Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
133/13.3GBODM.E1
Relator: CARLOS JORGE BERGUETE
Descritores: FACTOS CONCRETOS
BURLA INFORMÁTICA
Data do Acordão: 11/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – Se se provou quando, onde, como e de quanto o arguido se apropriou, resultando, pois, as datas em que as suas acções aconteceram, como se verificaram e em que locais, incluindo os contornos objectivos que revestiram e as consequências daí decorrentes, tendo na sua posse um computador portátil onde estavam instalados os programas específicos para tratamento de dados relativos a ATM’s, através dos quais efectuou intervenções informáticas, consubstanciadas em ordenar que as máquinas expelissem dinheiro e, na circunstância, não autorizadas, não se está perante afirmações ou factos genéricos.
II - A circunstância do crime de burla informática se tratar de um crime de execução vinculada restringe-se à exigência de que a lesão do património se produza através de meios informáticos, realizada por alguma das acções descritas no preceito incriminador.
III - O iter criminis revela-se, em concreto, em que, não estando autorizado a fazê-lo e dispondo de programas específicos para o tratamento dos dados em causa, o arguido fez com que as máquinas lhe fornecessem o dinheiro, assim tendo utilizado dados e intervindo no processamento das mesmas, inevitavelmente servindo-se da informática.
IV – A previsão do ilícito abarca modus operandi que se reconduza a essa utilização idónea a interferir no resultado do tratamento de dados, a ser efectivada “por qualquer modo”, compatível com as razões que presidiram à criação do tipo legal, em contrário à perspectiva de que a pormenorização meramente técnica seja necessária, o que, a não ser assim, se tornaria fácil caminho para o esvaziamento da tipicidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Criminal
do Tribunal da Relação de Évora

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1. RELATÓRIO

Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, com o número em epígrafe, da Instância Central da Comarca de Beja, o Ministério Público acusou JMBL, imputando-lhe, em autoria material e em concurso efectivo, a prática de três crimes de burla informática, p. e p. pelo art. 221.º, n.º 1, do Código Penal (CP) e cinco crimes de burla informática agravada, p. e p. pelo art. 221.º, n.ºs 1 e 5, alínea a), do CP.
Foram deduzidos pedidos de indemnização civil:
- pela assistente Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de S, CRL, pedindo a condenação do arguido/demandado no ressarcimento da quantia com que ilegitimamente se apoderou, retirada de uma caixa multibanco de sua propriedade, no montante total de € 12.000,00 (doze mil euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;
- pela assistente E – Empresa de Segurança, S.A., pedindo a condenação do arguido/demandado no pagamento de uma indemnização no valor de € 20.000,00 (vinte mil euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, pelo dano não patrimonial que a conduta do arguido causou à sua imagem e reputação;
- por G – Vigilância e Prevenção Electrónica, Unipessoal, Lda., pedindo a condenação do arguido/demandado no ressarcimento da quantia com que ilegitimamente se apoderou, retirada de uma caixa multibanco propriedade de um dos seus clientes, que teve de ressarcir no âmbito do contrato de prestação de serviços que celebrou, no montante total de € 8.000,00 (oito mil euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;
- por Banco C, S.A., pedindo a condenação do arguido/demandado no ressarcimento da quantia com que ilegitimamente se apoderou, retirada de duas caixas multibanco de sua propriedade, no montante total de €6.760,00 (seis mil setecentos e sessenta euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;
- pelo assistente Banco N, S.A., pedindo a condenação do arguido/demandado no ressarcimento da quantia com que ilegitimamente se apoderou, retirada de duas caixas multibanco de sua propriedade, no montante total de € 24.000,00 (vinte e quatro mil euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;
- por Banco S, S.A., pedindo a condenação do arguido/demandado no ressarcimento da quantia com que ilegitimamente se apoderou, retirada de duas caixas multibanco de sua propriedade, no montante total de € 11.790,00 (onze mil setecentos e noventa euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento.
O arguido contestou separadamente a acusação pública e os pedidos de indemnização cíveis.
Quanto à acusação, arguiu a ilegitimidade do Ministério Público para o procedimento criminal relativamente aos crimes de natureza semi-pública que lhe imputou, por falta de exercício do direito de queixa pelos respectivos titulares, sendo que, ainda, como alegou, omite factos, assenta em conclusões, não identifica nem descreve a concreta actuação do arguido nem os meios utilizados para se apoderar das descritas quantias. Mais invocou serem falsos os factos descritos, sendo possível que tenha existido responsabilidade de quem tinha como função carregar e descarregar o dinheiro nas ATM. Terminou pedindo a sua absolvição.
Quanto aos pedidos de indemnização cíveis, concluiu pela sua improcedência face à posição por si assumida em relação à acusação pública, invocando ainda que o Demandante G não tinha legitimidade para deduzir tal pedido porque, a existir lesado, seria o Bf.
