edifício/casa), aos réus / reconvintes (…) e (…), a quantia de € 104.162,00 (cento e quatro mil e cento e sessenta e dois euros), e autorizo estes últimos a procederem ao levantamento das restantes benfeitorias classificadas como úteis – tanque e respetiva canalização, bem como os muros edificados;
E) Condeno os autores/reconvindos (na qualidade de sucessores de …) a pagarem aos réus / reconvintes (…) e mulher, (…), e a (…) e sua mulher, (…), indemnização em valor a liquidar em sede oportuna (artigo 661.º, n.º 2, Código Processo Civil), correspondente às despesas que cada um daqueles réus suportou com a limpeza de mato (desmatagem), limpeza de caminhos e aceiros, nos anos de 2001, 2002, 2003 e 2004, no prédio identificado nos autos;”
Mais referiram que naquela acção foram analisadas as benfeitorias feitas entre os anos de 2000 e 2005, data da interposição da acção, acrescentando que durante os anos em que a mesma esteve pendente, os AA., confiantes de que obteriam vencimento na acção ou de que o prédio lhes seria adjudicado no processo executivo que moveram contra os RR. por incumprimento, levaram a cabo empreendimentos de variada natureza, designadamente os referidos em cada uma das alíneas do petitório, pedindo, em consequência, o ressarcimento dessas benfeitorias realizadas após a interposição da acção referida, esclarecendo que o muro é o mesmo que o referido na sentença nele proferido, mas com uma configuração diferente.
Remataram dizendo que atendendo à natureza das benfeitorias consideram-nas benfeitorias úteis ou necessárias, nos termos do disposto no artigo 216.º do Código Civil, não sendo qualquer dos melhoramentos discriminados susceptível de ser levantado pelo que deverão ser indemnizados pela sua realização, nos termos do disposto no artigo 1273.º, n.º 2, do Código Civil.

Citados, os Réus contestaram por excepção alegando a prescrição do direito dos Autores bem como a ilegitimidade daqueles e ainda a existência de caso julgado quanto aos pedidos relativos ao tanque de água e canalização para o tanque, na quantia de € 5.400,00, ripagem do terreno, plantação de vinha, cerejeiras e árvores de fruto, no montante de € 11.200,00, reparação do moinho, no valor de € 2.500,00, invocando terem as mesmas sido já conhecidas na acção de preferência, devendo ser absolvidos da instância nessa parte.
Defenderam-se, ainda, por impugnação sustentando que nenhum dos alegados melhoramentos reveste a natureza de benfeitoria necessária, ou acrescentou valor, ou são voluptuárias, pronunciando-se os Réus pela improcedência da acção, sem prejuízo do levantamento pelos Autores das benfeitorias à excepção das relativas à plantação do olival e do souto de castanheiros.
Os Réus deduziram ainda pedido reconvencional alegando ter a actuação dos Autores causado deteriorações no prédio que ascendem ao valor de € 28.900,00, mais acrescentando ainda terem os Autores usufruído do prédio, nele colhendo frutos, que igualmente descriminam, no valor total de € 223.661,00 terminando a pedirem a condenação dos Autores no pagamento de tais quantias, acrescidas de juros calculados à taxa legal, desde a data de citação, até efectivo e integral pagamento.
Os Autores replicaram, pugnando pela improcedência das excepções invocadas na contestação pelos Réus, arguindo quanto ao pedido reconvencional as excepções de prescrição, ilegitimidade e litispendência, mais impugnando a matéria de tal pedido, terminando a sustentar a improcedência do mesmo.
Responderam os Réus às invocadas excepções deduzidas relativamente ao pedido reconvencional, pronunciando-se pela sua improcedência.
Procedeu-se à realização de audiência prévia, onde foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade dos Autores e dos Réus reconvintes, bem como a excepção de caso julgado invocada pelos Réus, com excepção do que diz respeito ao pedido formulado pelos Autores sob a alínea f), relativamente à qual os Réus foram absolvidos da instância, assim como, ainda, improcedente a excepção de prescrição do direito dos Autores
Foi relegado para final o conhecimento da excepção de prescrição do direito dos Réus reconvintes relativamente ao pedido de indemnização pelas deteriorações existentes no prédio, da excepção de prescrição dos créditos pelos frutos percebidos e, por fim, foi julgada improcedente a excepção de litispendência entre estes autos e a acção de prestação de contas.
Procedeu-se à identificação do objecto do litigio e enunciaram-se os temas de prova.
Após, realizou-se a audiência final tendo no seu decurso sido admitida a ampliação do pedido dos Autores formulado na alínea j) do petitório para € 22.000,00 e do pedido reconvencional dos Réus para € 296.041,00 a que se seguiu a prolação de sentença que contem o seguinte dispositivo.
“1 – Julga-se parcialmente procedente, por parcialmente provada a presente acção, e, em consequência condenam-se os Réus no pagamento aos Autores da quantia de 15.000,00 (quinze mil euros), a título de benfeitorias realizadas no prédio identificado no ponto 1 dos factos provados e correspondente ao pedido formulado na alínea g) (construção e instalação de piscina), autorizando-se os Autores a procederem ao levantamento das benfeitorias a que correspondem as alíneas a) a e), e j) a o), classificadas como úteis, absolvendo-se os Réus do demais peticionado.
2 – Julga-se improcedente, por não provado, o pedido reconvencional deduzido, absolvendo os Autores e Réus reconvindos do mesmo.
*
Custas pelos Autores e Réus e Autores e Réus reconvintes e reconvindos, na proporção do respectivo vencimento e decaimento.”
*
Inconformados com a sentença, vieram os Autores/Reconvindos apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação de Évora, formulando as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES
1. Por via da sentença proferida, decidiu o Tribunal a quo classificar todas as benfeitorias realizadas pelos Autores como úteis e suscetíveis de levantamento à exceção da piscina, em cujo pagamento condenou os Réus.
2. Não se conformam os Autores com a Sentença assim proferida pelo Tribunal a quo, pelo que a impugnam na matéria de facto e de Direito.
Com efeito:
3. No que concerne à plantação de oliveiras e castanheiros, o Tribunal a quo não considerou a posição dos Réus na sua contestação, onde estes reconheceram o direito à indemnização dos Autores no que a esta benfeitoria concerne pelejando pelo seu não levantamento.
4. Desta forma, impõem-se uma alteração na matéria de facto, aditando-se ao elenco da matéria de facto provada o seguinte: 10.A) as plantações de castanheiros e oliveiras não podem ser levantadas sem detrimento para o prédio.
5. Ao ter desconsiderado a posição vertida pelos Réus na sua contestação daí não retirando as devidas consequências probatórias, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 342.º, n.os 1 e 2, do Código Civil (doravante CC), bem como o disposto no artigo 1273.º, n.os 1 e 2, do mesmo diploma legal.
6. Por corolário, devem os Réus ser condenados a indemnizarem os Autores no valor de
€ 13.000,00 (treze mil euros), segundo as regras do artigo 479.º do CC.
7. Por outro lado, os meios probatórios constantes do processo, como sejam o relatório pericial, a prova documental e a prova produzida em audiência conjugada com as regras de experiência comum, impunham que o Tribunal a quo tomasse decisão diversa quanto ao levantamento dos muros de sustentação de terras.
8. Das declarações de parte da Autora (concretamente no minuto 48:22) e da testemunha … (minuto 07:26), ficou claro que havendo levantamento dos muros de sustentação existirá um inevitável deslizamento de terras, o que compromete a transitabilidade do caminho de acesso à habitação e a manutenção da piscina.
9. O que, aliás, é corroborado pelos documentos 5, 11 e 12 juntos com a Petição Inicial e ainda pelo relatório pericial junto aos autos sob a ref. 2090208.
10. Pelo que, deve ser aditada à matéria de facto provada que: 23.A) retirar os muros do local acarreta um deslizamento de terras, sendo que um desses muros suporta terras onde se encontra a piscina e o outro suporta terras que permitem a transitabilidade e manutenção do caminho de acesso da via pública até à casa.
11. Ao decidir pelo levantamento dos muros de suporte de terras, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo comprometeu ainda congruência da sua decisão, pois que condenou os Réus a ressarcir os Autores pelo valor da piscina cujo levantamento considerou deteriorar o prédio, mas autorizou simultaneamente o levantamento do muro que a sustenta.
12. Consequentemente, deve decidir-se pela insusceptibilidade de levantamento dos muros sem deteriorações no prédio e, nesse sentido, serem os Réus condenados a indemnizarem os Autores no montante de € 30.000,00.
13. Ao não o ter entendido assim, o Tribunal a quo fez errada interpretação do disposto no artigo 1273.º, n.os 1 e 2, do CC.
14. Por outro lado, as obras que os autores fizeram na barragem configuram uma benfeitoria necessária, pelo que andou mal o Tribunal a quo ao classificá-la como útil.
15. Da prova produzida em audiência resultou claro que todas as barragens carecem de limpeza (cfr. minuto 11:38 da inquirição da testemunha … e 20:08 da testemunha …).
16. Resultou igualmente da prova produzida (testemunha … ao minuto 11:26 da sua inquirição, o Autor nas suas declarações ao minuto 15:45 e a Autora no minuto 13:02) que a barragem da propriedade não estava em funcionamento aquando da aquisição do prédio pelos apelantes.
17. O que aliás é corroborado pelo documento 4 da petição inicial.
18. Assim, tendo em consideração estes elementos probatórios, deve ser parcialmente revogado o n.º 3 dos factos dados por não provados, antes passando a constar que: 3. Que os Autores despenderam com a reparação da barragem o montante de € 9.000,00.
19. Devendo igualmente aditar-se aos factos provados que: 15-A) A barragem carecia das obras feitas pelos AA. sem a qual a mesma não estaria em funcionamento e permaneceria
insuscetível de qualquer aproveitamento.
20. Desta forma, é de concluir que as obras na barragem configuram uma benfeitoria necessária, pois que com as mesmas se evitou a perda ou deterioração de qualidades do prédio, contribuindo-se para o seu normal aproveitamento, como também conclui o Sr. Perito no seu relatório pericial.
