Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
8928/15.7T8STB.E1
Relator: JOÃO NUNES
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
ASSÉDIO
Data do Acordão: 12/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – O assédio previsto no n.º 1 do artigo 29.º do CT implica comportamentos manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, tendo em regra associado um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável.
II –Verifica-se o assédio previsto na referida norma, devendo a empregadora ser condenada pela prática de uma contra-ordenação muito grave, no circunstancialismo em que se apura que tendo proposto a um seu trabalhador – director de engenharia – a revogação do contrato de trabalho por mútuo acordo, que este não aceitou, na sequência, e com o fim de o levar a aceitar a cessação do contrato de trabalho, começou a retirar-lhe funções que até aí desempenhava, atribuiu-lhe um gabinete situado em local distante e separado das instalações onde se encontrava anteriormente, separado dos colegas e da equipa que antes chefiara, gabinete esse sem condições ao normal exercício das funções, e obrigou-o a fazer os registos do tempo de trabalho, o que só se verificava em relação aos trabalhadores de armazém.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 8928/15.7T8STB.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB, S.A. impugnou judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições do Trabalho (Unidade Local de Setúbal) que lhe aplicou (1) a coima no montante de 100 UC por infracção ao disposto no n.º 1 do artigo 279.º do CT (desconto indevido na retribuição mensal de um trabalhador) e (2) a coima, também no valor de 100 UC, por infracção ao disposto no n.º 1 do artigo 29.º do CT (assédio em relação a um trabalhador) e, em cúmulo jurídico, a coima única de 150 UC e a sanção acessória de publicidade.
Mais foi a arguida condenada no pagamento ao trabalhador e à Segurança Social de quantias em dívida, tendo em conta o desconto indevido na retribuição do trabalhador.

Por sentença de 30 de Maio de 2016, da Comarca de Setúbal (Setúbal – Instância Central – 1.ª Secção Trabalho – J2), foi negado provimento ao recurso quanto às coimas parcelares e coima única aplicada, bem como quanto à sanção acessória de publicidade, e revogada a decisão quanto ao pagamento ao trabalhador e à Segurança social das quantias (alegadamente) em dívida aos mesmos.

De novo inconformada, a recorrente interpôs recurso para este Tribunal da Relação, tendo na respectiva motivação formulado as seguintes conclusões:
«1. A decisão administrativa não procede à devida indicação dos factos não provados.
2. A ACT não levou em consideração a defesa apresentada pela recorrente.
3. A ACT não fundamentou a sua decisão de forma a que permitir a correta perceção do seu ratio.
4. A decisão da autoridade administrativa é, por todos essas circunstâncias, nula.
5. A recorrente não adotou qualquer comportamento em relação ao ex-trabalhador CC suscetível de integrar a previsão do art.º 29.º, 1 do CT.
6. Os comportamentos da recorrente que sustentam o alegado assédio moral não foram repetitivos nem reiterados, estando balizados por um curto período de 24 horas.
7. Os comportamentos da recorrente não podem ser interpretados isoladamente, enquadrando justificação no facto de o trabalhador ter sido reintegrado no dia imediatamente anterior à visita inspetiva, circunstância que pressupõe um período de adaptação.
8. Com efeito, o trabalhador foi reintegrado em 14.05.2013 e a inspeção da ACT teve lugar logo no dia seguinte, em 15.05.2013.
9. A ACT não realizou qualquer outra inspeção depois de 15.05.2013.
10. A recorrente não criou um ambiente de trabalho intimidativo.
11. Os comportamentos da recorrente não são suscetíveis de ter um efeito hostil, humilhante ou desestabilizador, designadamente, porque meramente pontuais.
12. A contraordenação correspondente à prática de mobbing tem necessariamente de ser cometida sob a forma dolosa em qualquer das modalidades em que o dolo pode registar-se: direto, necessário ou eventual.
13. O próprio tribunal a quo reconheceu que a recorrente agiu de forma não intencional.
14. Não se encontram preenchidos os elementos característicos do tipo assédio moral, nos termos em que o prevê o art.º 29.º, 1 do CT, designadamente, porque não ficaram provados nem a intencionalidade nem o caráter repetitivo dos alegados comportamentos desestabilizadores.
15. A coima proposta, no valor de € 15.300,00, é manifestamente infundada, devendo ser anulada, o mesmo sucedendo, consequentemente, com a sanção acessória de publicidade.
16. A recorrente não praticou qualquer contraordenação, pelo que o processo contraordenacional deve ser arquivado.
17. A decisão da 1.ª instância viola, entre outros, os artigos 1.º, 2º, 8º e 58º do Regime Geral das Contraordenações, o art.º 25º Regime Processual das Contraordenações Laborais e de Segurança Social, o art.º 29.º, 1 do CT e os artigos 32.º, 10, 61.º, 1 e 268.º, 3 da CRP.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença impugnada e absolvendo-se a arguida, aqui recorrente, como é de inteira JUSTIÇA».

