Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
398/13.0TTSTB.E1
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
LIBERDADE CONTRATUAL
DEVER DE LEALDADE
CLÁUSULA PENAL
Data do Acordão: 06/25/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
i. Não obstante ter havido transmissão de estabelecimento – enquanto unidade económica ou conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória (art. 285º n.º 5 do CT) – entre a anterior entidade empregadora da R. e uma outra empresa, transmissão operada para produzir efeitos a partir de 1 de maio de 2012, tendo-se transmitido, a partir de então, para a adquirente a posição contratual de empregador da aqui R. por força do disposto no n.º 1 deste art. 285º do Código do Trabalho, nada obstava que esta “motu próprio” e no âmbito da sua autonomia privada e pleno gozo de liberdade contratual de que sempre dispunha por força do art. 405º do Código Civil, ao invés de, naquela data, ter, naturalmente, passado a exercer funções laborais ao serviço da empresa adquirente do referido estabelecimento, optasse antes por aceitar um acordo que, então, lhe foi proposto por uma outra empresa do grupo desta, estabelecendo com ela e a partir de então um novo contrato de trabalho;
ii. Demonstrando-se que em pleno desenvolvimento desta nova relação laboral, a R., sem qualquer consentimento prévio da sua entidade empregadora se predispôs a ser e foi efetivamente nomeada como vogal do conselho de administração e administradora delegada de uma outra sociedade com ela concorrente, não há dúvida que a R. não poderia deixar de ter a perfeita noção de que, ao participar, em tais termos, na referida sociedade, estava a incorrer em clara violação do dever de lealdade na vertente de obrigação de não concorrência, em relação à sua entidade empregadora;
iii. Como consequência, assiste à A. – entidade empregadora da R. – o direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos por esta sofridos, com um mínimo estabelecido, a título de cláusula penal, no próprio contrato de trabalho entre ambas firmado.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora.

I. Relatório.
BB – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., intentou a presente ação emergente de contrato de trabalho contra CC, com os demais sinais identificadores nos autos, pedindo que seja a R. condenada a pagar-lhe indemnização de montante não inferior a € 60.000 pelos prejuízos sofridos, ou, caso assim não se entenda, a pagar-lhe a quantia de € 53.900 correspondente à soma das cláusulas penais fixadas nas cláusulas 8.4 e 9.2 do contrato de trabalho, quantias a que acrescem juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento.
Fundamenta a A. a sua pretensão na existência de um vínculo laboral com a R., que veio a cessar em 20/09/2012, e na violação pela R. do estipulado no contrato de trabalho, por ter desempenhado funções para a empresa DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., a título profissional e remunerado, em data em que ainda era trabalhadora da A., na violação do dever de lealdade e da obrigação de não concorrência para com a sua entidade empregadora e na prática de condutas que integram concorrência desleal.
Regularmente citada para os termos da ação, a R. apresentou contestação, invocando a nulidade do contrato de trabalho celebrado entre a A. e a R., por violação do disposto no art. 285.º do Código do Trabalho, e a compensação de créditos, por ter sido reduzido o valor mensal da sua retribuição e terem deixado de ser pagas ajudas de custo, e impugnando os factos alegados pela A., nomeadamente sustentando não ter exercido qualquer tipo de atividade para a sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., até 12/10/2012, apesar de formalmente nomeada administradora.
Defendeu, ainda, a R. serem as cláusulas penais estabelecidas no contrato de trabalho manifestamente excessivas.
Notificada, a A. respondeu à contestação, pugnando pela improcedência das exceções invocadas e sustentando a validade do contrato de trabalho celebrado entre as partes.
Foi proferido despacho saneador, no qual foi dispensada a fixação dos factos assentes e da base instrutória.
Procedeu-se à realização da audiência e discussão de julgamento, tendo sido consignada a matéria de facto provada e não provada, sem reclamações.
Seguidamente foi proferida sentença que culminou com a seguinte decisão:
«Por tudo o exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência, condeno a R. CC a pagar à A. BB – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., a quantia de € 26.950, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, e absolvo a R. do mais peticionado.
Custas a cargo da A. e da R., na proporção do respectivo decaimento (art. 527.º, do Novo Código de Processo Civil).»
Inconformada com esta sentença dela veio a R. CC interpor recurso de apelação para esta Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes conclusões:
1. O presente recurso de apelação vem interposto da sentença proferida a fls. dos autos, doravante designada, apenas, por decisão recorrida, na parte em que (i) concluiu pela validade do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012, (ii) julgou improcedente a excepção de compensação de créditos invocada pela Recorrente, (iii) condenou a Recorrente a pagar à Recorrida a quantia de € 26.950,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, a título de indemnização pela alegada violação do dever de lealdade e da obrigação de não concorrência a que estava obrigada por força da cláusula 9.ª, do referido contrato de trabalho, e (iv) não considerou manifestamente excessiva a cláusula penal constante da cláusula 9.2 do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012, não tendo, assim, procedido à sua redução, de acordo com a equidade, ao abrigo do disposto no artigo 812.º, n.º 1, do Código Civil;
2. A unidade económica consubstanciada no conjunto de meios organizados pela sociedade EE – Sociedade Unipessoal, Lda. (de ora em diante abreviadamente designada por EE) - anterior entidade empregadora da Recorrente - e pela sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., transmitiu-se para a sociedade BBB Services, Lda., com efeitos a partir de 01 de Maio de 2012;
3. Na sequência dessa transmissão, a posição de empregador no contrato de trabalho que a Recorrente celebrou com a sociedade EE, em 17 de Agosto de 2009, transmitiu-se para a sociedade BBB Services, Lda., com efeitos a partir de 01 de Maio de 2012, por força do disposto no artigo 285.º, n.º 1 do Código do Trabalho, motivo pelo qual a Recorrente se apresentou ao serviço na sede da sociedade BBB Services Lda.;
4. Porém, quando a Recorrente se apresentou ao serviço na sede da sociedade BBB Services Lda. – onde se situa igualmente a sede da Recorrida – foi-lhe apresentado, nessa ocasião, um contrato de trabalho por tempo indeterminado com a Recorrida, que é uma sociedade do grupo da sociedade BBB Services Lda., e que a Recorrente acabou por subscrever;
5. No entanto, tendo a sociedade BBB Services Lda., passado a ser o empregador da Recorrente, a partir do dia 01 de Maio de 2012, por força do disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho, o contrato de trabalho por tempo indeterminado celebrado entre a Recorrente e a Recorrida em 01 de Maio de 2012 viola a norma imperativa constante do referido artigo 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho, e, consequentemente, é nulo, nos termos previstos no artigo 280.º, n.º 1, do Código Civil, pois, se assim não fosse, estaríamos perante uma verdadeira fraude à lei, in casu, ao estabelecido no artigo 285.º, n.º 1 do Código do Trabalho, o qual visa precisamente acautelar os legítimos direitos dos trabalhadores numa situação de transmissão de empresa ou estabelecimento, como foi o presente caso;
6. Ao invés, a decisão recorrida considerou válido o contrato de trabalho por tempo indeterminado celebrado entre a Recorrente e a Recorrida em 01 de Maio de 2012, com base nos argumentos seguintes: a Recorrida e a sociedade BBB Services, Lda., exercem actividade económica diversa; a Recorrente foi desenvolver na Recorrida actividade diversa da que exercia no seu primitivo empregador; não estamos perante pluralidade de empregadores porque “a R. deixou de prestar trabalho para a BBB Services, Lda.”; e a Recorrente goza de liberdade contratual, nada impedindo que celebre contrato de trabalho com entidade diferente, não se tendo provado que a sua vontade estivesse viciada, aquando da assinatura do contrato de trabalho com a Recorrida;
7. No que respeita ao argumento de que a Recorrida e a sociedade BBB Services, Lda., exercem actividade económica diversa, o mesmo não corresponde à realidade, pois, conforme consta da motivação da decisão de facto (fls….da resposta à matéria de facto) a testemunha GG “em várias ocasiões fez referência à prestação de serviços de trabalho temporário e de outsourcing indiferenciadamente e que estavam distribuídos pelas duas sociedades do grupo”;
8. No que respeita ao argumento de que a Recorrente foi desenvolver na Recorrida actividade diversa da que exercia no seu primitivo empregador, o mesmo também não corresponde à realidade, porque as funções da Recorrente consistiam exactamente no mesmo e tinham o mesmo objectivo, quer na primitiva entidade empregadora (EE), quer na Recorrida, motivo pelo qual o contrato de trabalho por tempo indeterminado celebrado entre a Recorrente e a Recorrida, em 01 de Maio de 2012, não tinha, sequer, período experimental;
9. No que respeita ao argumento de que não estamos perante pluralidade de empregadores, porque “a R. deixou de prestar trabalho para a BBB Services, Lda.”, o mesmo, salvo o devido respeito, não faz sentido, porque se a sociedade BBB Services Lda., passou a ser o empregador da Recorrente, a partir do dia 01 de Maio de 2012, e se na mesma data (01 de Maio de 2012), a Recorrente e a Recorrida celebraram um contrato de trabalho por tempo indeterminado, então, a Recorrente não chegou a prestar trabalho para a sociedade BBB Services Lda., e, consequentemente, a Recorrente não pode ter deixado de prestar trabalho para a sociedade BBB Services Lda.;
