Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
425/18.5T8ALR.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: RECUSA DE COOPERAÇÃO
INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 02/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – A alocução fundamento para impor decisão diversa, nos termos proclamados pelo n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória, antes exige que o juízo efectuado pela Primeira Instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova.
2 – A inversão do ónus da prova nos termos previstos no artigo 344.º do Código Civil, para que remete o n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Civil, pressupõe que tenha havido uma recusa de cooperação processual por uma das partes que tenha tornado culposamente impossível a prova ao onerado.
3 – A inversão do ónus da prova está assim dependente da verificação dos seguintes pressupostos: i. a prova de determinada factualidade há de ter-se tornado impossível ou, pelo menos, particularmente difícil de fazer em virtude da actuação da parte contrária; ii. tal comportamento terá de lhe ser imputado a título de culpa.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 425/18.5T8ALR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Competência Genérica de Almeirim – J1
*
I – Relatório:
Na presente acção declarativa de condenação proposta por “(…), Tecnologias e Serviços para Economia de Energia, Unipessoal, Lda.” contra “(…) – Rectificação Mecânica de Precisão de (…), Lda.”, a sociedade Autora veio interpor recurso da sentença proferida.
*
A sociedade Autora pedia a condenação da Ré no pagamento de € 11.286,40 (onze mil e duzentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos), acrescidos de juros desde a citação, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da reparação defeituosa do seu veículo automóvel, por aquela realizada.
*
Em seu benefício, a sociedade Autora disse ser proprietária do veículo da marca SAAB, modelo 9.3 2200 TDI, matrícula (…) e ter contratado a Ré para realizar uma reparação especializada de rectificação e que esta, por errada intervenção técnica, deu origem a diversos prejuízos.
*
Devidamente citada, a Ré contestou, excepcionou a sua ilegitimidade (a qual foi julgada improcedente na audiência prévia) e a caducidade do direito (cujo conhecimento aí foi relegado para a sentença), como por impugnação, refutando a sua responsabilidade pelos danos alegados pela Autora e pelo pagamento da indemnização peticionada.
*
Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador e foram identificados o objecto do litígio e os temas da prova.
*
Realizada a audiência final, o Tribunal a quo decidiu julgar a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.
*
A sociedade Autora não se conformou com a referida decisão e as suas alegações continham as seguintes conclusões:
«A – Veio o Tribunal afirmar que, apesar de ter sido feita a prova de várias avarias no veículo da Autora, estas não chegam a configurar defeitos atendíveis para efeitos de cumprimento defeituoso da obrigação, por não ter sido demonstrada a existência de nexo de causalidade entre as intervenções da Recorrida no bloco do motor da viatura e as diversas avarias ocorridas na viatura.
B – Foi também dado como provado que após a primeira avaria do motor no veiculo da Autora, este veio a ser intervencionado pela Ré, seguindo-se sucessivas avarias sem que, no entendimento do Tribunal, a Autora tenha demonstrado o nexo de causalidade, pressuposto essencial da existência de defeitos imputáveis à prestadora do serviço, concluindo assim que, não sendo possível apurar a existência de cumprimento defeituoso da obrigação contratual da Ré, não poderia a mesma ser responsabilizada pelos prejuízos invocados pela Autora.
C – A exclusão da responsabilidade da Ré foi feita por se entender que apenas uma perícia técnica poderia confirmar que o encamisamento seria o motivo causador para todas as avarias subsequentes à primeira avaria.
D – Perícia técnica que veio efetivamente a ser solicitada pelo Tribunal a quo e cuja realização se revelou ser impossível pelo facto de o objeto do motor do veículo não mais estar na posse da Recorrente tendo sido – segundo afirma a sentença – desmontados e alienados pela Autora.
E – Na verdade, o bloco, mesmo depois de testado, nunca chegou a ser devolvido à ora recorrente, nem tão pouco os componentes que o integravam o e que não estavam danificados, por forma a, possivelmente, ocultar meio de prova que pudesse responsabilizar a Ré judicialmente.
F – De facto, o objeto do motor do veículo da Recorrente já não estava efetivamente na sua posse, mas tal apenas aconteceu porque a Recorrida assim o quis, porquanto pretendeu ficar com a posse do bloco do motor – tal facto é confirmado pela ausência de qualquer indicação contrária por parte da Recorrida quando foram enunciadas as questões a provar com a perícia (requerimento de 21 de setembro de 2020) e a mesma nada afirmou no sentido de que não estaria na posse do bloco. Aliás, competia-lhe a ela, recorrida, preservar o bloco que não era de sua propriedade, o que manifestamente não fez (vide relatório da perícia ou impossibilidade dela – 16 de fevereiro de 2021) – facto que determina a inversão do ónus da prova (artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil).
G – O Tribunal a quo deu como provado o ponto n.º 4 dos factos provados que menciona que “Em 12.06.2017, o veículo da Autora acima identificado sofreu uma avaria que implicou a substituição do turbo”, alegado por lapso na petição inicial, quando na verdade foi o cilindro número 2 que gripou conforme se constata por declaração de parte de (…) e depoimento da testemunha (…).
H – O que verdadeiramente esteve na origem das muito avultadas despesas suportadas pela ora Recorrente foi o procedimento denominado “encamisamento” efetuado no bloco da viatura, “encamisamento” esse que se veio a verificar não ser possível ser efetuado naquele veiculo automóvel propriedade da Recorrente.
I – Deu-se como provado que a testemunha (…), à data dos factos dono da oficina (…), que recomendou à Autora que o motor fosse retificado na oficina da Ré (…) e que nas instalações desta procedeu-se antes ao “encamisamento” – (Factos provados n.º 7 e 9 da sentença);
J – A testemunha … (antigo funcionário da Ré) e a …, sócia gerente da Ré, deram a entender que os motivos para as sucessivas avarias se deviam a alterações no turbo da viatura, o que é falso, porquanto o turbo apenas foi substituído aquando da terceira reparação da viatura, segunda ao bloco efetuado pela Ré, e que foi originada pelas limalhas metálicas que ao misturarem-se com o óleo foram desgastando todas as outras peças metálicas levando a danos no próprio turbo, bomba de agua, bomba de óleo.
K – Na verdade, o que levou às sucessivas avarias do bloco do motor foi o “encamisamento” num motor que não poderia ser encamisado, uma vez que a ficha técnica não permite que que os cilindros fossem retificados mais do que 0,50 milímetros, sendo necessário para encamisar, desbastar 3 a 4 milímetros.
L – Nas palavras de (…), sócio gerente da Recorrente, corroboradas pela testemunha (…), a Ré assumiu que suportaria os custos associadas às despesas extraordinárias tidas em virtude da deficiente intervenção ao bloco do motor.