Realizado o julgamento e proferido acórdão, neste decidiu-se:
- julgar a acusação parcialmente procedente e, em consequência:
- absolver o arguido como autor material, de três crimes de burla informática agravada (ATM´s instaladas nos estabelecimentos M, SB e A Shopping) e de um crime de burla informática simples (ATM instalada no estabelecimento R);
- declarar extinto o procedimento criminal, por ilegitimidade do Ministério Público para a acção penal, relativamente a um crime de burla informática simples (ATM instalada no estabelecimento P);
- condenar o arguido pela prática, em concurso real, efectivo, de dois crimes de burla informática agravada, p. e p. pelo art. 221.º, n.ºs 1 e 5, alínea a), do CP, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão, com respeito à ATM instalada na seguradora A em Castro Verde e, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, com respeito às ATM´s instaladas no Hospital de B e no Centro Comercial Ar, em S;
- em cúmulo jurídico de penas, condená-lo na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período;
- sujeitar a suspensão da execução da pena única de prisão a regime de prova a elaborar pela DGRSP, que contemplará o pagamento aos lesados, na respectiva proporção, do valor global de € 20.510,00 (vinte mil quinhentos e dez euros), a ser efectuado em tranches semestrais ao longo do período da suspensão, com excepção da última que ocorrerá no final dos quatro meses restantes, tranches essas igualmente proporcionais ao prejuízo sofrido por cada um dos lesados, devendo tal pagamento ser demonstrado nos autos nos dez dias subsequentes ao respectivo vencimento;
- julgar os pedidos de indemnização cíveis parcialmente procedentes e, em consequência:
- julgar extinta a instância cível, por impossibilidade superveniente da lide, quanto ao pedido deduzido pelo demandante Banco C, S.A., com respeito ao prejuízo sofrido na ATM instalada no P de Al;
- absolver o demandado dos pedidos deduzidos por Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de S, CRL, por Banco S, S.A. e por E:
- condenar o demandado a pagar a G, Lda. a quantia de € 8.000,00 (oito mil euros), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento;
- condenar o demandado a pagar a Banco Ma quantia de € 4.510,00 (quatro mil quinhentos e dez euros), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento;
- condenar o demandado a pagar a Banco N, S.A., a quantia de € 8.000,00 (oito mil euros), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.


Inconformado com tal decisão, o arguido/demandado interpôs recurso, formulando as conclusões:
a) AO CONSIDERAR COMO FACTOS PROVADOS A MATÉRIA ASSENTE EM 3/5/9/11/13/14/15/19/20/24, A QUAL ASSENTE EM CONSIDERAÇÕES GENÉRICAS E CONCLUSIVAS SOBRE AS QUAIS NÃO PODE O ARGUIDO EXERCER O CONTRADITÓRIO A SENTENÇA RECORRIDA VIOLOU O DIREITO AO CONTRADITÓRIO, ENQUANTO PARTE INTEGRANTE DO DIREITO DE DEFESA DO ARGUIDO, CONSTITUCIONALMENTE CONSAGRADO NO ART.º 32.º DO CRP, PELO QUE TAL MATÉRIA NÃO PODE SER DADA COMO ASSENTE.
b) AO CONDENAR O ARGUIDO O TRIBUNAL “ QUO” FEZ UM INCORRETA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS, TENDO FEITO UMA INCORRETA INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 221.º DO CÓDIGO PENAL, EM CONCRETO SOBRE O PREENCHIMENTO DO TIPO DO CRIME DE BURLA INFORMÁTICA PORQUANTO NÃO SE VERIFICAM ELEMENTOS OBJECTIVOS DO TIPO DE CRIME EM QUESTÃO.

c) INTEGRAM O ELEMENTO OBJETIVO DO TIPO ARTIGO 221.º DO CÓDIGO PENAL MODOS VINCULATIVOS E ALTERNATIVOS DE EXECUÇÃO DA “ACÇÃO TÍPICA PRINCIPAL”, OU SEJA, TRÊS POSSIBILIDADES DEACÇÕES TÍPICAS ACESSÓRIASE UMA CLÁUSULA ABERTA A FUNCIONAR COMO ALTERNATIVA AOS COMPORTAMENTOS DESCRITOS NO TIPO:
(1)MEDIANTE ESTRUTURAÇÃO INCORRECTA DE PROGRAMA INFORMÁTICO”,
(2)UTILIZAÇÃO INCORRECTA OU INCOMPLETA DE DADOS
(3)UTILIZAÇÃO DE DADOS SEM AUTORIZAÇÃO
(4)INTERVENÇÃO POR QUALQUER OUTRO MODO NÃO AUTORIZADA NO PROCESSAMENTO
d) O QUE RESULTOU PROVADO DOS AUTOS, E EM RELAÇÃO A TODOS OS CRIMES EM QUE O RECORRENTE FOI CONDENADO, FOI QUE O ARGUIDO TINHA NA SUA POSSE DE UM COMPUTADOR PORTÁTIL ONDE ESTAVAM INSTALADOS OS PROGRAMAS DE SOFTWARE ESPECÍFICOS PARA TRATAMENTO DE DADOS RELATIVOS A ATMS.
e) NENHUMA PROVA FOI FEITA, NEM TAL FACTO CONSTAVA DA ACUSAÇÃO SOBRE QUAIS ERAM OS PROGRAMAS DE SOFTWARE ESPECÍFICOS PARA TRATAMENTO DE DADOS QUE SE ENCONTRAVAM NA COMPUTADOR PORTÁTIL DO RECORRENTE.
f) O RELATÓRIO PERICIAL EFETUADO A TODO O MATERIAL INFORMÁTICO APREENDIDO AO ARGUIDO CONCLUIU QUE “DE TODOS OS FICHEIROS ANALISADOS NOS EQUIPAMENTOS APREENDIDOS NÃO FOI POSSÍVEL IDENTIFICAR ELEMENTOS QUE PUDESSEM LIGAR AOS ATAQUES CONHECIDOS
g) NÃO BASTAVA PROVAR A POSSE, NUM COMPUTADOR DE SOFTWARE ESPECÍFICO PARA TRATAMENTO DE DADOS RELATIVOS A ATM´S., PARA SE CONCLUIR PELA PRÁTICA DO CRIME DE BURLA INFORMÁTICA;
h) IMPORTAVA ASSIM FICAR DEMONSTRADO QUE SOFTWARE SE TRATAVA, QUE ESPECIFICAS INSTRUÇÕES QUE ERAM DETERMINADAS POR ESSE SOFTWARE, E QUE DADOS DOS ATM´S FORAM “ TRATADOS “ COM ESSE SOFTWARE;
i) SÓ POR VIA DA POSSE DE TAIS DADOS SE PODERIA CHEGAR À CONCLUSÃO QUE O ARGUIDO EFETUOU INTERVENÇÕES INFORMÁTICAS NÃO AUTORIZADAS...” (DESTAQUE NOSSO) CONCEITO CONCLUSIVO E DE DIREITO PARA O QUAL NÃO EXISTEM FACTOS QUE O SUSTENTEM E SOBRE OS QUIAS SE PUDESSE O ARGUIDO DEFENDER.