21. Ao não ter entendido assim, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 216.º do CC, fazendo errada interpretação do conceito de “perda ou deterioração” e consequentemente o artigo 1273.º, n.º 1, ambos do CC.
22. E assim, devem os Réus ser condenados a indemnizar os Autores nos termos do artigo 1273.º, n.º 1, do CC, no montante de € 2.400,00.
23. No que respeita ao poço e o depósito constituem tais obras benfeitorias úteis, mas que, com as suas dimensões e tipo de construção não podem ser levantas sem deteriorar o prédio.
24. Isto mesmo resulta da prova produzida em audiência (declarações de parte do Autor ao minuto 41:03, 01:05:34 e 01:06:07 tal como da Autora aos minutos 37:43 e 38:42), bem como das imagens juntas à Petição Inicial sob os documentos 7 e 8, do relatório pericial e das regras de experiência comum.
25. Pelo que, com o devido respeito, andou mal o Tribunal a quo ao dar por não provado o ponto de facto que elencou sob o n.º 4 (“A destruição do poço, em face da sua profundidade, coloca em risco a estrutura do solo com eventuais deslizamentos de terras”) que deve ser eliminado.
26. Os meios probatórios supra referidos impõem, aliás, que se adite ao elenco dos factos provados que: 17-A) O depósito está em parte inserido no solo e nele fixado sendo que a canalização está toda enterrada; 17-B) A instalação referida em 17, com a sua dimensão e estrutura, causará deteriorações no prédio se levantada; 18-A) O poço está construído e implementado no solo e nele fixado, pelo que existe risco de deterioração no prédio se levantado.
27. Ainda que V. Exas. entendam não ser de alterar a decisão da matéria de facto, sempre a solução jurídica tem de ser outra, dados os argumentos vertidos na sentença para o não levantamento da piscina, aplicável às obras aqui em causa atenta (também) a dimensão e incorporação das mesmas no solo.
28. Ao não entender assim, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 1273.º, n.os 1 e 2, do CC.
29. Em consequência, devem os Autores ser indemnizados no valor de € 22.000,00 relativos à construção e instalação do depósito e em € 4.000,00 pelo poço.
30. No que respeita às três fontes construídas pelos Autores, resultou da prova produzida
(declarações de parte da Autora a partir do minuto 36:05) que duas são alimentadas pela
barragem e outra pelo depósito, pelo que deve alterar-se o ponto elencado sob o n.º 16 da
matéria de facto provada aí passando a ler-se: 16. E procederam à construção de três fontes, duas alimentadas pela barragem e outra junto à casa, no que gastaram € 5.000,00.
31. Resultou igualmente da prova produzida que as três fontes são alimentadas pelos recursos hídricos existentes na propriedade, por via de tubos enterrados no solo (como explicado pelo Autor nas suas declarações, a partir do minuto 40:02) numa dimensão não apurada mas seguramente superior a mil metros, o que deverá elencar-se na matéria de facto nos seguintes termos: “16-A) As três fontes são alimentadas nos termos do número anterior, por via de canos enterrados no solo, numa dimensão não concretamente apurada mas seguramente superior a mil metros”.
32. E assim sendo, atenta a dimensão e configuração das fontes, que estão instaladas e em
funcionamento ininterrupto por via de tubos enterrados no solo, não se afigura possível o seu levantamento sem detrimento para o prédio.
33. Ao não o entender assim, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 1273.º, n.os 1 e 2, do Código Civil, devendo os Réus ser condenados a indemnizar os Autores também por esta benfeitoria, no valor de € 5.000,00.
34. Por fim, andou mal o Tribunal a quo ao considerar os socalcos uma benfeitoria útil (também) suscetível de levantamento, tendo desconsiderado o relatório pericial, as declarações do senhor perito em sede de audiência (minuto 07:14) e as regras de experiência comum.
35. Os socalcos envolvem movimentações de terras e, no caso dos autos, contam com cerca de dez metros de largura.
36. Conforme nos parece ser entendimento jurisprudencial, neste tipo de obras existe uma
impossibilidade material de levantamento, pelo que surge na esfera jurídica dos benfeitorizantes o direito a serem indemnizados.
37. Ao não ter entendido assim, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 1273.º, n.os 1 e 2, do CC, impondo-se a condenação dos Réus a indemnizar os Autores em € 7.200,00 por aplicação das regras de enriquecimento sem causa.
Nestes termos,
E nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente com as demais consequências legais, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”
Os Réus / Reconvintes não responderam ao recurso dos Autores / Reconvindos.
*
O Réu / Reconvinte (…) apresentou igualmente recurso de apelação independente no qual integrou as seguintes conclusões:
“Assim, e em conclusão:
1. Conforme resulta das declarações de parte dos AA. a piscina foi construída para seu lazer e para tornar o imóvel mais acolhedor para os seus filhos e, assim, levá-los a deslocarem-se aí com mais frequência – sessão de julgamento 10/01/2023, gravação com início à 10h29’, minuto 22’10’’ e sessão de julgamento 10/01/2023, gravação com início à 14h34’, minutos 16’17’’ e 60’17’’;
2. Não foi efectuada qualquer prova de que a piscina acrescenta valor ao prédio nem, por maioria de razão, qual o valor que acrescentou;
3. O ónus de tal prova cabe ao possuidor, não sendo um facto notório que a possa dispensar ou que possa ser substituída por razões de experiência comum;
4. Pelo exposto, o tribunal não deveria ter dado como provado que a piscina acrescenta valor ao prédio, o qual nem sequer foi alegado, mas sim como não provado;
5. Não se verificando tal prova, a piscina terá de ser considerada uma benfeitoria voluptuária e, em consequência, não têm os Autores direito ao seu levantamento ou a qualquer indemnização;
6. O Tribunal não aplicou, devendo fazê-lo, o disposto no artigo 216.º, n.º 3, do CC;
7. Ainda que assim não se entendesse, o certo é que também não foi feita qualquer prova de que a piscina não pudesse ser levantada sem detrimento para o prédio;
8. Na verdade, os factos alegados pelos AA. que, na sua perspectiva, consubstanciariam o detrimento do prédio, foram considerados como não provados;
9. A prova pericial não se pronunciou sobre tal matéria nem sobre a mesma incidiu outra prova;
10. Também neste caso, o ónus de tal prova cabe ao possuidor, não sendo um facto notório que a possa dispensar ou que possa ser substituída por razões de experiência comum;
11. Pelo exposto o tribunal não deveria ter dado como provado que a piscina não pode ser levantada sem detrimento para o prédio, mas sim como não provado;
12. Assim, o douto tribunal deveria ter aplicado, e não aplicou, o disposto no artigo 1273.º, n.º 1, do CC, pois que não deverá ser reconhecido aos Autores o direito a indemnização pela piscina mas, sem prejuízo do exposto supra, e sem conceder, tão somente, o direito ao seu levantamento;
13. O Tribunal a quo não deu como provado, devendo tê-lo feito, que existem na propriedade pelo menos 250 castanheiros e 250 oliveiras;
14. Tais factos resultam das declarações de parte do Autor – sessão de julgamento de 10/01/2023, a partir do minuto 10’01’’ – e dos documentos 14 e 15, fotografias Google Earth – juntas com a p.i., e que são expressamente identificadas como fundamento de matéria dada como provada;
15. Como consequência de tais factos, os AA. deverão ser condenados a pagar aos RR. o valor dos frutos respectivos e que são, considerando o tempo decorrido até outubro de 2019, no que respeita aos castanheiros no montante de pelo menos € 18.225,00, e no que respeita ao olival pelo menos no montante de € 3.400,00;
16. O tribunal considerou como provado que o valor locativo do imóvel urbano existente no prédio é de € 330,00/mês;
17. Não obstante, considerando que os Autores, não tendo dado de arrendamento tal imóvel nem percebido a correspondente renda, não têm de pagar aos RR/Reconvintes o correspondente valor;
18. Ora, ainda que o imóvel não esteja arrendado, o seu valor locativo traduz o valor que o mesmo tem, objectivamente, para quem está na sua posse;
19. Não considerar esta solução implica um empobrecimento do proprietário, que a lei não pode validar;
20. Ao adoptar a interpretação que adoptou, o douto Tribunal a quo não aplicou, devendo fazê-lo, o disposto no artigo 1271.º do CC;
21. Da sua aplicação resultará que os AA/Reconvindos deverão ser condenados a pagar aos RR/Reconvintes, relativamente ao período até outubro de 2019, a quantia de € 54.780,00, sendo o valor relativo ao período de novembro/2019 até à entrega do imóvel o que se vier a liquidar em sede de execução de sentença.
Termos em que, e nos do douto suprimento de VV. Exªs., deve ao presente recurso ser dado provimento, porque assim se mostra ser de Direito e de Justiça”.
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Os Autores / Reconvindos não responderam ao recurso do Réu / Reconvinte (…).
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Ambos os recursos foram admitidos na 1ª Instância como de apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Os recursos são os próprios e foram admitidos adequadamente quanto ao modo de subida e efeito, nada objectando a que se conheça dos mesmos.
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Correram Vistos.
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II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo , pelo que as questões a apreciar e decidir traduzem-se objectivamente no seguinte:
A) Do recurso dos Autores/Reconvindos:
1-Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
2-Reapreciação de mérito.