M – Verifica-se à saciedade que o depoimento (…), além de credível, está em consonância com as declarações prestadas pelo sócio gerente da Recorrente, no que ao motivo das sucessivas avarias ocorridas após o encamisamento efetuado pela Ré diz respeito – fissura do bloco originado pelo encamisamento sem observar as especificações de retificação, porquanto, os cilindros apenas podem ser retificados (debastados) no máximo 0,50 milímetros, sendo que a Ré, para introduzir as camisas, retificou (desgastou) muito acima desse valor. O mesmo se pode dizer quanto à assunção da responsabilidade por parte da Ré uma vez que a testemunha (…) e as declarações de parte de (…) demonstram que a (…), na figura da sua sócia gerente, manifestou que estaria na disposição de assumir os prejuízos que a Recorrente teve após as sucessivas intervenções efetuados ao bloco.
N – Não se consegue perceber como foi possível o Tribunal a quo considerar como não provados os seguintes factos, a saber:
A) Os prejuízos sofridos pela Autora são consequência direta e necessária das reparações efetuadas pela Ré, que o rebentamento interno do bloco;
B) O rebentamento interno do bloco do motor ficou a dever-se ao facto de o encamisamento ter sido realizado sem observar as especificações de retificação – já que tais cilindros somente devem ser retificados (desbastados) no máximo 0,50 milímetros, sendo que a Ré (…) para introduzir as novas camisas retificou (desgastou) muito acima desse valor;
C) Tendo todas as avarias posteriores ocorrido na sequência desta e como consequência da conduta da Ré, que não cumpriu os procedimentos necessários nas referidas reparações;
D) A Ré atuou com negligencia ao não proceder, nomeadamente, à verificação dos limites máximos de retificação permitidos para o bloco específico;
E) A Ré não desempenhou com zelo e diligência os serviços para os quais foi contratada pela Autora.
O – Pela prova enunciada (devidamente identificada supra – e para que se remete – seja quanto a quem depôs ou declarou, seja quanto a passagens objeto de gravação, nos termos previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil) deveria o Tribunal a quo, salvo melhor entendimento, ter dado como provados os factos não provados nas alíneas A), B), C), D) e E), quanto mais não fosse, até pela própria conjugação dos factos dados como provados e pela inversão do ónus da prova. Ou seja, se é dado como provado que o dono da oficina (…), (…), recomendou que levasse o motor para a oficina da Ré (…), a fim de ser retificado, que nas instalações da Ré, procedeu-se, antes, ao denominado “encamisamento” do motor e que pela Ré (…) foi sugerido que a Autora comprasse outro bloco que eles assumiriam essa despesa e fariam a retificação sem mais encamisamentos – o que foi feito (factos provados 7, 9 e 20) não se percebe então como se pode vir afirmar, como o veio fazer o Tribunal a quo, que o encamisamento não deu origem a sucessivas avarias. Isto porque, como parece ser por demais evidente, ninguém viria a assumir um prejuízo nem alterar o serviço que se propôs a fazer inicialmente (do encamisamento para apenas a retificação) se não entendesse ser o responsável por toda aquela panóplia de avarias sucessivas que a Recorrente veio a sofrer.
P – A fiabilidade da testemunha arrolada pela Ré, (…), é muitíssimo falaciosa, porquanto, a mesma não se encontrava na sala das testemunhas, sendo este local o apropriado por forma a evitar que as testemunhas tenham conhecimento dos depoimentos prestados por outras testemunhas, evitando que a espontaneidade que deve pautar cada depoimento seja colocado irremediavelmente em causa.
Q – A parte contra a qual for produzida a testemunha pode impugnar a sua admissão com os mesmos fundamentos por que o juiz deve obstar ao depoimento (artigo 514.º do Código de Processo Civil).
R – Não sendo possível a sua impugnação – no caso em apreço não seria possível a impugnação da testemunha – deveria a juiz do Tribunal a quo pedir os esclarecimentos necessários no sentido de tentar aferir da seriedade das declarações e de aferir a razão de ciência dos depoimentos, sendo certo que, se as suas declarações fossem contraditórias com as de outras testemunhas (e o foram manifestamente com o depoimento da testemunha …), deveria ter lugar a prova por acareação.
S – Terminadas as inquirições das testemunhas e sendo patente a falta de credibilidade do depoimento de (…), deveria a juiz do Tribunal a quo não aceitar o seu depoimento, indicando os motivos, aquando a analise critica da prova e da especificação dos fundamentos que foram decisivos para essa não aceitação, ou pelo menos aceitação com reservas, citando-se a titulo de exemplo o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 23 de fevereiro de 2010, in www.dgsi.pt, pelo que, com o devido respeito, houve um erro na apreciação da credibilidade da testemunha (…).
T – Perante todo o exposto, porque a prova testemunhal da Autora foi credível e coerente com a factualidade dada como provada em sede de audiência final, ao invés da prova apresentada pela Ré, sendo evidente o nexo de causalidade entre os danos e a má intervenção efetuada pela Ré (encamisamento que nem tão pouco deveria ter sido efetuado, devendo-se a Ré ficar pela retificação tal como lhe tinha sido solicitado), e, quanto mais não fosse, pela inversão do ónus da prova aplicável ao caso, como visto, deverá a ação ser julgada procedente, por provada e condenada a Ré a ressarcir a Recorrente por todo o seu prejuízo quantificado na sentença.
Por todo o exposto, e sem necessidade de mais amplas considerações, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, por conseguinte, revogar a decisão proferida pelo tribunal a quo, substituindo-a por douta decisão que ordene a reparação dos prejuízos sofridos pela Recorrente, assim se fazendo a costumada Justiça!».
*
A sociedade recorrida apresentou resposta ao recurso, defendendo a manutenção da sentença recorrida.
*
Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.
*
II – Objecto do recurso:
É entendimento universal que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de:
i) erro de apreciação da matéria de facto.
ii) erro de direito na apreciação do direito. *
III – Dos factos apurados:
3.1 – Factos provados:
Com relevância para a decisão, e excluídos os factos conclusivos e a matéria de direito, resultaram provados os seguintes factos:
1 – A Autora é dona e legítima proprietária da viatura de marca SAAB – modelo 9.3 2200 TDI, com a matrícula (…).
2 – (…) é sócio gerente da Autora.
3 – A Ré é uma empresa que se dedica à indústria de retificação mecânica de precisão.
4 – Em 12/06/2017, o veículo da Autora acima identificado sofreu uma avaria no pistão e no cilindro do bloco do motor que implicou a respectiva reparação[1].
5 – Após tal reparação, o veículo foi experimentado em estrada, tendo ocorrido nova avaria no motor.
6 – (…) procedeu, então, à desmontagem do seu motor na oficina “(…) – Auto Reparadora (…)”.
7 – O dono da oficina (…), (…), recomendou-lhe então que levasse o motor para a oficina da Ré “(…)”, a fim de ser “rectificado” e testado, para ser posteriormente montado na sua oficina.
8 – O que a Autora/(…) fizeram, contratando assim os serviços de tal empresa com o sobredito fim.
9 – Nas instalações da Ré procedeu-se, antes, ao denominado “encamisamento” do motor.