j) A PRÁRICA DO CRIME DE BURLA INFORMÁTICA IMPLICA ASSIM A IMPUTAÇÃO E PROVA DAS OPERAÇÕES EFETUADAS, PARA SE CONCLUIR QUE AS OPERAÇÕES INFORMÁTICAS NÃO ERAM AUTORIZADAS POIS SÓ ASSIM É POSSÍVEL VERIFICAR O PROCEDIMENTO DESSAS “INTERVENÇÕES INFORMÁTICAS NÃO AUTORIZADAS” QUE TERÁ, ORDENADO ÀS MAQUINAS ATM QUE FOSSE EXPELIDA UMA DETERMINADA QUANTIA EM NOTAS, I.E., TERIA QUE FICAR PROVADO E DEMOSTRADO PROCESSO EXECUTIVO, ITER CRIMINIS, DAQUELAS INTERVENÇÕES INFORMÁTICAS NÃO AUTORIZADAS.
k) RELATIVAMENTE A CADA UM DOS CRIMES A QUE O ARGUIDO FOI CONDENADO FICOU PROVADO, NOS DIAS QUE VEM INDICADOS PARA CADA UM DOS CRIMES, O ARGUIDO TERÁ ORDENADO ATRAVÉS DE “INTERVENÇÕES INFORMÁTICAS NÃO AUTORIZADAS” QUE OS ATM´S EXPELISSEM UMA QUANTIDADE DE NOTAS, SENDO QUE EM CONCRETO RESULTOU PROVADO QUE NO ATM DO BANCO BF, NO ESTABELECIMENTO A, FORAM EXPELIDAS 400 NOTAS DE 20€ NO TOTAL DE €8000, NO ATM DO HOSPITAL S. BERNARDO FORAM EXPELIDAS 400 NOTAS DE €20 NO VALOR TOTAL DE €8000, NO ATM DO CENTRO COMERCIAL AR FORAM EXPELIDAS 225 NOTAS DE €20 E UMA NOTA DE €10 NO VALOR TOTAL DE €4510, E NO ATM DO BANCO M, NO ESTABELECIMENTO P, FORAM EXPELIDAS 25 NOTAS DE €10 E 100 NOTAS DE 20€NO VALOR TOTAL DE €2250.
l) COMO PODE O TRIBUNAL “ A QUO” CONCLUIR QUAL O NÚMERO DE NOTAS EXPELIDAS SEM FAZER QUALQUER REFERÊNCIA AO NUMERO DE NOTAS QUE EXISTIRAM NAQUELE DIAS NAS DIVERSAS CAIXAS ATM? É QUE PARA CHEGAR A ESSA CONCLUSÃO, ERA IMPERATIVO QUE FICASSE PROVADA A DATA EM QUE AS CAIXAS ATM´S FORAM ABASTECIDAS E QUAL O MONTANTE QUE FOI ABASTECIDO.
m) ERA IMPERATIVO QUE TIVESSE PROVADA A QUANTIDADE DE NOTAS, COM RESPECTIVO VALOR FACIAL, QUE FOI ABASTECIDA NAS MÁQUINAS ATM.
n) PARA O EFEITO SUPRA, SERIA FORÇOSO PROVAR A DATA EM QUE FOI EFECTUADO O FECHO CONTABILÍSTICO E INDICAR O REGISTO DO TOTAL DE LEVANTAMENTOS E O NUMERO DE NOTAS, E SEU VALOR FACIAL, QUE FORAM LEVANTADAS, BEM COMO O NUMERO DE NOTA QUE DEPOIS DAS EXPELIÇÕES SE ENCONTRAVAM DENTRO DAS MÁQUINAS ATM., I.E, TERIA DE FICAR PROVADO QUE POR ACÇÃO DO RECORRENTE AS CAIXAS ATM FORAM ABASTECIDAS COM DETERMINADO VALOR, E QUE DEPOIS DE CONTABILIZADOS OS DIVERSOS LEVANTAMENTOS EFECTUADOS, HAVIA UMA DIFERENÇA QUE RESULTARIA DA ACTIVIDADE DO RECORRENTE.
o) A CONDENAÇÃO DO ARGUIDO SÓ PODERIA TER OCORRIDO SE SE TIVESSE PERCORRIDO E PROVADO TODOS OS FACTOS (DATA DO ABASTECIMENTO DA ATM, QUANTIDADE DE ABASTECIMENTO DA ATM, QUANTIDADE DE LEVANTAMENTOS NA MÁQUINA ATM E QUANTIDADE DE NOTAS EXISTENTE NA MÁQUINA) E TIVESSE CONCLUÍDO A EXISTIR UMA DIFERENÇA ENTRE OS VALORES APURADOS E O VALOR EXISTENTE DA MÁQUINA ATM
p) ORA, NADA DISTO FOI FEITO LIMITANDO-SE O DOUTO ACÓRDÃO A CONCLUIR QUE FOI O ARGUIDO QUEM SE APODEROU DAS QUANTIAS INDICADAS NA ACUSAÇÃO, SENDO QUE COM A FACTUALIDADE PROVADA NÃO É POSSÍVEL AFIRMAR QUE O MONTANTES, ALEGADAMENTE, EM FALTA, NÃO POSSAM ESTAR EM FALTA POR RESPONSABILIDADE DE QUEM ABASTECEU AS MÁQUINA ATM OU POR QUALQUER OUTRA CIRCUNSTÂNCIA.