O Ministério Público respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência, concluindo nos seguintes termos:
«1. A Mmª Juiz fundamenta com suficiente clareza a matéria de facto dada como provada e não provada, o mesmo se diga relativamente à fundamentação de direito;
2. A decisão administrativa contém, ao contrário do alegado, contém a indicação dos factos dados como não provados e a ponderação da culpa da recorrente, pelo que não é nula;
3. O trabalhador, que de um momento para o outro, e sem qualquer justificação que lhe possa ser imputada, vê-se afastado das suas funções, dos colegas com quem privava, do seu local de trabalho, são-lhe retirados os instrumentos de trabalho é privado de toda a informação a que tinha direito pelo seu estatuto e funções contratadas, e é colocado num espaço desadequado, para não dizer degradante, tendo em conta o facto de ser dirigente, afastado de tudo e de todos;
4. Situação que se manteve desde 21 de Janeiro até pelo menos 15 de maio de 2013, tinha apenas como objectivo levar o ex-trabalhador a sair da empresa, e só poderia conduzir ao acolhimento pelo trabalhador da proposta de acordo de revogação do contrato de trabalho, que inicialmente não aceitou;
5. Tal situação por indesejada, criou à volta do trabalhador um ambiente intimidativo, hostil, degradante e humilhante, idóneo a atingir o resultado pretendido pela arguida;
6. Assim sendo a douta sentença fez correcta aplicação do direito aos factos dados como provados e não provados.
Mantendo-se a sentença recorrida e desatendendo-se ao recurso interposto, será feita a costumada JUSTIÇA».

Por despacho de 28-09-2016, o recurso foi admitido na 1.ª instância, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, atenta a caução prestada.

Tendo os autos subido a este tribunal, aqui a Exma. Procuradora-Geral Adjunta neles emitiu douto parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Ao referido parecer respondeu a arguida/recorrente, a manifestar a sua discordância e a pugnar, mais uma vez, pela revogação da sentença recorrida e consequente absolvição das contra-ordenações por que foi condenada.

Remetido projecto de acórdão ao Exmo. Desembargador Presidente da Secção, bem como ao Exmo. Desembargador Adjunto, e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões que a recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso – artigos 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, ex vi do artigo 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas) e do artigo 50.º, n.º 4, da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, sendo que este último diploma estabelece o regime jurídico processual aplicável às contra-ordenações laborais e de segurança social.
Assim, tendo em conta as conclusões da motivação do recurso, são as seguintes as questões essenciais decidendas:
1. saber se a decisão da autoridade administrativa é nula, por não indicar os factos não provados, por não ter ponderado a defesa apresentada pela recorrente e por não ter fundamentado a decisão de forma a permitir a correcta percepção da sua ratio;
3. saber se os factos praticados pela recorrente configuram uma infracção ao disposto no artigo 29.º do CT.
Refira-se que em relação à coima (de 100 UC) aplicada à arguida/recorrente por infracção ao disposto no n.º 1 do artigo 279.º do CT (desconto indevido na retribuição do trabalhador), a recorrente omite qualquer referência à mesma no recurso, pelo que terá, forçosamente, que se entender que não é objecto de recurso, considerando-se, por consequência, nesta parte, que a decisão recorrida transitou em julgado.