B) Do recurso do Réu/Reconvinte:
1-Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
2- Reapreciação de mérito.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Consta do segmento da sentença recorrida relativo à decisão sobre a matéria de facto o seguinte:
“Produzida a prova e discutida a causa, mostram-se provados os seguintes factos, com interesse para a decisão:
1 – Por sentença datada de 19 de outubro de 2011, proferida no proc. n.º 1288/05.6TBPTG, actualmente do Juízo Central Cível e Criminal de Portalegre-J3, e transitada em julgado a 15 de março de 2012, foram – entre outros – os Autores condenados a reconhecer a “(…), (…) e (…), na qualidade de legais sucessores de (…), o direito a haverem para si, em substituição de (…) e mulher, (…), pelo preço de € 99.759,58 (noventa e nove mil, setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos), metade do prédio sito na freguesia de Alegrete, concelho de Portalegre, descrito na Conservatória do Registo Predial de Portalegre sob o n.º (…), a cuja parte rústica foi atribuído o valor patrimonial de € 89.789,62 (oitenta e nove mil setecentos e oitenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos), e à parte urbana, no que diz respeito ao artigo (…), o valor de € 4.987,98 (quatro mil, novecentos e oitenta e sete euros e noventa e oito cêntimos), e ao artigo (…), o valor de € 2.159,23 (dois mil, cento e cinquenta e nove euros e vinte e três cêntimos); bem como o direito a haverem para si, naquela mesma qualidade, em substituição de (…), e pelo preço de € 97.500,00 (noventa e sete mil e quinhentos euros), a outra metade do mesmo prédio, a que foram atribuídos os seguintes valores patrimoniais: à parte rústica, o valor de € 90.000,00 (noventa mil euros); à parte urbana, artigo (…), o valor de € 5.000,00 (cinco mil euros); artigo (…) o valor de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros);
B) Condeno todos os réus a verem reconhecido este direito;” com o teor de fls. 24 e ss., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais.
2 – Nos termos da mesma sentença ficaram os Autores condenados a reconhecer que os Réus eram titulares do direito de preferência, que exerceram por via da ação judicial.
3 – E ficaram também os aqui Réus condenados no pedido reconvencional, nos termos seguintes:
“D) Condeno os autores/reconvindos (na qualidade de sucessores de …) a pagarem a título de indemnização por benfeitorias úteis (reconstrução de edifício/casa), aos réus/reconvintes (…) e (…), a quantia de € 104.162,00 (cento e quatro mil e cento e sessenta e dois euros), e autorizo estes últimos a procederem ao levantamento das restantes benfeitorias classificadas como úteis – tanque e respetiva canalização, bem como os muros edificados;
E) Condeno os autores/reconvindos (na qualidade de sucessores de …) a pagarem aos réus / reconvintes (…) e mulher, (…), e a (…) e sua mulher, (…), indemnização em valor a liquidar em sede oportuna (artigo 661.º, n.º 2, Código Processo Civil), correspondente às despesas que cada um daqueles réus suportou com a limpeza de mato (desmatagem), limpeza de caminhos e aceiros, nos anos de 2001, 2002, 2003 e 2004, no prédio identificado nos autos”.
4 – Em face da falta de pagamento da quantia referida em 3, os Autores permaneceram na posse do imóvel.
5 – Para cobrança coerciva da referida quantia foi apresentada execução comum contra os aqui RR., que correu termos por apenso à acção referida em 1 que deu entrada em juízo em 22/10/2012, no âmbito da qual foi penhorado o prédio referido em 1.
6 – Tal execução foi declarada extinta por decisão do agente de execução, de 09-10-2019 pelo pagamento, já após publicidade da venda do referido prédio, por pagamento pelos executados da quantia exequenda.
7 – Por apenso à acção referida em 1, corre termos acção de prestação de contas dos aqui RR. contra o aqui A., relativamente ao período decorrido desde que foi nomeado fiel depositário do prédio em causa, em 28/11/2012.
8 – Por apenso ao processo referido em 1 correu termos procedimento cautelar de embargo de obra nova contra os preteridos na preferência referida em 1, na qual, em 11/10/2011 foi “decretado o embargo de obra nova requerido e determinar a suspensão imediata dos trabalhos de corte e abate das árvores existentes”, no prédio identificado em 1, com o teor de fls. 119 verso a 124, cujo teor aqui damos por reproduzido para todos os efeitos legais.
9 – Entre a data em que foram citados para a acção e a data do transito da sentença referida em 1, os AA. procederam à realização de obras e plantações no prédio.
10 – No referido prédio os AA. procederam à plantação entre 100 e 200 castanheiros e um número indeterminado de oliveiras.
11 – O valor actual da plantação de castanheiros e oliveiras existentes no prédio é de € 33.000,00 e a sua plantação valorizou o prédio em € 13.000,00.
12 – No prédio os AA. construíram socalcos que não existiam anteriormente, no que despenderam o valor de € 7.200,00.
13 – Os socalcos são susceptíveis de evitar a erosão e permitir o melhor aproveitamento da plantação de carvalhos.
14 – Os AA. procederam, na plantação de castanheiros e oliveiras, à instalação de um sistema de rega gota a gota.
15 – E procederam a obras na barragem existente no prédio, aproveitando a maquinaria que se encontrava no prédio para a realização de socalcos, no que despenderam pelo menos € 2.400,00.
16 – E procederam à construção de três fontes, duas alimentadas pela barragem e outra junto à casa, no que gastaram € 5.000,00.
17 – E instalaram um depósito para armazenar águas subterrâneas e aproveitá-las para o uso agrícola, com cerca de 2,5 metros de diâmetro e 3 metros de altura, que importou em € 2.000,00, sendo que a conduta que liga o depósito à casa numa extensão de aproximadamente 1.400 metros custou € 20.000,00.
18 – E construíram um poço, no qual gastaram € 4.000,00.
19 – Procederam ainda à construção de uma piscina, em cuja construção e instalação gastaram € 15.966,19, e um anexo com a função de armazenar utensílios agrícolas e domésticos.
20 – Procederam à pavimentação do espaço ao lado da habitação, para que ali estacionassem carros, plantando árvores e movimentando terras.
21 – Na entrada a propriedade que dá para a estrada colocaram dois pilares em pedra e um portão de acesso à mesma.
22 – Vedaram a propriedade numa extensão de aproximadamente, junto à vinha e caminho público, para evitar a entrada de pessoas e animais, no que gastaram € 4.000,00.
23 – E procederam à abertura de um outro caminho na parte baixa do prédio, junto ao ribeiro, que optimiza a exploração agrícola, no que gastaram € 5.000,00.
23 – Procederam à construção de dois muros, com altura entre 0,5 e 1,5 metros de altura, numa extensão de aproximadamente 300 metros, um deles junto à piscina, que permitem melhor conservar o caminho de acesso do portão principal à casa e também servem de sustentação das terras envolventes à piscina, no que despenderam € 30.000,00.
24 – Procederam à construção de um anexo à vivenda, com a função de arrumos, no qual gastaram € 10.000,00.
25 – Antes dos AA. tomarem posse do imóvel já existia canalização de água para a parte urbana do mesmo, de água proveniente de uma nascente que se encontra a um nível superior.
26 – Em frente da habitação existente no terreno existia um tanque que era alimentado pela nascente referida.
27 – No imóvel em causa existia um pomar e olival, sem que existissem socalcos.
28 – A propriedade foi sempre utilizada para fins agrícolas, e foi utilizada pelos AA. especialmente para lazer e como investimento imobiliário.
29 – Junto à habitação existia um lageado e espaço suficiente para a inversão de marcha de um veículo automóvel.
30 – O anexo à habitação substituiu um palheiro, cavalariça e forno.
31 – O prédio urbano para habitação existente no imóvel tem um valor locativo de, pelo menos, € 330,00/mês.
32 – A produção média anual do souto mais antigo é de aproximadamente 10 kg por árvore a um valor médio de € 2 por kg, resultando um valor bruto total de produção de € 400,00 anuais.
33 – A produção anual do souto mais recente, entre 2010 e 2018 (tendo em consideração que apenas produz a partir do 6º ano (2015) é respectivamente, por árvore, em média, 6 kg a € 2,8 kg a € 2,5, 10 kg a € 2,5 e 12 kg a € 2.
34 – A produção média do olival mais antigo é de 7,5 kg por árvore a um valor médio de 0,35 €/kg, no total de € 245,00 por ano.
35 – A produção média do olival mais antigo é de 7,5 kg por árvore a um valor médio de 0,35 €/kg, no total de € 875,00 por ano.
36 – O valor locativo de 5 hectares de pastagens é de € 250,00, ano.
37 – Um é de vinha tem uma produção de cerca de 3 kg/pé, com o valor de cerca de 0,50 kg.

E não provados, com interesse para a decisão:
1 – Os AA. procederam à plantação especificamente de 250 castanheiros e 300 novas oliveiras.
2 – As plantações de castanheiros e oliveiras teve como objectivo evitar incêndios e evitar o crescimento desmesurado de vegetação.
3 – Que os AA. procederam à reparação da barragem e que a mesma não se encontrasse em funcionamento e porque se não o fizessem a mesma perder-se-ia, nela gastando € 9.000,00.
4 – A destruição do poço, em face da sua profundidade, coloca em risco a estrutura do solo com eventuais deslizamentos de terras.
5 – A destruição da piscina provocará que parte do solo fique a descoberto, sujeito a erosões, potenciando problemas de humidade e drenagem do solo no futuro, colocando em risco a estrutura da casa.
6 – A construção referida em 24 tendo implicado a abertura no solo, construção de pilares e vigas, se forem levantados colocarão em risco o prédio.
7 – A construção do portão teve como objectivo a entrada de pessoas que confundiam o caminho como caminho público, e para evitar furtos e ocupações.
8 – A construção da passagem na parte baixa da propriedade era indispensável para a exploração agrícola dessa parte da propriedade.
9 – Que na plantação de castanheiros e oliveiras os AA. tenham despendido € 10.000,00.
10 – Que no sistema de rega gota a gota os Autores tenham gasto € 10.000,00.
11 – No anexo à habitação gastaram os Autores € 11.000,00.
12 – Na construção das três fontes gastaram € 7.000,00.
13 – No arranjo do logradouro da casa gastaram os Autores € 6.000,00.
14 – Na aquisição e construção do portão gastaram os Autores € 1.500,00.
15 – Na vedação junto à vinha e caminho publico gastaram os Autores € 6.000,00.
16 – As oras realizadas na barragem valorizam a propriedade em € 15.000,00.
17 – As benfeitorias alegadas pelos Autores foram realizadas por (…) e (…).
18 – Que o tanque referido em 28 tivesse a dimensão de cerca de 3x2m x 1,5m de profundidade.
19 – No local onde os AA. plantaram o olival, existia uma vala em “V” , que canalizava água para um tubo que a descarregava no ribeiro e que era utilizada para rega ou para abeberamento.