10. No que respeita ao argumento de que a Recorrente goza de liberdade contratual, nada impedindo que celebre um contrato de trabalho com uma entidade diferente, o mesmo apenas poderia fazer algum sentido se iniciativa de celebrar um contrato de trabalho com uma entidade diferente, neste caso, com a Recorrida, tivesse sido da Recorrente, o que não foi o caso, porque tal iniciativa foi da Recorrida;
11. Acresce que, como é sabido, o trabalhador encontra-se normalmente limitado e numa situação de desvantagem face ao empregador, especialmente num caso como este em que a Recorrente viu, por facto alheio à sua vontade, a sua entidade empregadora ser alterada da EE para a sociedade BBB Services Lda.;
12. A Recorrente, quando se apresentou ao trabalho na sede da sua nova entidade empregadora – a sociedade BBB Services Lda. – é óbvio que não teve liberdade, nem se sentiu minimamente em posição de negociar o que quer que fosse com a Recorrida, tanto mais que na sede da sociedade BBB Services Lda. se situa igualmente a sede da Recorrida e que esta é uma sociedade do grupo da sociedade BBB Services Lda., pois, naturalmente, receava as consequências negativas que poderiam advir de tal posição;
13. A decisão recorrida, na parte em que concluiu pela validade do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012, violou o disposto no artigo 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho, e no artigo 280.º, n.º 1, do Código Civil, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito;
14. Através do acordo de cessão de posição contratual que celebrou no dia 28 de Março de 2012, a sociedade BBB Services, Lda., assumiu os contratos de trabalho celebrados com as trabalhadoras permanentes responsáveis na sociedade EE, entre as quais, a Recorrente, mantendo e garantindo, designadamente, as condições contratuais constantes do seu Anexo II, de acordo com o qual a Recorrente tinha direito a auferir um vencimento base ilíquido mensal de € 2.100,00, acrescido de uma ajuda de custo no valor ilíquido mensal de € 250,00;
15. A partir de 01 de Maio de 2012, a Recorrida passou a pagar à Recorrente um vencimento base ilíquido mensal de € 1.925,00 e não lhe pagou qualquer ajuda de custo no valor ilíquido mensal de € 250,00, diminuindo, assim, a retribuição da Recorrente, em flagrante violação do disposto no artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho;
16. A Recorrida deve à Recorrente a quantia ilíquida de € 816,67, a título de vencimento base mensal, assim calculada: € 2.100,00 - € 1.925,00 x 4 meses (Maio, Junho, Julho e Agosto de 2012) + € 2.100,00 - € 1.925,00 : 30 x 20 dias de Setembro de 2012, e a quantia ilíquida de € 1.166,67, a título de ajuda de custo, assim calculada: € 250,00 x 4 meses (Maio, Junho, Julho e Agosto de 2012) + € 250,00 : 30 x 20 dias de Setembro de 2012, acrescidas dos respectivos juros de mora à taxa legal, desde a data de vencimento de cada prestação e até efectivo e integral pagamento.
17. A decisão recorrida, na parte em que julgou improcedente a excepção de compensação de créditos invocada pela Recorrente, violou o disposto no artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito;
18. A Recorrente, por deliberação de 24 de Agosto de 2012, foi nomeada vogal do conselho de administração e administradora delegada da sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A. (de ora em diante abreviadamente designada por DD), a qual tem como objecto social de cedência temporária de trabalhadores, desenvolvimento de actividades de selecção, orientação e formação profissional;
19. Nos termos do disposto na cláusula 9.1. do contrato de trabalho que celebrou com a Recorrida, em 01 de Maio de 2012, a Recorrente, durante a vigência do seu contrato de trabalho, não podia: (i) prestar trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente, salvo autorização expressa por escrito desta; (ii) exercer durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não; (iii) deter, de forma directa ou indirecta, qualquer participação social em sociedades que estabeleçam relações comerciais com a Primeira Contraente e/ou receber dessas sociedades qualquer contrapartida, em numerário ou em espécie, seja a que título for.
20. A Recorrente só exerceu funções de administradora da DD, pelo menos, a partir de 12 de Outubro de 2012, foi inscrita na Segurança Social como membro de órgão estatutário em 15 de Outubro de 2012, passou a ser remunerada pelo exercício dessas funções de administradora a partir de 15 de Outubro de 2012 e passou a efectuar contribuições para a Segurança Social a partir de Novembro de 2012;
21. A sociedade DD só foi autorizada a exercer a actividade de trabalho temporário por deliberação do Conselho Directivo do Instituto de Emprego e Formação Profissional de 22 de Novembro de 2012, tendo o seu alvará sido emitido pelo mesmo Instituto a 04 de Dezembro de 2012;
22. A Recorrente, durante a vigência do contrato de trabalho que celebrou com a Recorrida, em 01 de Maio de 2012, não prestou trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Recorrida, nem exerceu durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não, pelo que não violou o disposto na cláusula 9.1. do seu contrato de trabalho, não tendo, assim, qualquer aplicação a cláusula penal estabelecida na cláusula 9.2 do mesmo contrato de trabalho, uma vez que não se verifica o incumprimento da cláusula que a mesma visava proteger;
23. Nos termos do disposto na cláusula 9.2. do contrato de trabalho que a Recorrente celebrou com a Recorrida, em 01 de Maio de 2012, No caso de qualquer violação, sob qualquer forma, pelo Segundo Contraente das obrigações previstas na presente cláusula, a Primeira Contraente terá direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fracção de serviço do Segundo Contraente, constituindo essa violação justa causa de despedimento.” (destaque e sublinhado nossos);
24. O principal objectivo da cláusula penal, como é o caso da cláusula 9.2. do contrato de trabalho que a Recorrente celebrou com a Recorrida em 01 de Maio de 2012, é o de evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização dos prejuízos, porque os mesmos são de difícil quantificação ou concretização, pelo que não faz qualquer sentido condenar em indemnização estabelecida em cláusula penal quando não existem prejuízos, motivo pelo qual, o artigo 811.º, do Código Civil, que regula o funcionamento da cláusula penal, refere-se sempre à indemnização pelos danos ou prejuízos resultantes do incumprimento da obrigação principal;
25. Assim, o direito à indemnização prevista na cláusula 9.2. do contrato de trabalho que a Recorrente celebrou com a Recorrida, em 01 de Maio de 2012, pressupõe, sempre, que a Recorrida tivesse sofrido prejuízos, em resultado da violação, pela Recorrente, das obrigações que se encontram previstas na referida cláusula;
26. Porém, não resultaram provados quaisquer prejuízos invocados pela Recorrida, tendo mesmo resultado provado que a Recorrente apenas entrou em contacto com dois clientes da Recorrida em datas muito posteriores à data da cessação do seu contrato de trabalho, sendo certo que esses clientes já conheciam a Recorrente antes de esta trabalhar para a Recorrida, tendo os mesmos garantido não ter havido contactos da Recorrente para os angariar como clientes da DD enquanto era trabalhadora da Recorrida;
27. A decisão recorrida, na parte em que condenou a Recorrente a pagar à Recorrida a quantia de € 26.950,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento, a título de indemnização pela alegada violação do dever de lealdade e da obrigação de não concorrência a que estava obrigada por força da cláusula 9.ª, do referido contrato de trabalho, não tendo a Recorrida logrado provar qualquer prejuízo ou dano, violou o disposto no artigo 811.º, do Código Civil, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito;
28. A decisão recorrida equacionou a violação do dever de lealdade na vertente de não concorrência à luz de um quadro factual (situação de despedimento com justa causa) que é totalmente diferente do que estava em causa nos presentes autos, pelo que se encontra erradamente fundamentada, quer em termos de jurisprudência, quer em termos de doutrina;
29. O juízo de prognose e de potencial desvio de clientela equacionado na decisão recorrida, em que não é exigível a prova concreta de prejuízos ou o desvio efectivo de clientes, apenas faz sentido numa acção de apreciação da ilicitude do despedimento, porque o que aí se afere é se existe a possibilidade de continuar com a relação laboral, ainda que do comportamento concorrente/desleal do trabalhador não tenham resultado necessariamente prejuízos ou danos;
30. Nos presentes autos, o que estava em causa era a condenação da Recorrente pelos prejuízos e danos que alegadamente tinha causado à Recorrida, em consequência da também alegada violação de uma cláusula do seu contrato de trabalho relativa ao dever de exclusividade/não concorrência, pelo que o que importava aferir era se tinha havido ou não violação da cláusula contratual que estabelece o dever de exclusividade/não concorrência e se dessa violação tinham resultado ou não danos e prejuízos para a Recorrida;
31. O contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012 vigorou por pouco mais de quatro meses e meio, tendo cessado no dia 20 de Setembro de 2012;
32. A Recorrente, contrariamente ao referido na decisão recorrida, não exercia qualquer «cargo de confiança da direcção» da Recorrida;
33. A Recorrente só exerceu funções de administradora da DD, pelo menos, a partir de 12 de Outubro de 2012, foi inscrita na Segurança Social como membro de órgão estatutário em 15 de Outubro de 2012, passou a ser remunerada pelo exercício dessas funções de administradora a partir de 15 de Outubro de 2012 e passou a efectuar contribuições para a Segurança Social a partir de Novembro de 2012;
34. A sociedade DD só foi autorizada a exercer a actividade de trabalho temporário por deliberação do Conselho Directivo do Instituto de Emprego e Formação Profissional de 22 de Novembro de 2012, tendo o seu alvará sido emitido pelo mesmo Instituto a 04 de Dezembro de 2012.