q) RELATIVAMENTE AO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO DO G, ENTENDEU O TRIBUNAL “ A QUO” QUE O IDENTIFICADO DEMANDANTE FICOU SUB-ROGADO NOS DIREITOS DO BF E CONDENOU O ARGUIDO A PAGAR AO G, A QUANTIA DE €8000 (OITO MIL EUROS), ACRESCIDOS DE JUROS DE MORA À TAXA LEGAL CONTADOS DESDE A NOTIFICAÇÃO PARA CONTESTAR ATÉ INTEGRAL PAGAMENTO, POR ENTENDER QUE ESTE FICOU SUB-ROGADO NOS DIREITOS DO BF, SUB-ROGAÇÃO ESSA LEGAL.
r) A SUB-ROGAÇÃO PODE SER LEGAL OU CONTRATUAL, SENDO QUE O TRIBUNAL CONSIDEROU, QUE A SUB-ROGAÇÃO QUE EXISTIA ERA UMA SUB-ROGAÇÃO LEGAL NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART.º 592.º DO CC., NORMA QUE SAI ASSIM VIOLADA, PORQUANTO OS PRESSUPOSTOS LEGAIS DA SUB-ROGAÇÃO LEGAL SÃO:
1.º - QUE AQUELE QUE FICA SUB-ROGADO CUMPRA A OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR;
2.º - QUE QUEM CUMPRE A OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR:
A) A TENHA GARANTIDO; OU,
B) ESTEJA DIRETAMENTE INTERESSADO NA SATISFAÇÃO DO CRÉDITO;
s) DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS, NÃO É POSSÍVEL CONCLUIR QUE O G TENHA CUMPRIDO A OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR, RESULTANDO ANTES QUE CUMPRIU UMA OBRIGAÇÃO PRÓPRIA RESULTANTE DO CONTRATO QUE HAVIA CELEBRADO;
t) DOS FACTOS PROVADOS NÃO RESULTA TER EXISTIDO IGUALMENTE INTERESSE DIRETO NA SATISFAÇÃO DO CRÉDITO, PELO QUE A ÚNICA SUB-ROGAÇÃO QUE PODIA TER EXISTIDO SERIA A SUB-ROGAÇÃO CONTRATUAL, COM O INVESTIMENTO PELO BF NA PARTE CÍVEL DO DIREITO QUE TERIA SOBRE O AUTOR DO CRIME, MAS TAL NÃO RESULTOU DEMONSTRADO;
u) PELO QUE, SEMPRE SE DIRÁ QUE A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA A QUE O ARGUIDO FOI CONDENADO TERIA, EM CASO QUE MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO, SER ASSIM REDUZIDA
v) POR OUTRO LADO, SENDO A INDEMNIZAÇÃO EM QUE É CONDENADO RESULTANTE DE RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRA-CONTRATUAL, NÃO SE DEMONSTRANDO OS FACTOS CONDUCENTES À MESMA IMPROCEDERÃO TAIS PEDIDOS.
Nestes termos e nos melhores que V. Exas julguem aplicáveis deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser o Recorrente absolvido dos crimes pelo que foi condenado, como ser absolvido dos pedidos de indemnizações cíveis que foram julgados procedentes.

O recurso foi admitido.

O Ministério Público apresentou resposta, concluindo:
1.ª – O douto acórdão recorrido contém os factos essenciais consubstanciadores dos crimes de burla informática pelos quais o arguido foi condenado.
2.ª – As garantias de defesa a que alude o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, que impõem, além do mais, que o arguido tenha conhecimento dos factos para que deles possa defender-se, foram respeitadas.
3.ª – Na parte em que alega que não ficou provada a autoria da apropriação do numerário das ATM, o recurso não cumpre as exigências do artigo 412.º, n.º 3 e n.º 4, do Código de Processo Penal nem invoca nenhum dos vícios do artigo 410.º do mesmo compêndio legal.
4.ª – Diante disso, a matéria de facto não pode ser alterada pelo tribunal ad quem.
5.ª – Seja como for, resulta bem claro do proficiente segmento de fundamentação da matéria de facto do douto acórdão que o tribunal colectivo não ficou com a menor dúvida de que foi o arguido que se apropriou das quantias depositadas nas ATM instaladas na Seguradora A, em Castro Verde, no Hospital S. Bernardo e no Centro Comercial Ar, em S, e no P de Al.
6.ª – O douto acórdão não merece, assim, censura e deve ser confirmado.

Neste Tribunal da Relação, a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente.

Observou-se disposto no n.º 2 do art. 417.º do Código de Processo Penal (CPP), nada tendo sido apresentado.

Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

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2. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da motivação, como decorre do art. 412.º, n.º 1, do CPP, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, como sejam as nulidades do acórdão (art. 379.º, n.º 1, do CPP) e os vícios da decisão e nulidades que não se considerem sanadas (art. 410.º, n.ºs 2 e 3, do CPP), designadamente conforme jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário das Secções do STJ n.º 7/95, de 19.10 (publicado in D.R. Série I-A de 28.12.1995) e, entre outros, acórdãos do STJ: de 13.05.98 (BMJ n.º 477, pág. 263); de 25.06.98 (BMJ n.º 478, pág. 242); de 03.02.99 (BMJ n.º 484, pág. 271); e de 12.09.2007, no proc. n.º 07P2583 (www.dgsi.pt); Simas Santos/Leal Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 3.ª edição, pág. 48; e Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1994, vol. III, págs. 320 e seg..