10 – Após tal procedimento, o motor voltou para a (…) onde foi montado nos termos descritos supra, na aludida viatura.
11 – Em 15 de Junho de 2017, e não obstante o veículo ter saído desta oficina a trabalhar, realizou apenas cerca de 30 Kms, já que, ao chegar a (…), no Barreiro, próximo da localidade onde (…) habita, o motor, sem mais, parou.
12 – O mesmo viu-se então forçado a recorrer aos serviços de reboque, tendo a viatura sido transportada de novo para a oficina (…), onde foi aberto o motor.
13 – Aberto o motor verificou-se que um piston estava derretido e a camisa onde o mesmo trabalhava danificada.
14 – Verificou-se também que o injetor de gasóleo (desse piston) e a vela de aquecimento estavam derretidos, assim como outros componentes estavam deteriorados, nomeadamente a bomba de vácuo e turbo, porquanto as partículas de metal misturaram-se com o óleo, danificando os mesmos.
15 – Foi então de novo desmontado o motor e levado para a Ré (…) onde foi novamente intervencionado.
16 – Após, o motor voltou para a (…) para ser novamente montado.
17 – Concluindo-se assim a segunda desmontagem/remontagem do motor.
18 – Posto a trabalhar, ainda com o veículo no elevador, e como a ventoinha não disparava, foi aberta a tampa do óleo do motor, tendo-se verificado que o mesmo estava acastanhado e com espuma, o que significa que existia mistura de óleo com água.
19 – Nesta ocasião, o motor foi de novo desmontado e levado para as instalações da Ré (…).
20 – Pela Ré (…) foi sugerido à Autora que comprasse outro bloco que eles assumiriam essa despesa e fariam a retificação sem mais encamisamentos – o que foi feito.
21 – Após quatro semanas, quando circulava na Ponte Vasco da Gama, o motor iniciou uma elevada vibração, emitindo ruídos metálicos, ao mesmo tempo que a temperatura da água subiu de forma brusca.
22 – O veículo ficou imobilizado e foi de novo levado para a oficina (…).
23 – Procedeu-se de novo à desmontagem do motor.
24 – Foi, então, efectuada mais uma reparação, tendo a Autora adquirido todos componentes necessários para a remontagem do motor.
25 – Concluiu-se, assim, a quarta desmontagem/remontagem do motor.
26 – Com as sobreditas reparações a Autora teve custos no valor global de € 5.513,40.
27 – Acresce que, desde a primeira desmontagem até à última montagem do motor a Autora viu-se obrigada a alugar uma viatura de substituição para que o seu sócio gerente se pudesse deslocar aos diversos clientes a quem presta serviços, com o que despendeu a quantia de € 1.875,75.
28 – Realizou também várias deslocações quer à (…) quer a outros fornecedores para as reparações e aquisição de peças – quilómetros que contabilizou em € 397,25.
29 – Tudo no valor global de € 7.786,40 (sete mil, setecentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos).
30 – A Autora, através do seu sócio gerente, deu conhecimento das referidas despesas à Ré (…), solicitando o seu pagamento.
31 – O veículo automóvel em causa era utilizado pelo único sócio e gerente da Autora para as suas deslocações profissionais ao serviço da mesma, e também pessoais daquele.
32 – Na sequência das descritas avarias e reparações do veículo, a Autora viu comprometida a prestação dos seus serviços junto dos clientes.
33 – Toda esta situação causou transtornos e incómodos à Autora.
*
3.2 – Factos não provados:
Não se provaram os seguintes factos, com relevo para a decisão:
A) Os prejuízos sofridos pela Autora são consequência direta e necessária das reparações efetuadas pela Ré.
B) O rebentamento interno do bloco do motor ficou a dever-se ao facto de o encamisamento ter sido realizado sem observar as especificações de retificação – já que tais cilindros somente podem ser retificados (desbastados) no máximo de 0,50 milímetros, sendo que a Ré (…) para introduzir as novas camisas retificou (desgastou) muito acima desse valor.
C) Tendo todas as avarias posteriores ocorrido na sequência desta e como consequência da conduta da Ré, que não cumpriu os procedimentos necessários nas referidas reparações.
D) A Ré atuou com negligência ao não proceder, nomeadamente, à verificação dos limites máximos de retificação permitidos para o bloco específico.
E) A Ré não desempenhou com zelo e diligência os serviços para os quais foi contratada pela Autora.
F) A reparação foi feita pela Ré segundo as leges artis.
G) É falso que o bloco tenha rebentado em virtude da intervenção feita pela Ré.
H) A Autora nunca exigiu à Ré que reparasse quaisquer defeitos na viatura, nem esta se recusou a fazê-lo.
I) A Autora não denunciou os defeitos no prazo de trinta dias.
*
4 – Enquadramento jurídico:
4.1 – Matéria de facto:
Só à Relação compete, em princípio, modificar a decisão sobre a matéria de facto, podendo alterar as respostas aos pontos da base instrutória, a partir da prova testemunhal extractada nos autos e dos demais elementos que sirvam de base à respectiva decisão, desde que dos mesmos constem todos os dados probatórios, necessários e suficientes, para o efeito, dentro do quadro normativo e através do exercício dos poderes conferidos pelo artigo 662.º do Código de Processo Civil.
Em face disso, a questão crucial é a de apurar se a decisão do Tribunal de primeira instância que deu como provados certos factos pode ser alterada nesta sede – ou, noutra formulação, é tarefa do Tribunal da Relação apurar se essa decisão fáctica está viciada em erro de avaliação ou foi produzida com algum meio de prova ilícito e, se assim for, actuar em conformidade com os poderes que lhe estão confiados.
*
4.1.1 – Do depoimento prestado por (…):
A Autora entende que a testemunha (…) não é fiável e que a «a mesma não se encontrava na sala das testemunhas, sendo este local o apropriado por forma a evitar que as testemunhas tenham conhecimento dos depoimentos prestados por outras testemunhas, evitando que a espontaneidade que deve pautar cada depoimento seja colocado irremediavelmente em causa».
Defende assim que, logo que terminadas as inquirições e sendo patente a falta de credibilidade do depoimento de (…), a Mmª Juíza de Direito não deveria ter aceite aquele depoimento, indicando os motivos, aquando da análise critica da prova e da especificação dos fundamentos que foram decisivos para essa não aceitação, ou pelo menos aceitação com reservas, o que manifestamente não foi o caso.
O recorrente convoca a jurisprudência vertida num acórdão da Relação do Porto[2] para defender que o julgador a quo deveria ter pedido os esclarecimentos que entendesse no sentido de tentar aferir da seriedade das declarações e aferir a razão de ciência dos depoimentos a que se reporta actualmente o artigo 516.º[3] do Código de Processo Civil, sublinhando que deveria ter ocorrido a acareação com as declarações contraditórias que tiveram lugar[4] [5].