35. E não resultaram provados quaisquer prejuízos invocados pela Recorrida, tendo mesmo resultado provado que a Recorrente apenas entrou em contacto com dois clientes da Recorrida em datas muito posteriores à data da cessação do seu contrato de trabalho, sendo certo que esses clientes já conheciam a Recorrente antes de esta trabalhar para a Recorrida, tendo os mesmos garantido não ter havido contactos da Recorrente para os angariar como clientes da DD enquanto era trabalhadora da Recorrida;
36. A cláusula penal constante da cláusula 9.2 do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012 (indemnização com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição da Recorrente, acrescido do montante correspondente a duas vezes essa retribuição por cada ano ou fracção da Recorrente ao serviço da Recorrida, ou seja, € 26.950,00) é manifestamente excessiva;
37. A decisão recorrida, na parte em que não considerou manifestamente excessiva a cláusula penal constante da cláusula 9.2 do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e a Recorrente em 01 de Maio de 2012, não tendo, assim, procedido à sua redução, de acordo com a equidade, ao abrigo do disposto no artigo 812.º, n.º 1, do Código Civil, violou o disposto nos artigos 811.º, n.º 3, e 812.º, n.º 1, do Código Civil, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito.
Nestes termos, e nos demais de Direito, cujo douto suprimento expressamente se requer, deve ser concedido integral provimento ao presente recurso de apelação, revogando-se a decisão recorrida, pois, só assim se fará inteira JUSTIÇA!

Contra-alegou a A. concluindo apenas que deve improceder a apelação da Recorrente, confirmando-se a sentença recorrida.
Admitido o recurso com adequado regime de subida e efeito suspensivo dada a prestação de caução pela R./apelante, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.
Mantido o recurso, foi determinado se desse cumprimento ao disposto no n.º 3 do art. 87º do Cod. Proc. Trabalho, tendo a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitido o douto parecer de fls. 386 a 389 no sentido da improcedência do recurso e consequente manutenção da sentença recorrida.
Este parecer mereceu resposta discordante da parte da R./apelante.
Com a anuência dos Exmos Adjuntos foi dispensado o respetivo Visto.
Cumpre, agora, apreciar e decidir.

II. Apreciação.
Dado que são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto – art. 635º n.º 4 e art. 639º n.º 1 do Cod. Proc. Civil aqui aplicável por força do art. 87º n.º 1 do Cod. Proc. Trabalho – colocam-se à apreciação desta Relação as seguintes questões de recurso:
· Validade do contrato de trabalho celebrado em 1 de maio de 2012 entre a Recorrente e a Recorrida;
· Créditos da Recorrente sobre a Recorrida e sua compensação;
· Não violação do dever de não concorrência e, consequente, falta de fundamento para a condenação da Recorrente em cláusula penal;
· Excessividade da condenação da Recorrente no pagamento da quantia de € 26.950,00 a título de cláusula penal e dever de redução da mesma com base na equidade;

Fundamentos de facto.
Em 1ª instância considerou-se provada a seguinte matéria de facto:
1) A A. é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de cedência temporária de trabalhadores para utilização em terceiros utilizadores e de serviços de seleção, orientação e formação profissional e à consultadoria e gestão de recursos humanos.
2) No exercício da sua atividade, a A., representada pelo seu procurador HH, celebrou com a R., em 01/05/2012, um contrato de trabalho por tempo indeterminado, cuja cópia consta de fls. 17 a 24 e que se dá por reproduzido.
3) No âmbito de tal contrato de trabalho, a A. admitiu a R. ao seu serviço, para exercer, sob a sua autoridade e direção, as funções de Diretora de Agência, exercendo ainda funções na área da gestão, marketing, incluindo as funções afins ou funcionalmente ligadas a essa atividade.
4) O local de trabalho fixado para a R. prestar o seu trabalho à A. foi a agência desta na Amadora, sita na (...), ou em quaisquer outras instalações da A..
5) A A. e a R. acordaram ainda no âmbito de tal contrato de trabalho que o horário de trabalho desta seria de oito horas diárias e quarenta semanais.
6) A título de retribuição acordaram A. e R. que a primeira pagaria à segunda o montante mensal ilíquido de € 1.925, acrescido de um subsídio de refeição de € 6,41, por cada dia de trabalho efetivamente prestado por esta, e de subsídio de férias e subsídio de Natal calculados nos termos fixados nos arts. 263.º e 264.º do Código do Trabalho.
7) Acordaram ainda A. e R. que o referido contrato de trabalho entrasse em vigor no dia 01/05/2012 e mantivesse a sua vigência por tempo indeterminado, não havendo lugar a período experimental.
8) A. e R. acordaram ainda no âmbito da Cláusula 9.ª (Atividades não permitidas durante a vigência do contrato de trabalho) do referido contrato de trabalho que: “9.1. Durante a vigência do contrato de trabalho, o Segundo Contraente não poderá: (i) prestar trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente, salvo autorização expressa por escrito desta; (ii) exercer durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não; (iii) deter, de forma directa ou indirecta, qualquer participação social em sociedades que estabeleçam relações comerciais com a Primeira Contraente e/ou a receber dessas sociedades qualquer contrapartida, em numerário ou em espécie, seja a que título for. 9.2. No caso de qualquer violação, sob qualquer forma, pelo Segundo Contraente das obrigações previstas na presente cláusula, a Primeira Contraente terá direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fracção de serviço do Segundo Contraente, constituindo ainda essa violação justa causa de despedimento.”
9) Por carta datada de 10/09/2012, a R. comunicou à A. que rescindia o contrato de trabalho, celebrado entre as partes, com efeitos a partir de 14/10/2012.
10) Posteriormente, em 20/09/2012, A., representada pelo seu Diretor Geral JJ, e R. celebraram acordo cuja cópia consta de fls. 26, e se dá por reproduzido, nos termos do qual as partes acordaram mutuamente na desnecessidade de cumprimento do aviso prévio por parte da trabalhadora, acordando que a BB prescinde do aviso prévio de trinta dias a conceder por aquela, cessando o contrato de trabalho firmado em 01/05/2012 na data de 20/09/2012.
11) Mostra-se inscrita no registo comercial sob a matrícula n.º 5... a sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., constituída em 29/08/2012, com o objeto social de cedência temporária de trabalhadores, desenvolvimento de atividades de seleção, orientação e formação profissional, para a qual a R. foi nomeada vogal do conselho de administração e administradora delegada por deliberação de 24/08/2012.
12) A sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., foi inscrita na Segurança Social em 30/08/2012.
13) As funções da R. ao serviço da A. incluíam tarefas e responsabilidades comerciais, que consistiam em angariar clientes e preparar, remeter e negociar com possíveis clientes propostas de prestação de serviços, devendo, para o efeito, estabelecer contactos comerciais com os clientes da A..
14) A R. deveria ainda tentar angariar novos clientes para a sua entidade patronal.
15) O cliente da A. KK, S.A., deixou de trabalhar com esta em 31/01/2013 e passou a trabalhar com a DD, Empresa de Trabalho Temporário, S.A., a partir de tal data.
16) O cliente KK, S.A., trouxe à A. uma faturação mensal média de € 8.000 e uma margem de lucro média de € 600, no decurso do ano de 2012.
17) A A. tinha celebrado com o cliente KK, S.A., seis contratos de utilização de trabalho temporário (doravante CUTT), cujo termo da duração estava previsto para 2013 e 2014.
18) As funções que a R. exercia ao serviço da A. impunham a existência de uma relação de confiança com a direção da empresa.
19) Nos termos da Cláusula 8.1 do contrato de trabalho que celebrou com a R., supra descrito, a R. estava obrigada a manter confidencialidade sobre “todos os dossiers, listagens de Clientes, e fornecedores, arquivos, documentos, dados e informações obtidos em virtude da sua relação de trabalho” com a A. “relativos a esta (incluindo os seus colaboradores) ou outras sociedades associadas, ou aos seus Clientes, nomeadamente sobre a sua organização, actividade ou negócio, preços, serviços prestados e qualquer outro dado de natureza comercial e/ou técnica, não podendo, designadamente, extrair cópias, divulgá-los ou comunicá-los a terceiros”. (retificado nos termos referidos infra)
20) Nos termos do disposto na Cláusula 8.4 do contrato de trabalho que celebrou com a R., supra descrito, em caso de violação das obrigações fixadas na sua Cláusula 8.1, tem a A. o direito de exigir da R. o pagamento de uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos em resultado dessa violação, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição desta, acrescido do montante correspondente a duas vezes essa retribuição por cada ano ou fração da R. ao serviço da A..