III. Factos
A) A decisão impugnada deu como provada a seguinte factualidade:
1.) No dia 7 de Fevereiro de 2013, com início pelas 10 horas e 20 minutos, foi realizada visita inspetiva às instalações da sede da ora arguida, tendo a equipa sido recebida pela técnica de recursos humanos, DD, e pela secretária de administração EE.
2.) Foi solicitada a apresentação do registo de tempos de trabalho, o mesmo não foi exibido, porque não existia, tendo tal infração resultado em contraordenação laboral com condenação da arguida em 28 de Março de 2013.
3.) Pelos recursos humanos foi esclarecido que o procedimento de controlo de assiduidade dos trabalhadores, era da responsabilidade do trabalhador e sua chefia sendo efetuados os registos manualmente em aplicação informática pelo próprio trabalhador ou pela sua chefia.
4.) Na retribuição de Janeiro de 2013 foi efectuado desconto na retribuição do Diretor de Engenharia, CC, de 26,5 dias indicadas como faltas injustificadas;
5.) Entre 21 e 25 de Janeiro de 2013, previamente à discussão sobre as presenças/ausências, do trabalhador CC, foi-lhe proposto a revogação do contrato de trabalho por acordo, não tendo sido obtido acordo.
6.) Na sequência da indicação das ausências do referido trabalhador foi-lhe instaurado um processo disciplinar por faltas injustificadas.
7.) Desde essa altura começou a verificar-se a retirada de tarefas e funções próprias que realizava até então, nomeadamente deixou de ser chamado a reuniões, a novos projetos e receber pedidos de serviços.
8.) A empresa foi notificada por ofício a proceder ao apuramento das quantias existentes em dívida ao trabalhador, resultantes do desconto indevido das alegadas faltas injustificadas, devendo, num prazo de 5 dias, apresentar o apuramento efetuado e respetivo comprovativo do pagamento ao trabalhador daquelas quantias.
9.) No prazo fixado a arguida, apresentou resposta, na qual reitera que os descontos efetuados se ficaram a dever a faltas ao trabalho não procedendo ao apuramento e/ou pagamento de quaisquer verbas ao trabalhador.
10.) A empresa arguida não apresentou quaisquer elementos que evidenciassem que o trabalhador CC havia efetivamente cometido as faltas injustificadas em Dezembro de 2012 e em Janeiro de 2013 e que resultaram nos descontos efetuados referentes a 26,5 dias.
11.) Em 21 de Fevereiro 2013 foi ouvido novamente em declarações o trabalhador CC, nas instalações da ACT, sobre cada um dos dias em que lhe era atribuída falta injustificada.
12.) Após ter cessado a negociação com vista a revogação do contrato por acordo, a empresa deduziu, sem que houvesse factos que o fundamentassem, 26,5 dias na retribuição referente ao mês de Janeiro de 2013.
13.) Após decisão de despedimento, na sequência de procedimento disciplinar que lhe foi instaurado, o trabalhador requereu, junto do Tribunal de Setúbal, procedimento Cautelar de Suspensão de Despedimento o qual foi julgado procedente, conforme sentença de 09.05.2013.
14.) A arguida enquanto empregadora, recorreu da sentença, não requerendo o efeito suspensivo da mesma, pelo que foi obrigada a reintegrar o trabalhador.
15.) Após a reintegração do trabalhador foi-lhe atribuído um gabinete situado num local distante e separado fisicamente das instalações onde se encontrava anteriormente, separado dos colegas e equipa que antes chefiara, gabinete situado junto a um armazém com acesso condicionado aos horários dos funcionários do armazém;
16.) O gabinete situava-se num anexo usado somente para aceder às instalações sanitárias e estava equipado somente com uma secretária, uma cadeira e foi-lhe entregue uma caneta, um bloco e uma borracha;
17.) A arguida, mesmo não tendo um registo de tempos de trabalho para praticamente todos os seus trabalhadores, obrigou a que o trabalhador CC tivesse de o fazer, englobando-o no registo que os trabalhadores de armazém passaram a fazer durante determinado período, sendo este registo supervisionado pelo responsável de armazém.
18.) O trabalhador foi retirado de todos os projetos onde se encontrava, tendo-lhe sido atribuída uma única tarefa (efetivar um inventário técnico dos equipamentos ativos e passivos da rede).
19.) Deixou de exercer efetivamente funções de Direção, nomeadamente não tendo serviços e trabalhadores sob sua dependência hierárquica;
20.) Ainda que a Direção de Engenharia e Operações se inclua na Área de Tecnologias e Sistemas de Informação, foi o trabalhador, Diretor de Engenharia e Operações, retirado daquele departamento, e colocado na dependência hierárquica do Diretor Geral.
21.) Em ambas as visitas inspetivas, especialmente em 15 de Maio de 2013, o trabalhador CC apresentava-se notoriamente afetado com a situação laboral em que se encontrava.
22.) O comportamento descrito, adotado pela arguida, produziu um efeito perturbador e constrangedor no trabalhador, afetando a sua dignidade, para além disso, a arguida, criou, para aquele trabalhador, um ambiente hostil, degradante e desestabilizador.
23.) Ao agir do modo descrito a arguida não agiu com o dever de cuidado a que estava obrigada enquanto entidade patronal, incumprindo assim as disposições legais de que vem acusada.
24.) A arguida tem um volume de negócios superior a 100.000.000 euros.
25.) O trabalhador intentou contra a arguida uma acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento com o n.º 296/13.8TTSTB-A no seguimento da providencia cautelar de suspensão provisória de despedimento que decretou a suspensão do despedimento.
26.) O trabalhador peticionou a declaração de ilicitude do seu despedimento no que obteve procedência por sentença já transitada em julgado.
27). No âmbito da referida acção peticionou ainda «que seja a R. condenada a reintegrá-lo no mesmo estabelecimento da empresa; seja a R. condenada a pagar ao A. as retribuições que este deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento; seja a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 2.631,75 a título de valor da retribuição inerente ao benefício de utilização da viatura automóvel, no período compreendido entre 22 de Outubro de 2012 e 11 de Junho de 2013, e a integrar o valor de € 344,77/mês no vencimento base do A.; seja a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 656,62, a título de valor da retribuição inerente ao benefício de pagamento das despesas de combustível em utilização pessoal da viatura automóvel, no período compreendido entre 22 de Outubro de 2012 e 11 de Junho de 2013, e a integrar o valor de € 86,02/mês no vencimento base do A.; seja a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 5.540,62, correspondentes aos 26,5 dias de retribuição, incluindo subsídio de refeição, que lhe descontou em 31 de Janeiro de 2013; seja a R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 4.611,60, a título de prémio de desempenho relativo ao ano fiscal de 2012; seja R. condenada a pagar ao A. a quantia de € 15.000 a título de indemnização por danos não patrimoniais. Para o caso de vir a optar por uma indemnização em substituição da reintegração, ou em caso de improcedência da acção, peticionou o A. a condenação da R. a pagar-lhe as quantias de € 6.100, a título de direito a férias vencido em 01/01/2013, € 6.100, a título do correspondente subsídio de férias, e € 5.078,25, a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, exigíveis por causa da cessação do contrato de trabalho».
28.) Foi proferida decisão final na acção com o n.º 296/13.8TTSTB-A, devidamente transitada em julgado, nos termos da qual a ora arguida foi condenada a «a) a reintegrar o A. no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; b) a pagar ao A. as retribuições que este deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento, a apurar em sede de liquidação; c) a repor ao A. a quantia de € 5.540,62, descontada em 31/01/2013; d) a pagar ao A. a quantia mensal de € 344,77 desde Outubro de 2012 a Junho de 2013, correspondente ao valor da prestação retributiva relativa ao uso pessoal do veículo de serviço, e a integrar aquele valor no vencimento base do A. a partir daquela data; e) a pagar ao A. quantia correspondente ao valor da prestação retributiva relativa às despesas de combustível e portagens concernente ao uso pessoal do veículo de serviço, desde Outubro de 2012 a Junho de 2013, e a integrar esse valor no vencimento do A. a partir daquela data, a liquidar; f) a pagar ao A. indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 5.000».