Relativamente às questões da audição da prova e da acareação, importa referir que não foi suscitado nenhum incidente sobre esta problemática no Tribunal recorrido e, com ressalva da avaliação concreta da idoneidade dos depoimentos em concurso, esta matéria trata-se de uma questão nova e os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo acto recorrido. Na verdade, Miguel Teixeira de Sousa ensina que no direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o Tribunal não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas[6]. E esta é a posição unânime da jurisprudência dos Tribunais Superiores[7] [8] [9].
Porém, mesmo que assim não se entendesse, o que apenas se concede por mera hipótese académica, a situação relatada apenas poderia ser reconduzida a uma nulidade (por violação das regras do depoimento e da não realização de uma acareação).
Efectivamente, a ocorrer, esta violação por omissão incluir-se-ia na cláusula geral sobre as nulidades processuais constantes do n.º 1 do artigo 195.º do Código de Processo Civil[10]. Por nulidades do processo entendem-se quaisquer desvios do formalismo processual prescrito na lei, a que esta faça corresponder, embora não de forma expressa, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais[11].
É entendimento pacífico que da nulidade processual prevista no artigo 195.º do Código de Processo Civil não cabe directamente recurso para este Tribunal da Relação, devendo a mesma ser arguida perante o Tribunal em que teve lugar (artigo 199.º do mesmo diploma)[12]. Só posteriormente, no caso de discordância com o despacho que verse sobre a arguição de nulidade, quando se verifiquem os pressupostos da impugnação por via recursal, é que dessa decisão caberá recurso para este tribunal. Efectivamente, as nulidades do processo hão-de, em princípio, ser arguidas perante o Tribunal em que ocorreram e nele apreciadas e julgadas (sendo excepção não correspondente ao caso dos autos a hipótese prevista no n.º 3 do artigo 199.º). Como refere Alberto dos Reis «dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se»[13].
A apelante não invocou a alegada nulidade perante o Tribunal de Primeira Instância no modo e no tempo previstos na legislação aplicável, antes logo interpondo recurso para este Tribunal da Relação, impugnação que, nestas circunstâncias, também não poderia proceder pelos motivos supra aduzidos.
*
4.1.2 – Da discordância quanto aos factos apurados:
A sociedade recorrente discorda da matéria de facto apurada pela Primeira Instância pretendendo que seja considerada provada toda a matéria das alíneas a)[14], b)[15], c)[16], d)[17] e e)[18] dos factos não provados e alterado o ponto 4)[19] dos factos provados.
Existem dois blocos probatórios perfeitamente definidos. No fundo, resta assim realizar o confronto entre as duas teses concorrentes relativamente à culpa na produção do evento danoso, sendo que o sistema judicial nacional combina o sistema da livre apreciação ou do íntimo convencimento com o sistema da prova positiva ou legal.
Assim, a partir da prova pessoal obtida e da análise do teor dos documentos existentes nos autos ou doutra fonte probatória relevante, tomando em consideração a análise da motivação da respectiva decisão, importa aferir se os elementos de convicção probatória foram obtidos em conformidade com o princípio da convicção racional, consagrado pelo n.º 5 do artigo 607.º[20] do Código de Processo Civil.
A valoração da prova, nomeadamente a testemunhal, deve ser efectuada segundo um critério de probabilidade lógica, através da confirmação lógica da factualidade em apreciação a partir da análise e ponderação da prova disponibilizada[21].
Neste enquadramento jurídico-existencial, a credibilidade concreta de um meio individualizado de prova tem subjacente a aplicação de máximas de experiência comum que devem enformar a opção do julgador e cuja validade se objectiva e se afere em determinado contexto histórico e jurídico, à luz da sua compatibilidade lógica com o sentido comum e com critérios de normalidade social, os quais permitem (ou não) aceitar a certeza subjectiva da sua realidade[22].
*
É certo que o Tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão (n.º 3 do artigo 466.º do Código de Processo Civil). Porém, as declarações de parte foram avaliadas pelo Tribunal, tomando em atenção a natureza supletiva[23] e as cautelas que doutrinal[24] [25] [26] [27] e jurisprudencialmente[28] são enumeradas a este propósito, face à existência de um interesse próprio, direto e imediato na resolução da causa.
Neste enquadramento, somos adeptos da tese que admite a validade da prova por declarações de parte quando a mesma se reporta essencialmente a «acontecimentos do foro privado, íntimo ou pessoal dos litigantes»[29] [30].
Ao reconhecer os problemas associados à fiabilidade deste meio de prova, a nível doutrinal e jurisprudencial foi construída uma linha de actuação que se baseia na ideia que inexistindo outros meios de prova que minimamente corroborem a versão da parte, a mesma não deve ser valorada, sob pena de se desvirtuar na totalidade o ónus probatório, evitando que as acções se decidam apenas com base nas declarações das próprias partes[31] [32] [33].
No entanto, pese embora as especificidades das declarações de parte e as cautelas anteriormente anunciadas, entendemos que as declarações de parte podem estribar a convicção do juiz de forma auto-suficiente[34], embora no contexto atrás referenciado de apuramento de acontecimentos do foro privado, como sucede em parte neste caso.
Na situação vertente, com base nas declarações de parte, ao nível do apuramento da causa da avaria, o Tribunal de recurso não pode formular um juízo prudente e totalmente esclarecido sobre o nexo de causalidade e fixar se a avaria se deve a uma má prestação de serviço por parte da Ré, à deficiências técnicas na montagem do motor por parte da (…) ou a outro motivo relacionado com defeitos pré-existentes no veículo.
*
Escutada a restante prova e analisados os demais suportes presentes nos autos é perfeitamente lícita a conclusão que, quanto às causas das avarias ocorridas posteriormente à intervenção da Ré, não foi feita a demonstração que permitisse imputar à demandada o correspectivo nexo causal. Neste ponto, concorda-se em absoluto com a ideia que a sobredita aferição estaria dependente da realização de acto pericial, cuja realização foi inviabilizada pelas circunstâncias do caso concreto.
Tal como se escreve na fundamentação da decisão «tendo existido uma avaria inicial e anterior à primeira desmontagem do motor e sua reparação pela Ré, tal facto também contribuiu para que não se estabelecesse um nexo causal entre as intervenções da demandada e as avarias registadas».
Na realidade, a contradição entre prestações probatórias é insusceptível de permitir formular um juízo de erro relativamente aos pontos da matéria de facto transpostos a este propósito para as conclusões, os quais delimitam a capacidade cognitiva do Tribunal de Recurso.
Efectivamente, tal como este colectivo de Juízes Desembargadores vem pugnando a alocução fundamento para impor decisão diversa, nos termos proclamados pelo n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória antes exige que o juízo efectuado pela Primeira Instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova[35].
Na associação entre a prova gravada e os restantes meios de prova convocados na decisão, a decisão sobre a matéria de facto corresponde assim à verdade processualmente adquirida e a descrição efectuada na decisão recorrida é assim claramente suficiente para perfectibilizar os comandos legais destinados a salvaguardar a reconstituição do pensamento do julgador.