21) A sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., tem por objeto a prestação de serviços gerais de apoio e preparatórios ou complementares das atividades principais ou secundárias das pessoas coletivas, incluindo, sem limitação, serviços administrativos, organização, gestão e execução de projetos, gestão e arquivo, logística, organização e gestão de eventos e afins.
22) A sociedade EE – Sociedade Unipessoal, LDA., tem por objeto a prestação de serviços na área das vendas e promoções através da gestão de serviços de apoio a clientes, gestão e prestação de serviços de atendimento e promoção telefónicos, serviços de promoção direta e indireta de produtos e serviços de reposição de produtos em estabelecimentos comerciais, desenvolvendo soluções de marketing.
23) A R. foi admitida ao serviço da sociedade EE– Sociedade Unipessoal, Lda., no dia 17 de Agosto de 2009, mediante a celebração de um acordo escrito denominado contrato de trabalho a termo certo, para exercer, sob a sua autoridade e direção, as funções correspondentes à categoria profissional de Diretora de Departamento.
24) Por acordo escrito celebrado no dia 28 de Março de 2012, a sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e a sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., cederam à sociedade BBB Services, Lda., a sua posição contratual nos contratos de prestação de serviços de outsourcing que tinham celebrado com as sociedades V... – Distribuidora de Publicações, Lda., C&A Modas, Unipessoal, Lda., M... – Serviços de Telecomunicações, S.A., W...Portugal – Soluções Informáticas para a Banca, Lda., S..., Unipessoal, Lda., OR... Cosméticos, Lda, O... Comunicações, S.A., e KK, S.A..
25) No âmbito do referido acordo, a sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e a sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., cederam à sociedade BBB Services, Lda., todos os direitos e obrigações decorrentes dos supra referidos contratos de prestação de serviços.
26) Por via do referido acordo, a sociedade BBB Services, Lda., comprometeu-se a assumir os contratos de trabalho celebrados pela sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e pela sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., com os trabalhadores temporários e permanentes afetos a cada um dos supra referidos contratos de prestação de serviços, garantindo-lhes, designadamente, a sua antiguidade, bem como as suas condições contratuais em vigor no momento da cessão da posição contratual.
27) A mesma sociedade comprometeu-se, também, a assumir, os contratos de trabalho celebrados com as trabalhadoras permanentes responsáveis na sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e na sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., pela gestão dos supra referidos contratos de prestação de serviços de outsourcing, entre as quais, a R., mantendo e garantindo a sua antiguidade, benefícios e demais condições contratuais, designadamente as constantes do Anexo II do acordo.
28) A sociedade BBB Services, Lda., assumiu as viaturas da sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e da sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., afetas às operações objeto dos supra referidos contratos de prestação de serviços.
29) A sociedade BBB Services, Lda., assumiu os telemóveis da sociedade EE –Sociedade Unipessoal, Lda., e da sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., afetos às operações objeto dos supra referidos contratos de prestação de serviços.
30) A sociedade EE – Sociedade Unipessoal, Lda., e a sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., obrigaram-se a desenvolver junto das sociedades com quem tinham celebrado os supra referidos contratos de prestação de serviços todas as diligências necessárias à celebração dos respetivos contratos de cessão de posição contratual, através dos quais a sua posição contratual seria transferida para a sociedade BBB Services, Lda..
31) A posição contratual da sociedade EE – Sociedade Unipessoal, Lda., e da sociedade FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., nos supra referidos contratos de prestação de serviços foi transferida para a sociedade BBB Services, Lda., a partir do dia 1 de Maio de 2012.
32) A R. apresentou-se ao serviço na sede da sociedade BBB Services, Lda., na Rua (...), em Lisboa, onde se situa igualmente a sede da A..
33) Nessa ocasião, foi apresentado à R. o acordo descrito em 2).
34) De acordo com o Anexo II do acordo de cessão de posição contratual descrito em 24), a R. auferia um vencimento base ilíquido mensal de € 2.100, acrescido de uma ajuda de custo no valor ilíquido mensal de € 250.
35) A R. exerceu funções como administradora de DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., pelo menos, a partir de 12/10/2012, foi inscrita na Segurança Social como membro de órgão estatutário de DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., em 15/10/2012, tendo passado a ser remunerada pelo exercício dessas funções de administradora a partir de 15/10/2012 e tendo efetuado contribuições para a Segurança Social a partir de Novembro de 2012.
36) Por declaração de 05/09/2012, submetida pelo TOC LL, a sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., declarou à Autoridade Tributária e Aduaneira como data de início de atividade o dia 1 de Outubro de 2012.
37) A sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., por carta subscrita pela R., comunicou à Autoridade para as Condições do Trabalho como data de início de atividade o dia 12 de Outubro de 2012.
38) A sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., foi autorizada a exercer a atividade de trabalho temporário por deliberação do Conselho Diretivo do Instituto de Emprego e Formação Profissional de 22 de Novembro de 2012.
39) O alvará n.º 697, de Empresa de Trabalho Temporário, foi emitido pelo Instituto de Emprego e Formação profissional a favor da sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., em 04 de Dezembro de 2012.
40) A R. enviou uma proposta de trabalho temporário ao cliente KK, S.A., no dia 5 de Dezembro de 2012.
41) No caso do cliente W...Portugal, a R. enviou-lhe uma proposta de trabalho temporário no dia 15 de Fevereiro de 2013.
42) A A. e a sociedade BBB Services, Lda., pertencem ao mesmo grupo empresarial.

Muito embora na conclusão 7ª do seu recurso a R./apelante aluda ao depoimento de uma testemunha ouvida em audiência de julgamento, certo é que não deduz qualquer impugnação de matéria de facto e daí que, não havendo razões para alterar a matéria de facto que foi considerada como provada pelo Tribunal a quo se decida manter aqui a mesma na sua integralidade. Retifica-se, no entanto a expressão “… celebrou com a R.,…” contida na primeira linha do ponto 19 porquanto, face ao documento de fls. 17 a 24 dos autos, se verifica que houve da parte da Sr.ª Juíza do Tribunal a quo manifesto lapso de escrita, pretendendo dizer “… celebrou com a A.,…”.
Assim e em tal ponto da matéria de facto, onde se lê “… celebrou com a R.,…” deve passar a ler-se “… celebrou com a A.,…”.

Fundamentos de direito.
· Validade do contrato de trabalho celebrado em 1 de maio de 2012 entre a Recorrente e a Recorrida.
Em síntese e a este respeito, alega e conclui a R./apelante que, sendo trabalhadora da sociedade EE – Sociedade Unipessoal, Lda. (doravante designada apenas por “EE, Lda.”) desde 17 de agosto de 2009, a unidade económica consubstanciada no conjunto organizado de meios desta sociedade se transmitiu para a Sociedade BBB Services, Lda. com efeitos a partir de 1 de maio de 2012 e que, na sequência dessa transmissão, a posição de empregador da “EE, Lda.” se transmitiu para a sociedade “BBB Services, Lda. com efeitos a partir desta última data por força do art. 285º n.º 1 do Código do Trabalho. Daí que se tenha apresentado ao serviço na sede desta última sociedade.
Alega, todavia, que quando em 1 de maio de 2012 se apresentou ao serviço na sede da BBB Services, Lda., foi-lhe apresentado um contrato de trabalho por tempo indeterminado com Recorrida BB – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., (doravante designada apenas por BB, S.A.) a qual é uma sociedade do grupo da BBB Services, Lda., contrato que acabou por subscrever não obstante não ter liberdade nem se sentir minimamente na posição de negociar o que quer que fosse com a “BB, S.A.”, tanto mais que esta e a BBB Services, Lda. têm sede no mesmo local e receava as consequências negativas que poderiam advir de uma tal posição, razão pela qual tal contrato viola a norma imperativa do mencionado art. 285º n.º 1, motivo pelo qual é nulo nos termos do art. 280º n.º 1 do Código Civil, já que se assim não fosse se estaria perante uma verdadeira fraude à lei.
Vejamos se assiste razão à R./apelante.
Antes de mais, importa referir que, na análise desta e das demais questões de recurso se deve subsumir a matéria de facto provada ao direito aplicável e que no caso é, desde logo, o Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009 de 12-02, bem como as regras do Código Civil.
Posto isto e com interesse para a apreciação da mencionada questão de recurso, resulta da matéria de facto provada que a sociedade “EE, Lda.” tinha por objeto a prestação de serviços na área das vendas e promoções através da gestão de serviços de apoio a clientes, gestão e prestação de serviços de atendimento e promoção telefónicos, serviços de promoção direta e indireta de produtos e serviços de reposição de produtos em estabelecimentos comerciais, desenvolvendo soluções de marketing e que a aqui R./apelante CC foi admitida ao serviço dessa sociedade no dia 17 de Agosto de 2009, mediante a celebração de um acordo escrito denominado contrato de trabalho a termo certo, para exercer, sob a sua autoridade e direção, as funções correspondentes à categoria profissional de Diretora de Departamento (pontos 22 e 23 dos factos provados).
Também se demonstrou que uma sociedade denominada FF – Multiserviços, Sociedade Unipessoal, Lda., (doravante designada apenas por “FF, Lda.”) tinha por objeto a prestação de serviços gerais de apoio e preparatórios ou complementares das atividades principais ou secundárias das pessoas coletivas, incluindo, sem limitação, serviços administrativos, organização, gestão e execução de projetos, gestão e arquivo, logística, organização e gestão de eventos e afins (ponto 21).
