Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1125/17.9T8STR.E1
Relator: PAULA DO PAÇO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
BONIFICAÇÃO
CONTRATO DESPORTIVO
INCAPACIDADE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
Data do Acordão: 11/25/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I- O fator de bonificação 1,5, previsto na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI, aplica-se à incapacidade de praticantes desportivos profissionais não reconvertíveis em relação ao posto de trabalho que ocupavam antes do acidente.
II- A cumulação do referido fator de bonificação com a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, não viola os artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa.
III- Um sinistrado, vítima de um acidente de trabalho, quando exercia a atividade de jogador de futebol profissional, do qual resultou uma IPATH, tem direito a uma pensão anual após os 35 anos, calculada com base no grau de incapacidade permanente parcial resultante da aplicação da tabela anexa à Lei n.º 27/2011, juntamente com o fator de bonificação previsto na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI. (sumário da relatora)
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]

1. Relatório
Na presente ação especial emergente de acidente de trabalho, que H… (sinistrado) move contra Caravela Companhia de Seguros, S.A. (seguradora), foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
«Em face do exposto, decide-se julgar o sinistrado H…, na sequência do sinistro em causa nos autos, afetado de uma Incapacidade Permanente Parcial de 16,69%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) desde 18/01/2019 e, em consequência, condenar a CARAVELA – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.:
1. A pagar ao autor a pensão anual e vitalícia de € 6 225,18 (seis mil, duzentos e vinte e cinco euros e dezoito cêntimos), desde o dia 19/01/2019 e até completar trinta e cinco anos de idade, atualizada para o montante de € 6 268,76 (seis mil, duzentos e sessenta e oito euros e setenta e seis cêntimos), a partir de 1 de janeiro de 2020, a que acrescem juros de mora, à taxa legal de 4%, calculados desde aquela até integral pagamento, com o limite de catorze vezes o montante correspondente a quinze vezes a remuneração mínima mensal garantida que estiver em vigor quando o autor completar trinta e cinco anos de idade;
2. A pagar ao autor a pensão anual e vitalícia de € 1 362,89 (mil, trezentos e sessenta e dois euros e oitenta e nove cêntimos), depois de completar trinta e cinco anos de idade, com o limite de catorze vezes o montante correspondente a cinco vezes a remuneração mínima mensal garantida que estiver em vigor quando o autor completar trinta e cinco anos de idade.
3. A quantia de € 4 150,66 (quatro mil, cento e cinquenta e euros e sessenta e seis cêntimos), a título de subsídio por elevada incapacidade, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, calculados desde 19/01/2019 até integral pagamento;
4. A quantia € 60,00 (sessenta euros) a título de despesas realizadas com as deslocações a diligências obrigatórias.
Custas a cargo da entidade responsável.
Fixa-se o valor da causa em 107 268,51 (cento e sete mil, duzentos e sessenta e oito euros e cinquenta e um cêntimos).
Registe e notifique.»
Não se conformando com o decidido, veio a seguradora interpor recurso de apelação, sintetizando as suas alegações, com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem:
«I. O tribunal de primeira instância fixou ao sinistrado uma IPP de 16.69%, sendo que esta percentagem foi encontrada aplicando a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, à IPP de 10%, o que resultou numa IPP de 11,125% posteriormente majorada, por aplicação do fator de bonificação 1.5 previsto na TNI, para 16,69%;
II. Há, pois, lugar a três majorações do cálculo da pensão anual e vitalícia devida ao sinistrado;
III. A primeira majoração decorre da aplicabilidade da al. b) do n.º 3 do art.º 48.º da LAT, que, em vez de fazer incidir o cálculo sobre 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho, fá-lo incidir sobre 50% a 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível;
IV. A segunda majoração decorre da aplicação da tabela de comutação específica para desportistas profissionais a que alude o art.º 5.º da Lei n.º 27/2011, citada, aumentando a IPP genérica de 10% fixada ao autor para uma IPP de 11,125%, prevista para sinistrados com 32 anos de idade;
V. A terceira majoração decorre da aplicação do fator de bonificação de 1.5, em razão de o sinistrado não ser reconvertível em relação ao posto de trabalho, que coloca a incapacidade em 16,69 pontos percentuais;
VI. A recorrente defende a inaplicabilidade cumulativa do fator de bonificação 1.5, face ao entendimento de que a aplicação da Tabela anexa à Lei n.º 27/2011, de 16/06, construída numa lógica de bonificação em relação à TNI, engloba e/ou absorve a bonificação prevista nas instruções gerais desta;
VII. A aplicação do fator 1,5 da al. a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI à incapacidade de praticantes desportivos profissionais não reconvertíveis em relação ao posto de trabalho, equivale pois à tripla bonificação destes sinistrados;
VIII. Afigura-se à recorrente, para mais, que a cumulação do fator de bonificação com a tabela de comutação constitui um agravamento desproporcional e injustificado em face do que são os direitos dos trabalhadores em geral, não praticantes profissionais de desporto, introduzindo uma desigualdade social contrária ao que vem consagrado na Constituição da República Portuguesa, maxime, arts. 13.º e 59.º, n.º 1, al. f).
Pelo exposto,
IX. Deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por acórdão que determine que a pensão anual e vitalícia a pagar ao sinistrado até aos 35 anos de idade corresponda ao valor de 6.092,34€, atualizável (x 0,7%) para 6.134,99€ a partir de 01-01-2020, nos termos e pelos fundamentos acima alegados;
X. A douta sentença recorrida também condenou a recorrente ao pagamento da pensão anual e vitalícia de 1.326,89€, depois do autor completar trinta e cinco anos de idade, pensão essa calculada, não sobre a IPP geral, mas sobre a taxa de incapacidade agravada, acrescida do fator de bonificação de 1.5;
XI. Ora, a partir dos 35 anos a prática de desporto profissional deixa de ser tida em consideração para efeitos de valoração da incapacidade que afeta o sinistrado;
XII. O art.º 5.º da Lei 27/2011, citada, prevê uma tabela de incapacidades específicas para a atividade de praticante desportivo profissional com fundamento no facto de tais profissionais se empenharem fisicamente – por vezes, de forma extrema – no desempenho de atividades físicas de alta competição;
XIII. A capacidade de gerar tal empenho físico mantém-se apenas por um curto período das suas vidas, justificando-se por isso a existência da majoração das incapacidades que contraiam no decurso da sua atividade profissional;
XIV. Não desempenhando as mesmas atividades profissionais que a generalidade dos trabalhadores, portanto, a previsão legal dessa majoração da incapacidade laboral constitui, sem dúvida, tratamento distinto de situações também materialmente distintas, perfeitamente compaginável com o disposto no art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa;
XV. "Mas configura já um tratamento desigual e injustificado de situações manifestamente iguais calcular-se, para um (ex) praticante desportivo profissional, a pensão anual e vitalícia devida a partir dos 35 anos, data a partir da qual se dedicará a uma profissão genérica, com base numa IPP específica de um praticante desportivo profissional, ao passo que qualquer outro sinistrado que nunca foi praticante desportivo profissional verá a sua pensão anual e vitalícia para uma profissão genérica ser calculada com base na IPP genérica que lhe foi atribuída.";
XVI. "Ao cálculo da pensão anual e vitalícia devida ao Autor a partir dos 35 anos de idade não deve já ser aplicável a tabela de comutação específica da Lei 27/2011 mas apenas a Lei 98/2009 cabendo-lhe, por isso, a pensão calculada nos termos do artigo 48.º, n.º 3, alínea c) da LAT, sendo a redução na capacidade de ganho a considerar a IPP genérica e não a IPP específica anteriormente utilizada para cálculo da pensão por IPATH até aos 35 anos." – cf. Acórdão do STJ de 25-09-2019, citado.