B) A decisão impugnada da 1.ª instância deu como não provada a seguinte factualidade:
1. A dedução, na retribuição de janeiro de 2013, do trabalhador CC, de 26,5 dias, reporta-se a ausências qualificadas como faltas injustificadas;
2. No período de novembro de 2012 a janeiro de 2013, nos dias em que o trabalhador CC esteve ausente, não esteve ao serviço da arguida;
3. O trabalhador CC recusou-se a cumprir as ordens do seu Diretor-Geral de efetivar um inventário técnico do equipamento ativo e passivo da rede existentes no armazém, tarefa que se enquadra no âmbito das funções do referido trabalhador;
4. A atribuição de um outro Gabinete, diferente do que ocupava até janeiro de 2013 (com condições de acesso, conforto, modernidade e equipamentos, inferiores aos que possuía até então), noutras instalações afastadas do edifício principal, não causou constrangimentos de movimentação e de dignidade para o trabalhador, criando-lhe um ambiente de trabalho hostil, degradante e desestabilizador.

IV. Fundamentação
Delimitadas supra as questões essenciais a decidir, é o momento de analisar e decidir, de per si, cada uma delas.

1. Da (arguida) nulidade da decisão administrativa
Como já se deixou referido, a recorrente sustenta a nulidade da decisão da autoridade administrativa por, em síntese, não ter procedido à indicação dos factos não provados, por não ter levado em consideração a defesa apresentada (pela recorrente) e por não fundamentar suficientemente a decisão.
Vejamos.