Provou-se, por outro lado, que, por acordo escrito celebrado no dia 28 de Março de 2012, a sociedade “EE, Lda.” e a sociedade “FF, Lda.”, cederam à sociedade BBB Services, Lda., a sua posição contratual nos contratos de prestação de serviços de outsourcing que tinham celebrado com as sociedades V... – Distribuidora de Publicações, Lda., C&A Modas, Unipessoal, Lda., M... – Serviços de Telecomunicações, S.A., W...Portugal – Soluções Informáticas para a Banca, Lda., S..., Unipessoal, Lda., OR... Cosméticos, Lda, O... Comunicações, S.A., e KK, S.A. e que, no âmbito de tal acordo, a “EE, Lda., e a “FF, Lda.”, cederam à sociedade BBB Services, Lda. todos os direitos e obrigações decorrentes dos supra referidos contratos de prestação de serviços e que, por sua vez, a sociedade BBB Services, Lda., se comprometeu a assumir os contratos de trabalho celebrados pelas sociedades “EE, Lda.” e “FF, Lda.”, com os trabalhadores temporários e permanentes afetos a cada um dos supra referidos contratos de prestação de serviços, garantindo-lhes, designadamente, a sua antiguidade, bem como as suas condições contratuais em vigor no momento da cessão da posição contratual, bem como a assumir, os contratos de trabalho celebrados com as trabalhadoras permanentes responsáveis na sociedade “EE, Lda.”, e na sociedade “FF, Lda.”, pela gestão dos referidos contratos de prestação de serviços de outsourcing, entre as quais, a aqui R., mantendo e garantindo a sua antiguidade, benefícios e demais condições contratuais, designadamente as constantes do Anexo II do acordo (pontos 24, 25, 26 e 27).
Provou-se, para além disso, que a posição contratual da sociedade “EE, Lda., e da sociedade “FF, Lda.”, nos referidos contratos de prestação de serviços foi transferida para a sociedade BBB Services, Lda. a partir do dia 1 de Maio de 2012 e que a R. CC se apresentou ao serviço na sede desta sociedade BBB Services, Lda. sita na Rua (...), em Lisboa, onde se situa igualmente a sede da A. “BB, S.A.”, sendo que estas sociedades pertencem ao mesmo grupo empresarial (pontos 31, 32 e 42).
Todavia, tendo resultado demonstrado que a A. “BB, S.A.” é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de cedência temporária de trabalhadores para utilização em terceiros utilizadores e de serviços de seleção, orientação e formação profissional e à consultadoria e gestão de recursos humanos, provou-se que esta sociedade, representada pelo seu procurador HH, em 1 de maio de 2012 – precisamente no dia em que a R. CC se apresentou ao serviço na sede da “BBB Services, Lda.”, sede que é comum à “BB, S.A.”, na sequência da cessão da posição contratual da sua anterior empregadora “EE, Lda.” à “BBB Services, Lda.” – apresentou à R. CC e celebrou com ela um contrato de trabalho por tempo indeterminado, cuja cópia consta de fls. 17 a 24, no âmbito do qual a R. CC foi admitida ao serviço da A. “BB, S.A.”, para exercer, sob a autoridade e direção desta, as funções de Diretora de Agência, exercendo ainda funções na área da gestão, marketing, incluindo funções afins ou funcionalmente ligadas a essa atividade, funções que incluíam tarefas e responsabilidades comerciais, que consistiam em angariar clientes e preparar, remeter e negociar com possíveis clientes propostas de prestação de serviços, devendo, para o efeito, estabelecer contactos comerciais com os clientes da A. e angariar novos clientes para a sua entidade patronal (cfr. pontos 1, 2, 3, 13, 14 e 33 dos factos provados), sendo que o local de trabalho fixado para a R. CC prestar o seu trabalho à A. “BB, S.A.” foi a agência desta na Amadora, sita na (...), ou em quaisquer outras instalações da mesma (cfr. ponto 4).
Acordaram, para além disso, que o referido contrato de trabalho entrava em vigor nesse dia 1 de maio de 2012 e mantinha a sua vigência por tempo indeterminado, não havendo lugar a período experimental e que, no âmbito de tal contrato de trabalho, o horário de trabalho da R. CC seria de oito horas diárias e quarenta horas semanais estabelecendo-se ainda que, a título de retribuição, a A. “BB, S.A.” pagaria à R. CC o montante mensal ilíquido de € 1.925, acrescido de um subsídio de refeição de € 6,41, por cada dia de trabalho efetivamente prestado por esta, bem como subsídio de férias e subsídio de Natal calculados nos termos fixados nos arts. 263.º e 264.º do Código do Trabalho (cfr. pontos 5, 6 e 7 dos factos provados).
Ora, perante esta matéria de facto provada, se é certo que houve uma clara transmissão de estabelecimento – enquanto unidade económica ou conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória (art. 285º n.º 5 do CT) – entre a “EE, Lda.” e a “BBB Services, Lda.”, transmissão operada para produzir efeitos a partir de 1 de maio de 2012 e muito embora, por força do disposto no n.º 1 deste art. 285º do Código do Trabalho, se tivesse transmitido, a partir de então, para a adquirente “BBB Services, Lda.” a posição contratual de empregador da aqui R. CC detida, até essa data, pela transmitente “EE, Lda.”, nada obstava que a R. CC, “motu próprio” e no âmbito da sua autonomia privada e pleno gozo de liberdade contratual de que sempre dispunha por força do art. 405º do Código Civil, ao invés de, naquela data, ter, naturalmente, passado a exercer funções laborais ao serviço da adquirente do referido estabelecimento “BBB Services, Lda.”, optasse antes, como tudo indica que optou, por aceitar um acordo que, então, lhe foi proposto pela “BB, S.A.” e estabelecer com esta empresa, a partir de então, um novo contrato de trabalho, passando a laborar ao serviço da mesma precisamente a partir daquele dia 1 de maio de 2012 ao abrigo do contrato de trabalho a que fizemos referência e que consta dos factos provados 1 a 7, no desempenho de funções que se afiguram bem diversas das que tinha anteriormente ao serviço da sociedade “EE, Lda.” como decorre da matéria de facto que consta dos pontos 3, 13 e 14 quando em confronto com a que consta do ponto 23.
É certo que a R./apelante, como fundamento da invocada invalidade contratual, alega e conclui não ter tido liberdade nem se sentir minimamente em posição de negociar o que quer que fosse com a “BB, S.A.”. No entanto, para além desta sociedade ser distinta da “BBB Services, Lda.” – apenas pertencendo ao mesmo grupo empresarial e tendo as respetivas sedes no mesmo local –, competindo à R./apelante o ónus de alegação e prova de factos donde se pudesse inferir que tal falta de liberdade contratual ou constrangimento sucedera (art. 342º n.º 2 do Código Civil), verdade é que, da matéria de facto provada, nada resulta donde se possa, de algum modo, concluir ter a R. celebrado esse contrato de trabalho com a A. coartada na sua liberdade de escolha ou sob qualquer forma de coação ou de mero constrangimento ou vício.
Acresce que, tendo-se demonstrado que a R./apelante se apresentou no dia 1 de maio de 2012 na sede da “BBB Services, Lda.” para desempenhar as funções que, até então, exercera ao serviço da sua anterior empregadora “EE, Lda.”, seguramente que o fez por lhe ter sido dado a conhecer que se havia operado uma transmissão de estabelecimento entre esta e aquela e que essa transmissão também envolveria a da posição contratual de empregador de uma empresa para a outra, o que leva a concluir que a R. CC, quando no dia 1 de maio de 2012 se apresentou na sede “BBB Services, Lda.” para o desempenho das funções que, até então, havia exercido ao serviço da “EE, Lda.”, não desconhecia que, por força da aludida transmissão de estabelecimento e a partir daquela data, seria a “BBB Services, Lda.” a sua nova entidade patronal, sem ter necessidade de outorgar qualquer outro contrato de trabalho com quem quer que fosse e que, portanto, se o fez aceitando uma proposta que, nesse sentido, lhe foi apresentada pela “BB, S.A.” nesse mesmo dia 1 de maio de 2012 nos termos supra referidos, foi porque certamente viu qualquer vantagem, para além da mera questão remuneratória, na aceitação de uma tal proposta de acordo e consequente outorga de um outro contrato de trabalho, agora com esta empresa. Dizemos qualquer vantagem para além da mera questão remuneratória, porquanto, demonstrado ficou que, em conformidade com o Anexo II do acordo de cessão de posição contratual descrito em 24 dos factos provados, a R. auferia um vencimento base ilíquido mensal de € 2.100, acrescido de uma ajuda de custo no valor ilíquido mensal de € 250 (cfr. ponto 34 dos factos provados), o que representa uma remuneração monetária superior à que foi auferir ao serviço da A. “BB, Lda.”.