20 – A família dos RR. é uma família de pequenos agricultores, que vive da terra, através da sua exploração directa, sem recurso a outra mão-de-obra que não a sua própria.
21 – Os AA., entre o ano de 2007 e 2010, arrancaram pelo menos 30 árvores de fruto que existiam na propriedade, entre laranjeiras, figueiras, marmeleiros, macieiras, cerejeiras, ameixoeiras, pereiras, pessegueiros e videiras de uva de mesa.
22 – Tais árvores encontravam-se, parte no local onde agora se encontra a plantação de castanheiros feita pelos AA., e parte entre esse local e o imóvel urbano situado mais acima.
23 – Tais árvores de fruto têm o valor de € 900,00.
24 – Os AA., entre os anos de 2007 e 2008, arrancaram 180 oliveiras, no local onde vieram a plantar outro olival, sem as necessárias autorizações administrativas e camarárias.
25 – Tais oliveiras têm o valor de € 9.000,00.
26 – Os AA., entre os anos de 2007 e 2011, arrancaram pelo menos 20 castanheiros autóctones.
27 – Tais castanheiros têm o valo de € 1.000,00.
28 – Na parte do terreno acima do olival arrancado pelos AA. existia um tanque de dimensão não inferior a 5x4mx1,5m de profundidade, com uma bica.
29 – Após o ano de 2006, os AA. destruíram esse tanque e a bica aí existente.
30 – Tal tanque tem o valor de € 4.000,00.
31 – Também no terreno acima do actual souto de castanheiros existia uma pequena barragem e após o ano de 2006 os AA. soterraram/destruíram tal barragem.
32 – Tal barragem tem o valor de € 5.000,00.
33 – O tanque em frente à casa, após o ano de 2006 tal tanque foi destruído pelos AA.
34 – Tal tanque tem o valor de € 3.500,00.
34 – Na parte detrás da habitação existia uma bica que alimentava um bebedouro para os animais, designadamente cabras e vacas, que, após o ano de 2006, foi destruído pelos AA.
35 – As instalações referidas em 30 dos factos provados tinham o valor de € 5.000,00.
36 – Após terem tomado conhecimento da resposta aos quesitos na acção de preferência, o que aconteceu ano dia 16 de Setembro de 2011, os AA., iniciaram no imóvel trabalhos de corte das árvores adultas aí existentes, designadamente de pinheiros e eucaliptos,
37 – Os Autores procederam ao corte de uma área de 7,9000 ha de pinhal, no lado esquerdo da ribeira que atravessa a propriedade, cujas árvores tinham pelo menos 25 anos de crescimento.
38 – Os Autores retiraram da propriedade a madeira resultante de tal corte.
39 – Tal madeira tem o valor de € 30.000,00.
40 – Os Autores procederam ao corte de uma área de 7,5000 ha de pinhal, no lado direito da ribeira que atravessa a propriedade, cujas árvores tinham pelo menos 25 anos de crescimento.
41 – O número de pinheiros que foram cortados foi limitado pelo facto de uma parte dos pinheiros existentes nessa área ter sido cortada em 2005.
42 – Os Autores retiraram da propriedade a madeira resultante de tal corte.
43 – Tal madeira tem o valor de € 15.000,00.
44 – Os Autores procederam ao corte de uma área de 4,5000 ha de eucaliptal, no lado direito da ribeira que atravessa a propriedade, cujas árvores tinham pelo menos 9 anos de crescimento.
45 – Os Autores retiraram da propriedade a madeira resultante de tal corte.
46 – Tal madeira tem o valor de € 10.000,00.
47 – O total da madeira cortada pelos Autores é de € 55.000,00.
48 – Existem no prédio dois soutos de castanheiros, um mais antigo com 20 árvores, e outro mais recente com 247 árvores.
49 – A produção média anual do souto mais antigo é de 40Kg de castanha por castanheiro, ou seja, de 800Kg.
50 – O preço médio desta castanha é de € 1,5/Kg, pelo que o rendimento anual é de 800Kg x € 1,5 = € 1.200,00.
51 – A produção média anual do souto mais recente, com 247 árvores, desde a sua plantação até ao ano de 2018, levando em consideração a sua juventude, é de 20Kg de castanha por castanheiro, ou seja, de 4.940Kg ano.
52 – O preço médio desta castanha é de € 2,5/Kg, pelo que o rendimento anual é de 4940Kg x € 2,50 = € 12.350,00.
53 – De 2010 a 2018 o rendimento de tais árvores foi de € 12.350,00 x 8 = € 98.900,00.
54 – Existem no prédio dois olivais, um mais antigo com 97 oliveiras e outro mais recente com 250 oliveiras.
55 – A produção média anual do olival mais antigo é de 15Kg por oliveira, ou seja, 97 x 15Kg = 1.455Kg.
56 – Pelo que o rendimento de tais árvores é de € 509,25/ano.
57 – De 2006 a 2018 o rendimento de tal olival foi de € 509,25 x 12 = € 6.111,00.
58 – A produção média anual do olival mais recente, considerado apenas a partir do ano de 2015, é de 8Kg por oliveira, ou seja, de 2.000Kg/ano.
59 – O preço médio desta azeitona é de € 0,45/Kg, pelo que o rendimento de tais árvores é de € 0,45 x 2.000 = € 900,00 ano.
60 – De 2015 a 2018 o rendimento de tal olival foi de € 900,00 x 3 = € 2.700,00.
61 – Existem no prédio cerca de 5 hectares de pastagens e o rendimento da pastagem de 2006 a 2019 foi de € 3.250,00.
62 – Existe no prédio uma vinha com cerca de 200 pés e a produção média da vinha é de 4Kg/pé.
63 – O valor do Kg de uva é de € 0,45, pelo que o valor anual médio de produção de uva é de 200 x 4Kg x € 0,45 = € 360,00.
64 – O rendimento da vinha de 2013 a 2018 é de € 360,00 x 5 = € 1.800,00.”
*
IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Iniciemos, então, este segmento abordando a primeira das questões objecto de cada um dos recursos interpostos atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
Prevê o artigo 662.º, n.º 1, do CPC, o seguinte:
1 – A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa“.
Refere a propósito deste normativo o Conselheiro António Abrantes Geraldes (“Recursos no Novo Código de Processo Civil “, Almedina, 5ª ed., 2018, pág. 287), que:
“O actual artigo 662.º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava […], através dos nºs 1 e 2, alíneas a) e b), fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do principio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia.“
Diz-nos, também, sobre este preceito o Conselheiro Fernando Pereira Rodrigues (“Noções Fundamentais de Processo Civil”, Almedina, 2ª edição atualizada, 2019, págs. 463-464), o seguinte:
“A redação do preceito [662.º, n.º 1] não parece ter sido muito feliz quando manda tomar em consideração os “factos assentes” para proferir decisão diversa, que só pode ser daqueles mesmos factos considerados assentes, porque o que está em causa é modificar a decisão em matéria de facto proferida pela primeira instância.
[…]
A leitura que se sugere como mais adequada do preceito, salvaguardada melhor opinião, é que ele pretende dizer que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, “confrontados” com a prova produzida ou com um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Resulta, outrossim, do artigo 640.º do CPC, que se debruça sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o seguinte:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b), do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
[…]”.
A este propósito sustenta o Conselheiro António Abrantes Geraldes (obra acima citada, a págs. 168-169), que a rejeição total ou parcial respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve ser feita nas seguintes situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artigos 635.º, n.º 4 e 641.º, n.º 2, alínea b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artigo 640.º, n.º 1, alínea a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação“, esclarecendo, ainda, que a apreciação do cumprimento de qualquer uma das exigências legais quanto ao ónus de prova prevenidas no mencionado n.º 1 e 2, alínea a), do artigo 640.º do CPC, deve ser feita “à luz de um critério de rigor”.
Relativamente a esta matéria e entre os muitos arestos do Supremo Tribunal de Justiça que sobre ela se pronunciaram chamamos à colação, a título exemplificativo, o acórdão proferido pelo referido Tribunal em 28/04/2016 (Proc. 1006/12), acessível para consulta in www.dgsi.pt. de onde nos permitimos transcrever o seguinte excerto constante do respectivo sumário:
“1. Deve considerar-se satisfeito o ónus de alegação previsto no art. 640.º se o recorrente, além de indicar o segmento da decisão da matéria de facto impugnado, enunciar a decisão alternativa sustentada em depoimento testemunhal que identificou e localizou.”
Aqui chegados justifica-se plenamente recordar que em sede de formação da convicção do julgador e por remissão expressa feita a partir do artigo 663.º, n.º 2, última parte, do CPC, mostra-se aplicável o artigo 607.º, do mesmo diploma legal, que, na parte que ora releva, estatui que:
[…]
4. Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
5. O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”
A este propósito diz-nos José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (“Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2º, Almedina, 4ª edição, 2019, pág. 709), o seguinte:
“O princípio da livre apreciação da prova situa-se na linha lógica dos princípios da imediação, oralidade e concentração […]: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém-colhidas e com a convicção que, através delas, se foi gerando no seu espirito, de acordo com as máximas de experiências aplicáveis”.
Assim, a prova submetida à livre apreciação do julgador não significa prova sujeita unicamente ao livre arbítrio do mesmo, como, aliás, bem se depreende da leitura do n.º 4 do supra referido artigo 607.º do CPC, que na sua primeira parte impõe ao juiz que analise “criticamente” as provas, indique as “ilações tiradas dos factos instrumentais” e especifique os “demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção”.
Neste conspecto referem António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe de Sousa (“Código de Processo Civil Anotado, Vol. I”, Almedina, 2ª edição, 2020, pág. 745), o seguinte:
“O juiz deve, pois, expor a análise crítica das provas que foram produzidas, quer quando se trate de prova vinculada, em que a margem de liberdade é inexistente, quer quando se trate de provas submetidas à sua livre apreciação, envolvendo os motivos que o determinaram a formular o juízo probatório relativamente aos factos considerados provados e não provados.”
A) 1-- Impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pelos Autores-Reconvindos e ora Apelantes.