Assim, sem embargo de que a decisão de alguma questão prejudique o conhecimento e a análise de outra(s), reside, sem descurar das suas invocadas consequências, em apreciar:
A) - da impugnação de matéria de facto;
B) - da ausência de factos para preenchimento dos imputados crimes;
C) - da ausência de fundamento para condenação em indemnização a favor de G, Lda..
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No que ora releva, consta do acórdão recorrido:
Factos provados:
1.1- O arguido JMBL trabalhou como técnico especializado de electrónica para a empresa WN, desde Abril de 2011 a Setembro de 2013, sendo que no âmbito das suas funções competia-lhe efectuar a instalação, a manutenção e a reparação de máquinas de ATM.
1.2- Para o exercício das suas funções, aquela empresa disponibilizou ao arguido equipamento informático idóneo, nomeadamente programas de software específico para o tratamento de dados relativos a ATM´s, bem como um molho de chaves “universais” que permitiam ao arguido aceder ao interior de todas as máquinas ATM assistidas pela WN.
1.3- O arguido JMBL, na posse de um computador portátil onde estavam instalados os programas de software específicos para tratamento de dados relativos a ATM´s, no dia 14/5/2013, pelas 18h10, dirigiu-se ao estabelecimento Seguradora A, sita em Castro Verde onde se encontrava a máquina ATM nº 0038-0262-02, do banco Bf.
1.4- Nesse local, apresentou-se como técnico especializado que presta assistência e manutenção às ATM´s, e informou que a referida máquina ATM necessitava de ser intervencionada.
1.5- Após, na posse das referidas chaves “universais”, abriu a fechadura da protecção exterior da máquina ATM, abriu depois a fechadura de protecção interior, ligou o referido computador àquela máquina e, por esse meio, efectuou intervenções informáticas não autorizadas, que ordenaram que a referida máquina expelisse 400 notas de € 20 notas do cofre, na quantia total de € 8000.
1.6- Depois, o arguido, na posse dessa quantia monetária de € 8000, que sabia não lhe pertencer, abandonou o local, fazendo seus tais valores.
1.7- No âmbito de um contrato de prestação de serviços, a demandante G vinculou-se para com o Bf a proceder à recolha e tratamento de valores daquele banco em diversos locais, incluindo a ATM de Castro Verde.
1.8- Ao abrigo desse mesmo contrato a G pagou ao Bf a referida quantia de € 8.000,00.
1.9- O arguido JMBL, na posse de um computador portátil, onde estavam instalados os programas de software específicos para tratamento de dados relativos a ATM´s, no dia 11/11/2013, entre as 10h54 e 14h34, dirigiu-se ao Hospital de B, sito em S, onde se encontrava a máquina ATM nº 0007/0227/02, propriedade do Banco E(actualmente Banco N).
1.10- Nesse local, apresentou-se como técnico especializado que presta assistência e manutenção às ATM´s, e informou que a referida máquina ATM necessitava de ser intervencionada.
1.11- Após, na posse das referidas chaves “universais”, abriu a fechadura da protecção exterior da máquina ATM, abriu depois a fechadura de protecção interior, ligou o referido computador àquela máquina e, por esse meio, efectuou intervenções informáticas não autorizadas, que ordenaram que a referida máquina expelisse 400 notas de 20 € do cofre, na quantia total de € 8000.
1.12- Depois, o arguido, na posse dessa quantia monetária de € 8000, que sabia não lhe pertencer, abandonou o local, fazendo seus tais valores.
1.13- De seguida, pelas 14H45, o arguido JMBL dirigiu-se ao Centro Comercial Ar, naquela mesma cidade, ao piso 0, onde se encontrava a máquina ATM nº 0033/9401/23, propriedade do Banco M.
1.14- Na posse do mesmo computador portátil, onde estavam instalados os programas de software específicos para tratamento de dados relativos a ATM´s, apresentou-se como técnico especializado que presta assistência e manutenção às ATM´s, e informou que a referida máquina ATM necessitava de ser intervencionada.
1.15- Após, na posse das referidas chaves “universais”, abriu a fechadura da protecção exterior da máquina ATM, abriu depois a fechadura de protecção interior, ligou o referido computador àquela máquina e, por esse meio, efectuou intervenções informáticas não autorizadas, que ordenaram que a referida máquina expelisse 225 de 20 € e 1 nota de 10 € do cofre, na quantia total de € 4510.
1.16- Depois, o arguido, na posse dessa quantia monetária de € 4510, que sabia não lhe pertencer, abandonou o local, fazendo seus tais valores.
1.17- Na sequência destes factos, quer o BES, quer o BCP, accionaram a E, empresa de transporte de valores responsável pelo carregamento daquelas duas ATM´s, com vista a serem ressarcidos das quantias em falta.
1.18- A E não assumiu o reembolso de tais quantias.
1.19- O arguido JMBL, na posse de um computador portátil onde estavam instalados os programas de software específicos para tratamento de dados relativos a ATM´s, no dia 16/12/2013, às 13h40, dirigiu-se ao supermercado P, sito, em Al, onde se encontrava a máquina ATM nº 0033/9303/37, do Banco M.
1.20- Após, na posse das referidas chaves “universais”, abriu a fechadura da protecção exterior da máquina ATM, abriu depois a fechadura de protecção interior, ligou o referido computador àquela máquina e, por esse meio, efectuou intervenções informáticas não autorizadas, que ordenaram que a referida máquina expelisse 25 notas de 10 € e 100 nota de 20 € do cofre, na quantia total de € 2250.