Não merece, pois, censura, a sentença recorrida ao considerar válido o contrato de trabalho estabelecido entre ambas as partes envolvidas no presente litígio, assim como não merece censura a mesma sentença, ao concluir que, «sendo válido o contrato de trabalho, improcede, consequentemente, a excepção de compensação de créditos invocada pela R., que se baseava na manutenção do contrato primitivo». Com efeito e pelas razões anteriormente expostas, tendo a aqui R/apelante celebrado com a “BB, S.A.” um novo contrato de trabalho em 1 de maio de 2012, diferente, também em termos remuneratórios, do contrato de trabalho que mantivera com a “EE, Lda.” e que fora objeto de transmissão para a “BBB Services, Lda.”, transmissão que, contudo e na prática, não chegou a produzir os seus normais efeitos, não pode agora a R./apelante invocar créditos sobre a A./apelada decorrentes de uma diminuição de retribuição, desde logo, por que esta, em abono da verdade, não foi parte nem na mencionada transmissão de estabelecimento, nem na consequente transmissão da posição contratual no que ao anterior contrato de trabalho com a “EE, Lda.” dizia respeito e por outro lado a R./apelante aceitou uma proposta de acordo que, em 1 de maio de 2012, lhe foi apresentada pela “BB, S.A.” estabelecendo com ela o aludido contrato de trabalho.
Improcede, pois, a apelação quando às duas primeiras das suscitadas questões.

· Da não violação do dever de não concorrência e, consequente, falta de fundamento para a condenação da Recorrente em cláusula penal.
Sobre esta questão de recurso e em síntese, alega e conclui a R./apelante que durante a vigência do contrato de trabalho que celebrou com a A./apelada em 1 de maio de 2012, não prestou trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação direta ou indireta em empresas que se dedicassem a atividade igual ou similar à prosseguida por esta, nem exerceu durante o seu tempo de trabalho qualquer outra atividade profissional, remunerada ou não, pelo que não violou o disposto na cláusula 9.1. do seu contrato de trabalho, não tendo, assim, qualquer aplicação a cláusula penal estabelecida na cláusula 9.2 desse mesmo contrato.
Conclui ainda que, sendo o principal objetivo de uma cláusula penal o de evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante de indemnização dos prejuízos, na medida em que os mesmos são de difícil quantificação ou concretização, não se compreende a condenação da R./apelante em indemnização estabelecida em cláusula penal quando não resultaram provados quaisquer prejuízos invocados pela A./apelada, pelo que a decisão recorrida violou o disposto no art. 811º do Código Civil.
Finalmente e ainda com interesse conclui que a decisão recorrida equacionou a violação do dever de lealdade na vertente de não concorrência à luz do quadro factual (situação de despedimento com justa causa), o que é totalmente diferente do que estava em causa nos presentes autos, sendo que o juízo de prognose de potencial desvio de clientela equacionado naquela decisão, em que não é exigível a prova concreta de prejuízos ou o desvio efetivo de clientes, apenas faz sentido numa ação de apreciação de ilicitude de despedimento, porque o que aí se afere é se existe a possibilidade de continuar com a relação laboral, ainda que do comportamento concorrente/desleal do trabalhador não tenham resultado necessariamente prejuízos ou danos e o que estava em causa nos presentes autos era a condenação da Recorrente pelos prejuízos e danos que, alegadamente, tinha causado à Recorrida em consequência da violação de uma cláusula do seu contrato de trabalho relativa ao dever de exclusividade /não concorrência e se dessa violação tinham ou não resultado danos e prejuízos para Recorrida.
Vejamos!
Com interesse na apreciação desta questão de recurso, resulta demonstrado que a A./apelada “BB, S.A.” é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de cedência temporária de trabalhadores para utilização em terceiros utilizadores e de serviços de seleção, orientação e formação profissional e à consultadoria e gestão de recursos humanos, bem como que celebrou com a R./apelante CC, em 1 de maio de 2012, um contrato de trabalho por tempo indeterminado para que esta exercesse, sob a autoridade e direção daquela, as funções de Diretora de Agência, exercendo ainda funções na área da gestão, marketing, incluindo as funções afins ou funcionalmente ligadas a essa atividade, funções que incluíam tarefas e responsabilidades comerciais, que consistiam em angariar clientes e preparar, remeter e negociar com possíveis clientes propostas de prestação de serviços, devendo, para o efeito, estabelecer contactos comerciais com os clientes da A./apelada, bem como deveria ainda tentar angariar novos clientes para a sua entidade patronal (cfr. pontos 1 a 3, 13 e 14 dos factos provados).
Provou-se também que as funções que a R. CC exercia ao serviço da A. “BB, S.A.” impunham a existência de uma relação de confiança com a direção desta empresa (cfr. ponto 18).
No âmbito daquele contrato de trabalho e como ficou igualmente demonstrado, estabeleceu-se uma Cláusula 9ª sob a epígrafe “Atividades não permitidas durante a vigência do contrato de trabalho”, em que se estipulou que: “9.1. Durante a vigência do contrato de trabalho, o Segundo Contraente não poderá: (i) prestar trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente, salvo autorização expressa por escrito desta; (ii) exercer durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não; (iii) deter, de forma directa ou indirecta, qualquer participação social em sociedades que estabeleçam relações comerciais com a Primeira Contraente e/ou a receber dessas sociedades qualquer contrapartida, em numerário ou em espécie, seja a que título for. 9.2. No caso de qualquer violação, sob qualquer forma, pelo Segundo Contraente das obrigações previstas na presente cláusula, a Primeira Contraente terá direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fracção de serviço do Segundo Contraente, constituindo ainda essa violação justa causa de despedimento.”.
Provou-se ainda que, por carta datada de 10 de setembro de 2012, a R. CC comunicou à A. “BB, S.A.” que rescindia o contrato de trabalho, celebrado entre as partes, com efeitos a partir de 14 de outubro de 2012, mas também se demonstrou que, posteriormente, em 20 de setembro de 2012, a A. e a R. celebraram um acordo, cuja cópia consta de fls. 26 dos autos, nos termos do qual as partes assentaram mutuamente na desnecessidade de cumprimento do aviso prévio por parte da trabalhadora, acordando que a “BB” prescinde do aviso prévio de trinta dias a conceder por aquela, cessando o contrato de trabalho firmado em 1 de maio de 2012 na data de 20 de setembro de 2012 (pontos 9 e 10).
Por outro lado, demonstrou-se que foi inscrita no registo comercial sob a matrícula n.º 5... a sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A. (doravante designada por DD, S.A.”), constituída em 29 de agosto de 2012, com o objeto social de cedência temporária de trabalhadores, desenvolvimento de atividades de seleção, orientação e formação profissional, para a qual a R. CC foi nomeada vogal do conselho de administração e administradora delegada por deliberação de 24 de agosto de 2012, sociedade que foi inscrita na Segurança Social em 30 de agosto de 2012 (pontos 11 e 12), provando-se, para além disso, que a R. exerceu funções como administradora de “DD, S.A.”, pelo menos, a partir de 12 de outubro de 2012, foi inscrita na Segurança Social como membro de órgão estatutário desta empresa em 15 de outubro de 2012, tendo passado a ser remunerada pelo exercício dessas funções de administradora a partir deste mesmo dia e efetuado contribuições para a Segurança Social a partir de novembro de 2012, sendo que, por declaração de 5 de setembro de 2012, submetida pelo TOC LL, a sociedade “DD, S.A.”, declarou à Autoridade Tributária e Aduaneira como data de início de atividade o dia 1 de outubro de 2012 e, por carta subscrita pela R., comunicou à Autoridade para as Condições do Trabalho, como data de início de atividade, o dia 12 de outubro de 2012, sendo que a sociedade “DD, S.A.”, foi autorizada a exercer a atividade de trabalho temporário por deliberação do Conselho Diretivo do Instituto de Emprego e Formação Profissional de 22 de novembro de 2012, entidade que emitiu o alvará n.º 697, de Empresa de Trabalho Temporário a favor da sociedade “DD, S.A.” em 4 de dezembro de 2012 (pontos 35 a 39 dos factos provados).
Finalmente e ainda com interesse, demonstrou-se que a A. “BB, S.A.” tinha celebrado com o cliente KK, S.A., seis contratos de utilização de trabalho temporário cujo termo da duração estava previsto para 2013 e 2014, provou-se que este cliente KK, S.A., trouxe à A. uma faturação mensal média de € 8.000 e uma margem de lucro média de € 600 no decurso do ano de 2012, que a R. CC enviou uma proposta de trabalho temporário ao cliente KK, S.A. no dia 5 de Dezembro de 2012 e que a KK, S.A., deixou de trabalhar com a A. “BB, S.A.” em 31 de janeiro de 2013 e passou a trabalhar com a “DD, S.A., a partir dessa data (cfr. pontos 15 a 17 e 40).
Posto isto e a propósito da questão da violação ou não do dever laboral de não concorrência, a Sr. Juíza do Tribunal a quo pronunciou-se do seguinte modo na sentença recorrida: «Dispõe a cláusula 9.1 do contrato de trabalho celebrado entre as partes que: “Durante a vigência do contrato de trabalho, o Segundo Contraente não poderá: (i) prestar trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente, salvo autorização expressa por escrito desta; (ii) exercer durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não; (iii) deter, de forma directa ou indirecta, qualquer participação social em sociedades que estabeleçam relações comerciais com a Primeira Contraente e/ou a receber dessas sociedades qualquer contrapartida, em numerário ou em espécie, seja a que título for.