Pelo exposto,
XVII. É de concluir que a douta sentença recorrida, ao decidir condenar no pagamento de uma pensão anual e vitalícia, a partir dos 35 anos, calculada com base na IPP específica de desportista profissional, acrescida da bonificação de 1.5, violou o disposto no artigo 48.º, n.º 3, alínea c) da LAT.
Com efeito,
XVIII. "A interpretação do Tribunal a quo dos artigos 48.º, n.º 3, alínea c) da LAT e 5.º da Lei 27/2011, segundo a qual o sinistrado e desportista profissional que esteve a auferir uma pensão por IPATH até aos 35 anos de idade tem direito, a partir dessa idade, a uma pensão anual e vitalícia calculada com base na incapacidade específica de desportista profissional é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º e por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), ambos da Constituição da República Portuguesa.”;
XIX. “A referida interpretação representa um tratamento desigual entre trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho, que favorece aqueles que desempenharam a atividade de desportista profissional, ao calcular as respetivas pensões por IPP, após a idade que o legislador considera ser aquela em que estes terminam a sua carreira, com base numa IPP específica de desportista profissional, quando o que se pretende é somente indemnizar a perda da capacidade de ganho genérica de que ficam a padecer após o término da carreira." – idem;
XX. Acresce que a douta sentença recorrida, ao adicionar o fator 1.5 de bonificação, intrinsecamente associado à IPATH, agrava ainda mais a referida desigualdade, visto que o art.º 3.º, n.º 2 da Lei n.º 27/2011 determina especificamente que o cálculo específico da IPATH termina aos 35 anos de idade.
Deste modo,
XXI. É de concluir que a atribuição da bonificação de 1,5 aos praticantes desportivos profissionais, após os 35 anos de idade, com fundamento na impossibilidade de reconversão no posto de trabalho, tem como consequência prática a violação da proibição legal de atribuição de uma IPATH a partir dessa idade, constante do art.º 3.º, n.º 2, da Lei n.º 27/2011, citada.
Por conseguinte,
XXII. Deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por acórdão que determine o cálculo da pensão anual e vitalícia devida ao autor a partir dos 35 anos de idade com base na IPP genérica para toda e qualquer profissão de 10%, determinada na Junta Médica de Neurocirurgia, com o limite máximo previsto no artigo 4.º, alínea b) da Lei 27/2011 [14 x (5 x RMMG)].
Nestes termos,
XXIII. O valor da pensão anual e vitalícia a pagar ao sinistrado a partir dos 35 anos de idade, portanto, deve passar a ser de 816,59 €, nos termos e pelos fundamentos acima expostos.»
Contra-alegou o sinistrado, pugnando pela improcedência do recurso.
A 1ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Tendo o processo subido à Relação, foi dado cumprimento ao prescrito no n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seu parecer.
As partes não ofereceram resposta.
O recurso foi mantido e foram dispensados os vistos, com a anuência dos Exmos. Adjuntos.
Cumpre apreciar e decidir.
*
II. Objeto do Recurso
É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil aplicáveis ex vi do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho).
Em função destas premissas, as questões suscitadas no recurso são as seguintes:
1.ª Inaplicabilidade do fator de bonificação 1,5.
2.ª Necessidade de rever o cálculo da pensão devida ao sinistrado após os 35 anos de idade.
*

III. Matéria de Facto
O tribunal de 1.ª instância considerou provados os seguintes factos relevantes para a boa decisão da causa:
1. No dia 14/01/2016, pelas 10.50 horas, no desempenho da sua profissão de futebolista profissional ao serviço de Clube Desportivo de Mafra – Futebol SDUQ, Lda., no estádio do Clube, durante um treino, ao disputar a bola com outro jogador, H… caiu e sofreu uma forte dor nas costas.
2. Na sequência do referido em 1 o sinistrado sofreu as lesões descritas no auto de exame médico realizado em 27/03/2019, que aqui se dá por reproduzido.
3. Em consequência do referido em 2, o sinistrado apresenta como sequelas radiculopatia L5 direita.
4. O sinistrado teve alta em 18/01/2019.
5. Como consequência do referido em 3, o sinistrado encontra-se afetado de incapacidade permanente parcial de 16,69%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) desde a data da alta.
6. O sinistrado auferia, à data referida em 1, a retribuição anual de € 11 665,56.
7. A ré empregadora tinha a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho transferida para a Caravela – Companhia de Seguros, S.A., mediante a apólice n.º 10.00113929, quanto ao sinistrado, pela retribuição anual de 11 665,56.
8. O sinistrado despendeu a quantia de € 60,00 em despesas com transportes e alimentação nas deslocações por razões relacionadas com o processo, que a ré aceitou pagar.
9. O sinistrado encontra-se pago de todas as importâncias referentes ao período de incapacidade que decorreu da data do evento até à data da alta.
10. O sinistrado nasceu em 28/01/1986.
*
IV. Fator de bonificação 1,5
Na sentença recorrida, foi decidido que o sinistrado se encontra afetado de incapacidade permanente parcial (IPP) de 16,69%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH), desde a data da alta.
Para fundamentar o grau de IPP atribuído, escreveu-se o seguinte:
«A junta médica concluiu, por parecer unânime, que as lesões de que padece o sinistrado são enquadráveis no Cap. III, n.º 7 da TNI. Mais conclui que o sinistrado tem IPATH para futebolista profissional.
Do teor do laudo pericial junto constata-se que o mesmo está devidamente fundamentado, encontrando-se alicerçado o entendimento dos Senhores Peritos para a atribuição de uma incapacidade de 10% para todo e qualquer trabalho e de uma Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) ao sinistrado na sequência das lesões resultantes do sinistro.