1.21- Depois, o arguido, na posse dessa quantia monetária de € 2250, que sabia não lhe pertencer, abandonou o local, fazendo seus tais valores.
1.22- Na sequência destes factos, o BCP accionou a E, empresa de transporte de valores responsável pelo carregamento daquela ATM, com vista a ser ressarcido das quantias em falta.
1.23- A E não assumiu o reembolso de tais quantias.
1.24- O arguido, agiu livre e conscientemente em todas as condutas acima descritas, com o propósito concretizado de manipular e intervir informaticamente em todos as ATM´s supra descritas, e de tal forma ordenar às referidas máquinas ATM que expelissem a quantidade de notas que previamente determinava, para após, apossar-se, como apossou, dessas descritas quantias monetárias, bem sabendo que dessa forma obtinha benefício patrimonial ilegítimo e, consequentemente, prejuízo patrimonial do mesmo valor aos lesados, facto que não o impediu de prosseguir com as suas acções.
1.25- O arguido agiu em todas as suas condutas sabendo que as mesmas eram proibidas e punidas por Lei Penal.
1.26- A E é uma empresa idónea, gozando de máxima credibilidade.
1.27- No dia 8/4/2013, pelas 09H30, a ATM nº 0045-6333-01, do banco Caixa Agrícola, instalada no estabelecimento M, em V, foi alvo de uma intervenção em tudo semelhante à levada a cabo pelo arguido nas situações supra descritas, na sequência do que foi ordenado informaticamente que a referida máquina expelisse 600 notas de 20 € do cofre, na quantia total de € 12.000, quantia essa que até à presente data a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de S ainda não viu ressarcida.
1.28- No dia 10/5/2013, pelas 12H50, a ATM nº 0018-3615-02, do banco S, instalada no estabelecimento R, em O, foi alvo de uma intervenção em tudo semelhante à levada a cabo pelo arguido nas situações supra descritas, na sequência do que foi ordenado informaticamente que a referida máquina expelisse 20 notas de € 20 do cofre, na quantia total de € 400, quantia essa que até à presente data o Banco S ainda não viu ressarcida.
1.29- No dia 29/8/2013, pelas 12H10, a ATM nº 0018-5163-05, do Banco S, instalada no estabelecimento SB, em VN, foi alvo de uma intervenção em tudo semelhante à levada a cabo pelo arguido nas situações supra descritas, na sequência do que foi ordenado informaticamente que a referida máquina expelisse 19 notas de 10 € e 560 notas de 20 € do cofre, na quantia total de € 11.390, quantia essa que até à presente data o Banco S ainda não viu ressarcida.
1.30- No dia 15/11/2013, pelas 14H40, a ATM nº 0007/0274/01, do Banco E (actualmente Banco N), instalada na zona do hipermercado C, no centro comercial A Shopping, sito na G, foi alvo de uma intervenção em tudo semelhante à levada a cabo pelo arguido nas situações supra descritas, na sequência do que foi ordenado informaticamente que a referida máquina expelisse 800 notas de 20 € do cofre, na quantia total de €16.000, quantia essa que até à presente data o Banco N ainda não viu ressarcida.
1.31- Do registo criminal do arguido nada consta.
1.32- Foi elaborado pela DGRSP relatório social, do qual consta
«I - Condições sociais e pessoais
Preso preventivamente à ordem destes autos, (…). O relacionamento com a família de origem é próximo, encontrando-se a progenitora com doença do foro neurológico, que veio a agravar-se após o falecimento do pai, ocorrido há cerca de seis anos.
Há alguns anos voltou a encetar nova união de facto. Este relacionamento foi descrito pelo casal como harmonioso, sendo JL caracterizado pela companheira como pessoa calma, de fácil trato e trabalhadora.
A nível laboral e reportado à data dos factos, o arguido mantinha ocupação laboral na empresa WN, a operar na área da instalação e reparação de multibancos, área onde vinha a desempenhar atividade laboral desde há alguns anos, integrado nas empresas (…) igualmente operadoras na instalação e manutenção de sistemas de multibancos. Anteriormente teve experiência laboral em montagens de antenas, de auto-rádios, na montagem e reparação de máquinas de diversão e de reparação de aparelhos de vídeo.
Possui o curso profissional de informática e electrónica, o qual lhe facultou equivalência ao 12.º ano de escolaridade.
JL não se revê nos factos que constam da acusação que lhe é formulada, referindo impossibilidade da sua prática por não dispor de meios que lhe permitissem a abertura daquelas caixas. Contudo, está ciente da ilicitude de práticas que, em abstrato, descrevem a tipificação dos crimes constantes na acusação.
No meio de residência não existe impacto nem reacção negativa perante a posição processual de JL.
II - Conclusão
Perante o exposto, podemos concluir que JL detém como factores de proteção uma adequada integração familiar, com suporte afetivo consistente, hábitos de trabalho e aptidões profissionais que lhe permitem manter ocupação laboral em área das novas tecnologias, habilitações académicas de nível médio e adequada integração social. Perante o exposto e a verificar-se a condenação do arguido, afigura-se-nos que o mesmo dispõe de enquadramento apropriado para cumprimento, caso venha a ser judicialmente aplicada, de medida de caráter probatório.».

Factos não provados:
2.1- Na situação descrita em 1.19 o arguido se tenha apresentado como técnico especializado que presta assistência e manutenção às ATM´s, e informado que a referida máquina ATM necessitava de ser intervencionada.
2.2- Nas situações descritas em 1.27 a 1.30 tenha sido o arguido a praticar tais factos ou que o mesmo, por qualquer forma, se tenha apoderado e feito suas as descritas quantias.
2.3- A actuação do arguido gerou nos clientes da E incerteza e desconfiança, fazendo perigar o negócio desta.