Iniciando pela abordagem feita no recurso apresentado pelos Autores-Reconvindos percebemos que os mesmos se insurgem contra alguns pontos da matéria de facto considerada como provada e não provada na sentença recorrida, pugnando, outrossim, por alguns aditamentos à primeira, bem como que cumpriram suficientemente os ónus de obrigatória especificação prevenidos nos nºs 1 e 2 do artigo 640.º do CPC, acima transcrito.
Desde logo, pretendem um aditamento ao facto contido no ponto 10) dos factos considerados como provados na sentença recorrida, sustentando que na contestação os Réus-Reconvintes “reconheceram o direito à indemnização dos Autores” no tocante à plantação de oliveiras e castanheiros pugnando “pelo seu não levantamento”.
O facto contido no aludido ponto 10) tem a seguinte redacção:
“10 - No referido prédio os AA. procederam à plantação entre 100 a 200 castanheiros e um número indeterminado de oliveiras.”
O aditamento pretendido pelos Autores-Reconvindos espraia-se na seguinte redacção:
“10-A As plantações de castanheiros e oliveiras não podem ser levantadas sem detrimento para o prédio.”
Os Autores-Reconvindos alegaram matéria atinente à plantação de castanheiros e oliveiras e eventual direito a indemnização por tal procedimento nos artigos 11.º a 15.º, 63.º a 65.º e 67.º a 69.º da respectiva petição inicial, tendo, porém, os mesmos sido todos objecto de impugnação pelos Réus-Reconvintes nos artigos 30.º e 31.º da respectiva contestação.
De todo o modo sendo a redacção pretendida para o aludido ponto 10-A eminentemente conclusiva, pois não descreve um facto concreto e naturalístico, antes enunciando um facto conclusivo/opinativo e eminentemente jurídico, pois estriba-se em expressões contidas no artigo 1273.º do CC, mormente na segunda parte traduzida no trecho “não podem ser levantadas sem detrimento para o prédio”, não poderia o mesmo ser aditado à decisão relativa à matéria de facto, conforme pretendido pelos Autores-Reconvindos.
Improcede, em consequência do exposto, a impugnação no tocante ao ponto pretendido aditar.
Os Autores-Reconvindos pugnaram também pelo aditamento ao facto contido no ponto 23) dos factos considerados como provados na sentença recorrida, sustentando que das declarações de parte da Autora, do depoimento da testemunha (…) e dos documentos n.ºs 5, 11 e 12 juntos com a petição inicial, a par do relatório pericial junto aos autos, “ficou claro que havendo levantamento dos muros de sustentação existirá um inevitável deslizamento de terras, o que compromete a transitabilidade do caminho de acesso à habitação e a manutenção da piscina.”
O ponto 23 do segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida relativamente ao qual se pretende o aditamento, (pois por lapso, certamente de escrita, tal segmento possui um outro facto numerado como 23), tem a seguinte redacção:
“Procederam à construção de dois muros, com altura entre 0,5 e 1,5 metros de altura, numa extensão de aproximadamente 300 metros, um deles junto à piscina, que permitem melhor conservar o caminho de acesso do portão principal à casa e também servem de sustentação das terras envolventes à piscina, no que despenderam € 30.000,00.”
O aditamento pretendido pelos Autores-Reconvindos traduz-se no seguinte:
“23-A) Retirar os muros do local acarreta um deslizamento de terras, sendo que um desses muros suporta terras onde se encontra a piscina e o outro suporta terras que permitem a transitabilidade e manutenção do caminho de acesso da via pública até à casa.”
Vejamos de que modo o Tribunal a quo motivou o facto contido no ponto 23:
“A matéria constante nos nºs 9 a 24 resulta do teor da prova pericial realizada, no que diz respeito à natureza dos melhoramentos em causa e do respectivo valor, e dos esclarecimentos efectuados pelo Ilustre Perito em audiência de julgamento.
Pertinentes ainda, os depoimentos de (…), que forneceu castanheiros e oliveiras, bem como sistema de rega aos AA., (…), que procedeu à construção dos muros que suportam o portão, muros e trabalhos de terraplanagem […]
Levaram-se ainda em consideração as imagens de “Google Earth” juntas aos autos e exibidas no decurso da audiência de julgamento. Embora deles não se possam retirar as características concretas e pormenorizadas de todas e cada uma das alterações realizadas no prédio, revelando notórias alterações da estrutura do prédio, permitiram dar credibilidade aos elementos probatórios enunciados.”
Estão em causa, quer no tocante aos mencionados na motivação, quer nos que os Autores-Reconvindos invocam em sede de impugnação, meios probatórios integrantes da chamada prova não vinculada, como tal sujeita à livre apreciação do julgador de acordo com a sua prudente convicção, bom senso e regras de experiência comum.
Com efeito, também o relatório pericial fica sujeito a essa livre apreciação, por força do disposto na segunda parte do artigo 489.º do CPC.
Acresce que as declarações de parte dos Autores-Reconvindos, além de igualmente sujeitas à livre apreciação do julgador pois não configuram reconhecimento da realidade de facto desfavorável aos mesmos (cfr. artigo 466.º, n.º 3, do CPC), por serem emitidas por pessoas interessadas num concreto desfecho da acção devem ser sustentadas e confirmadas por outros meios probatórios produzidos.
No contexto acabado de descrever e examinado o teor do relatório pericial, bem como os documentos identificados (3 fotos, sendo que em nenhuma se vislumbra a piscina), a par das declarações de parte dos Autores-Reconvindos e do depoimento da testemunha (…) na parte da gravação identificada pelos Autores-Reconvindos, cujos excertos considerados relevantes foram, aliás, transcritos na motivação do recurso, não cremos que resulte demonstrada a factualidade contida no aditamento pretendido.
O que seguramente ressalta do cotejo desses meios probatórios, bem explicado no relatório pericial junto aos autos, é que os ditos muros são de sustentação de terras, o que ficou bem explicito na resposta ao quesito 9), ao afirmar-se que:
“A função dos muros é a sustentação de terras e modelação do terreno de forma a melhor conservar o caminho. Desenvolvem-se maioritariamente ao longo do caminho (em ambos os lados do mesmo) entre o portão principal e a moradia. Também se consideram os muros que sustêm as terras na envolvente da piscina”.
De resto, sempre se dirá que não correspondendo o descritivo constante da segunda parte do pretendido aditamento (desde “sendo que um desses muros” até ao final), ao que ficou provado sob o ponto 23 dos factos provados, designadamente no tocante ao caminho de acesso, sempre teria que ter sido impugnado esse ponto 23 mormente na parte correspondente, o que não foi feito pelos Autores-Reconvindos.
Quanto à parte inicial do pretendido aditamento correspondente ao trecho “retirar os muros do local acarreta um deslizamento de terras”, além de conter em si um juízo eminentemente conclusivo, que pode, ou não, resultar da interpretação do julgador a partir da prova feita de que os dois muros construídos, “servem de sustentação das terras envolventes à piscina”, reiteramos não resultar tal demonstrado pelo cotejo da prova indicada pelos Autores-Reconvindos, mas apenas provado que os ditos muros, tal como consta do ponto 23 dos factos considerados como provados, “servem de sustentação das terras envolventes à piscina”.
Do exposto, improcede, igualmente, a impugnação dos Autores - Reconvindos no tocante ao pretendido aditamento dum ponto 23-A no segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida.

Prosseguindo na análise da impugnação dirigida pelos mesmos contra a matéria de facto discriminada na sentença recorrida verificamos que os Autores-Reconvindos pretendem que com base nas suas declarações de parte, depoimentos das testemunhas (…) e (…), cujos excertos considerados como relevantes transcreveram na motivação do recurso e documento 4 (fotografia), junto com a petição inicial, seja “parcialmente revogado o número 3” dos factos considerados na sentença como não provados, assim como aditado um ponto 15-A ao segmento dos factos considerados como provados, indicando para ambos a seguinte redacção:
“3. Que os Autores despenderam com a reparação da barragem o montante de 9.000,00”.
“15-A) A barragem carecia das obras feitas pelos AA sem a qual a mesma não estaria em funcionamento e permaneceria insuscetível de qualquer aproveitamento”.
Vejamos de que modo o Tribunal a quo motivou o facto contido no ponto 3 dos factos considerados como não provados na sentença recorrida, sendo certo que a motivação respeitante ao ponto 15 dos factos provados já consta transcrita supra.
“O constante em 3 resulta da ausência de prova quanto à mesma. Com efeito, nem o próprio A. nas suas declarações de parte referiu que a barragem tivesse sem funcionar. O que ele mencionou foi que procederam ao seu alargamento e aprofundaram-na, aproveitando a terra que dela retiraram para por ao pé de casa.”
Do exame dos meios probatórios invocados pelos Autores-Reconvindos, mormente da leitura dos excertos selecionados e transcritos das declarações e depoimentos invocados por aqueles, percebemos, no tocante ao circunstancialismo factual julgado como não provado no ponto 3 dos factos considerados como não provados que os Autores pretendem infirmar, que apenas a Autora-Reconvinda, em resposta a pergunta formulada sobre se a charca/barragem existente se encontrava a funcionar, referiu que “naquela propriedade nada funcionava”, nada mais resultando com relevo, inclusive da observação do documento 4 junto com a petição inicial, que permita confirmar o teor da impugnação dirigida ao ponto 3 dos factos considerados como não provados e do mesmo passo possibilitar a demonstração do teor do aditamento pretendido através do ponto 15-A.
Na verdade, a alegada necessidade de limpeza da charca/barragem não se traduz na concretização de obras, assim como a realização de obras não se consubstancia necessariamente na reparação de algo podendo servir apenas para modificar, ampliar ou restringir, nem a necessidade de limpeza implica que algo esteja sem funcionar, ou sem aproveitamento, sendo certo ainda que quanto às duas fotos que integram o documento 4 junto com a petição inicial também não é possível concluir no sentido defendido pelos Autores-Reconvindos uma vez que é notória a diferença de resolução entre as duas fotografias estando a segunda, com menção “2009”, muito mais nítida que a primeira com menção “2005”.