Refira-se, antes de mais, que uma questão em tudo idêntica à aqui suscitada foi analisada e decidida no acórdão deste tribunal de 29-09-2016, também relatado pelo ora relator, proferido no Proc. n.º 8929/15.5T8STB.E1.
Por isso, vamos acompanhar, a par e passo, o que ali escrevemos.
É sabido que o direito contra-ordenacional ou direito de mera ordenação social encontra-se no nosso ordenamento jurídico autonomizado em relação ao direito penal. O Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10, com as alterações sucessivamente introduzidas, regula tal ramo do direito e, especificamente em relação a contra-ordenações laborais e da segurança social, a Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro.
Não obstante, assinalam Oliveira Mendes e Santos Cabral (Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 3.ª Edição, Almedina, pág. 27), face às alterações operadas no Direito de mera ordenação social pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, as bases normativas deste regime e as soluções da Parte Geral do Código Penal acentuaram-se, «(…) recorrendo agora o legislador na maior parte dos casos à importação pura e simples das soluções do Direito penal».
Tal aproximação ou “importação” verifica-se, designadamente, na vertente adjectiva, através de um reforço do garantismo.
Todavia, tal não pode significar que se desprezem por completo as regras existentes no Direito de mera ordenação social, maxime tendo presente a simplicidade da tramitação processual, seja na fase administrativa, seja, até, na fase de impugnação judicial.
Também o Tribunal Constitucional se tem pronunciado sobre as diferenças entre o ilícito penal e o ilícito de mera ordenação social, maxime quanto ao princípio da culpa e da proporcionalidade.
Escreveu-se, para tanto, no acórdão n.º 336/2008, de 19-06-2008, do referido tribunal (disponível em www.tribunalconstitucional.pt):
«No plano infraconstitucional, à semelhança do que sucede em direito penal, o direito de mera ordenação social português também repudia a responsabilidade objectiva, pois, segundo o disposto no n.º 1, do artigo 1.º, do regime geral das contra-ordenações, aprovado pelo Decreto-lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), na redacção do Decreto-lei n.º 244/95, “constitui contra-ordenação todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima”.
Todavia, não obstante este ponto de contacto, existem, desde sempre, razões de ordem substancial que impõem a distinção entre crimes e contra-ordenações, entre as quais avulta a natureza do ilícito e da sanção (vide FIGUEIREDO DIAS, em “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 144-152, da ed. de 2001, da Coimbra Editora).
A diferente natureza do ilícito condiciona, desde logo, a eventual incidência dos princípios da culpa, da proporcionalidade e da sociabilidade.
É que “no caso dos crimes estamos perante condutas cujos elementos constitutivos, no seu conjunto, suportam imediatamente uma valoração – social, moral, cultural – na qual se contém já a valoração da ilicitude. No caso das contra-ordenações, pelo contrário, não se verifica uma correspondência imediata da conduta a uma valoração mais ampla daquele tipo; pelo que, se, não obstante ser assim, se verifica que o direito valora algumas destas condutas como ilícitas, tal só pode acontecer porque o substrato da valoração jurídica não é aqui constituído apenas pela conduta como tal, antes por esta acrescida de um elemento novo: a proibição legal.” (FIGUEIREDO DIAS, na ob. cit., pág. 146).
Não se trata aqui “de uma culpa, como a jurídico-penal, baseada numa censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, mas apenas de uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor; dito de outra forma, da adscrição social de uma responsabilidade que se reconhece exercer ainda uma função positiva e adjuvante das finali­dades admonitórias da coima” (FIGUEIREDO DIAS em “O movimento da descriminalização e o ilícito de mera ordenação social”, in “Jornadas de Direito Criminal: O Novo Código Penal Português e Legislação Complementar”, I, pág. 331, da ed. de 1983, do Centro de Estudos Judiciários).
E por isso, se o direito das contra-ordenações não deixa de ser um direito sancionatório de carácter punitivo, a verdade é que a sua sanção típica “se diferencia, na sua essência e nas suas finalidades, da pena criminal, mesmo da pena de multa criminal (…) A coima não se liga, ao contrário da pena criminal, à personalidade do agente e à sua atitude interna (consequência da diferente natureza e da diferente função da culpa na responsabilidade pela contra-ordenação), antes serve como mera admoestação, como especial advertência ou reprimenda relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas; e o que esta circunstância representa em termos de medida concreta da sanção é da mais evidente importância. Deste ponto de vista se pode afirmar que as finalidades da coima são em larga medida estranhas a sentidos positivos de prevenção especial ou de (re)socialização.” (FIGUEIREDO DIAS, em “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 150-151, da ed. de 2001, da Coimbra Editora).
Daí que, em sede de direito de mera ordenação social, nunca há sanções privativas da liberdade. E mesmo o efeito da falta de pagamento da coima só pode ser a execução da soma devida, nos termos do artigo 89.º, do Decreto-lei n.º 433/82, e nunca a da sua conversão em prisão subsidiária, como normalmente sucede com a pena criminal de multa.
Por outro lado, para garantir a eficácia preventiva das coimas e a ordenação da vida económica em sectores em que as vantagens económicas proporcionadas aos agentes são elevadíssimas, o artigo 18.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 433/82 (na redacção dada pelo Decreto-lei n.º 244/95), permite que o limite máximo da coima seja elevado até ao montante do benefício económico retirado da infracção pelo agente, ainda que essa elevação não possa exceder um terço do limite máximo legalmente estabelecido, erigindo, assim, a compensação do benefício económico como fim específico das coimas.
Estas diferenças não são nada despiciendas e deverão obstar a qualquer tentação de exportação imponderada dos princípios constitucionais penais em matéria de penas criminais para a área do ilícito de mera ordenação social» (em idêntico sentido, vejam-se, entre outros, os acórdãos do mesmo tribunal n.º 659/2006 e n.º 487/2009).
Em relação à decisão condenatória da autoridade administrativa, estipulam as alíneas b) e c) do artigo 25.º da Lei n.º 107/2009 – que correspondem às alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 58.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10 – que a decisão que aplica a coima e ou as sanções acessórias deve conter a descrição dos factos imputados com indicação das provas obtidas e as normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão.
Porém, como escrevem Oliveira Mendes e Santos Cabral, a propósito deste último preceito legal (obra citada, pág. 194), encontramo-nos «(…) no domínio de uma fase administrativa, sujeita às características da celeridade e simplicidade processual, pelo que o dever de fundamentação deverá assumir uma dimensão qualitativamente menos intensa em relação à sentença penal. O que de qualquer forma deverá ser patente para o arguido são as razões de facto e de direito que levaram à sua condenação, possibilitando ao arguido um juízo de oportunidade sobre a conveniência da impugnação judicial e, simultaneamente, e já em sede de impugnação judicial permitir ao tribunal conhecer o processo lógico de formação da decisão administrativa. Tal percepção poderá resultar do teor da própria decisão ou da remissão por esta elaborada».
Ou seja, mister é que a decisão contenha as razões, ainda que sumárias, de facto e de direito, que conduziram à condenação da arguida, de forma a que esta possa aferir da oportunidade de impugnar judicialmente a decisão; porém, (a decisão) não tem que ter o rigor de uma sentença penal.
Dito ainda de outro modo: importa que a decisão da autoridade administrativa contenha, além do mais, uma descrição sucinta dos factos que são imputados à arguida, a respectiva subsunção jurídica e a indicação das circunstâncias que justificam a aplicação da concreta coima.
Daí que a decisão administrativa não tenha que obedecer, em toda a sua extensão, ao disposto, por exemplo, nos 358.º e 359.º do Código de Processo Penal, ou nos artigos 374.º e 379.º, do mesmo compêndio legal.