Convicção do tribunal:
O arguido, no exercício legítimo do direito que lhe assiste, não quis prestar declarações.
Donde, o Tribunal fundou a sua convicção nos depoimentos prestados em audiência, conjugados com a prova documental e pericial carreada para os autos e com as regras da experiência comum.
Concretamente, tomou-se em consideração:
- Auto de apreensão de fls.10.
- Fotografias de fls. 11 a 15.
- Informação da P, fls. 154 e 155
- Documentação junta com o Auto de denúncia, fls. 234 a 245.
- Auto de busca e apreensão, fls. 275 a 278, 291
- Documentação junta com o Auto de denúncia NUIPC 574/13.6 GCMTJ, fls. 380 a 395.
- Documentação junta com o Auto de denúncia NUIPC 1571/13.7 PBSTB, fls. 410 a 434.
(…)
- Auto de apreensão, fls. 674.
- Relatório de ocorrência, fls. 715
- Participação de acidente, fls. 719 a 722
- Guia de entrega, fls. 723.
- Prova por reconhecimento, fls. 285 a 287, 288 a 290, 518 a 520, 521 a 523, 524 a 526, 527 a 529, 530 a 532.
- Exame pericial 924 a 948.
- Documentação junta com os pedidos de indemnização cíveis (fls. 1167 a 1178, 1308/1309, 1347 a 1350) e no decurso da audiência, de fls. 1547 a 1552.
Assim, o período em que o arguido prestou serviços para a WN ficou demonstrado pelo teor do documento de fls. 1547 a 1552, conjugado ainda com depoimento prestado por RSA, responsável da equipa técnica de ATM´s da referida empresa, que de forma objectiva e absolutamente espontânea e segura descreveu que tipo de funções o arguido ali exerceu.
Esclareceu ainda qual a formação ministrada ao arguido, tipo de utensílios e ferramentas que foram disponibilizadas, relato este que foi confirmado pela testemunha (…) com as mesmas funções e em período parcialmente coincidente com o do arguido.
(…). Ou seja, a intervenção do arguido naquelas máquinas não foi autorizada ou sequer conhecida da SIBS, dos bancos em causa ou da empresa de manutenção para a qual trabalhava.
Então o que justificaria a presença e a intervenção do arguido naquelas máquinas que não fosse a apropriação de dinheiro?!
Como é óbvio, nada.
Ainda assim, se dúvidas subsistissem, a demais prova produzida foi absolutamente esmagadora. (…)
Foram ainda identificados manuais técnicos sobre os ATMs e manuais com procedimentos de manutenção que são comuns no contexto dos técnicos de manutenção de ATMs.»
Aptidão esta confirmada sem qualquer margem para dúvidas pelas testemunhas LM e Luís Bugalho, ambos técnicos de manutenção de ATMs, afirmando que aqueles são softwares disponibilizados pelas empresas de manutenção e, concretamente no que respeita aos modelos CS 9320 e 9110, que permitem intervenções no “dispensador” das ATM´s, designadamente dar “ordens” a tal dispositivo para expelir notas.
Mais referiram, secundados pela testemunha RSA, que é obrigação de todo e qualquer técnico de manutenção, uma vez findo o seu contrato de trabalho ou de prestação de serviços, devolver todo o material, ferramentas, hardware, software que lhe foi disponibilizado pela empresa de manutenção, donde não existir qualquer justificação, senão a de intenção de utilização abusiva, para que o arguido detivesse, aquando da apreensão, quer aqueles programas informáticos quer o cartão da anterior empresa para a qual havia prestado serviços (cf. Fls. 278).
(…)
Ora, se conjugarmos estes elementos com o relatório de fls. 725 a 727 verificamos que existe apenas uma diferença de € 39,40 em relação ao montante retirado daquela ATM, diferença essa facilmente justificável, por exemplo, com o pagamento de combustível e portagens, existindo coincidência na quantidade e tipo de notas subtraídas. Pelo que, não ficou este Tribunal com dúvidas de que também nessa situação foi o arguido que, pelo mesmo modus operandi, retirou dinheiro daquela ATM. Serve isto também para dizer que, nesta parte, não se atribuiu credibilidade à testemunha LM, quando referiu que nesse dia o arguido, que se encontrava desempregado (que como se viu não corresponde à verdade), esteve a ajudá-lo no seu estabelecimento em Alcácer, levando consigo apenas um “ferro de soldar”, o que também é falso.
Relativamente aos factos que se referem à intenção e consciência do Arguido na prática dos demais, não tendo havido confissão (e por isso, insusceptíveis de prova directa), a convicção do tribunal formou-se por inferência da prova dos factos objectivos e tendo em atenção as regras da experiência comum – cfr. Ac.R.E. de 09-10-2001, in C.J. 2001, Tomo IV, pág.285.
Assim, tendo-se provado que o arguido, sem autorização ou sequer conhecimento das entidades competentes, interveio abusivamente em ATM´s e, dessa forma, delas retirou as quantias descriminadas, dúvidas não há de que agiu com o propósito concretizado de as fazer suas, causando o correspondente prejuízo patrimonial.
(…)
Acresce que, e isso ficou claro em audiência, à semelhança do arguido existia todo um universo de outros técnicos de manutenção com acesso aos mesmos meios e conhecimentos que poderiam ter levado a cabo tais acções, isoladamente ou mesmo através de um plano delineado nesse sentido. Aliás, a testemunha Cristina Rocha da Eira afirmou que a SIBS teve conhecimento de outras situações semelhantes, além daquelas que vinham imputadas ao arguido.