Dito isto, pensamos que também quanto a este ponto a motivação expressa na sentença recorrida assente na convicção do julgador a quo mostra-se acertada.
Destarte, improcede a impugnação dirigida contra a decisão da matéria de facto também no tocante ao ponto acabado de analisar.

Continuando na apreciação do mérito da impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pelos Autores-Reconvindos percebemos que com fundamento nas suas declarações de parte, cujos excertos entendidos por relevantes transcreveram na motivação do recurso, bem como nos documentos 7 e 8 juntos com a petição inicial, teor do relatório pericial junto aos autos em 22/06/2022 e esclarecimentos prestados relativamente ao mesmo datados de 20/09/2022, igualmente juntos aos autos, os Autores-Reconvindos pugnam pela eliminação do ponto 4 do segmento dos factos considerados como não provados e do mesmo passo o aditamento ao acervo dos factos considerados como provados na sentença recorrida de um ponto 17-A, outro 17-B e ainda um ponto 18-A.
O ponto 4 do elenco dos factos considerados como não provados tem o seguinte teor:
“4- A destruição do poço, em face da sua profundidade, coloca em risco a estrutura do solo com eventuais deslizamentos de terras.”
Por seu turno, os pontos de facto cujo aditamento é pretendido têm o seguinte teor:
“17-A) O depósito está em parte inserido no solo e nele fixado sendo que a canalização está toda enterrada;
17-B) A instalação referida em 17, com a sua dimensão e estrutura, causará deteriorações no prédio se levantada;
18-A) O poço está contruído e implementado no solo e nele fixado, pelo que existe risco de deterioração no prédio se levantado.”
Vejamos de que forma o Tribunal a quo motivou o ponto 4 dos factos considerados como não provados, na certeza de que a motivação que abrange os factos elencados sob os pontos 17 e 18 dos factos considerados como provados já se encontra transcrita supra.
“O constante em 4 a 7 não foi mencionado por ninguém, nem resulta do relatório pericial.”
Desde já se deixa expresso que o aditamento pretendido através dos pontos 17-B e 18-A mais não revela que juízos eminentemente conclusivos e opinativos, não se traduzindo no enunciado de um facto concreto e naturalístico sendo assim de rejeitar.
Quanto ao restante pretendido percebemos pela análise concertada dos excertos de declarações de parte transcritos, com o teor do relatório pericial e esclarecimentos prestados quanto ao mesmo e ainda das fotografias numeradas como documentos 7 e 8 com a petição inicial não resultar demonstrado o pretendido pelos Autores-Reconvindos sendo assim de manter a redacção do ponto 4 dos factos considerados como não provados na sentença recorrida e refutar o pretendido aditamento ao acervo dos factos provados do ponto 17-A.
Na verdade, não estando as declarações de parte dos Autores-Reconvindos secundadas por qualquer outro meio probatório, designadamente pelo relatório pericial e esclarecimentos prestados quanto ao mesmo, nem pelos documentos 7 e 8, que não permitem revelar o pretendido pelos Autores, notando-se, desde logo, que a resolução do documento 7 é fracamente inferior à do documento 8, não permitindo este último perceber, sequer, o que foi captado no solo, sem esquecer que nos esclarecimentos prestados pelo perito no documento datado de 20/09/2022 o mesmo se refere a conduta enterrada e não a “canalização toda enterrada”, impõe-se também quanto a esta matéria considerar improcedente a impugnação relativa à matéria de facto apresentada pelos Autores-Reconvindos.

Por fim, sustentam os Autores-Reconvindos, com fundamento nas declarações de parte prestadas pelos próprios, de que destacaram os excertos considerados como relevantes na motivação do recurso, que a redacção do facto contido no ponto 16 do segmento dos factos considerados como provados na sentença recorrida deve ser alterada, passando a ser a seguinte:
“16. E procederam à construção de três fontes, duas alimentadas pela barragem e outra junto à casa, alimentada pelo depósito, no que gastaram € 5.000,00”.
Sustentaram ainda que deve ser aditado um facto ao referido ponto de facto com o seguinte teor:
“16-A As três fontes são alimentadas nos termos do número anterior, por via de canos enterrados no solo, numa dimensão não concretamente apurada mas seguramente superior a mil metros.”
Encontra-se provado sob o ponto 16 do segmento atinente aos factos provados na sentença recorrida o seguinte:
“16 – E procederam à construção de três fontes, duas alimentadas pela barragem e outra junto à casa, no que gastaram € 5.000,00.”
A motivação do Tribunal a quo no tocante, além de outros, à prova do facto contido no ponto 16 dos factos provados já se encontra acima expressa.
Os meios probatórios indicados pelos Autores-Reconvindos cingem-se apenas a excertos das suas próprias declarações de parte.
Não estando, também relativamente à matéria de que ora nos ocupamos, em causa o reconhecimento da realidade de factos desfavoráveis aos Autores-Reconvindos e favoráveis aos Réus-Reconvintes, impunha-se, conforme já o defendemos supra, que as ditas declarações fossem acompanhadas de outros meios de prova, ainda que igualmente não vinculada.
O que não sucede, visto que no relatório pericial e nos esclarecimentos prestados quanto ao mesmo pelo perito (quesito 15), apenas houve pronúncia quanto ao valor estimado com a construção e instalação das três fontes nada se tendo dito sobre a respectiva forma de alimentação.
Em todo o caso, lendo atentamente os excertos transcritos na motivação recursiva respeitantes às declarações de parte prestadas pelos Autores-Reconvindos nem sequer resulta evidenciado com o mínimo de segurança a redacção pretendida pelos mesmos para o facto contido no ponto 16 dos factos julgados como provados na sentença recorrida.
Na verdade, a Autora refere-se a “tanque” e não a depósito e o Autor alude a “canalizações”.
Do exposto, resulta improcedente, também quanto ao ponto acabado de apreciar, a impugnação relativa à decisão da matéria de facto apresentada pelos Autores-Reconvindos.
Em conformidade com o supra expendido, improcedem as conclusões recursivas no tocante a toda a matéria que conforma a impugnação apresentada pelos Autores-Reconvindos relativamente à decisão relativa à matéria de facto discriminada na sentença recorrida.

B) 1 - Impugnação da decisão relativa à matéria de facto apresentada pelo Réu-Reconvinte e ora Apelante (…).
Nas suas conclusões recursivas o Réu-Reconvinte sustenta, respectivamente nos pontos 4 e 11 das ditas conclusões que “o tribunal não devia ter dado como provado que a piscina acrescenta valor ao prédio, o qual nem sequer foi alegado, mas sim como não provado” e ainda que “o tribunal não deveria ter dado como provado que a piscina não pode ser levantada sem detrimento para o prédio, mas sim como não provado.”
Sucede, porém, que o Réu-Reconvinte e Apelante não logrou especificar adequadamente no aludido segmento das conclusões do recurso quais os pontos de facto descriminados como provados na sentença recorrida que pretendeu infirmar por os considerar incorrectamente julgados, nem efectuou remissão para eventual identificação feita no segmento motivatório do recurso.
Mas há mais a salientar. É que na verdade lendo atentamente todos os pontos de facto descriminados na sentença recorrida e integrantes do segmento relativo aos factos considerados como provados não descortinamos qualquer ponto de facto em que se tenha considerado como assente que “a piscina acrescenta valor ao prédio”, nem como assente que “a piscina não pode ser levantada sem detrimento para o prédio”.
O Réu-Reconvinte e apelante sustentou ainda nas suas conclusões recursivas que o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que “existem na propriedade pelo menos 250 castanheiros e 250 oliveiras”, acrescentando que tal facto resulta das declarações de parte do Autor-Reconvindo e dos documentos 14 e 15 (fotografias), juntas com a petição inicial.
Na sentença recorrida ficou assente sob o ponto 10- do segmento atinente aos factos considerados como provados que “No referido prédio os AA procederam à plantação entre 100 e 200 castanheiros e um número indeterminado de oliveiras” e no segmento relativo aos factos não provados sob o ponto 1 como indemonstrado que “Os AA procederam à plantação especificamente de 250 castanheiros e 300 novas oliveiras” e no ponto 54 como não provado que “Existem no prédio dois olivais, um mais antigo com 97 oliveiras e outro mais recente com 250 oliveiras.”
Dito isto, afigura-se-nos que o Réus-Reconvinte e apelante estava obrigado a especificar nas conclusões recursivas os três pontos de facto acabados de mencionar, como tendo sido incorrectamente julgados, o que não fez expressamente, nem por remissão para a motivação do recurso.
Acresce que da leitura exaustiva e atenta dos articulados carreados ao processo não se descortina que em qualquer deles tenha sido concretamente alegado que “existem na propriedade pelo menos 250 castanheiros e 250 oliveiras”.
A este propósito, de acordo com linha orientadora já seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça noutros arestos anteriores e com a qual concordamos, não podemos deixar de lembrar um excerto muito significativo a propósito da matéria ora em análise constante de recente acórdão do STJ de 14/02/2023 (relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Pedro Lima Gonçalves), proferido no processo 82/20.9T8FAR.E1.S1, com o seguinte teor:
“[…] uma vez que, conforme é jurisprudência maioritária neste STJ, nas conclusões deve constar, pelo menos, a referência à impugnação da matéria de facto, e bem assim, quais os concretos pontos de factos que o recorrente pretende impugnar.
- cfr., neste sentido, os seguintes Acs. do STJ, de 15/09/2022 (Revista n.º 556/19.4T8PNF.P1.S1), de 21/06/2022 (Revista n.º 644/20.4T8LRA.C1.S1), de 9/02/2021 (Revista n.º 16926/04.0YYLSB-B.L1.S1).”
Ainda no tocante ao aresto que trouxemos à colação, permitimo-nos transcrever a elucidativa nota sumativa do seguinte conteúdo:
“Não se pode considerar cumprido pelo Recorrente o ónus de impugnação da matéria de facto, previsto no artigo 640.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, quando o Recorrente não faz de forma expressa nas conclusões a indicação e também não o faz por remissão para a motivação das alegações de recurso.”