O exame não enferma de qualquer irregularidade nem foi impugnado pelas partes.
A prova pericial, cujo valor é apreciado livremente pelo tribunal – cf. artigos 389.º do Código Civil e 591.º do Código de Processo Civil -, destina-se a fornecer ao tribunal uma especial informação de facto tendo em conta os específicos conhecimentos técnicos ou científicos do perito que não se alcançam pelas regras gerais da experiência (Manuel Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, 261).
Ora, em face da composição plural e da habilitação técnica dos senhores peritos que integram a junta médica, a decisão judicial a proferir quanto à fixação da incapacidade para o trabalho, embora não estando obrigada a fazer, necessariamente, prevalecer a perícia realizada pela junta médica, só deverá afastar-se ou contrariar o resultado da mesma em casos justificados, que se mostrem fundamentados numa opinião científica abalizada ou decorram de razões processuais relevantes (neste sentido, v. Ac. TRE de 14 de setembro de 2017, Proc. n.º 423/13.5TTSTR.1.E1, disponível em www.dgsi.pt).
Veio o sinistrado requerer a aplicação ao caso da tabela de comutação específica para a atividade de praticante desportivo profissional e, bem assim, da aplicação do fator de bonificação de 1,5 por o sinistrado não ser reconvertível em relação ao seu posto de trabalho de praticante desportivo, tendo a ré deduzido oposição à aplicação deste último fator de bonificação.
Vejamos.
Porque o autor é jogador profissional de futebol, é-lhe aplicável o regime especial de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, previsto na Lei n.º 27/2011 de 16 de junho e, em tudo o que no mesmo não estiver especialmente regulado, é aplicável o regime geral de reparação por acidentes de trabalho previsto na Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro.
Nos termos do artigo 5.º da mencionada Lei n.º 27/2011, ao grau de incapacidade resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidente de trabalho e doenças profissionais corresponde o grau de incapacidade previsto na tabela de comutação específica para a atividade de praticante desportivo profissional, anexa à mesma lei, salvo se da primeira resultar valor superior.
Do teor do auto de perícia médica resulta que a junta médica não procedeu à comutação nos termos da tabela específica para a atividade de praticante desportivo profissional anexa à Lei n.º 27/2011, de 16/06, que estabelece o regime específico relativo à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais.
Em face do exposto, considerando a atividade exercida pelo sinistrado, não existem dúvidas de que há lugar à aplicação da tabela de comutação específica aplicável à atividade de praticante desportivo profissional.
Consequentemente, tendo em conta o teor da tabela referida e, bem assim, a idade do sinistrado à data da alta – 32 anos – à IPP de 10% atribuída corresponde a uma IPP de 11,125%.
Quanto à aplicação do fator de bonificação de 1.5 previsto na al. a) do n.º 5 da TNI:
A ré discorda da aplicação do fator de bonificação de 1.5 pela não reconversão no posto de trabalho, por o considerar desproporcionado, acabando o autor, no seu entendimento, por beneficiar de 2 majorações.
Vejamos.
Conforme acima referido, porque o autor é jogador profissional de futebol é-lhe aplicável o regime especial de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, previsto na Lei n.º 27/2011 de 16 de junho e, em tudo o que no mesmo não estiver especialmente regulado, o regime geral de reparação por acidentes de trabalho previsto na Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro.
A Lei n.º 27/2011 é muito limitada, porquanto visa regular os limites máximos de pensões e de idade ativa a atender, a estabelecer uma tabela com graus de incapacidade específica agravada relativamente aos graus de incapacidade determinados nos termos gerais, a permitir franquias para IT, a regular a possibilidade de acordos no acompanhamento clinico/terapêutico do sinistrado pela empregadora e, ainda, a estipular a necessidade de prova de contrato de seguro aquando do registo do contrato de trabalho desportivo.
De acordo com este diploma, o grau de incapacidade permanente determina-se com recurso à tabela nacional de incapacidade, fazendo depois correspondeu um grau de comutação específico, agravado.
Daqui resulta que é a própria lei especial a remeter para a lei geral quanto aos critérios genéricos de fixação de incapacidade.
Consequentemente, a determinação da incapacidade é efetuada de acordo com a TNI por acidentes de trabalho e doenças profissionais, pelo que a TNI é aplicável ao autor, jogador profissional, na sua totalidade, não se vislumbrando qualquer fundamento para limitar essa aplicação a uma parte da mesma. Tal não resulta da letra da lei e também não resulta do espírito da mesma, já que somente não será aplicável o que vem especificamente regulado no regime especial de praticantes desportivos profissionais.
Como tal há que concluir que, nada na lei afasta a aplicação do regime referente ao fator de bonificação de 1.5.
De acordo com a alínea a) da Instrução Geral 5ª da TNI, os coeficientes de incapacidade previstos na tabela são bonificados, até ao limite da unidade, com uma multiplicação pelo fator 1,5, segundo a fórmula: IG + (IG X 0,5), se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse fator.
De acordo com o acórdão uniformizador do STJ n.º 10/2014, de 28.05.2014, in DR 123, I Série, de 30 de junho, “(…) [a] expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.», referindo-se, a dado passo da sua fundamentação, que: “(…) aquele segmento normativo «não reconvertível em relação ao posto de trabalho», como pressuposto da bonificação prevista naquela alínea, refere-se às situações em que o sinistrado não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que desempenhava antes do acidente.”.
Pode ler-se ainda neste acórdão que: “Adite-se que na linha da jurisprudência definida nesta secção os casos de IPATH são situações típicas de não reconvertibilidade do sinistrado em relação ao seu anterior posto de trabalho. (…)”.
Revertendo ao caso do trabalhador praticante desportivo profissional, não se vislumbra fundamento para se negar a aplicação deste fator de bonificação de 1.5, porque, também aquele, à semelhança dos outros trabalhadores, por força da incapacidade para o trabalho habitual, terá de fazer um esforço acrescido para se adaptar a novas funções. Este fator de bonificação visa compensar a impossibilidade de, por virtude das lesões sofridas, o sinistrado, ainda que com recurso a reabilitação e reintegração, não possa retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente, compensando-se a necessidade de desempenhar funções diferentes e o natural esforço acrescido.
Já a comutação prevista na tabela anexo à Lei 27/2011 destina-se a acautelar a situação de curta duração da carreira de desportista profissional, pelo que as majorações em causa têm fundamentos de aplicação diversos, não se confundem e visam compensar perdas diferentes, concluindo-se, assim, que não existe uma duplicação de bonificações.
Em face do exposto, conclui-se que, no caso, há lugar à aplicação do fator de bonificação de 1.5.