E, por isso, à luz dos contributos doutrinais editados a este respeito [36] [37] [38] [39] [40] [41] [42] [43] [44], interligando a resposta do Tribunal e as exigências expressas na lei, não existe fundamento para julgar procedente as propostas de modificação da decisão de facto quanto aos factos não provados.
Relativamente ao ponto 4 dos factos provados existe um lapso, o qual, aliás, é certamente provocado pelo conteúdo da petição inicial que, em momento prévio, imputou a avaria à destruição do turbo, quando a origem do problema ocorreu no pistão e no cilindro do bloco do motor, tal como ressalta da audição dos depoimentos concordantes tomados a (…), (…) e (…).
A referida alteração será feita directamente no texto dos factos provados e realçada a negrito, a fim de facilitar a respectiva compreensão.
Deste modo, a finalizar, com ressalva do ponto 4 dos factos provados, não existe qualquer motivo bastante para censurar a decisão de facto e promover a modificação da mesma nos termos propostos, sem prejuízo de, mais à frente, aquando da análise da questão jurídica, ser debatida a problemática da inversão do ónus da prova.
*
4.2 – Do erro de direito (Da inversão do ónus da prova):
Sobre o tema das provas podem ser consultados Alberto dos Reis[45], Vaz Serra[46], Pires de Lima e Antunes Varela[47] [48], João Castro Mendes[49], Miguel Teixeira de Sousa[50] [51], Michel Taruffo[52], Lebre de Freitas[53] [54], Montalvão Machado e Rui Pinto[55], Remédio Marques[56], Rita Lynce de Faria[57] [58],José Manuel Linhares[59], Lopes do Rego[60], Luís Filipe Sousa[61], Francisco Ferreira de Almeida[62], Pais do Amaral[63], Isabel Alexandre[64], Pedro Múrias[65], Maria Clara Calheiros[66], Cláudia Trindade[67] e Rui Rangel[68], entre muitos outros comentadores e doutrinadores.
A prova pode ser definida como a demonstração de factos em juízo e tem por referência a verdade do facto probando[69]. No nosso direito processual, ter o ónus da prova significa sobretudo determinar qual a parte que suporta a falta de prova de determinado facto, mais do que saber qual a parte que tem de efectuar a prova de determinado facto. Os factos constitutivos são aqueles que constituem pressuposto do respectivo aparecimento[70].
O n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil inverte o ónus da prova quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, o que pode suceder tanto através de uma conduta activa como omissiva desta parte contrária, desde que decisiva para a prova se tornado impossível e desde que culposa[71].
Vejamos.
No final da sessão de julgamento realizada no 16/09/2020, a Meritíssima Juíza de Direito entendeu que, «sem prejuízo dos esclarecimentos prestados pelas testemunhas ouvidas e da boa vontade demonstrada em esclarecerem o tribunal, estando em causa a apreciação de matéria de natureza técnica, que exige conhecimentos específicos de mecânica automóvel, considero essencial para a boa decisão da causa a realização de uma perícia a esse nível que permita, por um lado, avaliar e identificar as sucessivas causas dos danos provocados no motor do veículo, como a descrição desses danos e a identificação da necessidade e do custo das intervenções realizadas no mesmo (aqui se incluindo o material gasto)».
Seguidamente, por despacho datado de 05/11/2020, voltando a sublinhar que o Tribunal não tinha ficado esclarecido quanto à intervenção da Ré naquele veículo e respectivas consequências, o julgador «a quo» sublinhou que «sendo necessário aferir se a intervenção realizada pela Ré no motor do veículo era adequada ou não à sua reparação; se foi causa ou não de posteriores avarias; e da necessidade/custo das intervenções que a própria Ré admite ter realizado no motor, afigura-se manifesto que será ao nível dos conhecimentos de reparação automóvel e não da sua engenharia que importa, neste caso, recolher ensinamentos / informação».
Nesta sequência, através de requerimento entrado em 17/11/2020, a Autora veio informar que o veículo automóvel em causa tinha sofrido no início de Outubro de 2020, um acidente de viação e que havia adquirido uma nova viatura. E, nesse momento, revela que «procedeu à desmontagem de todos os componentes do motor que se encontravam em bom estado de funcionamento e conservação para os comercializar no mercado nacional, motivo pelo qual, pouco mais sobra da viatura que o seu chassis, não se encontrando desta forma em condições para se fazer qualquer exame direto ao motor se caso disso for necessário».
Em função disso, após comunicação à entidade responsável pela realização da perícia, esta assumiu que, após análise à documentação remetida, verificamos que já foram realizadas desmontagens no motor, as quais condicionam a nossa análise e que assim não estariam reunidas as condições para dar continuidade à perícia solicitada.
Na fundamentação da sentença, no que reporta à causa das avarias, o Tribunal de Primeira Instância entendeu que «não foi feita prova – de natureza necessariamente técnica e, por isso, inviabilizada pela impossibilidade de realização da ordenada perícia».
A sociedade recorrente entende que à recorrida competia preservar o bloco que não era de sua propriedade e isso determinava a inversão do ónus da prova, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil.
A inversão do ónus da prova nos termos previstos no artigo 344.º[72] do Código Civil, para que remete o n.º 2 do artigo 417.º[73] do Código de Processo Civil, pressupõe que tenha havido uma recusa de cooperação processual por uma das partes que tenha tornado culposamente impossível a prova ao onerado.
A figura da inversão do ónus de prova, pressupondo que a revelação de particularizado circunstancialismo factual se tornou impossível de fazer, por acção ou omissão da parte contrária, exige similarmente que esta contingência lhe possa ser atribuível a título de culpa sua[74].
A jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores tem equiparado a impossibilidade à grave dificuldade da prova, entendendo que, neste último caso, há também lugar à inversão do ónus da prova se o onerado não puder produzi-la por culpa da contraparte[75].
A decisão de efectivação da inversão do ónus da prova nos termos do artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil terá lugar depois de esgotada a possibilidade de a parte onerada com tal inversão produzir a respectiva prova e da valoração, em sede de prova livre, dos resultados probatórios desse modo obtidos, ou seja, a jusante da decisão sobre os factos controvertidos[76].
Nas palavras de Vaz Serra parece, pois, poder formular-se o princípio de que o ónus da prova se inverte quando for inexigível ao onerado que faça a prova. E um dos casos em que esse princípio se aplicaria seria o de a outra parte ter tornado culposamente impossível a prova[77].
Como já asseverou, a inversão do ónus da prova exige que a comprovação do facto «se tenha tornado impossível ou particularmente difícil para a parte onerada»[78]. Ou, por outras palavras, a inversão do ónus da prova prevista nesta norma está dependente da verificação dos seguintes pressupostos: i. a prova de determinada factualidade há de ter-se tornado impossível ou, pelo menos, particularmente difícil de fazer em virtude da actuação da parte contrária; ii. tal comportamento terá de lhe ser imputado a título de culpa[79].