Dito isto impõe-se rejeitar a impugnação contra a decisão relativa à matéria de facto apresentada pelo Réu-Reconvinte e apelante, por incumprimento do ónus de especificação obrigatória previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC.
Pelo exposto, mantêm-se imutáveis, em consequência do resultado da apreciação das impugnações contra a decisão relativa à matéria de facto descrita na sentença recorrida apresentadas por Autores-Reconvindos e Réu-Reconvinte nos respectivos recursos, os segmentos da dita sentença que contem em si a descriminação dos factos provados e dos factos não provados.

A) 2- Reapreciação de mérito
Da leitura das conclusões recursivas dos Autores-Reconvindos percebemos que no tocante à questão da indemnização, a título de benfeitorias realizadas, no valor de € 13.000,00 pela plantação de castanheiros e oliveiras, de € 30.000,00 pelo levantamento dos muros de suporte de terras, de € 2.400,00 pelas obras na barragem e de € 5.000,00 pela construção das 3 fontes, o sucesso do recurso ficou dependente da pretendida alteração à matéria de facto discriminada na sentença recorrida, consubstanciada em impugnação que foi considerada integralmente improcedente supra.
Na verdade, relativamente às indicadas matérias os Autores - Reconvindos não apresentaram solução jurídica diferente da vertida na sentença recorrida para a hipótese de a impugnação que apresentaram viesse a ser, como foi, julgada improcedente.
Como tal e atendendo ao disposto na 1.ª parte do n.º 2 do artigo 608.º, aplicável ex vi do n.º 2 do artigo 663.º, ambos do CPC, mostra-se prejudicada a apreciação das indicadas questões.
Sempre se dirá, contudo, face ao exposto no ponto 11 das conclusões recursivas não se vislumbrar o alegado comprometimento da “congruência” da decisão recorrida desde logo porque do facto contido no ponto 23 da matéria de facto considerada como provada na sentença recorrida não resulta que algum dos dois muros sustenta a piscina, mas apenas que “servem de sustentação das terras envolventes da piscina”, o que é realidade diversa.
No ponto 27 das respectivas conclusões recursivas os Autores - Reconvindos entendem que os argumentos vertidos na sentença recorrida para o não levantamento da piscina devem ser aplicáveis às obras descritas nos pontos 17 e 18 dos factos considerados como provados na sentença recorrida, entendendo que diverso entendimento viola o disposto no artigo 1273.º, nºs 1 e 2, do Código Civil (doravante apenas CC).
Comecemos por recordar a previsão do normativo acabado de mencionar epigrafado “Benfeitorias necessárias e úteis” e que é a seguinte:
1. Tanto o possuidor de boa-fé como o de má-fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento desta.
2. Quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa.”
Vejamos qual a argumentação plasmada na sentença recorrida justificadora do não levantamento da piscina.
Relativamente à piscina, com as dimensões constantes nos documentos juntos no decurso da audiência de julgamento relativos à sua construção e instalação, tendo em consideração razões de experiência comum, afigura-se que o seu levantamento gera necessariamente a deterioração do prédio que se quer evitar, ainda que não seja possível afirmar que os detrimentos sejam especificamente os referidos no ponto 5 dos factos não provados.
Assim, quanto a esta, afigura-se que se impõe condenar os RR. a indemnizarem os AA. relativamente a esta benfeitoria, sendo a indemnização calculada de acordo com as regras do enriquecimento sem causa.”
Recordemos, igualmente, a argumentação utilizada relativamente às restantes benfeitorias / melhoramentos invocadas pelos Autores - Reconvindos e consideradas como provadas na sentença recorrida:
Relativamente às restantes, afigura-se evidente que a sua retirada consubstanciará uma acentuada desvalorização do prédio em causa, implicando demolições e alterações no relevo do terreno, mas não resultou matéria provada, ou tal resulta de razões de experiência comum, que a sua retirada tem como inerente o detrimento da coisa. A sua retirada traduzir-se-á na colocação do prédio na situação que estaria no momento anterior à realização de tais melhoramentos.”
Ora considerando os factos vertidos nos pontos 17 e 18 do segmento da sentença recorrida atinente aos factos considerados como provados e sem prejuízo de relativamente à piscina termos de reanalisar especificamente o bem, ou mal, fundado quanto ao que ficou decidido na sentença recorrida no tocante à questão do eventual detrimento no solo do prédio causado pelo seu levantamento, o que se justificará fazer infra em sede de reapreciação de mérito do recurso independente dos Réus - Reconvintes, pensamos que a argumentação utilizada pelo Tribunal a quo mostra-se acertada no tocante ao depósito para armazenamento de águas, não se vislumbrando qualquer incongruência em não aplicar a tal melhoramento os considerandos feitos no tocante à piscina.
Na verdade, sabemos que se trata de uma estrutura com um diâmetro bem inferior às medidas da piscina e que se eleva do terreno por três metros com uma conduta que o liga à casa não se vislumbrando, por um lado, impossibilidade de remoção ou levantamento e por outro que este último cause necessariamente detrimento da coisa, ou seja do solo do prédio misto sobre que foi feito.
Quanto ao poço, além de apenas ter resultado provado que foi construído pelos Autores-Reconvindos, que nele gastaram € 4.000,00, impõe-se ainda recordar que resultou não provado sob o ponto 4 do segmento atinente aos factos considerados como não provados na sentença recorrida que a destruição do mesmo em face da sua profundidade coloca em risco a estrutura do solo com eventuais deslizamentos de terras.
Acresce que, apesar de tal ponto de facto ter sido impugnado no recurso dos Autores-Reconvindos, certo é que a impugnação do mesmo foi desatendida acima.
Assim, não tendo resultado provado nos autos outra factualidade relativa ao poço de que seja possível concluir que a sua remoção causará seguro detrimento do solo do prédio onde foi construído urge concluir também quanto ao mesmo pela inexistência de incongruência por não ter sido seguido quanto ao poço o raciocínio feito relativamente à piscina.
Dito isto, carece de fundamento o pretendido ressarcimento aos Autores-Reconvindos por tal melhoramento.
Nos pontos 34 a 36 das respectivas conclusões recursivas alegam ainda os Autores-Reconvindos que o Tribunal a quo incorreu em erro ao considerar na sentença recorrida os socalcos como benfeitoria útil susceptível de levantamento, acrescentando que os socalcos “envolvem movimentações de terras”, contando no caso em apreço com “cerca de dez metros de largura”, mais acrescentando que “neste tipo de obras existe uma impossibilidade material de levantamento”, razão pela qual deveriam ser indemnizados por tal benfeitoria.
Na sentença recorrida ficou demonstrado sob os pontos 12 e 13 do segmento dos factos considerados como provados o seguinte.
“12- No prédio os AA, construíram socalcos que não existiam anteriormente, no que despenderam o valor de € 7.200,00.
13- Os socalcos são susceptíveis de evitar a erosão e permitir o melhor aproveitamento da plantação de carvalhos.”
Ora bem, é ponto assente que os Autores-Reconvindos não impugnaram especificamente nenhum dos dois factos acabados de transcrever.
Por outro lado, não resulta da respectiva redacção que os concretos socalcos dos autos tenham cerca de dez metros de largura.
Recorrendo para melhor elucidação do conceito à “INFOPÉDIA-Dicionários Porto Editora” percebemos que o significado de socalco é “Porção de terreno mais ou menos horizontal; Espécie de degrau, nas encostas, suportado por muro, para cultivo”.
O socalco está, assim, intimamente ligado a uma técnica agrícola e de conservação do solo empregue em terrenos muito inclinados, permitindo em simultâneo o seu cultivo e o controle da erosão hídrica.
Perante esta constatação afigura-se francamente inviável, ou mesmo impossível, o levantamento do prédio dos ditos socalcos sem detrimento para o solo deste último.
E, sendo assim, julgamos que, mantendo também quanto aos socalcos o entendimento sufragado na sentença recorrida de que no caso concreto tal benfeitoria se traduziu numa benfeitoria útil, o que, aliás, decorre do facto contido no ponto 13 dos factos considerados como provados na sentença recorrida acima transcrito e que não foi impugnado em nenhum dos recursos, na medida em que as circunstâncias de facto aí descritas permitem presumir o aumento do valor do solo do prédio onde os socalcos foram edificados, atendendo à manifesta inviabilidade de remover ou levantar tais socalcos sem detrimento para o prédio é de reconhecer razão aos Autores-Reconvindos quanto a esta questão.
Isto dito, deverão os Autores-Reconvindos serem ressarcidos por tal benfeitoria sendo, então, caso de se chamar à colação o artigo 479.º do CC, epigrafado “Objeto da obrigação de restituir”, cuja previsão é a seguinte:
1. A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
2. A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data da verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.”
Por seu turno, nas duas alíneas do artigo 480.º do CC salienta-se a citação judicial do enriquecido para a restituição (al a) e o conhecimento pelo enriquecido da falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação (alínea b)).
Nas suas conclusões recursivas os Réus-Reconvintes não se insurgem contra o aludido melhoramento e menos ainda quanto ao valor do ressarcimento pretendido pelo mesmo.
Já sabemos que resultou provado que os Autores/Reconvindos gastaram com a construção dos socalcos a quantia de € 7.200,00.
Porém, do exame atento do petitório formulado na petição inicial verificamos que pela benfeitoria dos socalcos os Autores-Reconvindos pediram o pagamento do montante de € 7.000,00.
Assim, considerando a previsão do n.º 2 do artigo 479.º do CC, julgamos adequado o ressarcimento da benfeitoria em apreço no montante de € 7.000,00, devendo os Autores-Reconvindos serem indemnizados pelos Réus-Reconvintes nessa quantia.
Do exposto, resulta a parcial procedência do recurso interposto pelos Autores-Reconvindos.

B) 2- Reapreciação de mérito
Da análise das conclusões recursivas do Réu-Reconvinte e Apelante percebemos que o mesmo se insurge contra o juízo formulado na sentença recorrida assente na classificação da piscina como benfeitoria útil, por a considerar benfeitoria voluptuária e ainda por se ter entendido na mesma sentença não poder a piscina ser levantada sem detrimento para o prédio.