Assim sendo, à IPP de 11,125%, com IPATH, há a acrescer o fator de bonificação de 1.5 previsto na al. a) do n.º 5 da TNI, resultando uma IPP de 16,69%.»
Ora, a recorrente não se conforma com a aplicação do mencionado fator de bonificação 1,5.
Para tanto, baseia-se em dois argumentos:
1.º - O fator de bonificação 1,5, previsto na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI, não se aplica à incapacidade de praticantes desportivos profissionais não reconvertíveis em relação ao posto de trabalho.
2.º- A cumulação do referido fator de bonificação com a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, viola os artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa.
Cumpre apreciar.
Relativamente ao primeiro argumento apresentado, desde já adiantamos que não assiste qualquer razão ao recorrente.
Em 2014, o Supremo Tribunal de Justiça proferiu o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 10/2014[2], que decidiu:
«A expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.»
Esta linha jurisprudencial foi seguida no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-09-2014, proferido no processo n.º 2426/10.2TTLSB.L1.S1[3].
No Acórdão de 13-01-2021, proferido no processo n.º 6113/17.2T8BRG.G1.S2[4], o Supremo Tribunal de Justiça admitiu uma revista excecional quanto à questão de se saber se um sinistrado, vítima de um acidente de trabalho, quando exercia a atividade de jogador de futebol profissional, do qual resultou uma IPATH, tem direito a uma pensão anual até à data em que complete 35 anos, calculada com base num grau de incapacidade resultante da aplicação da tabela anexa à Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, e, cumulativamente, com o fator de bonificação 1.5, previsto na instrução geral n.º 5 alínea a) da TNI, com a seguinte fundamentação:
«A referida Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, estabelece um regime específico relativo à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, no que concerne às pensões por morte (art.º 2), pensões por incapacidade permanente absoluta (art.º 3.º) e pensões por incapacidade permanente parcial (art.º 4).
O seu artigo 5.º, sob a epígrafe Tabela de incapacidades específicas, estabelece que «Nos casos previstos nos artigos anteriores, ao grau de incapacidade resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidente de trabalho e doenças profissionais corresponde o grau de incapacidade previsto na tabela de comutação específica para a atividade de praticante desportivo profissional, anexa à presente lei, da qual faz parte integrante, salvo se da primeira resultar valor superior».
Esta disposição legal exige que se faça uma articulação entre a tabela nacional de incapacidades por acidente de trabalho e doenças profissionais e a tabela anexa à Lei n.º 27/2011, de 16 de junho.
Como já se referiu, estamos perante um regime jurídico relativamente recente, reconhecendo-se que as questões jurídicas suscitadas apresentam um carácter paradigmático e exemplar, que pode ser transponível para outras situações, assumindo assim relevância autónoma e independente em relação aos interesses das partes envolvidas.»
Assim, no que diz respeito a estas questões suscitadas pelas R.R. seguradora e empregadora admite-se a revista excecional.»
Não temos conhecimento de que já tenha sido proferido acórdão sobre a revista excecional admitida.
Assim, tendo em consideração o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência identificado supra, entendemos que num caso como o dos autos em que o sinistrado (futebolista profissional) foi vítima de um acidente de trabalho, em consequência do qual sofreu lesões que lhe determinaram uma incapacidade permanente absoluta para o exercício da sua profissional habitual, o que implica que o mesmo não seja reconvertível em relação ao posto de trabalho[5], é aplicável o fator de bonificação 1,5, previsto na instrução geral n.º 5 alínea a) da TNI.
Efetivamente, a Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, que estabelece o regime relativo à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, prescreve, no artigo 10.º, que à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho de praticantes desportivos profissionais é aplicável a regulamentação do regime de reparação de acidentes de trabalho, aprovado pela Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro (LAT), em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente lei.
Por sua vez, o artigo 20.º da LAT estipula que a determinação da incapacidade é efetuada de acordo com a TNI por acidentes de trabalho e doenças profissionais.
A Lei n.º 27/2011 não regula, de forma especifica, a atribuição da bonificação de 1,5 decorrente da não reconversão do sinistrado desportista profissional.
Todavia, visando o fator de bonificação 1,5 corrigir a incapacidade permanente prevista na TNI, tendo em consideração determinadas situações especiais que justificam tal correção, não vislumbramos razão para que tal fator não seja aplicável aos praticantes desportivos profissionais, se os requisitos para tanto exigidos se verificarem.
Tal situação não é especialmente impedida pela Lei n.º 27/2011 e mostra-se prevista no direito subsidiário que a própria lei determina como aplicável.
Face ao exposto, entendemos que num caso como o dos autos, em que o sinistrado não é reconvertível em relação ao posto de trabalho, bem andou a 1.ª instância ao aplicar o fator de bonificação previsto na instrução geral n.º 5 alínea a) da TNI.
Improcede, pois, o primeiro argumento apresentado pela recorrente.
Quanto à alegada inconstitucionalidade da cumulação do referido fator de bonificação com a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, por violação dos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa, aderimos, absolutamente, à posição assumida no Acórdão da Relação de Guimarães de 31-03-2020, proferido no processo n.º 6113/17.2T8BRG.G1[6], no qual se escreveu:
«Em relação à alegada inconstitucionalidade aventada por violação do princípio da igualdade (13º da CRP) convocamos novamente o supra dito sobre o sentido deste preceito a propósito do recurso do autor e para o qual remetemos. Sublinhando-se, de novo, que a essência do mesmo é a proibição de livre arbítrio nas opções, com o sentido negativo de proibir tratamento desigual a situações iguais e com o sentido positivo de permitir condições mais favoráveis em situações diversas que tenham explicação racional e percetível, com vista a atingir a igualdade real.
Não sendo esse o caso quando a um/a sinistrado/a é atribuído “…o fator de bonificação da forma como deve ser conferido a todos os sinistrados que se encontrem, como aquela, afetados com uma IPATH e sem possibilidades, em consequência das lesões, de retomarem o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupavam antes do acidente, não se concede à sinistrada um tratamento diferenciado relativamente aos demais cidadãos na mesma situação, nem de favor relativamente aos sinistrados afetados de IPATH, mas que puderam reassumir funções no concreto posto de trabalho anteriormente ocupado.”
Do mesmo modo não se alcança como possa ter sido violado o preceito constitucional que estabelece o principio da justa reparação do trabalhador vítima de acidente de trabalho (59º/1/f, CRP), quando o fator de bonificação 1.5 atribuiu precisamente ao trabalhador maior pensão por força da sua diminuição da capacidade de trabalho/ganho ao não poder voltar a assumir as funções que antes desempenhava. Trata-se, pois, de opção legislativa e interpretação jurisprudencial que cumprem o princípio constitucional da justa reparação do dano sofrido pelo sinistrado, ao invés de o violar.