Para justificar esse entendimento, a sociedade recorrente refere que «o bloco, mesmo depois de testado, nunca chegou a ser devolvido à ora Recorrente, nem tão pouco os componentes que o integravam e que não estavam danificados, por forma a, possivelmente, ocultar meio de prova que pudesse responsabilizar a Ré judicialmente».
Porém, esta é uma petição de princípio que não se mostra factualmente demonstrada nos autos e que o Tribunal da Relação não pode acolher. Nos autos não existe nenhum sinal da veracidade desta afirmação, mas mesmo que assim fosse, a impossibilidade de realização da diligência surge basicamente por que a própria Autora «procedeu à desmontagem de todos os componentes do motor que se encontravam em bom estado de funcionamento e conservação para os comercializar no mercado nacional».
No decurso de uma acção judicial, quando já se perspectivava a realização da perícia, o bom senso ditaria que, pelo menos, o motor deveria ter sido preservado durante o tempo necessário à realização da diligência.
Aliás, a venda do veículo automóvel em peças é o facto que potencia o impedimento da realização da perícia e a circunstância de já terem sido «realizadas desmontagens no motor, as quais condicionam a nossa análise». O acto pericial exigia uma avaliação integral do motor e não é simplesmente a indemonstrada não preservação e descaminho do bloco do motor intervencionado que inviabiliza a realização da perícia. Não está assim preenchido o requisito da inviabilidade da produção de prova por motivo imputável à sociedade Ré.
Analisada toda a conjuntura, não estando demonstrado que a situação de fragilidade probatória evidenciada no processo esteja associada a qualquer conduta causal reprovável da contraparte, neste contexto não lhe aproveita a inversão do ónus probatório nos termos pretendidos, valendo aqui a regra geral do ónus da prova depositada no artigo 342.º[80] do Código Civil.
Assim, prevalecendo a regra de que quem invoca um direito em juízo deve fazer a prova dos factos constitutivos do direito, olhando para o conspecto factual apurado, não resta outra alternativa que não seja a de confirmar a decisão recorrida, por não se ter provado um cenário da culpa da Ré na produção do evento aqui em discussão.
*
V – Sumário:
(…)
*
VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso apresentado, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas do recurso a cargo da parte vencida, atento o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
*
Processei e revi.
*
Évora, 10/02/2022
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário

__________________________________________________
[1] Alteração decorrente da reavaliação da prova realizada na secção 4.1.2 do presente acórdão.
[2] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto 23/02/2010, publicado em www.dgsi.pt.
[3] Artigo 516.º (Regime do depoimento):
1 - A testemunha depõe com precisão sobre a matéria dos temas da prova, indicando a razão da ciência e quaisquer circunstâncias que possam justificar o conhecimento; a razão da ciência invocada é, quando possível, especificada e fundamentada.
2 - O interrogatório é feito pelo advogado da parte que ofereceu a testemunha, podendo o advogado da outra parte fazer-lhe, quanto aos factos sobre que tiver deposto, as instâncias indispensáveis para se completar ou esclarecer o depoimento.
3 - O juiz deve obstar a que os advogados tratem desprimorosamente a testemunha e lhe façam perguntas ou considerações impertinentes, sugestivas, capciosas ou vexatórias.
4 - O interrogatório e as instâncias são feitos pelos mandatários das partes, sem prejuízo dos esclarecimentos pedidos pelo juiz ou de este poder fazer as perguntas que julgue convenientes para o apuramento da verdade.
5 - O juiz avoca o interrogatório quando tal se mostrar necessário para assegurar a tranquilidade da testemunha ou pôr termo a instâncias inconvenientes.
6 - A testemunha, antes de responder às perguntas que lhe sejam feitas, pode consultar o processo, exigir que lhe sejam mostrados determinados documentos que nele existam, ou apresentar documentos destinados a corroborar o seu depoimento; só são recebidos e juntos ao processo os documentos que a parte respetiva não pudesse ter oferecido.
7 - É aplicável ao depoimento das testemunhas o disposto no n.º 2 do artigo 461.º.
[4] Artigo 523.º (Acareação):
Se houver oposição direta, acerca de determinado facto, entre os depoimentos das testemunhas ou entre eles e o depoimento da parte, pode ter lugar, oficiosamente ou a requerimento de qualquer das partes, a acareação das pessoas em contradição.
[5] Artigo 524.º (Como se processa):
1 - Estando as pessoas presentes, a acareação faz-se imediatamente; não estando, é designado dia para a diligência.
2 - Se as pessoas a acarear tiverem deposto por carta precatória no mesmo tribunal, é ao tribunal deprecado que incumbe realizar a diligência, salvo se o juiz da causa ordenar a comparência perante ele das pessoas que importa acarear, ponderado o sacrifício que a deslocação represente.
3 - Caso os depoimentos devam ser gravados ou registados, é registado, de igual modo, o resultado da acareação.
[6] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., LEX, Lisboa 1997, página 395.
[7] Os recursos ordinários visam o reexame da decisão proferida dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento em que a proferiu. Por conseguinte, os recursos são meios de impugnação e de correcção de decisões judiciais e não constituem instrumentos processuais para obter decisões novas e daí não pode o Tribunal de recurso ser chamado a pronunciar-se sobre questões não suscitadas ao Tribunal recorrido Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27/07/1965, BMJ 149-297; de 26/03/1985, BMJ 345-362; de 02/12/1998, BMJ 482-150; de 12-07-1989, BMJ 389-510; de 28/06/2001, in www.dgsi.pt, de 30/10/2003, in www.dgsi.pt, de 20-07-2006, in www.dgsi.pt, de 04/12/2008, in www.dgsi.pt.
[8] A título de exemplo, pode consultar-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Março de 2010, disponível em www.dgsi.pt, que firmou posição no sentido de que «os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas, não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas sim a apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso. Despistam erros in judicando, ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados (quanto à questão de facto), ou com referência à regra de direito respeitante à prova, ou à questão controvertida (quanto à questão de direito) que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. Assim, o julgamento do recurso não é o da causa, mas sim do concreto recurso e tão só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa. Não pode, pois, o Tribunal Superior conhecer de questões que não tenham sido colocadas ao Tribunal de que se recorre».
[9] No acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/10/2013, in www.dgsi.pt., refere-se que «no direito português, os recursos ordinários, como é o caso, são de reponderação; visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento do seu proferimento; o que significa que o Tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Daí o dizer-se que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamentos de questões novas; estando por isso excluída a possibilidade de alegação de factos novos na instância de recurso».
[10] A prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
[11] Anselmo de Castro, «Direito Processual Civil Declaratório», vol. III, página 103.
[12] Artigo 199.º (Regra geral sobre o prazo da arguição):
1 - Quanto às outras nulidades, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
2 - Arguida ou notada a irregularidade durante a prática de ato a que o juiz presida, deve este tomar as providências necessárias para que a lei seja cumprida.
3 - Se o processo for expedido em recurso antes de findar o prazo referido neste artigo, pode a arguição ser feita perante o tribunal superior, contando-se o prazo desde a distribuição.