No caso em apreciação consta da proposta de decisão, sob o n.º I, a ”Descrição dos factos”/diligências levados a cabo, fazendo-se aí referência, além do mais, às respostas apresentadas pela arguida às informações/esclarecimentos que lhe foram solicitados pela autoridade administrativa.
E sob o n.º II da mesma proposta de decisão consta, de forma expressa, a “Defesa” apresentada pela arguida aos factos que lhe foram imputados.
Por sua vez, sob o n.º V constam os factos “Provados” e no n.º V os factos “Não Provados”.
Naturalmente que nesses factos – provados ou não provados – não há incluir todos aqueles alegados pela arguida, mas tão só os relevantes para a decisão.
Atente-se que nesses factos “não provados” consta, entre o mais, (i) que o trabalhador CC se tenha recusado a cumprir as ordens do seu Director-Geral de efectivar um inventário técnico de equipamentos activos e passivos da rede existentes no armazém, (ii) que essa tarefa se enquadre nas suas funções e (iii) que a atribuição de um gabinete diferente do que ocupava até Janeiro de 2013 (com condições de acesso, conforto, modernidade e equipamentos inferiores aos que possuía até então) não tenha causado constrangimentos de movimentação e de dignidade para o trabalhador, criando-lhe um ambiente de trabalho hostil, degradante e desestabilizador.
Seguidamente, no n.º VI da mesma proposta consta a “Motivação de decisão de facto”: em síntese, com base no auto de notícia, nos documentos juntos aos autos, sendo que o “o inspector autuante dá conta dos factos por si presenciados, de forma pessoal e directa”, na resposta da arguida e ainda a indicação quanto aos factos “não provados” que assim foram dados por falta de prova.
Finalmente, sob o n.º VII procede-se à «análise crítica dos factos e aplicação do Direito», onde se faz a subsunção fáctico-jurídica, para concluir que a arguida cometeu as contra-ordenações por que lhe foi levantado o auto de notícia e, bem assim, a moldura das coimas: aí se refere, nomeadamente, o porquê de a arguida ter praticado a contra-ordenação ora em apreciação (o comportamento da arguida, ainda que não intencional, constitui uma retaliação e penalização contra o trabalhador face à sua não aceitação da cessação do contrato de trabalho), e o elemento subjectivo da infracção (dada a especial qualidade da empregadora era-lhe exigível que pautasse o seu comportamento de forma diferente, respeitando os direitos do trabalhador).
Sequencialmente, sob o n.º VIII, fundamentam-se as coimas parcelares, bem como a coima única aplicada e a sanção acessória de publicidade.
Na decisão final, concordando-se com a proposta de decisão, foi a mesma dada por reproduzida nos termos do n.º 5 do artigo 25.º da Lei n.º 107/2009.
Atente-se que de acordo com este número e artigo, [a] fundamentação da decisão pode consistir em mera declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas de decisão elaborados no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação”.
Pois bem: como se disse, o que é fundamental é que a decisão administrativa contenha as razões, ainda que sumárias, de facto e de direito, que conduziram à condenação da arguida.
Ora, no caso, a decisão administrativa, por força do referido n.º 5 do artigo 25.º da Lei n.º 107/2009, explicita, de forma que consideramos clara e suficiente, os factos provados e não provados relevantes, os meios de prova e, enfim, as razões de facto e de direito da condenação da arguida, motivo por que não vislumbramos qualquer fundamento para que a mesma se possa considerar nula.
Improcedem, por consequência, nesta parte as conclusões da motivação de recurso.