Vejamos se lhe assiste alguma razão.
Convoquemos, para tal, a argumentação expressa a propósito na sentença recorrida que nos permitimos transcrever de seguida, na certeza de que uma parte dela até já foi transcrita supra aquando da apreciação do mérito do outro recurso independente dos Autores-Reconvindos.
Se forem benfeitorias necessárias, ainda que o possuidor esteja de má fé, conferem o direito a ser indemnizado do seu valor. Todavia, tal indemnização não corresponde ao seu reembolso, não podendo exceder o valor do benefício ao tempo da entrega.
Se forem benfeitorias úteis, o possuidor é admitido a levantá-las, se o puder fazer sem detrimento da coisa principal ou, então, quando não haja lugar a tal levantamento, deve ser satisfeito/indemnizado segundo as regras do enriquecimento sem causa. Assim, o proprietário não pagará mais do que o despendido nelas, nem pagará mais que o valor que as benfeitorias representam para a coisa.
Se forem voluptuárias, o possuidor de boa fé apenas tem o direito a levantá-las se esse levantamento não implicar prejuízo para a coisa. Se for de má-fé não tem qualquer direito, perdendo-as em beneficio do proprietário.
[…]
Por conseguinte, e concluindo, tendo em consideração as características dos melhoramentos, afigura-se que nenhuma reveste a natureza de benfeitorias necessárias, em vista da definição destas supra referidas. Mas, também atendendo a razões de experiência comum, resulta inequívoco que todas aumentaram o valor do prédio, sendo inequivocamente úteis.
Assim sendo, e relativamente a estas, benfeitorias úteis, seja o possuidor de boa ou má fé, de acordo com o estatuído no artigo 1273.º, n.º 1, do Código Civil, apenas cabe o direito a levantar as benfeitorias realizadas, desde que o possa fazer sem detrimento dela.
Relativamente à piscina, com as dimensões constantes nos documentos juntos no decurso da audiência de julgamento relativos à sua construção e instalação. tendo em consideração razões de experiência comum, afigura-se que o seu levantamento gera necessariamente a deterioração do prédio que se quer evitar, ainda que não seja possível afirmar que os detrimentos sejam especificamente os referidos no ponto 5 dos factos não provado.”
Já se disse supra carecer de qualquer fundamento a impugnação pretendida pelos Réus-Reconvintes no tocante à piscina, uma vez que pretendeu infirmar factos que na sua perspectiva resultaram como provados e que na realidade não constam de todo da fundamentação de facto descrita na sentença recorrida.
Não obstante no tocante à piscina resultar apenas provado o singelo facto descrito sob o ponto 19 dos factos considerados como provados na sentença recorrida em face do contexto concreto em que surge implantada como apoio a uma casa de habitação e resultando de documentação carreada as respectivas medidas, afigura-se poder acompanhar a argumentação acabada de transcrever no tocante à classificação de tal benfeitora como útil, pois é susceptível de ter valorizado o prédio misto onde foi implantada.
Sem embargo, já não poderemos acompanhar na mesma medida a argumentação aduzida na sentença recorrida para justificar o detrimento do solo do prédio onde a piscina foi edificada caso a mesma seja levantada ou removida, uma vez que nada mais tendo resultado provado além do facto contido no aludido ponto 19 e resultado, por outro lado, não provado no ponto 5 do segmento respeitante aos factos não provados que “A destruição da piscina provocará que parte do solo fique a descoberto, sujeito a erosões, potenciando problemas de humidade e drenagem do solo no futuro, colocando em risco a estrutura da casa”, não vislumbramos apoio factual seguro para concluir que o levantamento de tal melhoria acarretará seguramente detrimento no prédio onde foi erigida, pois fica por ilustrar qualquer concreto detrimento.
E, assim sendo, carece de fundamento o pretendido ressarcimento aos Autores-Reconvindos por tal melhoramento.

Pretende, por fim, o Réu-Reconvinte e apelante que os Réus sejam ressarcidos pelos Autores-Reconvindos pela posse do prédio em causa até Outubro de 2019 e da quantia a liquidar em sede de execução de sentença desde tal data até à entrega do imóvel alegando que, não obstante o imóvel urbano do prédio misto em apreço não se encontrar arrendado, ficou provado que este último tem um valor locativo mensal de € 330,00, devendo, como tal, serem restituídos nos termos pretendidos ao abrigo do disposto no artigo 1271.º do CC.
É indiscutível que resultou provado na sentença recorrida sob o ponto 31 do segmento dos factos considerados como provados elencados na mesma que o prédio urbano para habitação existente no prédio misto em causa “tem um valor locativo de pelo menos € 330,00/mês”.
E também se verifica que na contestação/reconvenção os Réus-Reconvintes aludiram ao valor locativo do dito imóvel urbano designadamente nos artigos 122.º e 123.º do mencionado articulado.
Na sentença recorrida o Tribunal a quo pronunciou-se sobre a questão do seguinte modo:
Reconvencionalmente pediram ainda os RR. a condenação dos AA. no pagamento dos frutos percebidos por estes entre 2006 a 2018, enquanto possuidores de má-fé.
Não sendo possível a sua restituição em espécie, reputam os mesmos no valor de € 223.661,00, ampliado no decurso da audiência de julgamento, e no que se liquidar em execução de sentença, quanto aos vencidos na pendência da presente acção.
Nos termos do disposto no artigo 1271.º do Código Civil, o possuidor de má fé deve restituir os frutos que a coisa produziu até ao termo da posse e responde, além disso, pelo valor daqueles que um proprietário diligente poderia ter obtido.
Como escrevem Antunes Varela e Pires de Lima, “na medida em que obriga o possuidor de má fé a restituir todos os frutos produzidos pela coisa, o artigo 1271.º afasta-se das regras da responsabilidade civil, as quais só permitiriam ao proprietário exigir o valor dos frutos que ele próprio teria colhido, se a coisa se encontrasse em seu poder.
Por outro lado, remetendo para os frutos que um proprietário diligente poderia ter obtido, “se os frutos percepiendos (os que um proprietário diligente poderia ter obtido) excederem os frutos produzidos pela coisa, pode o proprietário exigir ainda ao possuidor a soma correspondente a esse excesso; se, pelo contrário, os frutos produzidos pela coisa excedem os que um proprietário diligente poderia ter obtido, pode o proprietário exigir todos aqueles frutos”.
Cfr. “Código Civil anotado”, volume III, Coimbra Editora, 1987, pág. 40.
Descreveram os RR. os alegados frutos percebidos nos artigos 109º a 145º da contestação.
Todavia fazem-no, liquidando frutos e quantias em cuja condenação dos AA. pedem de forma que se afigura confundirem o direito de restituição aos frutos e o direito de indemnização baseada em responsabilidade civil por facto ilícito, por privação do uso.
Escrevemos isto porque, entre outros pedem o valor referente ao valor locativo do imóvel, bem como do valor locatício das pastagens.
Tratando-se essas rendas de frutos civis, da matéria de facto provado não resultou a qualquer titulo, nem isso foi alegado, que os AA. tenham recebido as mesmas.
Por outro lado, o não recebimento dessas rendas, ou a não colocação de habitação ou das pastagens em arrendamento, em face da utilização que os AA. fizeram do prédio e dos melhoramentos realizados, independentemente da posse de boa ou má fé, não se afigura que consubstancie uma actuação desconforme à de um proprietário diligente.
Assim, quanto a estes frutos há que julgar o pedido reconvencional improcedente.”
Concordamos com a transcrita argumentação e solução expostas na sentença recorrida e que acima nos permitimos transcrever pelo que também quanto a esta questão acompanhamos a dita douta sentença, carecendo, como tal, de razão o Réu-Reconvinte e apelante relativamente à pretensão manifestada baseada no valor locativo do imóvel urbano existente no prédio misto.
Do exposto resulta parcialmente procedente o recurso independente interposto pelo Réu-Reconvinte (…), mormente no que tange à sua absolvição do pedido atinente à benfeitoria correspondente à construção da piscina cujo ressarcimento foi peticionada na alínea g) do petitório formulado no final da petição inicial.
Em suma, deverão os Autores-Reconvindos serem ressarcidos, a título de benfeitorias realizadas por estes últimos, pelos Réus-Reconvintes, da quantia de € 7.000,00 (sete mil euros), correspondente ao pedido formulado na alínea c) da petição inicial (construção de socalcos).
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V- DECISÃO
Termos em que, face a todo o exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação independente interposto pelos Autores-Reconvindos (…) e (…) e igualmente parcialmente procedente o recurso de apelação independente interposto pelo Réu-Reconvinte (…), decidindo-se o seguinte:
I- Revogar o segmento relativo ao ponto 1 do dispositivo da sentença recorrida, que se substitui pelo seguinte:
1- Julga-se parcialmente procedente, por parcialmente provada, a presente acção e, em consequência, condenam-se os Réus-Reconvintes no pagamento aos Autores-Reconvindos da quantia total de € 7.000,00 (sete mil euros), a título de benfeitorias realizadas por estes últimos no prédio identificado no ponto 1 dos factos provados, correspondente ao pedido formulado na alínea c) (construção dos socalcos), autorizando-se os Autores-Reconvindos a procederem ao levantamento das benfeitorias a que correspondem as alíneas a), b), d), e), g) e i) a o), do petitório da petição inicial classificadas como úteis, absolvendo-se os Réus-Reconvintes do demais peticionado;
2- Manter no mais o segmento decisório da sentença recorrida.
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II- Condenar os Autores-Reconvindos e o Réu-Reconvinte nas custas respeitantes ao recurso interposto pelos primeiros, na proporção de 85% para Autores-Reconvindos e de 15% para o Réu-Reconvinte, bem como nas custas respeitantes ao recurso interposto pelo Réu-Reconvinte na proporção de 85% para este e de 15% para os Autores-Reconvindos (artigo 527.º, n.º 1 e 2, do CPC).
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Notifique.
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Évora, 25 de Janeiro de 2024
José António Moita (Relator)
Maria da Graça Araújo (1ª Adjunta)
Francisco Xavier (2º Adjunto)