Na verdade: “Não podendo a sinistrada, por virtude das lesões sofridas, reassumir as funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente na organização empresarial, a atribuição do fator de bonificação previsto na lei para estas situações, configura exatamente a justa reparação do acidente sofrido e da diminuição da sua capacidade de ganho, ou seja, consubstancia a cabal conformação da decisão com o invocado preceito constitucional.”
Improcede assim a as alegações de inconstitucionalidade.»
Efetivamente, se o fator de bonificação 1,5 constitui um fator corretivo que visa alcançar soluções mais justas e adequadas às situações especiais às quais se aplica, a sua cumulação com a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais, não viola o principio da igualdade.
Um jogador de futebol profissional terá de fazer face ao mesmo esforço que qualquer outro trabalhador, para se adaptar ao exercício de novas funções profissionais, uma vez que não pode retomar a sua profissão habitual.
Assim sendo, a cumulação do aludido fator de bonificação com a tabela especifica para os desportistas profissionais é um corolário do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e uma medida para uma justa reparação pelo acidente de trabalho sofrido, conforme impõe a alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º do mesmo diploma legal.
Concluindo, a cumulação do fator de bonificação 1,5 com a tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, não viola o principio da igualdade, nem o direito à justa reparação pelo acidente de trabalho sofrido.
Em suma, improcede, totalmente, a primeira das questões suscitadas no recurso.
*
V. Pensão devida ao sinistrado após os 35 anos de idade.
A recorrente foi condenada a pagar ao sinistrado a pensão anual e vitalícia de € 1.362,89, depois de o sinistrado completar os 35 anos de idade, com o limite de catorze vezes o montante correspondente a cinco vezes a remuneração mínima mensal garantida que estiver em vigor quando o sinistrado complete os 35 anos.
Porém, não se conformando com o decidido, vem a recorrente alegar que o cálculo da pensão está errado, porquanto a partir de tal idade deve deixar de se aplicar a majoração derivada do regime especial consagrado na Lei n.º 27/2011, bem como o fator de bonificação 1,5, pelo que o cálculo deve ser feito com base uma IPP de 10%, resultante da TNI, que foi atribuída pela junta médica de Neurocirurgia.
Acrescenta que a atribuição da bonificação de 1,5 aos praticantes desportivos profissionais, após os 35 anos de idade, com fundamento na impossibilidade de reconversão do posto de trabalho, constitui uma violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º e do direito previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.
Analisemos.
Sobre a matéria em causa, escreveu-se na sentença recorrida:
«O direito à reparação em caso de incapacidade permanente compreende a indemnização em capital ou pensão vitalícia correspondente à redução de capacidade de trabalho ou de ganho – cfr. artigo 23.º, al. b), 47 n.º 1 al. c) e 48.º, n.º 3, al. c), todos da Lei n.º 98/2009, de 4/09.
A pensão por incapacidade permanente, em regra, é calculada com base na retribuição anual ilíquida, normalmente devida ao sinistrado à data do acidente – cfr. artigo 71º n.º 1 da Lei n.º 98/2009, de 4/09.
Tratando-se de um praticante desportivo profissional com IPATH, na determinação da pensão anual há que atender à especificidade prevista no n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 27/2011 de 16 de junho, que prevê que:
“2 — Para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais dos quais resulte uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, as pensões anuais calculadas nos termos da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, só são devidas até à data em que o praticante complete 35 anos de idade e tem como limite máximo 14 vezes o montante correspondente a 15 vezes a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da fixação da pensão.”
O regime de reparação de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais previu, assim, a reparação por IPATH apenas até aos 35 anos, por se ter entendido ser esta a média da idade ativa dos atletas, tratando-se de uma profissão que, requerendo capacidade e esforço físico muito acima da média, é uma profissão de desgaste rápido, que justifica regulamentação própria.
Após completar os 35 anos, a pensão passará a ser calculada nos termos previstos no na al. b) do artigo 4.º da Lei 27/2011, que prevê que:
“Para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais dos quais resulte uma incapacidade permanente parcial para todo e qualquer trabalho, as pensões anuais calculadas nos termos da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, obedecem aos seguintes limites máximos: (…)
b) 14 vezes o montante correspondente a 5 vezes a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da alteração da pensão, após a data referida na alínea anterior.”
A pensão fixa-se no dia seguinte ao da alta, sempre que se trate de pensão por incapacidade permanente – artigo 50.º, n.º 2 da Lei n.º 98/2009, de 4/09.
Para além disso o sinistrado tem direito a ser reembolsado das despesas efetuadas nos termos do disposto no artigo 39.º, n.ºs 1, 2 e 3 da Lei n.º 98/2009, de 4/09.
Assim, vertendo ao caso concreto:
- Da pensão anual e vitalícia pela incapacidade parcial permanente:
No caso em apreço dever-se-á atender, no cálculo da pensão devida pela incapacidade permanente de que padece o sinistrado, à retribuição anual de € 11 665,56, e no coeficiente de desvalorização de 16,69%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, sendo a responsabilidade pelo seu pagamento atribuída à seguradora.
- Fixação do valor da pensão até completar 35 anos de idade:
(…)
- Fixação do valor da pensão depois dos 35 anos de idade:
A partir dos 35 anos o sinistrado deixa de beneficiar da pensão calculada com base na IPATH.
No que se refere ao valor da pensão, este correspondeu a 70% da redução na capacidade geral de ganho, nos termos do artigo 48º, n.º 3, al. c), da NLAT. A pensão terá, ainda, o limite de 14 vezes o montante correspondente a 5 vezes a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da alteração da pensão previsto no referido regime de reparação de acidentes de trabalho de praticante desportivo profissional.
Assim, a pensão é menor a partir dos 35 anos uma vez que deixa de se aferir a pensão com base na IPATH e passa-se a aferi-la pela IPP, o que significa que a pensão é calculada com base em 70% da redução da capacidade geral de ganho e não com base em 50% a 70% da retribuição; a pensão passa a ter o limite inferior de 14x (5xSMN).
A partir dos 35 anos, média da idade ativa dos atletas, o sinistrado continua a estar afetado de uma incapacidade permanente parcial de igual modo como acontece a qualquer outro sinistrado, pelo que se prevê que lhe seja atribuída uma pensão para compensar a
Uma vez que, após os 35 anos, continuam a perdurar as sequelas de incapacidade de um acidente ocorrido quando o sinistrado era praticante desportivo, tal deve repercutir-se no seu regime de reparação, continuando a ser aplicado o regime da IPP prevista na Lei n.º 27/2011 e com os limites aí previstos em conformidade com o disposto no artigo 4.º, al. b).