Esta cláusula, no essencial, constitui a consagração contratual do dever laboral previsto no art. 128.º, n.º 1, al. f), do CT2009, de acordo com o qual o trabalhador deve “guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações relativas à sua organização, métodos de produção ou negócios”, ou seja, do dever de lealdade e de não concorrência.
Proíbe, assim, o legislador ao trabalhador a prática de quaisquer actos que possam entrar em concorrência com a actividade que o empregador desenvolve.
Como escreve Pedro Romano Martinez (in Direito do Trabalho, 2010, 5.ª Edição, pág. 534), a “(…) proibição de concorrência justifica-se por motivos óbvios. (…) Se alguém contrata trabalhadores, não pode estar sujeito ao risco de estes entrarem em concorrência com a sua actividade. Os trabalhadores encontram-se numa situação privilegiada para entrarem em concorrência com o empregador, pois, em princípio, conhecem a clientela, muitas vezes melhor que o próprio empregador, visto que têm contacto directo com os clientes”.
A proibição legal apenas subsiste na vigência da relação laboral, a não ser que tenha sido estabelecido um pacto de não concorrência que perdure para além daquela.
Ainda de acordo com o citado eminente jurista (ob. cit., págs. 536/537) “a violação deste dever só existirá no caso de o trabalhador, a exercer uma segunda actividade, entrar em concorrência com o empregador, em particular se desviar clientela do primeiro empregador para o segundo. (…) Fundamental para admitir a violação do dever de não concorrência é a existência de um desvio de clientela, ainda que potencial, visto ser este o facto que pode causar prejuízos ao empregador”.
Ora, a R. foi nomeada vogal do conselho de administração e administradora delegada da sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., por deliberação de 24/08/2012.
De acordo com o art. 407.º do Código das Sociedades Comerciais, o conselho de administração pode delegar certas matérias da administração e a gestão corrente da sociedade, sendo que os actos praticados pelos administradores, incluindo os delegados, vinculam a sociedade (art. 408.º do mesmo compêndio legal).
O objecto social da A. e da sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., é em tudo idêntico, dedicando-se ambas à cedência temporária de trabalhadores e a actividades de selecção, orientação e formação profissional.
O simples facto de a R. ter sido nomeada vogal do conselho de administração e administradora delegada de uma sociedade concorrente da sua, então, empregadora importa, no nosso entender, a violação do dever de lealdade, na vertente de obrigação de não concorrência.
Ainda que essa sociedade só tenha iniciado a sua actividade, para efeitos fiscais, em 01/10/2012, ainda que se tenha provado apenas que, pelo menos, a partir de 15/10/2012 a R. tenha passado a exercer e a ser remunerada pelo exercício das funções de administradora, e ainda que a referida sociedade apenas tenha obtido licença para o exercício da sua actividade em 04/12/2012, é inequívoco que a R. assumiu, pelo menos formalmente, o cargo de vogal do conselho de administração e de administradora delegada e que, na pendência da relação laboral, estava pessoalmente envolvida naquela sociedade, pelo que, acompanhando o Acórdão da Relação do Porto de 01/07/2013 (processo n.º 669/09.0TTVFR.P1), “havia um perigo potencial de concorrência, ao qual, legitimamente, segundo as expectativas de receio e estratégia na guerra comercial, a Ré podia associar a posição privilegiada do Autor – e dizemos nós, este tinha o dever de estar consciente disso mesmo”. Ou seja, no caso em apreço, o dever de não concorrência, para além de decorrer directamente da lei, resultava expressamente da cláusula 9.ª do contrato de trabalho celebrado entre as partes e, não há dúvida, a concorrência opera-se, nomeadamente, pela participação do trabalhador em sociedade concorrente, principalmente quando este ocupa o cargo de gestor corrente da sociedade, como sucedeu com a R., que, naturalmente, não poderia deixar de estar consciente da sua nomeação para cargo de administração em empresa concorrente da sua empregadora. A R., enquanto Directora da Agência da A. na Amadora, e exercendo ainda funções de gestão e marketing, desenvolvia funções que impunham a existência de uma relação de confiança com a direcção da A. e não podia deixar de saber que ao participar numa sociedade concorrente estava a violar o dever de lealdade, na perspectiva da obrigação de não concorrência. Aliás, atento o cargo que exercia ao serviço da A., tem que concluir-se que a R. estava, objectivamente, em condições de compreender a relevância concorrencial da sociedade em que se envolveu.
Não logrou a A. provar que tivesse havido um desvio de clientela durante a vigência do contrato de trabalho, ou que a R. tivesse tentado provocar esse desvio, nem que a R. apenas tenha conseguido aceder aos clientes da A., nomeadamente ao cliente KK, S.A., através das funções que exercia por conta da A..
No entanto, é por demais evidente, pelo seu envolvimento pessoal na sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., a existência de um comportamento da R. de molde a criar a expectativa de uma actividade concorrencial ou de um potencial desvio de clientela.
Ao actuar da forma que actuou, a R. violou o dever de lealdade e a obrigação de não concorrência a que estava obrigada por força do contrato de trabalho celebrado com a A..
Neste sentido, de que a violação do dever de lealdade, através da criação de uma situação de concorrência pelo trabalhador, não exige ou implica a efectividade de prejuízos para o empregador em causa, nem o efectivo desvio de clientela, sendo suficiente que esse desvio seja potencial, isto é, não é imperioso que se verifique a prática efectiva de negócios, bastando que o comportamento do trabalhador seja meramente preparatório de molde a criar a expectativa de uma actividade concorrencial, vejam-se, para além do já citado, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09/04/2008, relatado por Mário Pereira, da Relação de Lisboa de 15/06/2011, relatado por Ferreira Marques, e da Relação do Porto de 23/05/2011, relatado por Machado Silva (disponíveis em www.dgsi.pt.
Diga-se, desde já, que se concorda com a abordagem da questão da violação do mencionado dever laboral de lealdade na perspetiva de não concorrência por parte da R./apelante feita nos termos em que se mostra expressa neste excerto da sentença recorrida. Com efeito, estabelecendo-se no art. 128º n.º 1 al. f) do Código do Trabalho e sob a epígrafe “Deveres do trabalhador” que: «Sem prejuízo de outras obrigações, o trabalhador deve:… f) Guardar lealdade ao empregador, nomeadamente não negociando por conta própria ou alheia em concorrência com ele, nem divulgando informações referentes à sua organização, métodos de produção ou negócios», não há dúvida que ao estipular-se no ponto 9.1 da Cláusula 9ª do contrato de trabalho estabelecido em 1 de maio de 2012 entre as aqui A./apelada e R./apelante que: «Durante a vigência do contrato de trabalho, o Segundo Contraente não poderá: (i) prestar trabalho por conta própria ou alheia ou mediante qualquer forma de intermediação directa ou indirecta em empresas que se dediquem a actividade igual ou similar à prosseguida pela Primeira Contraente, salvo autorização expressa por escrito desta; (ii) exercer durante o seu tempo de trabalho qualquer outra actividade profissional, remunerada ou não; (iii) deter, de forma directa ou indirecta, qualquer participação social em sociedades que estabeleçam relações comerciais com a Primeira Contraente e/ou a receber dessas sociedades qualquer contrapartida, em numerário ou em espécie, seja a que título for», as partes contratantes, sobretudo a A./apelada “BB, S.A.”, pretenderam vincar, de forma bem expressa, a importância do acatamento pela trabalhadora R./apelante do dever legal de lealdade na sua vertente de não concorrência e isto, seguramente, tendo em consideração uma forte exigência de confiança em que deveria assentar a relação laboral entre ambas estabelecida e que decorria das funções que a R. era chamada a desempenhar ao serviço da A., ou seja, funções de Diretora de Agência, com funções na área da gestão, marketing, incluindo funções afins ou funcionalmente ligadas a essa atividade, funções que incluíam tarefas e responsabilidades comerciais, que consistiam em angariar clientes, preparar, remeter e negociar com possíveis clientes propostas de prestação de serviços, devendo, para o efeito, estabelecer contactos comerciais com os clientes da sua entidade patronal, bem como tentar angariar novos clientes para esta.
Na verdade, tendo em consideração as funções laborais de Direção de Agência, com o conjunto de tarefas e as responsabilidades delas decorrentes, que a R., com a celebração de tal contrato de trabalho, foi chamada a desempenhar ao serviço da A. «…a obrigação de lealdade constitui uma parcela essencial, e não apenas acessória, da posição jurídica do trabalhador. Este juízo assenta na realidade de que tais cargos envolvem um peculiar grau de confiança, não apenas no plano subjectivo, mas também no que toca às condições objectivas (inserção orgânica e funcional do trabalhador) que induzem riscos particularmente intensos para a realização dos interesses do empregador… este traço do dever de lealdade é tanto mais acentuado quanto mais extensa for a (eventual) delegação de poderes no trabalhador e quanto maior for a atinência das funções exercidas à realização final do interesse do empregador.» como de forma clarividente escreve António Monteiro Fernandes em “Direito do Trabalho” 12ª Edição pag.ªs 232/233.