2. Quanto a saber se é de imputar à arguida, aqui recorrente, a contra-ordenação por violação do disposto no artigo 29.º do CT
A este propósito sustenta a arguida/recorrente que não lhe pode ser imputada a infracção em causa, ancorando-se para tanto em três argumentos essenciais: (i) os comportamentos que lhe são imputados encontram-se balizados num curto de período de 24 horas, (iii) não criou um ambiente hostil e (iii) a prática de mobbing tem necessariamente de ser cometida sob a forma dolosa.
Adiantando desde já solução, impõe que se diga que não podemos acompanhar o entendimento da recorrente.
Expliquemos porquê.
De acordo com o disposto no artigo 15.º do CT, o empregador, incluindo as pessoas singulares que o representam, e o trabalhador gozam do direito à respectiva integridade física e moral.
E sob a epígrafe “Assédio”, prescreve o n.º 1 do artigo 29.º que se entende por assédio o «(…) comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador»; por sua vez, prescreve o n.º 2 do mesmo artigo que «[c]onstitui assédio sexual o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objectivo ou efeito referido no número anterior».
Com este preceito alargou-se o âmbito do assédio, pois enquanto no anterior Código (n.º 2 do artigo 24.º) se qualificava como tal todo o comportamento indesejado conexionado com um dos factores indicados no n.º 1 do artigo 23.º, no Código actual passou a abranger qualquer comportamento indesejado que crie situações humilhantes, vexatórias e atentatórias da dignidade do trabalhador.
Como faz notar Guilherme Dray (in Código do Trabalho Anotado, de Pedro Romano Martinez e Outros, 9.ª Edição, 2013, Almedina, págs. 185-186), o conceito de assédio passou a abranger «(…) não apenas as hipóteses em que se vislumbra na esfera jurídica do empregador o objectivo de afectar a dignidade do visado, mas também aquela em que, ainda que se não reconheça tal desiderato, ocorra o efeito a que se refere a parte final do n.º 2. (…) Conjugando este preceito com o artigo 15º, conclui-se que o assédio a que se refere o presente preceito abarca também, para além do assédio sexual, o assédio moral discriminatório, habitualmente denominado de mobbing – prática persecutória reiterada, contra o trabalhador, levada a efeito, em regra, pelos respetivos superiores hierárquicos ou pelo empregador, tendo por base um dos fatores de discriminação previsto no artigo 24º, a qual tem por objetivo ou como efeito afetar a dignidade do visado, levando-o eventualmente ao extremo de querer abandonar o emprego».
Afirmou-se a este propósito no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-03-2012 (Proc. n.º 429/09.TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt) que o que importa apurar é, ao fim e ao resto, se há aspectos da conduta do empregador para com o trabalhador (através dos seus superiores hierárquicos) que sejam aptos a criar neste um desconforto e mal estar no trabalho que firam a respectiva dignidade profissional e integridade moral e psíquica; ou, no dizer do acórdão do mesmo tribunal, de 03-12-2014 (Proc. n.º 712/12.6TTPRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt) «[o] assédio moral implica comportamentos (em regra oriundos do empregador ou de superiores hierárquicos do visado) real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador[], aos quais estão em regra associados mais dois elementos: certa duração; e determinadas consequências».
Porém, como se acentua no mesmo acórdão, no assédio não tem de estar presente o elemento volitivo de afectar o trabalhador, bastando que este resultado seja consequência do comportamento adoptado pelo empregador: mas, apesar do legislador ter prescindido do elemento volitivo, o assédio, em qualquer das modalidades, tem em regra associado um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável.
No caso que nos ocupa, ao contrário do que perpassa pela motivação de recurso da recorrente, não se trata de um acto isolado, que vigorou apenas durante 24 horas, mas sim de um conduta que se iniciou entre 21 e 25 de Janeiro de 2013 e se prolongou, pelo menos, até 15 de Maio de 2013.
Com efeito, conforme dá conta a matéria de facto, entre 21 e 25 de Janeiro de 2013 a empregadora, aqui recorrente, propôs ao trabalhador CC, Director de Engenharia, a revogação do contrato de trabalho por mútuo acordo, mas sem êxito.