De igual modo e pelos mesmos fundamentos, deverá continuar-se a aplicar o fator de bonificação de 1.5, previsto na al. a) do n.º 5 da TNI.
Assim:
Após atingir 35 anos a pensão é calculado do seguinte modo, tendo como limite máximo 14 x (5 x RMMG)]:
€ 11 665,56 x 70% x 16,69% = € 1 362,89 (mil, trezentos e sessenta e dois euros e oitenta e nove cêntimos)»
Desde já referimos que a decisão recorrida não merece censura.
A mesma aplicou devidamente o regime legal, desde logo, ao excluir a reparação devida por IPATH a partir dos 35 anos, de harmonia com o preceituado no n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 27/2011.
Ademais, não existe justificação para deixar de atender ao grau de incapacidade decorrente da tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais, acrescido do fator de bonificação 1,5, a partir dos 35 anos de idade do sinistrado.
Neste sentido se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-09-2019, proferido no processo n.º 246/14.4TTGMR.G1.S1, que também apreciou a constitucionalidade de tal solução.
Escreveu-se neste aresto:
«A tabela de comutação específica dos praticantes desportivos, aliás já prevista no artigo 2.º n.º 3 da Lei n.º 8/2003 e atualmente constante do artigo 5.º da Lei n.º 27/2011 demonstra, nas palavras de JOANA CARNEIRO, «uma justa apreciação da situação do sinistrado face às especificidades resultantes de uma lesão quando este é desportista profissional, tentando, assim, colmatar as eventuais desigualdades resultantes do facto de o atleta ser efetivamente diferente de um sinistrado que não utiliza, de modo tão intenso, as capacidades físicas na sua profissão»[1]. Mas será que esta especial tutela de um profissional face a uma atividade de desgaste rápido apenas se justifica até aos 35 anos e já não quando o desportista profissional é forçado a «reconverter-se» a outra atividade profissional? Ou seja, será que a lei ao manter a taxa de incapacidade agravada não terá sido, no fim de contas, sensível às especiais dificuldades desta reconversão e ao facto de que alguns praticantes desportivos procuram frequentemente reconverter-se ou requalificar-se em atividades ainda ligadas ao desporto (como a de treinadores ou técnicos desportivos) e em que ainda podem relevar as sequelas de um acidente ocorrido quando eram praticantes desportivos? Além desta perda de oportunidade é ainda necessário ter em conta que o desporto profissional é tão exigente que mesmo em fase anterior o aspirante a praticante desportivo vê amiúde limitada a sua educação profissional e a sua capacidade para, mais tarde, procurar outra profissão.
Em suma, não é inteiramente igual a situação de quem nunca foi praticante desportivo e a de quem o foi tendo depois que exercer outra atividade profissional, e podendo ainda padecer das consequências de um acidente conexo com uma atividade bem mais exigente também do ponto de vista físico daquela a que estão sujeitos muitos outros trabalhadores. E esta «pós-eficácia» da especial proteção do trabalhador que foi um praticante desportivo não viola, então, o princípio da igualdade, pelo que não existe a inconstitucionalidade invocada.»
E sumariou-se o seguinte:
«A manutenção da taxa de incapacidade agravada mesmo depois dos 35 anos justifica-se pelas especiais dificuldades da reconversão profissional a que é forçado o desportista profissional e pela perda de oportunidades que a lesão pode acarretar, não sendo inconstitucional por violação do princípio da igualdade esta interpretação dos artigos 2.º n.º 3 e 5.º da Lei n.º 27/2011.»
No mesmo sentido, também se pronunciou o Acórdão da Relação de Guimarães, anteriormente identificado.
Escreveu-se neste aresto:
«Fixação do valor da pensão depois dos 35 anos de idade: (questão comum ao recurso de ambas as rés, aqui unificada):
Na sentença recorrida fixou-se esta pensão, já não com base na IPATH, mas recorrendo antes à incapacidade permanente parcial e mantendo a conversão agravado pela tabela especifica dos praticantes desportivos, de acordo com o disposto no artigo 4º, b), da Lei 27/2011, de 16-06, bem como o fator de bonificação de 1.5% da al. a) do nº 5 da TNI. Ou seja, atendeu-se igualmente à IPP de 58,731%.
No que se refere ao valor da pensão, este correspondeu a 70% da redução na capacidade geral de ganho nos termos do artigo 48º/3/c, NLAT, não tendo aplicação o disposto no artigo 48º/3/b, NLAT, próprio para a pensão até aos 35 anos. A pensão terá, ainda, o limite de 14 vezes o montante correspondente a 5 vezes a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da alteração da pensão previsto no referido regime de reparação de acidentes de trabalho de praticante desportivo profissional.
Ou seja, a pensão é menor a partir dos 35 anos devido a duas causas: i) deixa de se aferir a pensão com base na IPATH e passa-se a aferi-la pela IPP, o que significa que a pensão é calculada com base em 70% da redução da capacidade geral de ganho (retribuiçãoX70%x58,731%) e não com base em 50% a 70% da retribuição que daria sempre um montante superior; ii) a pensão passa a ter o limite inferior de 14x (5xSMN) em vez de 14x (15xSMN).
Feito o enquadramento da sentença, discordam as partes do facto de se ter mantido o grau de IPP comutado/agravado pela tabela específica dos praticantes desportivos e, ainda, da aplicação do fator de bonificação de 1.5% da al. a) do nº 5 da TNI. Invocando, mais uma vez, as rés a inconstitucionalidade de outra interpretação da lei por violação do princípio da igualdade e da justa reparação do trabalhador quando vítima de acidente de trabalho. A ré empregadora chega a alegar que a partir dos 35 anos não há lugar a atribuição de pensão.
A questão não é nova, aderindo-se sem reservas ao entendimento expresso na sentença recorrida.
Na verdade, o regime de reparação de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais somente previu a reparação por IPATH até aos 35 anos, por se ter entendido ser esta a média da idade ativa dos atletas, tratando-se de uma profissão que, requerendo capacidade e esforço físico muito acima da média, é uma profissão de desgaste rápido, que justifica regulamentação própria.
Contudo, a partir de tal idade o ex-atleta continua a estar afetado de uma incapacidade permanente parcial de igual modo como acontece a qualquer outro sinistrado, não se encontrando qualquer justificação para que não lhe seja atribuída uma pensão para compensar a redução geral na capacidade de trabalho e de ganho relativamente a qualquer atividade. Entender o contrário, isso sim, seria violador do principio da igualdade e da justa reparação de acidente de trabalho, pois significaria que a lei passaria a desconsiderar, e a não compensar, a redução da capacidade geral de ganho e de trabalho do jogador a partir dos 35 anos, pese embora subsistisse a IPP.
No que se refere à aplicação da tabela de comutação agravada, a jurisprudência tem vindo a entender que na situação de IPATH a partir dos 35 anos, existindo uma lacuna, porquanto o regime específico só prevê expressamente a IPA, a IPATH e a IPP, deverá ser aplicado o regime da IPP prevista no diploma e com os limites aí previstos em conformidade com o artigo 4º/b, Lei 27/2011, de 16-06. Uma vez que, continuando a perdurar as sequelas de incapacidade de um acidente ocorrido quando o sinistrado era praticante desportivo, tal deve repercutir-se no seu regime de reparação. Este entendimento foi acolhido na sentença recorrida.
Como se referiu em acórdão do STJ: “Além desta perda de oportunidade é ainda necessário ter em conta que o desporto profissional é tão exigente que mesmo em fase anterior o aspirante a praticante desportivo vê amiúde limitada a sua educação profissional e a sua capacidade para, mais tarde, procurar outra profissão. Em suma, não é inteiramente igual a situação de quem nunca foi praticante desportivo e a de quem o foi tendo depois que exercer outra atividade profissional, e podendo ainda padecer das consequências de um acidente conexo com uma atividade bem mais exigente também do ponto de vista físico daquela a que estão sujeitos muitos outros trabalhadores. E esta «pós-eficácia» da especial proteção do trabalhador que foi um praticante desportivo não viola, então, o princípio da igualdade, pelo que não existe a inconstitucionalidade invocada.”
Quanto ao fator de bonificação por não reconversão no posto de trabalho previsto na al. a) do nº 5 da TNI, igualmente não vemos razão para não o aplicar, pelas razões supra referidas, associadas ao facto de a incapacidade para o trabalho habitual ser um caso típico de não reconversão no posto de trabalho e de as instruções gerais da TNI serem plenamente aplicáveis ao praticante desportivo profissional.
No caso do atleta profissional, embora a partir dos 35 anos deixe de se valorizar a IPATH, tal não impede a aplicação daquele fator de bonificação. Como acima explicámos, a valorização da IPATH e a valorização do fator de bonificação de 1.5 da al. a) do nº 5 da TNI não se confundem e visam compensar perdas diferentes, caso contrário haveria uma duplicação, questão que, nos termos supra referidos, desde o acórdão uniformizador do STJ nº 10/2014, se encontra ultrapassada e fixada orientação no sentido de aplicar o fator de bonificação de 1.5.
E, como acima referenciámos, continua a fazer sentido compensar-se a impossibilidade de, por virtude das lesões sofridas, o sinistrado, ainda que com recurso a reabilitação e reintegração, não poder retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente, compensando-se a necessidade de desempenhar funções diferentes e o natural esforço acrescido. Portanto a não valorização da IPATH a partir dos 35 anos não impede a consideração do fator de bonificação de 1.5, da al a) do nº 5 da TNI.
Poder-se-á objetar que, com lesão ou sem lesão, a partir dos 35 anos o atleta profissional sempre teria se adaptar-se a outras funções, dada a ficção legal da média da idade ativa. Sendo esta uma verdade, a situação do ex profissional desportivo que atinge os 35 anos “saudável” não é a mesma do profissional que sofreu um acidente de trabalho que o incapacitou de molde a impedir o exercício do desporto até à data previsível dos 35 anos, porquanto certamente este último terá uma dificuldade, ainda mais acrescida, de se adaptar a funções que tenderá a procurar na sua área e para as quais estará em desvantagem.
Tudo para concluir que carecem as rés de razão nas objeções que tecem quanto à aplicação da tabela de incapacidade agravada e do fator de bonificação de 1.5% depois dos 35 anos.
Não se verificando, nos termos que acima foram sendo expostos, as alegadas inconstitucionalidades por violação do principio da igualdade e da justa reparação do trabalhador quando vítima de acidente de trabalho. Cujos argumentos se convocam porque inteiramente aplicáveis e donde, em suma, se conclui que não compete ao julgador opinar sobre o mérito da lei da competência do poder legislativo, reservando-se o juízo de inconstitucionalidade aos casos de opções baseadas em livre arbítrio. E que não sejam objetiva e racionalmente compreensíveis no quadro da igualdade real, que tanto proíbe tratar de modo desigual o que é igual, como tratar de modo igual o que desigual, sendo esta última a situação dos autos.
Assim sendo, mostra-se correto o modo de fixação da pensão depois dos 35 anos.»
Sabemos que no âmbito do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-01-2021[7], também foi admita a revista excecional interposta do Acórdão de Guimarães, quanto às seguintes questões:
- Saber se um sinistrado, vítima de um acidente de trabalho, quando exercia a atividade de jogador de futebol profissional, do qual resultou uma IPATH, tem direito a uma pensão anual após os 35 anos, calculada com base num grau de incapacidade resultante da aplicação da tabela anexa à Lei n.º 27/2011.
- Saber se um sinistrado, vítima de um acidente de trabalho, quando exercia a atividade de jogador de futebol profissional, do qual resultou uma IPATH, tem direito a uma pensão anual após os 35 anos, calculada com base num grau de incapacidade resultante da aplicação do fator de bonificação 1.5, previsto na instrução geral n.º 5 alínea a) da TNI.
Mais uma vez, a revista excecional foi admitida por estar em causa um regime jurídico relativamente recente, reconhecendo-se que as questões jurídicas suscitadas pelas recorrentes apresentam um carácter paradigmático e exemplar, que pode ser transponível para outras situações, assumindo assim relevância autónoma e independente em relação aos interesses das partes envolvidas.
Como já referimos, não temos conhecimento de que a revista excecional já tenha sido decidida.
Seja como for, acompanhando a jurisprudência citada, entendemos que, mantendo-se, após os 35 anos de idade, as sequelas derivadas do acidente ocorrido quando o sinistrado era praticante desportista, que determinam a incapacidade permanente parcial que afeta o sinistrado, o grau inicialmente atribuído resultante da tabela de comutação prevista especificamente para desportistas profissionais na Lei n.º 27/2011, deve ser considerado após tal idade.
A tabela anexa à Lei n.º 27/2011, aplica-se à incapacidade permanente genérica que afeta o desportista profissional.
Se o legislador pretendesse que a comutação da incapacidade resultante da tabela deixasse de ser considerada após os 35 anos de idade do sinistrado, bastava-lhe ter previsto tal situação, tal como fez no n.º 2 do artigo 3.º da mencionada lei, quanto à reparação derivada da IPATH.
Com interesse, relembramos o que se escreveu no Acórdão desta Secção Social de 12-10-2017, proferido no processo n.º 447/13.2TTFAR.E1[8]:
«Decorre do disposto no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 27/2011, que para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais dos quais resulte uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, as pensões anuais calculadas nos termos da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, só são devidas até à data em que o praticante complete 35 anos de idade.
Como sublinha a Exma. Procuradora-Geral Adjunto no seu douto parecer, «(…) exercendo o sinistrado a atividade de futebolista profissional, aquando dos acidentes a que se reportam os autos, o regime específico que o abrange, procurou ter em conta as circunstâncias de que estas profissões se configuram como profissões de desgaste rápido, de baixa média etária, que são objeto de carreiras cuja duração é bastante inferior à das demais carreiras profissionais. Assim, eliminou-se a possibilidade de atribuição de reparação de acidentes incapacitantes para o trabalho habitual, depois dos 35 anos, por se entender não ser expectável o exercício da profissão depois daquela idade».
Porém, assinale-se, essa limitação temporal da pensão – até aos 35 anos de idade – reporta-se apenas à pensão por incapacidade para o trabalho habitual.
Não se pode olvidar que o sinistrado se encontra afetado de uma IPP de 2%, com IPATH: essa incapacidade permanente parcial mantém-se, diremos para o resto da vida, independentemente da profissão que o sinistrado exerça ou venha a exercer (a menos, naturalmente, que se verifique uma revisão da mesma).
Constitui direito do trabalhador, quando vítima de acidente de trabalho, que lhe seja conferida uma justa reparação (cfr. artigo 59.º, n.º 1, alínea f) da CRP).
Ora, afigura-se que que tal direito seria posto em crise se estando o trabalhador afetado de uma incapacidade permanente parcial de 2%, a mesma não fosse objeto de qualquer reparação a partir dos 35 anos!
Por isso mesmo, e estando em causa um regime específico de reparação de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais se consagram no artigo 3.º as regras das pensões por incapacidade permanente absoluta e no artigo 4.º as pensões por incapacidade permanente parcial.
Assim é que encontrando-se o sinistrado afetado de uma IPATH a pensão é calculada nos termos previstos no artigo 3.º e com o limite de atribuição dos 35 anos de idade, por ser a idade que o legislador presume ser aquela em que o desportista profissional exerce a sua atividade (embora hoje em dia, concretamente em relação aos futebolistas, como é de conhecimento público são cada vez mais os que exercem a atividade profissional para além dessa idade).
Após os referidos 35 anos, a lei desvaloriza a reparação do acidente por incapacidade para a profissão habitual porque parte do princípio, ficciona, que, independente do acidente, ele já não teria aptidão física para continuar a exercer essa profissão.
No entanto, a partir dos 35 anos o sinistrado continua com uma incapacidade permanente parcial para todo e qualquer trabalho que, pelas razões que se deixaram expostas, tem que ser reparada: é o que estabelece o artigo 4.º, havendo neste caso que aplicar a limitação prevista na alínea b): a pensão anual tem como limite máximo «14 vezes o montante correspondente a 5 vezes a remuneração mínima mensal garantida em vigor à data da alteração da pensão (…)».
Como assertivamente escreve o recorrente, «[a] não ser assim estaríamos perante uma situação profundamente desajustada e injusta na qual um sinistrado com um determinado grau de IPP e com IPATH apenas receberia uma pensão até completar 35 anos de idade, enquanto um sinistrado apenas com uma IPP, isto é, sem IPATH, receberia uma pensão vitalícia.
Vide o exemplo dos autos para que melhor se perceba a injustiça de tal situação: tendo-lhe sido fixada uma IPP de 2% com IPATH, o sinistrado apenas receberia uma pensão até perfazer 35 anos; Se apenas lhe tivesse sido fixada uma IPP de 2% já receberia uma pensão vitalícia…
Certamente não foi esse o espírito do legislador ao impor o limite da pensão por IPATH até aos 35 anos de idade. A ideia subjacente a esta limitação foi o facto de, habitualmente, as carreiras dos desportistas profissionais não se estenderem para além dos 35 anos de idade. Por esse motivo, entendeu o legislador que a partir dessa data, mesmo sem as sequelas resultantes do acidente, o sinistrado deixaria de exercer tal profissão. E que, por esse motivo, não faria sentido que continuasse a receber uma pensão por incapacidade para exercer essa profissão».
Procedem, por consequência, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso, devendo condenar-se os Réus no pagamento de uma pensão anual e vitalícia, a partir dos 35 anos de idade do Autor, isto é a partir de 14-05-2018, com base no salário anual de € 99.911,90 e a IPP de 2%.»
Avançando…
Relativamente ao fator de bonificação 1,5, o mesmo não se confunde com a IPATH atribuída, e que deixa de ser considerada para o cálculo da pensão a partir dos 35 anos de idade.
Ainda que a irreconvertibilidade no posto de trabalho, que justificou a atribuição do fator de bonificação, seja uma consequência ou um corolário inevitável da atribuída IPATH, a mesma autonomiza-se desta e visa compensar uma perda diferente.
Pelo exposto, a desconsideração da IPATH após os 35 anos de idade do sinistrado, não impede a consideração do fator de bonificação 1,5, previsto na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da TNI.
A solução jurídica que defendemos, tal como é referido na fundamentação dos acórdãos mencionados anteriormente, à qual aderimos para evitar tautologias, não viola o principio da igualdade nem o direito à justa reparação pelo acidente de trabalho, respetivamente, previstos nos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa.
Nesta conformidade, sufragamos o modo de fixação da pensão devida ao sinistrado após os 35 anos de idade.
Concluindo, o recurso mostra-se totalmente improcedente.
*
VI. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Notifique.
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Évora, 25 de novembro de 2021
Paula do Paço (Relatora)
Emília Ramos Costa (1.ª Adjunta)
Moisés Silva (2.º Adjunto)
_______________________________________________
[1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Emília Ramos Costa; 2.ª Adjunto: Moisés Silva
[2] Este Acórdão Uniformizador foi proferido no processo n.º 1051/11.5TTSTB.E1 desta Secção Social de Évora, respeitante, também, a um jogador de futebol profissional, e encontra-se publicado no DR N.º 123, Série I, de 30-06-2014. O Acórdão da Relação está disponível em www.dgsi.pt.
[3] Consultável em www.dgsi.pt.
[4] Idem.
[5] Neste sentido, o Acórdão desta Secção Social de 14-05-2015, proferido no processo n.º 365/12.1T2SNS.E1, acessível em www.dgsi.pt.
[6] O mesmo processo sobre o qual foi admitida a revista excecional que anteriormente foi mencionada. Este acórdão está acessível em www.dgsi.pt.
[7] Processo n.º 6113/17.2T8BRG.G1.S2, acessível em www.dgsi.pt.
[8] Publicado em www.dgsi.pt.