[13] Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, página 507.
[14] (A) Os prejuízos sofridos pela Autora são consequência direta e necessária das reparações efetuadas pela Ré.
[15] (B) O rebentamento interno do bloco do motor ficou a dever-se ao facto de o encamisamento ter sido realizado sem observar as especificações de retificação – já que tais cilindros somente podem ser retificados (desbastados) no máximo de 0,50 milímetros, sendo que a Ré (…) para introduzir as novas camisas retificou (desgastou) muito acima desse valor.
[16] (C) Tendo todas as avarias posteriores ocorrido na sequência desta e como consequência da conduta da Ré, que não cumpriu os procedimentos necessários nas referidas reparações.
[17] (D) A Ré atuou com negligência ao não proceder, nomeadamente, à verificação dos limites máximos de retificação permitidos para o bloco específico.
[18] (E) A Ré não desempenhou com zelo e diligência os serviços para os quais foi contratada pela Autora.
[19] (4) Em 12/06/2017, o veículo da Autora acima identificado sofreu uma avaria que implicou a substituição do turbo.
[20] Artigo 607.º (Sentença):
1 - Encerrada a audiência final, o processo é concluso ao juiz, para ser proferida sentença no prazo de 30 dias; se não se julgar suficientemente esclarecido, o juiz pode ordenar a reabertura da audiência, ouvindo as pessoas que entender e ordenando as demais diligências necessárias.
2 - A sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar.
3 - Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.
4 - Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
5 - O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
6 - No final da sentença, deve o juiz condenar os responsáveis pelas custas processuais, indicando a proporção da respetiva responsabilidade.
[21] Antunes Varela, Miguel Varela e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, páginas 435-436.
[22] Sobre esta matéria ver, em sentido próximo, o Acórdão da Relação de Lisboa de 19/05/2016, in www.dgsi.pt, que realça que «a prova dos factos assenta na certeza subjectiva da sua realidade, ou seja, no elevado grau de probabilidade de verificação daquele, suficiente para as necessidades práticas da vida, distinguindo-se da verosimilhança que assenta na simples probabilidade da sua verificação».
[23] Paulo Pimenta, Processo Civil, Declarativo, Almedina, 2014, página 357.
[24] Para José Lebre de Freitas, A acção declarativa comum, à luz do Código de Processo Civil de 2013, página 278, «a apreciação que o juiz faça das declarações de parte importará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outros não haja, como prova subsidiária, maxime as partes tiverem sido efectivamente ouvidas».
[25] Elisabeth Fernandez, «Nemo Debet Essse Testis in Propria Causa? Sobre a (in)coerência do Sistema Processual a este propósito», Julgar Especial, Prova difícil, 2014, página 27, pugna que, até à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, as razões determinantes da rejeição deste meio de prova assentavam no «receio de perjúrio; as partes têm um interesse no resultado da acção e podem ser tentadas a dar um testemunho desonesto e finalmente mesmo que as mesmas não sejam desonestas, estudos psicológicos demonstram que as pessoas têm uma maior tendência a recordar factos favoráveis do que factos desfavoráveis pelo que o depoimento delas como testemunhas nos processos em que são partes não é, por essa razão de índole psicológica, fidedigno».
[26] As Malquistas declarações de parte – “Não acredito na parte porque é parte”, em Colóquio organizado no Supremo Tribunal de Justiça, estudo disponível na página web do STJ e ainda em www.trp.pt/.../as%20malquistas%20declaraes%20de%20parte_juizdireito%20luis%20f... A sobredita visão pessimista sobre a fiabilidade do meio de prova é rebatida por Luís Filipe Sousa que defende que «(ii) a degradação antecipada do valor probatório das declarações de parte não tem fundamento legal bastante, evidenciando um retrocesso para raciocínios típicos e obsoletos de prova legal; (iii) os critérios de valoração das declarações de parte coincidem essencialmente com os parâmetros de valoração da prova testemunhal, havendo apenas de hierarquizá-los diversamente».
[27] Carolina Henriques Martins, Declarações de Parte, página 56, estudo editado na internet em
https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/28630/.../Declaracoes%20de%20parte.pdf, nesta discórdia valorativa sobre a fiabilidade do meio de prova, diz que aquilo que é relevante é que o juiz análise «o discurso da mesma tendo sempre presente a máxima da experiência que dita a escassa fiabilidade do mesmo quanto às afirmações que a esta são favoráveis».
[28] De acordo com o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/04/2014, in www.dgsi.pt. este inovador meio de prova, dirige-se primordialmente, às situações de facto em que apenas tenham tido intervenção as próprias partes, ou relativamente às quais as partes tenham tido uma percepção directa privilegiada em que são reduzidas as possibilidades de produção de prova (documental, testemunhal ou pericial), em virtude de terem ocorridas na presença das partes.
[29] Remédio Marques, «A aquisição e a Valoração Probatória dos Factos (Des)Favoráveis ao Depoente ou à Parte», Julgar, Jan-Abril, 2012, n.º 16, página 168.
[30] Ou, seguindo a formulação de Elisabeth Fernandez, Obra citada, página 37, o recurso a meio de prova é admissível quando se destina a apurar «factos de natureza estritamente doméstica e pessoal que habitualmente não são percepcionados por terceiros de forma directa»
[31] Remédio Marques, A aquisição e a valoração probatória de factos (des)favoráveis ao depoente ou a parte chamada a prestar informações ou esclarecimentos, Caderno II – O novo Processo Civil – Contributos da Doutrina no decurso do processo legislativo designadamente á luz do Anteprojecto e da Proposta de Lei n.º 133/XII, Centro de Estudos Judiciários, página 92.
[32] Idêntico posicionamento prático é defendido pelos juízes de Direito Paula Faria e Ana Luísa Loureiro, em Primeiras Notas ao Código de Processo Civil – Os Artigos da Reforma, 2ª edição, página 395.
[33] Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 15/09/2014 e 20/11/2014, in www.dgsi.pt.
[34] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26/04/2017, in www.dgsi.pt, que sublinha que:
«I- No que tange à função e valoração das declarações de parte existem três teses essenciais: (i) tese do carácter supletivo e vinculado à esfera restrita de conhecimento dos factos; (ii) tese do princípio de prova e (iii) tese da auto-suficiência das declarações de parte.
II – Para a primeira tese, as declarações de parte têm uma função eminentemente integrativa e subsidiária dos demais meios de prova, tendo particular relevo em situações em que apenas as partes protagonizaram e tiveram conhecimento dos factos em discussão.
III – A tese do princípio de prova defende que as declarações de parte não são suficientes para estabelecer, por si só, qualquer juízo de aceitabilidade final, podendo apenas coadjuvar a prova de um facto desde que em conjugação com outros elementos de prova.
IV – Para a terceira tese, pese embora as especificidades das declarações de parte, as mesmas podem estribar a convicção do juiz de forma auto-suficiente.