Desde essa altura começou a verificar-se a retirada de funções ao trabalhador – funções essas que até então desempenhava –, nomeadamente deixou de ser chamado a reuniões, a novos projectos e de receber pedidos de serviços.
E logo no final desse mês foi-lhe efectuado desconto na retribuição, com indicação de 26,5 dias de faltas injustificadas, não tendo, todavia, não obstante lhe ter sido solicitado, apresentado qualquer prova de que o trabalhador tinha faltado ao trabalho; e instaurou também procedimento disciplinar ao trabalhador com fundamento nas faltas injustificadas, que culminou com o seu despedimento, o qual foi impugnado judicialmente, desde logo através de providência cautelar de despedimento, que veio a ser julgada procedente.
Na sequência, tendo sido obrigada a reintegrar o trabalhador, atribuiu-lhe um gabinete situado em local distante e separado das instalações onde se encontrava anteriormente, separado dos colegas e da equipa que antes chefiara, gabinete esse situado num anexo usado somente para aceder às instalações sanitárias, junto a um armazém com acesso condicionado aos horários dos funcionários do armazém, e que apenas dispunha de uma secretária, de uma cadeira, tendo sido apenas entregue ao trabalhador uma caneta, um bloco e uma borracha.
Além disso, não obstante a arguida não ter registo de tempos de trabalho para praticamente todos os trabalhadores, obrigou o referido trabalhador CC a ter que fazer o registo do tempo de trabalho, englobando-o no registo que os trabalhadores de armazém passaram a fazer durante determinado período, registo supervisionado pelo responsável do armazém.
Tudo isto, recorde-se, na sequência da proposta feita ao trabalhador entre 21 e 25 de Janeiro de 2013, para revogação do contrato por acordo, que ele não aceitou, da subsequente instauração de procedimento disciplinar que culminou com o despedimento, que ele impugnou judicialmente e da necessidade de o reintegrar no seu posto de trabalho.
Houve, pois, uma prática reiterada sobre o trabalhador durante, pelo menos, cerca de 4 meses, com o objectivo de o levar a aceitar a cessação do contrato de trabalho, ou até de tomar ele mesmo a iniciativa de fazer cessar a relação de trabalho.
Convenhamos que se nos afigura pacífico que é um comportamento humilhante, vexatório para com um trabalhador que desempenhava as funções de Director de Engenharia, que tinha trabalhadores sob a sua dependência hierárquica, não só por lhe serem efectuados descontos indevidos na retribuição e lhe ter sido instaurado procedimento disciplinar que culminou com um despedimento sem justa causa, mas sobretudo por ter sido retirado das funções de direcção, deixar de ter trabalhadores sob a sua dependência e ser-lhe atribuída como única tarefa a realizar o inventário técnico dos equipamentos activos e passivos da rede…nas instalações que se deixaram descritas, anexo usado somente para aceder às instalações sanitárias!
Como também já se deixou assinalado, o assédio não implica necessariamente o elemento volitivo de afectar o trabalhador, o mesmo é dizer o dolo, bastando que o trabalhador seja afectado pelo comportamento do empregador que visava um fim ilícito; foi o que se passou no caso em presença: com o comportamento adoptado a arguida/recorrente visava encontrar forma de pôr fim à relação do trabalho com o trabalhador, utilizando para tal meios (retirada de funções, colocação em local sem as condições adequadas, etc.) vexatórios, humilhantes para com o trabalhador.
Por isso, torna-se imperioso concluir que a arguida cometeu a contra-ordenação em causa.
Assim, aqui chegados, sem desdouro pelo esforço argumentativo da recorrente, mais não resta que afirmar que o recurso não pode obter provimento.

3. Vencida no recurso, a recorrente deverá suportar o pagamento das custas respectivas, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC (artigo 59.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro, e artigo 8.º, n.ºs 7 e 9, do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, e respectiva tabela III anexa).

V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto por BB, S.A., e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

(Documento elaborado e integralmente revisto pelo relator – artigo 94.º, n.º 2, do CPP).

Évora, 07 de Dezembro de 2016
João Luís Nunes (relator)
Moisés Pereira da Silva