Ora, quando ainda em pleno desenvolvimento da relação laboral estabelecida entre as partes, mais concretamente a partir de 24 de agosto de 2012, a R. CC, sem qualquer consentimento prévio da sua entidade empregadora já que nada se demonstrou nesse sentido, se predispôs a ser e foi efetivamente nomeada como vogal do conselho de administração e administradora delegada da sociedade “DD, S.A.”, sociedade que, de acordo com a inscrição no registo comercial, foi constituída em 29 de agosto de 2012 e inscrita sob a matrícula n.º 5... com o objeto social de cedência temporária de trabalhadores, desenvolvimento de atividades de seleção, orientação e formação profissional, tendo sido inscrita na Segurança Social em 30 de agosto de 2012, não há dúvida que a R. não poderia deixar de ter a perfeita noção de que, ao participar, em tais termos e naquela altura, na referida sociedade “DD, S.A.”, estava a incorrer em clara violação do mencionado dever de lealdade na vertente de obrigação de não concorrência, em relação à sua entidade empregadora.
Na verdade, como se afirma na sentença recorrida «…é por demais evidente, pelo seu envolvimento pessoal na sociedade DD – Empresa de Trabalho Temporário, S.A., a existência de um comportamento da R. de molde a criar a expectativa de uma actividade concorrencial ou de um potencial desvio de clientela», pois como também refere Júlio Vieira Gomes em “Direito do Trabalho” – Vol. I – Relações Individuais de Trabalho – pag.ª 535 «Para falar-se em concorrência não será necessário pois que se verifique um desvio efectivo da clientela, bastando um desvio meramente potencial» e o certo é que a constituição de uma tal sociedade “DD, S.A.” naquela altura e com a participação da R. nos termos em que esta se verificou, sendo certo que o objeto social de uma tal empresa era em tudo idêntico ao da A./apelada “BB, S.A.”, aquela não poderia deixar de ser encarada como uma futura concorrente desta, como, aliás, se veio cabalmente a demonstrar em face da matéria de facto provada e que anteriormente reproduzimos. Nem se diga que o juízo de prognose de potencial desvio de clientela, em que não é exigível a prova concreta de prejuízos ou o desvio efetivo de clientes (como reconhece a R./apelante) apenas faz sentido numa ação de apreciação de ilicitude de despedimento. Faz igualmente sentido no âmbito da apreciação da verificação de violação ou não do dever de lealdade na vertente de não concorrência numa ação como a ora em apreço.
Contudo, a questão em análise incide, também, na falta de fundamento para a condenação da R./apelante no pagamento de cláusula penal, sobretudo porque, de acordo com a alegação desta, a A./apelada não logrou demonstrar quaisquer prejuízos, pelo que a decisão recorrida violou o disposto no art. 811º do Código Civil.
Vejamos!
Da mesma Cláusula 9ª do contrato de trabalho estabelecido em 1 de maio de 2012 entre ambas as partes, faz parte um ponto 9.2 em que se estipulou que «No caso de qualquer violação, sob qualquer forma, pelo Segundo Contraente das obrigações previstas na presente cláusula, a Primeira Contraente terá direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fracção de serviço do Segundo Contraente, constituindo ainda essa violação justa causa de despedimento.».
Em face desta norma contratual com a natureza de uma efetiva cláusula penal, um dado que devemos considerar na sequência de tudo quanto anteriormente deixamos referido é o de que a aqui R./apelante incorreu, efetivamente, em violação do que se estabelecia no precedente ponto 9.1 da aludida Cláusula 9ª do contrato de trabalho e, assim sendo, por força do estabelecido entre as partes contratantes, assiste à ora A./apelada o direito a uma indemnização correspondente aos prejuízos sofridos, com um mínimo equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fração de serviço da R./apelante.
Todavia, embora esta afirme que aquela não logrou demonstrar ter sofrido quaisquer prejuízos, isso não corresponde à realidade pois face à matéria de facto que também resultou demonstrada e que consta dos pontos 15 a 17 dos factos tidos por assentes na sentença recorrida e que anteriormente reproduzimos, pode afirmar-se que, fruto da violação do já mencionado dever laboral de lealdade na vertente de não concorrência, com a criação da sociedade “DD, S.A.” no momento em que a mesma se verificou e com a participação que nela “ab initio” teve a R/apelante, ainda antes do termo do contrato de trabalho que tinha com a A./apelada, sem dúvida que tal redundou pelo menos na perda para a A./apelada e a muito curto prazo de, pelo menos, um dos seus clientes, a empresa KK, S.A., com quem a A. tinha tido uma faturação mensal média de € 8.000,00 no decurso do ano de 2012 e que, nesse ano, lhe conferira uma margem de lucro média de € 600,00, para além de ser uma empresa com quem a A./apelada havia celebrado seis contratos de utilização de trabalho temporário cujo termo de duração estava previsto para 2013 e 2014.
É verdade que a matéria de facto provada não permite quantificar os prejuízos sofridos pela A./apelada, mas que os sofreu isso sofreu na sequência de um comportamento violador do referido dever laboral e assumido pela R./apelante ainda no decurso da vigência do contrato de trabalho entre ambas existente, razão pela qual e a nosso ver, existe fundamento para a condenação desta na cláusula penal estabelecida no ponto 9.2 da Cláusula 9ª daquele contrato de trabalho.
Não assiste também nesta parte razão à R./apelante.

· Excessividade da condenação da Recorrente no pagamento da quantia de € 26.950,00 a título de cláusula penal e dever de redução da mesma com base na equidade.
Quanto a esta questão de recurso, dispõe o art. 812º n.º 1 do Código Civil que «A cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente; é nula qualquer estipulação em contrário.».
Ensinava o Prof. Mota Pinto em “Direito Civil”, 1980, pag.ª 224 – citado por Abílio Neto em anotação a este preceito do Código Civil – que «A redução da pena só deve efectuar-se em casos excepcionais. A redução destina-se a evitar abusos evidentes, situações de clamorosa iniquidade a que conduzem penas «manifestamente excessivas», francamente exageradas, face aos danos efectivos. Doutro modo, anular-se-iam as vantagens da cláusula penal. O tribunal, não só não deve fixar a pena abaixo do prejuízo do credor, como nem sequer deverá fazê-la coincidir com os prejuízos efectivos, pois a redução da pena destina-se apenas a afastar o exagero da pena e não a anulá-la».
No mesmo sentido se pronunciou João Calvão da Silva em “Cumprimento da Sanção Pecuniária Compulsória”, pag.ª 273 ao afirmar que «A intervenção judicial do controlo do montante da pena não pode ser sistemática, antes deve ser excepcional e em condições e limites apertados, de modo a não arruinar o legítimo e salutar valor coercitivo da cláusula penal, e nunca perdendo de vista o seu carácter «à forfait». Daí que apenas se reconheça ao juiz o poder moderador, de acordo com a equidade, quando a cláusula penal for extraordinária ou manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente».
A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça também tem alinhado por tais entendimentos doutrinais, sendo exemplo disso o douto Acórdão daquele Tribunal de 05/12/2002 proferido no processo n.º 02B3522 e de 24/04/2012 proferido no processo n.º 605/06.6TBVRL.P1.S1, ambos publicados em www.dgsi.pt, e este segundo citado na sentença recorrida.
Revertendo ao caso em apreço, é verdade que se desconhece ao certo o valor dos prejuízos sofridos pela A./apelada com o mencionado comportamento da R./apelante violador do dever de lealdade, na vertente de não concorrência, que se lhe impunha enquanto no cumprimento do contrato de trabalho estabelecido entre ambas. No entanto, as próprias partes, nesse contrato de trabalho, estabeleceram como limite mínimo, em caso de violação de um tal dever por parte da trabalhadora e aqui R./apelante um montante «… equivalente a doze vezes o valor da última retribuição, acrescido do correspondente a duas vezes essa remuneração por cada ano ou fracção de serviço…», sendo certo que, como se afirma na sentença recorrida «…atendendo à natureza do contrato celebrado entre as partes, contrato de trabalho por tempo indeterminado (tendo sido prescindido o período experimental), de carácter tendencialmente duradouro, a remuneração mensal acordada e o cargo de confiança da direcção exercido pela R. (e, acrescentamos nós, as funções de Direção de Agência com as diversas tarefas de responsabilidade que esta foi chamada a desempenhar) numa actividade sujeita a uma elevada concorrência (do conhecimento comum), a cláusula penal fixada para a eventualidade de violação do dever de lealdade e da obrigação de não concorrência não nos parece manifestamente excessiva, pelo que a sua redução colidiria com a necessária preservação do seu valor cominatório e dissuasor».
Ora, o montante da cláusula penal estabelecido na sentença recorrida corresponde precisamente a este limite mínimo convencionado entre as partes no contrato de trabalho entre elas estabelecido em 1 de maio de 2012, razão pela qual não se impõe a sua redução.
Não merece, pois, censura a sentença recorrida, também quanto a esta parte.

III. Decisão.
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas a cargo da R./apelante.
Évora, 25/06/2015

(José António Santos Feteira)
(Paula Maria Videira do Paço)
(Alexandre Ferreira Batista Coelho)