V – É infundada e incorrecta a postura que degrada – prematuramente – o valor probatório das declarações de parte só pelo facto de haver interesse da parte na sorte do litígio. O julgador tem que valorar, em primeiro lugar, a declaração de parte e, só depois, a pessoa da parte porquanto o contrário (valorar primeiro a pessoa e depois a declaração) implica prejulgar as declarações e incorrer no viés confirmatório.
VI – É expectável que as declarações de parte primem pela coerência e pela presença de detalhes oportunistas a seu favor (autojustificação) pelo que tais características devem ser secundarizadas.
VII – Na valoração das declarações de partes, assumem especial acutilância os seguintes parâmetros: contextualização espontânea do relato, em termos temporais, espaciais e até emocionais; existência de corroborações periféricas; produção inestruturada; descrição de cadeias de interacções; reprodução de conversações; existência de correcções espontâneas; segurança/assertividade e fundamentação; vividez e espontaneidade das declarações; reacção da parte perante perguntas inesperadas; autenticidade
[35] Por todos podem ser consultados os acórdãos de 30/01/2020, 13/02/2020, 04/06/2020, 08/10/2020, 03/12/2020, 13/05/2021 e 30/06/2021, entre muitos outros disponíveis na plataforma www.dgsi.pt.
[36] Alexandre Pessoa Vaz, Direito Processual Civil, Almedina, Coimbra, 1998, páginas 1-241.
[37] Gonçalves Salvador, Motivação, Boletim do Ministério da Justiça n.º 121, páginas 85-117.
[38] Oliveira Martins, Justiça Portuguesa, n.º 29, página 49.
[39] Gonçalves Pereira, Poderes do juiz em matéria de facto, Justiça Portuguesa, n.º 32, página 81.
[40] Miguel Corte-Real, O dever da fundamentação da decisão judicial dada sobre a matéria de facto, Vida Judiciária, n.º 24, páginas 22-24.
[41] Michele Taruffo, Note sulla garanzia constituzionale della motivazione, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, n.º 55, páginas 29-38.
[42] Cláudia Sofia Alves Trindade, A prova de estados subjectivos no processo civil: presunções judiciais e regras de experiência, Almedina, Coimbra, 2006, páginas 317-225.
[43] Marta João Dias, A fundamentação do juízo probatório — Breves considerações, Julgar n.º 13, Janeiro de 2011.
[44] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-Dezembro 2013, remetendo aqui para as demais referências bibliográficas ali contidas sobre este assunto.
[45] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, Coimbra, Editora, Coimbra, 1950.
[46] Adriano Vaz Serra, Provas; direito probatório material, Boletim do Ministério da Justiça, nºs 110 a 112, nov. 1961 a jan. 1962.
[47] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição – revista e actualizada, reimpressão –, Coimbra Editora, Coimbra, 2010.
[48] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985.
[49] João Castro Mendes, Do conceito de prova em Processo Civil, Ática, Lisboa, 1961.
[50] Miguel Teixeira de Sousa, a livre apreciação da prova em Processo Civil, SI, vol. XXIII, n.º 187, jan-abril 1984.
[51] Miguel Teixeira de Sousa, Código Civil Comentado, vol. I – Parte Geral, org. António Menezes Cordeiro, CIDP | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Almedina, Coimbra, 2020.
[52] Michele Taruffo, Simplesmente la verdade, Marcial Pons, Madrid, 2010.
[53] José Lebre de Freitas, A confissão no Direito Probatório, Coimbra Editora, Coimbra, 1991.
[54] José Lebre de Freitas, A falsidade no direito probatório, Coimbra Editora, Coimbra, 2013.
[55] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2008.
[56] J. P. Remédio Marques, Acção Declarativa á luz do Código Revisto, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2011.
[57] Rita Lynce de Faria, A inversão do ónus da prova no Direito Civil Português, Lex, Lisboa, 2001.
[58] Rita Lynce de Faria, Comentário ao Código Civil – Parte geral, Universidade Católica Editora. Lisboa, 2014.
[59] José Manuel Aroso Linhares, Regras da experiência e liberdade objectiva do juízo de prova/Convenções e limites de um possível modelo teorético, 1988.
[60] Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2º Edição, Coimbra, Almedina, 2004.
[61] Luís Filipe Pires de Sousa, Prova por presunção no direito civil, Almedina, Coimbra, 2012.
[62] Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. I, Almedina, Coimbra, 2010.
[63] Jorge Augusto Pais do Amaral, Direito Processual Civil, 10ª edição, Almedina, Coimbra, 2011.
[64] Isabel Alexandre, Provas Ilícitas em Processo Civil, 1998.
[65] Pedro Ferreira Múrias, Por uma distribuição fundamentada do ónus da prova, Lex, Lisboa, 2000.
[66] Maria Clara Calheiros, Para uma teoria da prova, 2015.
[67] Cláudia Sofia Alves Trindade, A prova dos estados subjectivos no Processo Civil – Presunções judiciais e regras da experiência, Almedina, Coimbra, 2016.
[68] Rui Rangel, O ónus da prova no Processo Civil, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2006.
[69] Miguel Teixeira de Sousa, Código Civil Comentado, vol. I – Parte Geral, org. António Menezes Cordeiro, CIDP | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Almedina, Coimbra, 2020, página 977.
[70] Rita Lynce de Faria, Comentário ao Código Civil – Parte geral, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2014, página 812.
[71] Isabel Alexandre, Código Civil Comentado, vol. I – Parte Geral, org. António Menezes Cordeiro, CIDP | Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Almedina, Coimbra, 2020, página 1008.
[72] Artigo 344.º (Inversão do ónus da prova):
1. As regras dos artigos anteriores invertem-se, quando haja presunção legal, dispensa ou liberação do ónus da prova, ou convenção válida nesse sentido, e, de um modo geral, sempre que a lei o determine.
2. Há também inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações.
[73] Artigo 417.º (Dever de cooperação para a descoberta da verdade):
1 - Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados.
2 - Aqueles que recusem a colaboração devida são condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil.
3 - A recusa é, porém, legítima se a obediência importar:
a) Violação da integridade física ou moral das pessoas;
b) Intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações;
c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, sem prejuízo do disposto no n.º 4.
4 - Deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado.
[74] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/07/2016, disponibilizado em www.dgsi.pt.
[75] Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 18/05/78, in CJ, 78, III, página 847 e de 09/10/79, in CJ, 79, IV, página 1276, do Supremo Tribunal de Justiça de 18/03/83, in BMJ n.º 324, página 584 e do Tribunal da Relação de Coimbra de 19/12/2012, in www.dgsi.pt.
[76] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 24/05/2018, publicitado em www.dgsi.pt.
[77] Vaz Serra, in Provas (Direito Probatório Material), in BMJ 110 – 1961, página 165.
[78] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25/02/2021, divulgado em www.dgsi.pt.
[79] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/04/2019, consultável em www.dgsi.pt.
[80] Artigo 342.º (Ónus da prova):
1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito.