Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ALBERTINA PEDROSO | ||
Descritores: | REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS RESIDÊNCIAS ALTERNADAS ALIMENTOS | ||
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Data do Acordão: | 03/16/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I – Em caso de separação ou divórcio dos progenitores, as responsabilidades parentais mantém-se e devem ser exercidas no superior interesse da criança, porquanto a dissolução do casal não extingue a sua co-parentalidade, e, ao invés, acentua a necessidade de uma atitude de concertação e cooperação recíprocas entre os progenitores, no que tange à sua função parental, no sentido de garantirem aos filhos a possibilidade de um desenvolvimento são e harmonioso da respetiva personalidade, assegurando o seu bem-estar emocional e as suas necessidades materiais. II – A mudança de paradigma, também legal, “impõe que a residência alternada surja hoje, não só, como uma das soluções a equacionar, mas ainda que, na tomada de decisão sobre a entrega da criança, se deva avaliar, em primeiro lugar, a aplicação do regime de residência alternada e, só se a mesma não se mostrar adequada ao caso concreto e não for aquela que melhor salvaguarda os interesses da criança, ponderar se a residência deve ser fixada junto do pai ou da mãe”. III – A existência de conflitualidade entre os progenitores, por si só, não pode impedir o decretamento da residência alternada. Se assim fosse, estaria encontrada a forma de potenciar conflitos objetivamente infundados, visando evitar a residência alternada e favorecendo a alienação parental. IV – Não obstante os progenitores tenham dificuldade em gerir as suas diferenças e pontos de vista quanto ao que é melhor para o filho, como os principais momentos de conflito têm incidido precisamente nas divergências quanto à divisão dos tempos de cada um deles com o filho, o regime de residência alternada semanal pode inclusivamente ser benéfico para diminuir os conflitos entre ambos, já que não precisam de estar sempre em contacto para esse efeito e cada um deverá articular os seus tempos com a criança e a sua família alargada na semana em que o filho está consigo, afigurando-se-nos que na situação em apreço, não só será este o regime que melhor serve os interesses da criança, potenciando a possibilidade de uma vivência equilibrada com cada um dos progenitores, como será o regime que melhor poderá potenciar uma diminuição da litigiosidade que tem estado associada à questão da partilha da residência. V – Não estando demonstrado que exista entre os progenitores uma acentuada discrepância de rendimentos, que justifique a atribuição de pensão de alimentos àquele progenitor que, por ter menos possibilidades, devesse ver essa menor capacidade de suprir as necessidades do filho quando consigo se encontra, pela contribuição do outro, por forma a que o menor beneficiasse sempre de um nível de vida semelhante, estando repartidas igualitariamente as despesas, e agora também o tempo em que a criança está a viver com cada um dos progenitores, não deve manter-se a decisão recorrida no segmento em que determinou que o Apelante devia pagar uma pensão de alimentos, anualmente atualizada. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 876/21.8T8STB.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal[1] ***** Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:I – RELATÓRIO 1. AA, veio requerer contra BB a regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao filho de ambos CC, nascido em .../.../2014, pedindo que a criança fique a residir consigo em permanência. Em fundamento da sua pretensão, invocou, em síntese, que: «Os pais da criança estão separados, tendo o requerido abandonado o lar no dia 21/12/2020, ficando a criança sozinha com a mãe, aqui requerente, não havendo acordo quanto à regulação das responsabilidades parentais, já que o requerido pretende a residência alternada da criança e a requerente entende que tal não é benéfico para o menor, devendo o filho ficar a residir com a mãe, já que é esta que tem cuidado dele, prestando-lhe toda a assistência e carinho e dispõe de maior flexibilidade de horários para estar com a criança, sendo certo que o pai trabalha em Lisboa, nunca chegando a casa antes das 19 horas e também tem que trabalhar em alguns dias do fim de semana, não tendo sequer estabelecido uma grande relação afetiva com o menor». 2. Realizou-se a conferência de pais (cfr. ata de 07.04.2021), onde apenas foi possível estabelecer acordo quanto a um regime provisório de exercício das responsabilidades parentais, nos termos do qual, em síntese, a criança ficou a residir com a mãe, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas em comum por ambos os progenitores; ficando o pai com a criança de 15 em 15 dias, desde sábado ao final do dia até quinta-feira de manhã; pagando o pai mensalmente 80€, a título de pensão de alimentos, e suportando metade das despesas médicas/medicamentosas, do prémio de seguro, de ATL/centro de estudos/transporte, e de atividades extracurriculares, e, posteriormente, na conferência de 05.07.2021, os progenitores acordaram provisoriamente quanto às férias de verão. 3. As partes foram remetidas para audição técnica especializada, tendo-se pronunciado sobre o relatório junto aos autos em 25.10.2021 (ref.ª 6060580). 4. Notificadas para o efeito, ambas as partes apresentaram alegações e arrolaram testemunhas. 5. Realizada a audiência final, em 04.09.2022, foi proferida sentença, na qual se decidiu proceder à regulação do exercício das responsabilidades parentais da criança CC, nos seguintes termos: «1º- A criança fica a residir com ambos os progenitores, em semanas alternadas, de sexta a sexta feira seguinte, incumbindo àquele com quem a criança irá passar a semana ir busca-la ao estabelecimento de ensino ou centro de estudos que a mesma frequente, no final das respetivas atividades. No caso de a sexta-feira ocorrer fora do período letivo ou quando por alguma razão o estabelecimento de ensino/centro de estudos estiver encerrado, ou o menor não possa ir à escola, o progenitor com quem a criança irá passar a semana deverá ir buscá-la a casa do outro pelas 19h00 desse dia, sendo a criança entregue no mesmo local ou no estabelecimento de ensino (se já estiver aberto), na sexta feira seguinte. 2º - As responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, serão exercidas em comum por ambos os progenitores, ressalvando-se os casos de manifesta urgência, em que qualquer dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível. 3º – Os progenitores prestarão, mutuamente, todas as informações relativas a questões relevantes na vida da criança, tais como: estado de saúde, notas escolares, reuniões escolares e respetivo resultado. 4º - No dia de aniversário da criança esta tomará uma refeição com cada um dos progenitores, sem prejuízo da atividade escolar da criança, podendo ficar com o progenitor com quem almoce até às 15h30, incumbindo ao outro progenitor, com quem vai jantar, ir buscá-lo a essa hora a casa do outro ou a outro local previamente acordado. Na impossibilidade de cumprir este regime, o menor jantará em anos alternados com o pai ou a mãe. 5º - Nos dias de aniversário dos pais, a criança ficará com o respetivo aniversariante, no dia do pai com o pai e no dia da mãe com a mãe. 6º - A criança passará alternadamente com cada um dos progenitores a época festiva de Natal (nela se compreendendo os dias 24 e 25 de dezembro) e a época festiva de passagem de ano (nela estando incluídos os dias 31 de dezembro e 1 de janeiro), começando com o pai e trocando nos anos seguintes. 7º - No período das férias escolares de verão, a criança passará quinze dias de férias com cada um dos progenitores, a acordar entre eles até ao final de março de cada ano. Em caso de desacordo entre os progenitores sobre os períodos de férias que a criança passará com cada um deles, prevalecerá a escolha da mãe nos anos pares e a escolha do pai nos anos ímpares. 8º - O pai pagará uma pensão de alimentos para a criança no valor de € 80,00 mensais, por transferência bancária para a conta da mãe, até ao dia 8 de cada mês. 9º - A pensão de alimentos deverá ser anualmente atualizada de acordo com a taxa de inflação publicada pelo I.N.E., relativa ao ano anterior. 10º - Cada um dos progenitores pagará metade das despesas médicas, medicamentosas e escolares, incluindo ATL/centro de estudos/transporte escolar, e bem assim, com atividades extracurriculares que a criança frequente com o acordo de ambos os progenitores e o prémio de seguro referente ao menor, mediante a apresentação dos respetivos comprovativos». 6. Inconformados, Requerente e Requerido, apelaram, finalizando as respetivas minutas recursórias com extensas conclusões, que se sintetizam nas seguintes questões: 6.1. O Requerido: «A- Vem o presente Recurso de Apelação da Sentença da Meritíssima Juiz do Tribunal de Primeira Instância, que fixou o Regime do Exercício das Responsabilidades Parentais do menor CC, filho do Recorrente e da Recorrida, quanto ao segmento da decisão que fixa uma Pensão de Alimentos, a favor do menor a pagar pelo progenitor à progenitora. B- A questão concreta a decidir no presente recurso pelos Ilustres Senhores Desembargadores, é a de saber se o Tribunal recorrido tinha provas suficientes e fez uma análise crítica sobre os elementos de prova carreados para o processo que permitisse ter dado como provado que o ora Recorrente tinha um rendimento mensal superior ao da ora Recorrida e nessa sequência ter decidido que haveria lugar à fixação de uma pensão de alimentos a pagar por Aquele a Esta, devendo assim manter-se a obrigação de pagamento de uma pensão de alimentos, passando o regime de guarda a ser a guarda partilhada. (…) V- Assim, deve ser alterado o ponto 5 dos III - Factos Assentes de forma a que o mesmo termine com a frase “cujo montante, não se apurou em concreto e a frase “mas de valor global próximo do ordenado mínimo nacional” devendo ser substituída pela seguinte “mas de valor global equivalente ao do requerido”. Ou se assim não se entender, proceder simplesmente à eliminação da última parte do sobredito ponto 5. W- O último parágrafo do III – Direito, em que se refere que “o pai tem um rendimento superior ao da mãe, pelo que se justificará a manutenção da pensão de alimentos que já foi fixada provisoriamente nos autos e que mereceu a concordância de ambos os progenitores” deve ser substituído por outra que diga que “verifica-se que o pai e a mãe têm rendimentos de valor global equivalente, pelo que não se justificará, atento o regime de residência alternada, fixar uma pensão de alimentos”, ou, caso assim não se entenda deve ser o referido parágrafo ser substituído por outro que refira que “não foi possível aferir os rendimentos dos progenitores, razão pela qual, cada um suportará as despesas ocasionadas pelo filho, enquanto este estiver à sua guarda e cuidados” X- Por último, devem ser eliminados os pontos 8º e 9º da IV – Decisão, e o ponto 8º ser substituído por outro que diga que cada um dos progenitores suportará as despesas correntes do menor, enquanto este se mantiver à sua guarda e cuidados. O ponto 10º da Decisão deve manter-se». 6.2. A Requerente: 1. O presente recurso, que versa sobre a matéria de facto e sobre a matéria de direito, vem interposto da sentença que fixou o regime de responsabilidades parentais para o CC no seguinte segmento: “1º- A criança fica a residir com ambos os progenitores, em semanas alternadas, de sexta a sexta feira seguinte, incumbindo àquele com quem a criança irá passar a semana ir busca-la ao estabelecimento de ensino ou centro de estudos que a mesma frequente, no final das respetivas atividades. No caso de a sexta-feira ocorrer fora do período letivo ou quando por alguma razão o estabelecimento de ensino/centro de estudos estiver encerrado, ou o menor não possa ir à escola, o progenitor com quem a criança irá passar a semana deverá ir busca-la a casa do outro pelas 19h,00 desse dia, sendo a criança entregue no mesmo local ou no estabelecimento de ensino (se já estiver aberto), na sexta feira seguinte.” 2. Nos termos da al. a) do n.º 1 do art. 640.º do CPC, e considerando o teor da factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, impugna-se a matéria dada por provada nos pontos 12 e 13 dos factos provados (…), por não corresponderem à realidade dos factos e contradizerem os depoimentos prestados pelas testemunhas (…) 19. Assim, por ser notoriamente errado o que consta dos pontos 12 e 13 cumpre verificar que a redação adequada para estes artigos, por forma a juntamente com a demais factualidade, ser proferida uma decisão justa, é, nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, a seguinte: - O progenitor tem acompanhado o menor no seu percurso escolar e quando a criança está com ele, também a tem levado a consultas médicas ou mesmo ao hospital, recusando-se, contudo, a prestar quaisquer informações sobre todas as questões relacionadas com os menores referentes a todos estes assuntos de especial relevância para a vida do menor; - O pai do menor desde a separação tem demonstrado maior interesse no acompanhamento das atividades do menor do que aquele que revelava antes da separação, pese embora, continue a ser notada a sua ausência em muitas dessas atividades. Em dias de cerimónia da catequese nunca compareceu. - Só a mãe do menor demonstra preocupação pelo bem-estar do filho e competências para o exercício das responsabilidades parentais, uma vez que os diversos comportamentos adotados pelo progenitor desde a separação (imposição de comunicações exclusivamente por email/sms; atrasos na entrega dos pertences do menor; recusa na divulgação de informações relacionadas com a saúde do menor; recusa na entrega de documentos de identificação do menor; incapacidade de assegurar o descanso do menor) revelam que o pai sobrepõe o conflito com a Mãe ao interesse do menor. Sem prescindir, 20. Mesmo admitindo, por mero dever de patrocínio a improcedência do recurso sobre a matéria de facto assente, reconhece-se que a questão central do presente recurso se prende com a questão de saber se a residência alternada deve ser fixada, a uma criança de 8 anos, quando não só não existe acordo nesse sentido, como se regista uma incapacidade de diálogo, entendimento, cooperação e conflitualidade entre os progenitores, pergunta esta que no nosso entender apenas pode merecer uma resposta de sentido negativo. (…) 24. Diga-se desde, já que no nosso entender não há qualquer razão para que seja fixada a residência alternada numa situação em que não só não existe acordo nesse sentido, como se regista uma incapacidade de diálogo, entendimento, cooperação e conflitualidade entre os progenitores. 25. Por isso, não nos convence a decisão no seu raciocínio, raciocínio que não se acha alicerçado em razões de ciência, nem em princípios dominantes, sejam eles jurídicos ou não jurídicos. (…) 36. Neste âmbito aderimos à posição sufragada por MARIA CLARA SOTTOMAYOR, nos termos da qual “a solução da residência alternada só deve ser considerada num contexto de consenso, confiança mútua entre os progenitores, profundo respeito pelo outro progenitor e real desejo de colaboração com ele”. 37. O que não ocorre entre os progenitores nestes autos, muito antes pelo contrário. Na realidade, resultou claro, como referido anteriormente, que os pais apesar de estarem separados há quase dois anos ainda não conseguiram superar o elevado grau de conflitualidade, o que não lhes permite dialogar com vista a um entendimento sobre as questões de interesse relativas à educação do menor. (…) 42. Perante o clima de conflito e desconfiança entre os progenitores, e considerando a tenra idade da criança, com apenas 8 anos, entendemos que para salvaguardar o superior interesse do CC não deve ser adotada a residência alternada, que iria implicar uma exposição muito acentuada deste aos conflitos entre os progenitores com todos os inconvenientes que daí poderão advir para a sua estabilidade e para a sua saúde física e psíquica. (…) 46. Em suma, pelas razões avançadas – de que se destacam a dificuldade do pai em cumprir o regime provisório anteriormente acordado, com consequências para o equilíbrio emocional do menor; e o elevado grau de conflitualidade existente entre os progenitores, que não permite uma comunicação minimamente aceitável para as questões inerentes ao menor - tudo aconselha a que seja fixado o regime de confiança do menor aos cuidados da sua mãe, com um regime de visitas a seu pai, ou não sendo tal possível que se mantenha o regime provisório nos termos do qual foi fixado: “O pai ficará com a criança de 15 em 15 dias desde sábado ao final do dia à quinta-feira de manhã, devendo para o efeito ir buscar a criança no sábado às 19h00 a casa da mãe e entregá-la na quinta-feira de manhã no estabelecimento de ensino ou em casa da mãe caso aquele se encontre encerrado.”». 7. O requerido e o Ministério Público, apresentaram contra-alegações, pugnando pela confirmação da sentença recorrida, sendo o progenitor, apenas na parte em que não a impugnou. 8. Observados os vistos, cumpre decidir. ***** II. O objeto do recurso. Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, evidentemente sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Assim, atenta a delimitação que cada uma das partes efetuou quanto ao âmbito do recurso, as únicas questões que importa decidir, pela ordem lógica de apreciação dos recursos, são as de saber se: i) a decisão da matéria de facto deve ser modificada como preconizam os Apelantes: ii) a residência da criança deve ser fixada junto da mãe, ou, assim não se entendendo, nos termos do acordo provisório; iii) caso se mantenha a residência alternada, deve ou não ser fixada pensão de alimentos a cargo do progenitor. ***** III – FundamentosIII.1. – De facto Na sentença recorrida consideraram-se “factos provados” os seguintes: «1. CC nasceu a .../.../2014, encontrando-se registado como filho de BB e de AA. 2. Os pais da criança não são casados entre si e encontram-se separados desde dezembro de 2020. 3. Na conferência de pais realizada no âmbito destes autos no dia 07/04/2021, foi estabelecido o seguinte regime provisório: 1º - O menor ficará a residir com a mãe, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas em comum por ambos os progenitores. 2º - O pai ficará com a criança de 15 em 15 dias desde sábado ao final do dia à quinta-feira de manhã, devendo para o efeito ir buscar a criança no sábado às 19h00 a casa da mãe e entregá-la na quinta-feira de manhã no estabelecimento de ensino ou em casa da mãe caso aquele se encontre encerrado. 3º - No dia de aniversário da criança esta tomará uma refeição com cada um dos progenitores. 4º - Nos dias de aniversário dos pais, a criança ficará com o respetivo aniversariante, no dia do pai com o pai e no dia da mãe com a mãe. 5º - O pai pagará uma pensão de alimentos para a criança no valor de 80 euros mensais, por transferência bancária para a conta da mãe, até ao dia 8 de cada mês. 6º - Cada um dos progenitores pagará metade das despesas médicas, medicamentosas, de ATL/centro de estudos/transporte, e bem assim, com atividades extracurriculares que a criança frequente com acordo dos progenitores e o prémio de seguro referente ao menor, mediante a apresentação dos respetivos comprovativos. 4. A progenitora vive sozinha com o filho menor, em casa com condições de habitabilidade, onde a criança dispõe de quarto para sua utilização. 5. A requerente é trabalhadora independente, “a recibos verdes”, dando explicações em diversos Centros de Estudos, designadamente no “7Cores”, e também em casa, auferindo rendimentos variáveis, cujo montante não se apurou em concreto, 6. A criança no ano letivo de 2021/2022 frequentou o 2.º ano de escolaridade, na Escola EB1, n.º 2, do Agrupamento de Escolas ..., na Quinta .... 7. E também frequenta o Centro de Estudos “7Cores” desde o 1º ano de escolaridade, onde faz os deveres escolares. 8. A professora da criança, DD, refere que o CC é um menino tranquilo e sempre bem-disposto, embora um pouco reservado, apresentando-se cuidado, possuindo todos os materiais e livros necessários para a sua aprendizagem, tendo muito bom aproveitamento e os pais sempre se mostraram disponíveis quando solicitados para qualquer atividade e outros assuntos relacionados com o CC. 9. O progenitor trabalha para a firma H..., S.A., auferindo um vencimento de aproximadamente € 1.000,00 por mês. 10. Reside na companhia da sua irmã gémea, em casa com condições de habitabilidade, onde o filho CC dispõe de quarto para sua própria utilização. 11. Após a fixação do regime provisório das responsabilidades parentais, acima referido, o Requerido passou a ter um horário reduzido nos dias em que o menor está aos seus cuidados, entrando às 10h00 horas e saindo às 18h00, compensando as horas de trabalho a menos nos dias em que a criança está aos cuidados da mãe. 12. O progenitor tem acompanhado o menor no seu percurso escolar e quando a criança está com ele também a tem levado a consultas médicas ou mesmo ao hospital, quando necessário, administrando-lhe os medicamentos prescritos e acompanha o menor nas atividades extracurriculares, nomeadamente o futsal e a natação. 13. Ambos os progenitores demonstram preocupação pelo bem-estar do filho e competências para o exercício das responsabilidades parentais. 14. A criança manifesta forte ligação afetiva a ambos os progenitores. 15. No entanto, estes não se têm mostrado capazes de dialogar sobre as questões relevantes e necessárias na vida do filho CC, surgindo conflitos entre eles sobretudo relacionados com a concretização e tempo de permanência da criança com cada um, comunicando geralmente apenas por e-mail e SMS». Não existem factos julgados “não Provados”. ***** III.2. – O mérito do recursoIII.2.1. – Da impugnação da matéria de facto Insurgem-se ambos os Apelantes quanto à matéria de facto considerada provada. A Recorrente dissente dos pontos n.ºs 12 e 13, e o Recorrente do ponto n.º 5, pugnando cada um pela sua respetiva modificação nos termos acima preconizados. Para além das referências respeitantes ao que as testemunhas mencionaram (ou ainda ao facto de o não terem feito), da referência ao relatório da Audição Técnica Especializada, e aos documentos já juntos aos autos, a Requerente, para evidenciar que «a conflitualidade entre os progenitores impede quaisquer decisões em comum sobre a educação do filho capazes de instituir uma linha comum», e que por isso não existem condições para a instituição do fixado regime de residência alternada, juntou com as alegações de recurso “4 documentos, admissíveis nos termos do artigo 425.º ex vi do artigo 651.º, n.º 1, do CPC”. Na resposta apresentada, o Recorrido «considera que os emails juntos ao presente Recurso, que não foram juntos ao processo no tribunal recorrido, não devem ser admitidos». No entanto, e para a hipótese deste Tribunal ter entendimento diferente, «por se considerarem documentos supervenientes à prolação da sentença, o ora Recorrido também junta uma série de emails trocados recentemente entre Recorrente e Recorrido», visando, com estes e os anteriores, fazer «prova do comportamento obsessivo da Requerente em questões relacionadas com o filho e do controlo cerrado que a Recorrente faz de todos os movimentos que o menor faz quando se encontra à guarda e cuidados do pai». Vejamos, pois, se os documentos apresentados por Recorrente e Recorrido, com as alegações de recurso e a resposta, devem ou não ser admitidos. É consabido que os documentos são meios de prova cuja exclusiva função é a de demonstrar os factos (artigo 341.º do Código Civil), daí que a sua junção, em regra, deva ser efetuada na fase instrutória da causa, nos momentos que atualmente se mostram previstos no artigo 423.º do CPC, sendo o momento regra a sua apresentação com os articulados (n.º 1 do preceito). Este regime regra decorre do princípio da audiência contraditória, visando que a parte contrária possa, desde logo, contestar no articulado ou em resposta subsequente quer a admissibilidade, quer a autenticidade e a força probatória material do documento apresentado. Não obstante, atento o interesse público no apuramento da verdade material, o n.º 2 do citado preceito possibilita que a parte possa ainda apresentar documento que não juntou com o articulado respetivo, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo porém condenada em multa pela apresentação tardia, exceto se provar que não pôde oferecer o documento oportunamente, podendo ainda efetuar a sua apresentação após aquele limite temporal mas apenas quando se verifique alguma das situações excecionais previstas no n.º 3 do artigo 423.º do CPC. Sendo este o regime-regra, a junção de documentos com as alegações de recurso só é passível de ser efetuada no âmbito do recurso de apelação em que nos movemos, quando se verifique alguma das situações prevenidas no artigo 651.º do CPC, do qual resulta que “as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”. No caso vertente, a Apelante juntou os documentos para fundamentar a sua argumentação sobre a inviabilidade de ser estabelecida a residência alternada do CC, atenta a litigiosidade persistente entre os progenitores, e para justificar não encontrar qualquer suporte probatório para as conclusões fácticas vertidas nos pontos 12 e 13 da matéria de facto provada. Na espécie, a audiência de julgamento teve lugar em 29.03.2022, tendo a sentença recorrida sido proferida em 04.09.2022, e notificada às partes no dia 05.09.2022. Ora, os documentos que a recorrente apresentou com as alegações de recurso, são correspondência eletrónica trocada entre si e o pai do filho (que preenche quase 30 páginas dos autos), no período compreendido entre 01.09.2022 e 20.09.2022, e concretamente, logo no dia seguinte à notificação da sentença, questionando a Apelante quando teria o Apelado disponibilidade para falarem ambos com o CC sobre a decisão. Por seu turno, o Apelado junta a troca de correspondência ocorrida entre os dias 16.09.2022 e 26.10.2022. Portanto, tais documentos são objetivamente supervenientes, já que não existiam nem à data da alegação inicial, nem no momento da prova dos factos correspondentes. Porém, tal não significa que devam permanecer nos autos. Com efeito, da conjugação do disposto nos artigos 425.º e 651.º do CPC, verifica-se que apenas é admissível a junção de documentos no âmbito das alegações de recurso de apelação nestes tipos de situações: i) - quando não tenha sido possível a sua apresentação até ao encerramento da discussão em primeira instância; ii) - quando a apresentação se tenha tornado necessária apenas em virtude do julgamento proferido pela primeira instância. Sabido é que, quanto à primeira das referidas possibilidades – documentos cuja junção não tenha sido possível até ao encerramento da discussão em primeira instância – o preceito abrange quer a superveniência objetiva do documento, quer a superveniência subjetiva decorrente, por exemplo, do desconhecimento da existência do documento, ou mesmo da junção de documentos que tenham sido formados posteriormente àquele momento temporal[5]. No entanto, os documentos supervenientes a que o preceito se refere, não podem ser todos e quaisquer documentos que se reportem a factos já constantes da instrução da causa. Na verdade, considerando que os recursos se destinam ao controle da decisão impugnada, hão-de admitir-se apenas os que tenham relevância processual quanto a factos supervenientes estranhos ao objeto da lide ou que se destinem a pôr-lhe termo, ou aqueles que, tendo havido impugnação da matéria de facto, se enquadrem na previsão do n.º 1, do artigo 662.º, isto é, aqueles documentos que, sendo novos e supervenientes, só por si, tenham força probatória suficiente para destruir a prova em que a decisão da primeira instância assentou[6]. Manifestamente não é o caso da correspondência trocada entre os progenitores, que apenas espelha a incapacidade que têm vindo a demonstrar de colocarem o interesse do filho em primeiro lugar, mas não faz prova, e muito menos plena, nem do erro de julgamento dos impugnados pontos de facto, nem, mais genericamente, de que a residência alternada não sirva os interesses da criança, como a Apelante pretende demonstrar com a sua junção. Na realidade, em caso de separação ou divórcio dos progenitores, as responsabilidades parentais mantém-se e devem ser exercidas no superior interesse das crianças, porquanto a dissolução do casal não extingue a sua co-parentalidade, e, ao invés, acentua a necessidade de uma atitude de concertação e cooperação recíprocas entre os progenitores, no que tange à sua função parental, no sentido de garantirem aos filhos a possibilidade de um desenvolvimento são e harmonioso da respetiva personalidade, assegurando o seu bem-estar emocional e as suas necessidades materiais. Por isso que, o exercício das responsabilidades parentais tenha que ser regulado, conforme preceituado nos artigos 1905.º a 1908.º, ex vi artigo 1911.º do Código Civil[7], quanto às questões essenciais, que devem constar no acordo sujeito a homologação ou na sentença, de acordo com o previsto nos artigos 34.º e 40.º da Lei n.º 141/2015, de 08 de Setembro, que aprovou o Regime Geral do Processo Tutelar Cível[8], regulação que pode ser efetuada por acordo entre os progenitores, sujeito a homologação, ou por sentença proferida no termo do correspondente processo especial, como ocorreu na situação em presença, em que os pais se têm mantido num acentuado nível de litigiosidade, que em nada concorre para o bem-estar do seu filho e ao qual devem capacitar-se que têm que pôr cobro, a bem do CC. No caso, conforme as incidências processuais acima resumidamente transcritas evidenciam, desde o requerimento inicial que a requerente defende que a residência do filho seja fixada junto de si, com os motivos sinteticamente vertidos no relatório supra. Assim, não tendo requerente e requerido, na conferência ocorrida em 07.04.2021, acordado quanto à regulação das responsabilidades parentais do seu filho, acordaram provisoriamente nos termos acima transcritos, designadamente quanto à residência e à prestação de alimentos, sabendo consequentemente que estas questões teriam necessariamente de ser objeto da sentença que viesse a regular o exercício das responsabilidades parentais, pelo que, não foi a decisão proferida que tornou necessária a sua junção. Efetivamente, quanto aos documentos cuja apresentação se tenha tornado necessária apenas por virtude do julgamento proferido pela primeira instância, interpretando o preceito de harmonia com o seu carácter excecional, não bastará para possibilitar a junção com este fundamento que a decisão seja desfavorável ao recorrente para que ele junte em sede de recurso documentos, sendo «evidente que, na sua última parte, a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado em 1.ª instância. O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida»[9]. Assim, por não serem estranhos ao objeto da lide, mas antes mero desenvolvimento da forma de comunicação que os progenitores infelizmente decidiram adotar entre si, da qual já existiam exemplos anteriores, os documentos não podem igualmente ser juntos “por se terem tornado necessários em virtude da decisão proferida”. Finalmente, impõe-se repetir que os documentos em apreço também não têm força probatória que, por si só, determine a modificação dos impugnados pontos de facto, nos termos do artigo 662.º, n.º 1, do CPC, e nem assumem relevância para, nos termos previstos no n.º 2, alínea b), os admitir na modalidade de produção de novos meios de prova em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada em 1.ª instância, «medida que, sem custos excessivos, pode servir para firmar a convicção mais segura sobre determinado facto controvertido, designadamente quando para tal baste a apreciação de algum documento cuja junção pudesse ser oficiosamente decretada»[10], isto pela já indicada razão de não estarmos perante prova vinculada. O que vimos de referir quanto à apresentação com as alegações de recurso da troca de emails entre os progenitores, vale tanto para a Apelante como para o Apelado. Pelo exposto, recusa-se a junção dos documentos em apreço, determinando-se que sejam retirados do processo e restituídos aos apresentantes, nos termos do preceituado no artigo 443.º, n.º 1, do CPC, e condenando-se Apelante e Apelado, pelo incidente a que deram causa com esta junção intempestiva, na multa correspondente a 1 UC, de harmonia com o previsto no artigo 27.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais. ***** Isto posto, vejamos, então, se a demais prova documental, tempestivamente produzida, bem como a prova oral a respeito dos impugnados factos provados sob os pontos 5, 12 e 13, impõe ou não decisão diversa da recorrida.Como é sabido, na reapreciação da matéria de facto impugnada, atento o disposto no artigo 663.º, n.º 2, do CPC, os poderes conferidos por lei à Relação quanto ao princípio fundamental da apreciação das provas previsto no artigo 607.º, n.º 5, do CPC, têm amplitude idêntica à conferida ao tribunal de 1.ª instância, devendo a 2.ª instância expressar a respetiva convicção acerca da matéria de facto impugnada no recurso, e não apenas conferir a lógica e razoabilidade da convicção firmada pelo tribunal a quo[11], impondo-se-lhe ainda, quanto à fundamentação do acórdão, em obediência ao n.º 4 do aludido preceito, compatibilizar toda a matéria de facto adquirida. A impugnação da matéria de facto efetuada por ambos os Recorrentes, deve considerar-se efetuada com observância dos ónus a respetivo cargo previstos nas três alíneas do n.º 1 e no n.º 2 alínea a) do artigo 640.º do Código de Processo Civil, cumprindo consequentemente verificar se existem ou não razões para modificar a matéria de facto nos termos pretendidos pelos Apelantes. Ora, a convicção do Tribunal, quer de primeira instância, quer da Relação, não se funda meramente na prova oral produzida, sendo a mesma conjugada com todos os demais meios de prova que a podem confirmar ou infirmar, designadamente a prova documental, e sendo evidentemente globalmente apreciada segundo as regras de experiência e a livre convicção do julgador, de acordo com um exame crítico e concatenado de todas as provas produzidas. De facto, «[o] “exame crítico” das provas constitui uma noção com dimensão normativa, com saliente projecção no campo que pretende regular - a fundamentação em matéria de facto -, mas cuja densificação e integração faz apelo a uma complexidade de elementos que se retiram, não da interpretação de princípios jurídicos ou de normas legais, mas da realidade das coisas, da mundividência dos homens e das regras da experiência. O exame crítico consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção (cfr.,v.g., acórdão do Supremo Tribunal de 30 de Janeiro de 2002, proc. 3063/01)»[12]. Acresce ainda preliminarmente referir que, relativamente à reapreciação do julgamento de facto pela Relação cumpre também ter presente que a mesma se destina primordialmente a corrigir invocados erros de julgamento - atento o preceituado no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, que rege sobre a modificabilidade da decisão de facto -, evidenciados a partir dos factos tidos como assentes, da prova produzida ou de um documento superveniente, por forma a imporem decisão diversa. Significa esta formulação legal que não basta que a prova produzida nos autos permita decisão diversa, necessário é que a imponha. Por isso que, também na respetiva fundamentação a Relação tem de motivar, ou seja, dizer as razões que determinaram o respetivo juízo probatório, para aquilatar se tais elementos impõem ou não decisão diversa da recorrida quanto aos concretos pontos de facto impugnados. Para formar a nossa própria convicção e tendo presente que a Senhora juíza se referiu ao conjunto da prova produzida sem especificar em concreto qual a relevante para fundar aqueles concretos pontos de facto impugnados, auditámos a prova oral registada, concatenando-a com a prova documental produzida nos autos, atentando nos e-mails trocados entre os progenitores, no relatório da Audição Técnica Especializada junto aos autos e nas consultas das bases de dados levadas. A julgadora fundamentou a sua convicção a respeito dos factos de forma global, não especificando a concreta matéria «de facto» impugnada. Assim, em fundamento da sua convicção, aduziu que «A factualidade assente fundou-se sobretudo no teor da certidão do assento de nascimento da criança junta com a petição inicial, informação sobre a Audição Técnica Especializada (refª 6060580), documentos juntos aos autos com a petição inicial, comprovativos da frequência da criança do centro de estudos “7Cores” e atividades extracurriculares, designadamente natação, assim como as informações obtidas das bases de dados do ISS relativamente aos rendimentos auferidos por cada um dos progenitores, em conjugação com o que cada um deles declarou sobre essas matérias e as testemunhas confirmaram, sobretudo as testemunhas EE e FF, que demonstraram conhecimento direto sobre a atividade laboral desenvolvida pela Requerente, sendo que a primeira é proprietária e monitora no centro de estudos “7Cores”, Quinta ..., dizendo que a Requerente presta serviço naquele centro de estudos como trabalhadora independente (a recibos verdes), das 9h,00 às 12h,00, exceto 4ª feira, e também faz abertura do centro das 07h,30 às 13h,00, exceto à sexta-feira. Mais esclareceu a testemunha EE que a Requerente também dá explicações em casa e em outros locais, nomeadamente num outro ATL, na parte da tarde, o que coincide com o que a testemunha FF (educadora de infância) afirmou, dizendo que conheceu a Requerente num centro de estudos onde ela trabalhava e que sabe que a mesma continua a dar explicações, como trabalhadora independente, igualmente confirmado pelas testemunhas GG e HH. A testemunha II também confirmou que a criança CC frequenta o seu centro de estudos, “7Cores”, desde o 1º ano e que faz aí os trabalhos escolares, tendo a testemunha referido que notou, após a separação do casal, que houve uma maior aproximação do pai ao CC, indo buscar o filho ao Centro de Estudos nos dias da semana em que ele está com o pai. As testemunhas GG, EE e JJ, confirmaram ainda que a Requerente e o Requerido não conseguem manter um diálogo um com o outro, comunicando por e-mail ou SMS, conforme resulta, de resto, dos elementos constantes dos autos, nomeadamente o teor da informação da audição técnica especializada. Por sua vez, as testemunhas KK (irmã gémea do Requerido) e LL (amigo de ambos os pais) afirmaram que o CC é uma criança feliz e alegre quando está com o pai, notando-se o seu contentamento pela forma como se abraça ao pai e há muita brincadeira entre os dois, sendo que o pai até já mudou o tempo de trabalho para estar mais disponível para o filho. A testemunha KK que vive na mesma casa que o irmão, aqui Requerido, referiu que no H..., onde o irmão trabalha, dão-lhe flexibilidade de horários para poder entrar mais tarde e sair mais cedo do trabalho nas semanas em que a criança está com o pai, compensando as horas em falta na semana seguinte, o que também foi confirmado pela testemunha MM, que é a responsável pelo Garden do Horto do Campo Grande em Lisboa, dizendo esta testemunha que o Requerido pediu a redução do horário, adaptado aos dias em que tem o filho com ele (neste momento entra às 10h,00 e sai às 18h,00 quando tem o filho), sendo a testemunha que decide a alteração de horários e se for necessário autorizará a mudança da folga de segunda feira para sábado para que o pai possa estar com o filho durante todo o dia de sábado». Vejamos, então, a matéria de facto impugnada. Pela ordem numérica, iniciamos a impetrada reapreciação pela alteração preconizada pelo Recorrente quanto ao ponto 5. da matéria de facto provada, com o seguinte teor: «A requerente é trabalhadora independente, “a recibos verdes”, dando explicações em diversos Centros de Estudos, designadamente no “7 Cores”, e também em casa, auferindo rendimentos variáveis, cujo montante não se apurou em concreto, mas de valor global próximo do ordenado mínimo nacional». Dissente o Apelante, defendendo que o segmento final deve ser modificado, porque «qualquer pessoa, colocada na posição de pater familiae, sabendo que uma professora, presta serviço em pelo menos 2 centros de estudo e dá explicações em vários locais e em casa, sabe que esta pessoa não pode ter um rendimento médio mensal de menos de 500,00€, tem sim que ter um rendimento mensal bastante superior. Considerando que o salário mínimo nacional é no ano de 2022, de 705,00€ e que a Requerente fazia metade de um horário de 8 horas diárias num centro de estudos e a outra metade num outro centro de estudos, no global, tinha, pelo menos, um rendimento mensal de 705,00€. Através de uma simples pesquisa junto de pais cujos filhos frequentam explicações, e se encontrem no 2º e 3º ciclo de escolaridade, ciclos de escolaridade que segundo declarações da testemunha EE seria o seu público alvo, chega-se à conclusão que o preço mínimo por hora de explicação é de 15,00€, sendo normalmente muito mais elevado. Prosseguindo o raciocínio de que a Requerente dava, pelo menos 2 horas de explicações por dia, chegamos à conclusão de que por mês tinha um rendimento extra de 660,00€. Pelo que o rendimento mensal mínimo auferido pela Requerente nunca seria inferior a 1.365,00€ por mês». Ora, a este respeito dos rendimentos dos progenitores, os únicos documentos constantes nos autos resultam da consulta da base de dados da Segurança Social que foi efetuada em 01.03.2021, e da qual resulta que a Requerente ali consta como trabalhadora independente, tendo declarado no mês de janeiro de 2021, rendimentos de 490,44€; por seu turno, o Requerido consta como trabalhador no H..., estando ali indicado, por referência ao mesmo mês, que auferiu 910,00€. Tendo-se procedido à audição da gravação da audiência de discussão e julgamento, verificamos que, ao contrário do que perpassa do início da fundamentação, os progenitores não foram ouvidos em declarações de parte (note-se que mesmo no decurso da hora inicial em que foi tentada a obtenção de acordo entre os progenitores as suas intervenções respeitaram apenas às questões relativas à fixação da residência do filho, e esta questão da pensão de alimentos nunca foi sequer mencionada), e verifica-se ainda que nenhuma das testemunhas fez referência aos concretos rendimentos auferidos pela Requerente em cada um dos locais onde trabalha, nem quanto ao valor que recebe por hora de trabalho prestado, nem ainda qualquer menção quanto ao rendimento mensal global. Se alguma referência foi feita perante o tribunal não foi seguramente neste momento, sendo que, a conferência de pais, na qual foi fixado o regime provisório, não se encontra gravada. Com efeito, como aliás notou o Recorrente, a questão do rendimento dos progenitores e concretamente da progenitora nunca foi questão que tivesse tido relevância no decurso do julgamento. As referências à atividade profissional da requerente foram sempre feitas pelas testemunhas por reporte ao foco das inquirições que lhes foram efetuadas, e que respeitava à disponibilidade dos progenitores para assegurarem o dia-a-dia com o CC, não tendo o tribunal tentado sequer apurar algum elemento a este respeito, que igualmente não consta em momento algum alegado pelas partes, já que o seu litígio tem estado centrado na partilha da residência. Sintomático do que vimos de afirmar, é a análise do requerimento inicial e das alegações após a conferência de pais, onde a menção à questão laboral dos progenitores se centra apenas nos seus horários e consequente disponibilidade, não tendo a Recorrida sequer contra-alegado nesta sede. Assim, com interesse para a suscitada impugnação, do depoimento das testemunhas NN, FF, GG, JJ, e EE OO, retira-se que a requerente dá explicações, trabalhando a “recibos verdes”, por conta própria, em centros de estudos e em casa. Mais concretamente, extrai-se do depoimento desta última testemunha, proprietária e monitora do centro de estudos “7 Cores”, onde a progenitora presta serviço, que a requerente “é trabalhadora independente”, que “tem sempre um horário predefinido, mas há sempre ajustes, há sempre ajustes”, e ainda que conta sempre com a AA “dentro também da disponibilidade dela, com o trabalho que ela tem no outro ATL”, referindo ainda que a AA dá explicações em sua casa e vai a casa de outros. Naquele centro, vai das 9h às 12h, exceto às quartas-feiras, e faz a abertura das 7h30 às 13h, exceto às sextas-feiras. Percebemos ainda do depoimento da testemunha FF que a AA teria um horário no outro centro que a testemunha referiu ser também da parte da manhã, presumindo-se que será então à quarta-feira, mas não só. Tanto assim que a criança está inscrita no Centro de Estudos, tendo havido referência da própria requerente (no início da audiência aquando da tentativa de obtenção de acordo) sobre a disponibilidade para ir buscar o filho às 17h30, e inclusivamente referiu nessas conversações prévias à audiência, a existência de uma ou duas horas de explicações ao sábado. É certo que o montante dos rendimentos da requerente não foi concretamente apurado. Mas, mais do que isso, em momento algum houve qualquer referência a que o valor percebido pela requerente do seu trabalho seja “de valor global próximo do ordenado mínimo nacional”, que em 2022 se situava em 705€, pelo que, este segmento do ponto 5 não pode manter-se como provado. Porém, não podemos fazer a extrapolação proposta pelo Recorrente de que a Recorrida tem um valor/hora de 15€, já que, ainda que possa cobrar esse montante nas explicações particulares e que esse seja até um valor médio para os alunos do nível de escolaridade em causa, desconhecemos de todo qual o valor que a requerente recebe dos Centros de Estudos onde exerce funções, depreendendo-se dos depoimentos que será nestes que presta funções durante mais tempo. Consequentemente, impõe-se a modificação do ponto 5 da matéria de facto provada, eliminando-se o identificado segmento final, e passando a ter a seguinte redação: «5. A requerente é trabalhadora independente, “a recibos verdes”, dando explicações em diversos Centros de Estudos, designadamente no “7 Cores”, e também em casa, auferindo rendimentos variáveis, cujo montante não se apurou em concreto». ***** Vejamos agora a matéria de facto impugnada pela Recorrente, vertida nos pontos 12. e 13. da matéria provada, que, em síntese, respeitam ao acompanhamento e competências dos progenitores para o exercício das responsabilidades parentais, defendendo a Apelante, desde o requerimento inicial, que é ela quem tem melhores competências para o efeito, e que deve ser considerada a “pessoa de referência” da criança.Consta dos indicados pontos de facto que: «12. O progenitor tem acompanhado o menor no seu percurso escolar e quando a criança está com ele também a tem levado a consultas médicas ou mesmo ao hospital, quando necessário, administrando-lhe os medicamentos prescritos e acompanha o menor nas atividades extracurriculares, nomeadamente o futsal e a natação. 13. Ambos os progenitores demonstram preocupação pelo bem-estar do filho e competências para o exercício das responsabilidades parentais». Dissente a Apelante pretendendo que a redação adequada para estes artigos, por forma a juntamente com a demais factualidade, ser proferida uma decisão justa, é, nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC, a seguinte: - O progenitor tem acompanhado o menor no seu percurso escolar e quando a criança está com ele, também a tem levado a consultas médicas ou mesmo ao hospital, recusando-se, contudo, a prestar quaisquer informações sobre todas as questões relacionadas com o menor referentes a todos estes assuntos de especial relevância para a vida do menor; - O pai do menor desde a separação tem demonstrado maior interesse no acompanhamento das atividades do menor do que aquele que revelava antes da separação, pese embora, continue a ser notada a sua ausência em muitas dessas atividades. Em dias de cerimónia da catequese nunca compareceu. - Só a mãe do menor demonstra preocupação pelo bem-estar do filho e competências para o exercício das responsabilidades parentais, uma vez que os diversos comportamentos adotados pelo progenitor desde a separação (imposição de comunicações exclusivamente por email/sms; atrasos na entrega dos pertences do menor; recusa na divulgação de informações relacionadas com a saúde do menor; recusa na entrega de documentos de identificação do menor; incapacidade de assegurar o descanso do menor) revelam que o pai sobrepõe o conflito com a Mãe ao interesse do menor. Salvo o devido respeito, a Apelante não tem razão na sua pretensão, antecipando-se desde já que a prova produzida não impõe decisão diversa da recorrida. Mas, mais do que isso, o terceiro ponto proposto é desde logo contraditado pelos primeiros. Se o pai, quando a criança está com ele, a tem levado a consultas médicas ou mesmo ao hospital, e tem acompanhado as atividades do menor, não se poderia concluir, como pretende a recorrente, que só a mãe do menor demonstra preocupação pelo bem-estar do filho e competências para o exercício das responsabilidades parentais. Acresce que, na parte atinente à “avaliação das competências parentais” consta no relatório da Audição Técnica Especializada que «No decurso das diligências realizadas, designadamente em sede das sessões individuais presenciais com cada um dos progenitores, quer a requerente, AA, quer o requerido, BB, aparentaram ser pais com adequadas competências para o exercício da parentalidade relativamente ao seu filho, CC. Ambos manifestaram, designadamente, capacidade de atuação no que se refere à prestação dos cuidados básicos de higiene, alimentação, educação, saúde e proteção da criança. Denotaram, igualmente, uma eficaz comunicação e capacidade de interacção com a mesma». Mais consta, na parte respeitante aos “Dados relevantes sobre a criança em causa” que «Atualmente, o CC frequenta o 2.º ano de escolaridade, na Escola EB1, n.º 2, do Agrupamento de Escolas ..., na Quinta .... Pelo contacto estabelecido com a professora da criança, Dr.ª DD, foi pela mesma informado ser professora do CC “desde o 1º ano de escolaridade, ou seja, no ano letivo 2020/2021. O CC é um menino tranquilo e sempre bem-disposto, à sua maneira, pois considero-o uma criança um pouco reservada. Sempre se apresentou bastante cuidado, possuindo tudo aquilo que necessita em contexto escolar, refiro-me a lanche e materiais necessários para a sua aprendizagem. Os pais sempre se mostraram disponíveis quando solicito qualquer atividade e posso referir que foram muitas ao longo do ano letivo anterior. Os pais estiveram sempre disponíveis para assuntos relacionados com o CC. Demonstrando, ambos sempre preocupação pelo bem-estar do menino. Tomei conhecimento da situação familiar do CC pelos pais, que fizeram questão de me pôr ao corrente de tal, quando abordo o CC acerca do assunto, ele fala pouco, não consigo perceber o seu agrado ou desagrado em relação à situação, apenas refere que está tudo bem. O CC teve no ano anterior um excelente desempenho escolar”». Portanto, é uma evidência que a professora do CC se refere à disponibilidade de ambos os pais para as questões escolares e não apenas à da mãe (e note-se que esta é a encarregada de educação, mas a professora não distinguiu). Pretende a Recorrente colocar o foco sobre as competências parentais do Recorrido, não apenas em momentos da sua vivência em conjunto, como em episódios ocorridos após a separação, que as testemunhas que arrolou tiveram a ocasião de relatar, e que não vamos escalpelizar, por inútil, centrando-se em ausências do progenitor ocorridas em jogos, na catequese, ou em festas/jantares de amigos, sem que atendesse o telefone ou respondesse às mensagens da Requerente, devendo notar-se que se verifica ainda uma “ligação” entre aquilo que eram as questões entre o casal e são agora do ex-casal (por exemplo, a falta de comunicação), com aquelas que respeitam à parentalidade. Tanto assim que, quando confrontadas, por regra, davam ou aceitavam que a explicação inicialmente dada como sendo decorrência da criança estar com o pai, podia ter outra explicação. Alguns exemplos desta afirmação. A testemunha GG (tia do lado materno), referiu que achava o CC talvez um pouco mais retraído. Perguntada sobre se achava que o CC estava bem (com o pai), retorquiu que a única coisa que assistiu foi ele querer prolongar o convívio e gostar de continuar com a família e ficar triste por ter que ir para o pai. Perguntada sobre se sabia se o mesmo se passava ao contrário, disse não saber. Ora bem. Ouvida a testemunha KK (tia do lado paterno), referiu precisamente que o CC por vezes manifesta que gostava de ficar mais tempo com o pai para fazerem coisas que tinham pensado. Diremos, aliás, que cremos ser exatamente o mesmo que acontece quando qualquer criança com esta idade, filha de pais juntos, está a brincar, ou com alguém de quem gosta e os pais lhe dizem que têm que ir embora para casa. A única diferença é que, nesse caso, ninguém está a ver na reação da criança qualquer outra questão que não seja o facto de esta, naturalmente, pretender continuar a fazer o que gosta. Também a testemunha PP disse que achou o CC mais triste, mais fechado. Porém, logo após referiu “que também podia ter a ver com a pandemia”, devendo, aliás, notar-se que a separação dos pais, a instituição do regime provisório, e a entrada deste menino no 1.º ano de escolaridade, ocorreu em período de pandemia, com todas as dificuldades acrescidas que tal colocou, incluindo um confinamento do CC junto do pai. Também houve referência a que o CC agora “cuspia para o chão”, inculcando que tal teria que ver com o pai. Perguntada se não poderia ter visto esse comportamento em outro menino, a testemunha NN, admitiu que sim. A testemunha JJ referiu que o CC está mais agressivo, mais respondão, mais agarrado às tecnologias, a jogar, e que o tentam conduzir para outro tipo de atividades. Se ouvirmos do “outro lado”, diz-nos a tia KK, irmã gémea do pai, com quem este partilha a casa, e com quem o menor está quando em casa do pai, referiu que o CC pedia muito para jogar e quando o pai não queria dizia que na mãe podia estar com o tablet. Mais referiu que o sobrinho tem um problema de visão (estrabismo, usa óculos e tem que tapar um dos olhos) e o médico estabeleceu que só pode estar cerca de 20 minutos. O irmão cumpre essas regras e o CC agora já nem pede. Finalmente, as referências ao cansaço, implicitamente imputáveis ao facto de o pai ir buscar o filho mais tarde, por trabalhar em Lisboa. A tia KK foi a própria a referir que o CC se queixa de cansaço e, por vezes, até tem olheiras. Perguntada o que provoca esse cansaço, referiu que, pontualmente acontece o CC deitar-se mais tarde. Não se concretizou porquê, mas admitimos que tal aconteça também, por exemplo, nos dias a seguir àqueles em que o CC tem treino de futsal. Esta referência a que se nota um certo cansaço, mais lento a fazer os trabalhos de casa, que tem comportamentos e atitudes que não tinha antes, de distração e alguma rebeldias, e que tal se nota mais nas semanas do pai, foi também efetuada pela testemunha EE, que no entanto, não deixou de referir que até lhe diziam “olha CC, foi das Aiecs”, e que ele por vezes responde que sim, e outras refere que não, queixando-se, por exemplo, de ter dormido mal. Porém, como é uma evidência, tal não determina a modificação dos indicados pontos de facto, nada indicando que mesmo admitindo-se que a criança se apresente mais cansada nos dias em que está com o pai, tal imponha que se considere provado que só a mãe se preocupa com o bem estar do filho e tem competências parentais. Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, não se verifica um erro de julgamento de facto, mas antes uma correta ponderação da prova produzida, nada justificando a pretendida alteração dos factos provados sob os n.ºs 12 e 13, que assim se mantêm. ***** III.2.2. – Da residência alternadaConforme decorre da conjugação do preceituado nos artigos 1874.º, n.º 2, 1878.º, n.º 1, e 1879.º do Código Civil[13], mesmo durante a vida em comum, compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, e administrar os seus bens. Em caso de divórcio ou separação, as responsabilidades parentais mantêm-se e devem ser exercidas no superior interesse das crianças, porquanto a dissolução do casal não extingue a sua co-parentalidade, e, ao invés, acentua a necessidade de uma atitude de concertação e cooperação recíprocas entre os ex-cônjuges, no que tange à sua função parental, no sentido de garantirem aos filhos a possibilidade de um desenvolvimento são e harmonioso da respetiva personalidade, assegurando o seu bem-estar emocional e as suas necessidades materiais. Por isso que, como acima referido, o exercício das responsabilidades parentais tenha que ser regulado, seja por acordo entre os progenitores, sujeito a homologação, seja por sentença proferida no termo do correspondente processo especial. Como refere TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO[14], «A decisão de regulação do exercício das responsabilidades parentais terá por objeto as seguintes questões: fixação da residência da criança, ou seja, com qual dos pais fica a residir; atribuição do exercício das responsabilidades parentais sobre as questões de particular importância a ambos os pais, ou apenas ao progenitor com quem residir se for entendido que o exercício conjunto é contrário aos interesses do filho; atribuir a guarda da criança a terceira pessoa nos termos do art.º 1907.º do C. Civ., bem como quando se verifiquem as circunstâncias referidas no art.º 1918.º do C. Civ.; fixar o montante dos alimentos devidos à criança, bem como o regime de visitas ao progenitor não residente. A regulação do exercício das responsabilidades parentais engloba, assim, as seguintes questões essenciais: fixação da residência da criança; o regime de visitas; a prestação de alimentos a cargo do progenitor com quem não resida habitualmente; podendo ainda consistir na atribuição do seu exercício unilateral das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância para a vida da criança, como decorre dos art.ºs 1905.º e 1906.º, do C. Civ. e n.ºs 1, 2 e 8 do presente artigo». Pois bem, seguindo de perto o referido no acórdão deste TRE de 20.12.2018, sendo indiscutível, atento o que decorre do artigo 1906.º do CC e do artigo 40.º do RGPTC, que o superior interesse da criança é o critério orientador essencial que há-de nortear o julgador na resolução das questões atinentes ao exercício das responsabilidades parentais, conforme impõe, aliás, o artigo 3.º da Convenção sobre os Direitos das Crianças, e que no entender do legislador nacional, a partilha de responsabilidades e a manutenção de uma relação de grande proximidade com ambos os progenitores será, em regra, a solução que melhor serve o seu interesse, importa sublinhar que para efeitos decisórios é este interesse das crianças e jovens, e não o interesse individual de cada um dos seus progenitores, aquele que assume efetiva relevância na ponderação decisória[15]. Ora, no caso vertente, efetuadas as diligências probatórias, e no concernente à fixação da residência, dum quadro de regime provisório em que o CC, de quinze em quinze dias ficava com o pai de sábado a quinta-feira, veio a estabelecer-se quanto ao regime da residência, a residência alternada semanal do menino, com cada um dos progenitores. Insurge-se a Recorrente contra o decidido, pelas ordens principais de razões sumariadas nas conclusões, em síntese, por defender que perante o clima de conflito e desconfiança entre os progenitores, e considerando a tenra idade da criança, com apenas 8 anos, entendemos que para salvaguardar o superior interesse do CC não deve ser adotada a residência alternada, que iria implicar uma exposição muito acentuada deste aos conflitos entre os progenitores com todos os inconvenientes que daí poderão advir para a sua estabilidade e para a sua saúde física e psíquica.. Mas, a nosso ver, sem qualquer razão, isto apesar de os autos, de um lado, infelizmente evidenciarem a conflitualidade entre os progenitores, que não se têm mostrado capazes de dialogar sobre as questões relevantes e necessárias na vida do filho, surgindo conflitos entre eles sobretudo relacionados com a concretização e tempo de permanência da criança com cada um, comunicando geralmente por e-mail e SMS (facto provado 15.); e, do outro lado, felizmente reportarem que o CC, apesar dessa litigiosidade, é um menino tranquilo e bem-disposto (facto provado 8), que manifesta forte ligação afetiva a ambos os progenitores (facto provado 14), que têm ambos competências parentais e condições habitacionais, dispondo o CC de quarto para a sua própria utilização em cada uma das casas (factos provados 4., 10., e 13.). Na verdade, é sabido que, entre outras condições desejáveis, um quadro de entendimento entre os progenitores, potencia o sucesso de um regime de residência alternada, conforme se afirmou no Acórdão deste Tribunal da Relação de 22-03-2018[16], já que, mesmo no quadro legal então vigente se defendia que nada impedia «que os progenitores, por acordo, e desde que satisfaça os superiores interesses do filho, estabeleçam a residência alternada no âmbito do exercício conjunto das responsabilidades parentais». Porém, como também se afirmou, «a fixação do regime de residência alternada não depende do acordo dos progenitores, devendo ser decretado pelo Tribunal sempre que, sopesados os riscos associados às posições divergentes dos pais, for de concluir, ainda assim, que o superior interesse da criança o aconselha». Na verdade, já então se ponderava que «não se desconhece que alguma doutrina e jurisprudência, também citada pela apelante, fazem depender a fixação da residência alternada do acordo dos progenitores. Concedendo que nesses casos o regime fixado será de mais fácil execução – sendo certo que, em bom rigor, e face ao acordo dos pais, parece dispensável a intervenção do tribunal para decidir a questão da residência, salvo se aquele se revelar desajustado no caso concreto – decorre do que acima se deixou referido a propósito da melhor interpretação do citado art.º 1906.º que não perfilhamos o referido entendimento, devendo o tribunal optar pela residência alternada sempre que, a despeito do desacordo dos progenitores, sopesados os riscos associados, concluir, ainda assim, que o superior interesse da criança o aconselha (cf., neste sentido, acs. deste mesmo TRE de 9/11/2017, processo 1997/15.1T8STR-E1, e do TRC de 24-10-2017, 273/13.9TBCTB-A.C1, acessíveis em www.dgsi.pt)». Acontece que, a recente Lei n.º 65/2020, de 4 de novembro, veio estabelecer as condições em que o tribunal pode decretar a residência alternada do filho, em caso de divórcio ou separação, alterando o Código Civil no sentido que já antes preconizávamos, decorrendo atualmente do artigo 1906.º, n.º 6, do CC, que: «6 - Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos.» Portanto, esta alteração veio tornar expressa a possibilidade de ser fixado o regime de residência alternada, mesmo para os casos em que não haja mútuo acordo entre os progenitores nesse sentido, como acontece na situação em presença, onde apenas o progenitor defende tal solução, enquanto a progenitora pretende que o interesse do filho só é acautelado com a fixação da residência junto de si, e com o estabelecimento de um regime de visitas ao pai. Porém, ressalvada a situação de conflitualidade entre os progenitores (que abaixo veremos mais detalhadamente), nada há em desabono de nenhum dos pais que desaconselhe que a criança esteja igual tempo com cada um dos progenitores, porquanto o CC gosta de estar com os dois e tem forte ligação afetiva a ambos, sendo que mãe e pai têm competências parentais adequadas e condições habitacionais, relevando neste aspeto considerar que perpassa dos autos que as residências são próximas do centro de vida escolar e lúdico da criança, facilitando, portanto, este tipo de regime, que, se bem virmos, ainda que não na sua plenitude, já ocorre desde o regime provisório fixado em abril de 2021, em cerca de 60/40 de divisão do tempo da criança, respetivamente, junto de mãe e pai, de 15 em 15 dias. A questão que se poderá colocar é a de saber se existe na situação de vida em presença algum fator que desaconselhe o regime decretado pelo tribunal, e a resposta não pode deixar de ser negativa. Aliás, verifica-se até que a própria mãe aceitaria, sucedaneamente, que o regime provisório fixado se tornasse definitivo. E, também por isso, se evidencia, que não há nada no comportamento dos progenitores com o CC, e concretamente por parte do pai, que objetivamente desaconselhe esse regime igualitário de partilha da residência, que foi fixado na decisão recorrida. Dissente a Recorrente, considerando que não existem condições para estabelecer tal regime de residência alternada, em face da conflitualidade entre os progenitores e da tenra idade do filho. Ora, em boa verdade, uma criança de 8 anos, não pode já considerar-se de “tenra idade”, já ultrapassou a fase da primeira infância (que comummente se considera ser até aos 6 anos de vida), encontra-se em idade escolar, e não depende exclusivamente da mãe para a satisfação sequer da alimentação (como um bébé dependeria, sendo que, mesmo nesses casos, já existem formas de conservar o leite materno). Mas, mesmo que ainda fosse uma criança de tenra idade, conforme impressivamente se referiu no Acórdão do TRP de 13.05.2014[17], “O critério da preferência maternal não pode ser hoje, por si só, o critério determinante para fixar a residência do menor, nos casos de tenra idade. Este elemento tem que ser conjugado com todos os outros elementos disponíveis a fim de se apurar da capacidade de cada um dos progenitores para ter o filho a viver consigo”. Acresce que, é sabido que quando as crianças são mais novas, têm maior facilidade de adaptação a novas circunstâncias, especialmente quando se sentem seguros pela presença do pai ou da mãe. Sem embargo, como se sublinhou no Acórdão do TRG, de 02.11.2017[18], o certo é que, num caso de separação “sempre as crianças terão de se adaptar a uma nova realidade (qualquer que ela seja!). A verdade é que os pais já não vivem juntos e, com residência alternada ou sem ela, o dia-a-dia das crianças nunca mais voltará a ser o mesmo”, considerando que “a residência alternada é o regime que melhor evita conflitos de lealdade e sentimentos de abandono ou de rutura afetiva. Só a residência alternada faz convergir os progenitores para a efetiva participação mútua na vida dos filhos, porque permite que os pais continuem a dividir atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, ou seja, tal regime permite concretizar o princípio da igualdade de ambos os progenitores, no exercício das responsabilidades parentais”. Com efeito, a mudança de paradigma, também legal, “impõe que a residência alternada surja hoje, não só, como uma das soluções a equacionar, mas ainda que, na tomada de decisão sobre a entrega da criança, se deva avaliar, em primeiro lugar, a aplicação do regime de residência alternada e, só se a mesma não se mostrar adequada ao caso concreto e não for aquela que melhor salvaguarda os interesses da criança, ponderar se a residência deve ser fixada junto do pai ou da mãe”[19]. Como se refere no acórdão deste Tribunal de 06.12.2018[20], a residência alternada «tem por norma como vantagem clara promover o contacto e consequente desenvolvimento de relações afetivas em termos iguais entre ambos os progenitores, bem como por esta forma possibilitar que ambos possam ter um papel ativo e responsável na educação e desenvolvimento da criança, satisfazendo o princípio da igualdade destes previsto quer na CRP (vide artigos 13º e 36º nºs 3 e 5) quer na Convenção sobre os Direitos da Criança [CDC] (vide artigo 18º desta última, adotada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990). Na guarda ou residência alternada, são reconhecidas como adicionais vantagens, a preservação da relação em modos igualitários com ambos os progenitores, em moldes similares à situação experienciada em momento anterior à separação, reduzindo o risco e a incidência da “alienação parental”, bem como o potencial conflito parental e consequentemente situações de incumprimento, entre outras (…)». No caso em presença, é uma evidência que os progenitores têm tido divergências e conflitos, especialmente a respeito do tempo que o filho pode/deve, na visão da mãe, estar com o pai. E, sobretudo, adotaram uma forma de “comunicação”, que seguramente, atenta a extensão de alguns e-mails, há-de ser desgastante para ambos, nada resolve, e, sejamos claros, apenas parece ocorrer para que possam depois ser usados os emails e as mensagens como uma espécie de prova do que se vai se passando no dia-a-dia. Quem fez, ou não fez o quê, o que disse e não devia ter dito, o que não comunicou e devia ter comunicado, manifestações de descontentamento com comportamentos, enfim, uma panóplia de situações objetivamente escusadas, se ambos os progenitores aceitassem que, com a separação do casal, têm necessariamente que encontrar forma de agilizarem as questões referentes à vida do filho, de forma natural. Como certeiramente referiu a testemunha JJ, que conhece os pais do CC há tanto tempo quanto a criança tem de vida, “isto resolvia-se tudo se em vez de mandarem emails e mensagens, falassem”. Mas, será que esta “prova” de conflitualidade deve obstar a que o tribunal considere que o superior interesse da criança é estar alternadamente com cada um dos pais? Cremos que não. Como se afirmou no Acórdão do TRL de 06.02.2020, «se a falta de capacidade de diálogo, entendimento e cooperação entre os progenitores não impede o exercício conjunto das responsabilidades parentais, ela não impede também, nem poderia impedir, a residência alternada. Aquelas capacidades só têm a ver com a necessidade de respeito pelas orientações educativas mais relevantes por eles tomadas para o exercício em comum das responsabilidades parentais e de não se porem em causa as condições para esse exercício». Aliás, se assim fosse, estaria encontrada a forma de potenciar conflitos infundados, de criar uma tempestade num copo de água, visando evitar a residência alternada e favorecer a alienação parental! Dito de outra forma, como no último referido aresto «exigir a ausência de conflito para permitir a residência alternada, nos termos em que essa exigência está a ser feita, traduz-se em negar a possibilidade de residência alternada sempre que um dos progenitores não a quer. O que, afinal, é o mesmo que dizer que a residência alternada não pode ser fixada sem o acordo dos pais. Isto não pode ser assim, sob pena de se estar a dar razão ao progenitor que desencadeia ou agudiza o conflito para evitar a residência alternada. E sempre seria de averiguar quem é que é o responsável ou o maior responsável pelo conflito, e apurando-se que o é o progenitor que não quer a residência alternada, não decidir, apesar disso, atribuir-lhe, como se fosse um prémio, a residência única. E para além disso é contraproducente para os interesses dos filhos, que era o que devia estar em causa: se, nos processos, se puder defender a tese de que se houver conflito entre os progenitores não deve ser fixada a residência alternada, os conflitos serão exacerbados artificialmente para o efeito, por aqueles que querem a residência fixa». Ao invés da preconizada ausência de conflito, há é que avaliar o circunstancialismo em presença, e distinguir conflitos fundados em situações de elevada gravidade (como são os previstos no artigo 1906.º-A), dos decorrentes da alteração da vida dos adultos e das crianças decorrente da rutura familiar, estes amiúde revelados, como no caso dos autos, essencialmente por questões de logística, e pela imputação de não comprovadas dificuldades do pai em cumprir o regime provisório anteriormente fixado. Nestes casos, mesmo não existindo acordo dos pais, a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais, viabilizando a presença de ambos os pais na vida do filho, presença que é fundamental para o seu desenvolvimento integral e harmonioso, sendo dever dos pais, ao invés de gastarem as suas energias em acusações mútuas, revelarem o seu amor pelo filho através de uma atuação colaborante um com o outro, que revele a sensatez e a maturidade de saber alterar pontualmente o estabelecido, por exemplo, quando um deles está mais disponível e o outro não, tudo em prol da prossecução da estabilidade afetiva e emocional do CC, favorecendo o seu desenvolvimento seguro e não o colocando na situação de sentir que tem de esconder junto de um dos progenitores o sentimento de afeto que tem pelo outro, ou seja, não fazendo da vida do filho um conflito de lealdade constante, e com o tempo a criança sentirá que pertence aos dois lares em igualdade de circunstâncias. Em suma, devem os pais trabalhar os seus sentimentos, se necessário com recurso a ajuda profissional, dando prioridade aos reais interesses do filho, e aprendendo a desvalorizar o que hoje ainda veem como problemas e conflitos inultrapassáveis entre ambos, os quais, assim queiram, o tempo se encarregará de colocar no lugar próprio, ultrapassado que seja este período inicial mais conturbado que têm vivido. Ora, para isso, ao contrário do que preconiza a Apelante, a residência alternada, pode ser mesmo a melhor solução, também para os pais. Sabendo ambos com o que contam, adequarão as suas vidas pessoais e profissionais de molde a estarem mais livres na semana em que têm o CC consigo, compensando, designadamente a atividade profissional na semana em que o filho está com o outro. Sabendo que o CC ficará alternadamente com cada um, adaptarão as rotinas, e, a pouco e pouco, a necessidade que têm atualmente de enviar emails por tudo e por nada, irá desaparecendo, pois cada um saberá o que tem que enviar com o CC, e aquilo que ele terá já na casa do outro progenitor e que não precisará de andar duma casa para a outro. Conforme se salientou no Acórdão do TRL, proferido no processo n.º 20994/15.0T8SNT-E.L1-7, «o histórico da conflitualidade dos progenitores, nomeadamente a sua persistência ou agudização após a separação dos progenitores, constitui um elemento a ponderar na decisão a tomar, sem que seja de lhe atribuir um valor tão sintomático e perentório para a decisão a enunciar pelo tribunal, como é assumido pela jurisprudência que sustenta a inadequação da residência alternada quando ocorre ambiente de elevada conflitualidade entre os progenitores. Não são as crianças que têm de se acomodar às idiossincrasias, inseguranças e conflitos dos progenitores, pelo contrário, são os progenitores que têm de se reinventar e de se superar, aperfeiçoando competências para suprir as necessidades e zelar pelo superior interesse dos filhos». In casu, como já referido, nada havendo de objetivamente obstaculizante ao exercício responsável da parentalidade por cada um dos progenitores, não podem estes olvidar que os motivos que estiveram na base da sua separação estão nos antípodas do sentimento que os uniu e do qual nasceu o CC. Portanto, ao invés de prolongarem através do filho a discórdia, disputa e desentendimento, provocando na criança sentimentos de tristeza, angústia, ansiedade, e chamadas de atenção, deverão antes, num exercício de maternidade e paternidade responsável, aprender a resolver, se necessário com recurso ao devido acompanhamento, as questões respeitantes ao filho, centrando-se no essencial, e aprendendo a relacionar-se para lhe proporcionarem um crescimento saudável e harmonioso, protegido dos sentimentos negativos que advieram para os adultos com o fim do seu relacionamento. Na situação em presença, estamos perante criança que se encontra a crescer de forma saudável e harmoniosa, apesar dos desentendimentos que têm ocorrido entre os pais. Assim, caso não seja negativamente influenciado, estamos em crer que não obstante os progenitores tenham dificuldade em gerir as suas diferenças e pontos de vista quanto ao que é melhor para o CC, como os principais momentos de conflito têm incidido precisamente nas divergências quanto à divisão dos tempos de cada um deles com o filho, que o regime de residência alternada semanal, tal como preconizado na sentença recorrida, se venha inclusivamente a mostrar benéfico para diminuir os conflitos entre ambos, já que não precisam de estar sempre em contacto para esse efeito e cada um deverá articular os seus tempos com a criança e a sua família alargada na semana em que o filho está consigo, afigurando-se-nos que na situação em apreço, não só será este o regime que melhor serve os interesses da criança, potenciando a possibilidade de uma vivência equilibrada com cada um dos progenitores, como será o regime que melhor poderá potenciar uma diminuição da litigiosidade que tem estado associada à questão da partilha da residência. Em nota final, dir-se-á ainda que bem sabemos que ambos os progenitores gostariam de estar sempre com o filho, não sendo fácil gerir o tempo em que tal não acontece. Porém, essa dificuldade decorre das circunstâncias da vida dos adultos que levaram à separação do casal e aplica-se a ambos os progenitores. Assim, se ambos os pais se entenderem – o que o bem estar do seu filho vivamente aconselha –, nada obstará a que durante a alternância fixada, existam diariamente conversas telefónicas e/ou com recurso a um meio de comunicação que permita a visualização da criança, ou mesmo um jantar a meio da semana com aquele dos progenitores com quem o CC não está nessa semana, o que estamos convictos que cada um dos progenitores terá todo o interesse em facilitar ao outro, porque sabe que terá também idêntico tratamento na semana seguinte, atenuando assim não apenas o tempo em que cada um deles não está com o filho, como o tempo em que este não está com esse progenitor, tudo em prol do bem estar da criança e, por reflexo, de cada um deles. O bom senso aconselha que o cartão de cidadão, que é só um, acompanhe o menor. Pelo exposto, a apelação da Recorrente improcede, sendo de manter a decisão que determinou a residência alternada do CC com cada um dos progenitores. ***** III.2.3. – Da pensão de alimentosPretende o Apelante que a decisão recorrida seja revogada no segmento atinente à fixação da pensão de alimentos estabelecida a seu cargo, invocando, em suma, que concordou com o valor provisoriamente estabelecido porque o filho estava consigo em percentagem de tempo inferior àquele que passava com a mãe, não se justificando agora o estabelecimento de qualquer valor, uma vez que os rendimentos da mãe são de valor equivalente ao seu. Apreciando. Quanto à vertente patrimonial das responsabilidades parentais, expressa na obrigação de prestação de alimentos, importa recordar que esta obrigação, seja qual for o seu fundamento, encontra-se sujeita, por inteiro, ao princípio da relatividade[21]. De facto, a noção genérica de «alimentos» é-nos dada pelo artigo 2003.º, n.º 1, do CC, de acordo com cuja previsão «por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário», sendo a sua medida determinada nos termos do disposto no artigo 2004.º do CC, ou seja, «os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los», atendendo-se ainda na respetiva fixação «à possibilidade de o alimentando prover à sua subsistência», o que não se aplica ao caso. Tentando concretizar a noção legal de alimentos à luz de uma existência digna, a doutrina e a jurisprudência têm ainda densificado o princípio da proporcionalidade ínsito no artigo 2004.º, através do binómio necessidade do alimentando/possibilidade do obrigado, e da avaliação da possibilidade de aquele prover à sua subsistência, quando é o caso. Porém, tem sido também consistentemente afirmado que «a obrigação parental de alimentos é mais extensa que a obrigação alimentar comum, dado que não se mede pelas estritas necessidades vitais da criança, antes visa assegurar-lhe um nível de vida, económico-social idêntico aos dos pais - mesmo que já se encontrem dissociados; neste caso, deve atender-se ao nível de vida de que os pais desfrutavam na constância da união parental»[22]. Conforme é sabido - e temos vindo a afirmar, designadamente no Acórdão deste Tribunal de 09.03.2017[23] -, de acordo com o disposto nos artigos 2009.º, n.ºs 1 e 2, e 2010.º do Código Civil, a vinculação à obrigação de prestar alimentos encontra-se legalmente deferida pela ordem ali indicada nas sucessivas alíneas, encontrando-se em igualdade de posições nessa obrigação os ascendentes [alínea c)], salvo se algum dos onerados não puder satisfazer a parte que lhe cabe, caso em que o encargo recai sobre os demais obrigados. Assim, havendo uma desproporção evidente entre os rendimentos dos progenitores, mesmo em casos de fixação de residência alternada justifica-se a fixação de uma pensão a suportar por aquele dos dois que tenha maiores possibilidades. In casu, os factos provados não permitem concluir, em termos concretos, pelas necessidades do menor (aceitando ambos os progenitores a comparticipação em metade das despesas médicas, medicamentosas, do prémio de seguro, e escolares, incluindo ATL/centro de estudos/transporte escolar, e bem assim, com atividades extracurriculares que a criança frequente com o acordo de ambos os progenitores, nos termos previstos no ponto 10), e das possibilidades dos progenitores apenas foi demonstrado o vencimento do Apelante, num valor de cerca de 1.000,00€ mensais, nada se tendo demonstrado também quanto às despesas de cada um, falta de prova que corre por conta de cada um deles nas partes que lhes seriam favoráveis[24]. Revertendo estes princípios gerais ao caso em presença, e relativamente às possibilidades da mãe, como vimos, mercê da alteração da matéria de facto que vinha dada como provada da primeira instância, não se demonstrou que o valor por si auferido fosse (apenas) próximo do salário mínimo. Mas, pese embora não se tenha demonstrado qual o valor concretamente auferido pela Apelada na sua atividade profissional independente, parece-nos seguro dizer que o valor da atividade de explicadora, que vem sendo desenvolvida pela requerente em horário bastante alargado, não terá um valor médio compatível com o que consta na declaração de janeiro de 2021. Mesmo admitindo que a requerente tenha um valor/hora muito baixo nos Centros de Estudos onde trabalha, se bem virmos, no requerimento inicial, tendo pedido que a residência fosse fixada junto de si, e a repartição das despesas de saúde, educação, e extraescolares (nestas se incluindo “centro de estudos, serviço de transporte personalizado, futsal e natação”), a Requerente propunha que o Requerido pagasse uma pensão de alimentos de 150€. Assim, não sendo excessivo (pelo contrário) se computarmos um valor médio de despesa diária com a criança em 10€ (não olvidemos que nesta se encontra a alimentação, vestuário, calçado, etc.), inferimos que a Requerente admitiu suportar com o filho, pelo menos – sublinha-se –, o mesmo valor que propunha fosse despendido pelo Requerido, donde se depreende que receberá, pelo menos, um valor mensal global próximo do recebido pelo requerido, tanto assim que, podendo trazer aos autos elementos que concretizassem os seus rendimentos, nunca o fez, sendo que, a ausência dessa prova, não a pode favorecer. Consequentemente, não estando demonstrado que exista entre os progenitores uma acentuada discrepância de rendimentos, que justifique a atribuição de pensão de alimentos àquele progenitor que, por ter menos possibilidades, devesse ver essa menor capacidade de suprir as necessidades do filho quando consigo se encontra pelo outro, por forma a que o menor beneficiasse sempre de um nível de vida semelhante, estando repartidas igualitariamente as sobreditas despesas, e agora também o tempo em que o CC está a viver com cada um dos progenitores, não deve manter-se a decisão recorrida no segmento em que determinou que o Apelante devia pagar uma pensão de alimentos para o filho, anualmente atualizada. Nestes termos, procede a apelação interposta pelo Recorrente, sendo de revogar os pontos 8 e 9 da decisão recorrida, eliminando-se o ponto 9. e devendo o ponto 8 passar a ter a seguinte redação: «Não se fixa qualquer quantia a título de pensão de alimentos, devendo cada um dos progenitores prover ao sustento do filho no período em que este esteja consigo». ***** IV - DecisãoPelo exposto, acordam os juízes desta conferência: a) na improcedência da Apelação interposta pela progenitora, AA, em confirmar a sentença, mantendo a residência alternada da criança CC, com cada um dos progenitores, nos termos fixados no ponto 1.º do dispositivo; b) na procedência da Apelação interposta pelo progenitor, BB, em revogar os pontos 8.º e 9.º da sentença recorrida, eliminando o ponto 9.º e passando a constar no ponto 8.º, a seguinte redação: «Não se fixa qualquer quantia a título de pensão de alimentos, devendo cada um dos progenitores prover ao sustento do filho no período em que este esteja consigo». c) Vencida, a Apelante suporta as custas devidas, na vertente de custas de parte, atento o princípio da causalidade e o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, 529.º, n.ºs 1 e 4, e 533.º, todos do CPC. ***** Évora, 16 de março de 2023 Albertina Pedroso [25] Francisco Xavier Maria João Sousa e Faro __________________________________________________ [1] Juízo de Família e Menores de Setúbal - Juiz 1. [2] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: Francisco Xavier; 2.ª Adjunta: Maria João Sousa e Faro. [3] Doravante abreviadamente designado CPC. [4] Modificação efetuada na sequência da reapreciação da matéria de facto provada. [5] Cfr. neste sentido, AMÂNCIO FERREIRA, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª Edição, Almedina 2009, pág. 215. [6] Cfr. neste sentido, LUÍS BRITES LAMEIRAS, in Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2.ª Edição Aumentada e Reformulada, ALMEDINA, pág. 123. Na mesma linha de pensamento, cfr. JOÃO ESPÍRITO SANTO, in O DOCUMENTO SUPERVENIENTE, ALMEDINA, 2001, nomeadamente páginas 45 e ss. Aí se refere, inter alia, que o pressuposto da admissibilidade da junção de documentos em sede recursiva tem em mira “contradizer, …, meios de prova introduzidos de surpresa no processo, que venham a pesar na decisão” (pág. 50). Este Autor refere-se, ainda, a um segundo caso, admitido por ANTUNES VARELA (Anotação ao acórdão do STJ, de 9/12/1980, RLJ, Ano 115, página 95): hipótese de uma decisão baseada em preceito jurídico com cuja aplicação as partes não tivessem contado. [7] Doravante abreviadamente designado CC. [8] Doravante abreviadamente designado RGPTC. [9] Cfr. ANTUNES VARELA, MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO e NORA, in MANUAL DE PROCESSO CIVIL, 2.ª Edição, Revista e Actualizada, COIMBRA EDITORA, 1985, págs. 533 e 534. JOÃO ESPÍRITO SANTO, pág. 49, refere: “… o móbil fulcral e único que possibilita a junção é a sentença da primeira instância.”. [10] Cfr. ABRANTES GERALDES, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, ALMEDINA 2013, pág. 225. [11] Cfr. neste sentido, Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 3.ª Edição Revista e Actualizada, pág. 313; e na jurisprudência de forma meramente exemplificativa, Ac. STJ de 24-05-2012, processo n.º 850/07.7TVLSB.L1.S2, disponível em www.dgsi.pt. [12] Cfr. Acórdão do STJ de 25.01.2006, proferido no Processo n.º 05P3460, e disponível em www.dgsi.pt. [13] Doravante abreviadamente designado CC. [14] In “Regime Geral do Processo Tutelar Cível, Anotado e Comentado”, Quid Juris, 2017, 2.ª Edição, págs. 126 e 127. [15] Cfr. neste sentido, inter alia Acórdão do STJ de 04.02.2010, Proc. 1110/05.3TBSCD.C2,P1, disponível em www.dgsi.pt. [16] Proferido no processo n.º 297/15.1T8PTM-C.E1. [17] Proferido no processo n.º 5253/12.9TBVFR-A.P1. [18] Proferido no processo n.º 996/16.0T8BCL-C.G1. [19] Cfr. Ac. TRC, proferido no processo n.º 623/17.9T8PBL.C1. [20] Proferido no processo n.º 2641/15.2T8PTM.E1, citando Clara Sotto Mayor, in Temas de Direito das Crianças, ed. 2016 - Almedina, “Entre idealismo e realidade: a dupla residência das crianças após o divórcio”, p. 72/73. [21] Cfr. Manuel de Andrade, RLJ Ano 77, pág. 226. [22] Cfr. Ac. TRL de 07.04.2011, proferido no processo n.º 9079/10.6TBCSC.L1-2, disponível em www.dgsi.pt. [23] Proferido no processo n.º 26/12.1TBPTG-D.E1, e disponível em www.dgsi.pt. [24] Cfr. neste sentido, Ac. TRL de 06.02.2020, disponível em www.dgsi.pt. [25] Texto elaborado e revisto pela Relatora, e assinado eletronicamente pelos juízes Desembargadores que compõem esta conferência. |