(…)
Quanto ao facto não provado relativo ao pedido deduzido pela E, sendo esta uma empresa de segurança, responsável pelo transporte de valores, está perfeitamente enquadrado no risco próprio do seu negócio, quando existe um problema que assenta numa falha do sistema de segurança (independentemente de se saber quem é o responsável), que aquela empresa seja chamada à liça pelos seus clientes. Agora, daí até ao ponto de, conforme alegado, tal fazer perigar o seu negócio, vai um longo caminho que não ficou minimamente demonstrado. Aliás, se esse perigo fosse efectivamente real, a postura assumida pela E, não assegurando o ressarcimento das quantias aos seus clientes, teria levado a que estes prescindissem dos seus serviços, o que não fizeram.
Não se consideraram outras alegações constantes dos pedidos de indemnização cíveis por serem conclusivas, de direito ou absolutamente irrelevantes ou desnecessárias para a boa decisão da causa.

Aplicação do direito aos factos:
Dispõe o artigo 221º, n.º1 e 4 do Cód. Penal que «Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, causar a outra pessoa prejuízo patrimonial, interferindo no resultado de tratamento de dados ou mediante estruturação incorrecta de programa informático, utilização incorrecta ou incompleta de dados, utilização de dados sem autorização ou intervenção por qualquer outro modo não autorizada no processamento, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa».
Como se refere no Ac. STJ de 6.10.2005, proc. nº 2253/05-5ª, CJ, Acs. STJ, Ano XIII, tomo 3, 179, no crime de burla informática “o bem protegido é não só o património, mais concretamente a integridade patrimonial, mas também os programas informáticos, o respectivo processamento e os dados, na sua fiabilidade e segurança”.
A diferença, relativamente aos tipos penais que tutelam especificamente a criminalidade informática, é que aqui “a protecção dos dados e processamento se restringe aos casos em que o agente tem a intenção de obter um enriquecimento ilegítimo e causa a outra pessoa prejuízo patrimonial” – idem.
Com efeito, as razões que conduziram à criação deste tipo legal de crime foram:
“- Frequência com que se verificaram utilizações abusivas de caixas automáticas;
- A existência de condutas que, em geral, envolvem riscos consideráveis para o comércio jurídico e para o tráfico ou sistema de provas;
- A difícil detecção dessas condutas, que mereciam uma repulsa social cada vez mais forte;
- A insuficiência dos tipos penais tradicionais (de enriquecimento patrimonial) para a protecção do bem jurídico” – ibidem.
Trata-se de um crime de dano já que a sua consumação ocorre com o prejuízo patrimonial do ofendido e de resultado parcial ou cortado na medida em que depende da verificação de um evento, o dano patrimonial, independentemente da efectiva verificação do benefício económico por parte do agente.
Para além disso, atendendo à conduta do agente, configura-se como um crime de execução vinculada dependendo assim o preenchimento do tipo da verificação de qualquer das condutas descritas no tipo objectivo, prescindindo no entanto no duplo nexo de causalidade que caracteriza o crime de burla, enquanto tipo fundamental, de acordo com o disposto 217º, n.º1 do Cód. Penal.
Quanto ao tipo subjectivo, trata-se de um crime doloso, em qualquer das suas modalidades, exigindo-se assim que o agente actue com intenção de obter, para si ou para outrem, enriquecimento ilegítimo.
Da matéria de facto dada como provada em 1.1 a 1.25 verifica-se que o arguido, aproveitando-se dos seus conhecimentos técnicos e meios proporcionados pela empresa para a qual prestava serviços, acedeu às identificadas ATM´s sem conhecimento e consentimento de quem de direito, e com utilização e manipulação abusiva de programas informáticos, emitiu “ordens” para que expelissem dinheiro, do qual se apropriou, causando o correspondente prejuízo patrimonial às entidades bancárias proprietárias desse dinheiro. Agiu com dolo directo já que actuou voluntária, livre e deliberadamente com intenção de alcançar o seu propósito de enriquecimento patrimonial ilegítimo.
Insurgiu-se o arguido, na sua contestação escrita, contra a acusação deduzida pelo Ministério Público por entender que a mesma não enunciava factos, mas sim referências vagas e conclusões, não identificando em concreto quais os específicos meios e programas informáticos por si utilizados.
Como é óbvio, o Tribunal não se deixou impressionar por tal alegação, nem lhe atribuiu qualquer mérito porquanto, se assim o tivesse entendido, tinha à sua disposição prova bastante para, com uma simples alteração não substancial de factos, “compor” a acusação. E não lhe atribuiu mérito porque o tipo de crime não exige uma tal concretização.
Não se apuraram quaisquer causas que excluam a ilicitude e a culpa.
Pelo que se mostram preenchidos os elementos objectivo e subjectivo do tipo de crime que vem imputado ao arguido.
Quanto ao número de crimes, e tendo em conta do disposto no artigo 30º do Código Penal, temos a prática homogénea de factos em quatro situações distintas, todas subsumíveis no tipo legal do crime de burla informática.
Não ficou contudo demonstrado que o arguido agiu, nos termos do nº. 2 do referido preceito legal, no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que lhe tenha diminuído consideravelmente a culpa, ou seja, não se verificam todos os pressupostos de que dependia o enquadramento da actuação do arguido no âmbito do crime continuado.
Por outro lado, tendo ocorrido uma actuação em Maio de 2013 em Castro Verde, outra em Novembro de 2013 em S, outra em Dezembro de 2013 em Al, também não permite que este Tribunal conclua no sentido de estarmos perante uma única resolução criminosa.
Apenas no que respeita à situação ocorrida em S, nas ATM´s do Hospital de B e do Centro Comercial Ar, que foram alvo da actuação do arguido no mesmo dia e num intervalo de minutos, apresenta-se como evidente a existência de uma única resolução criminosa. O que invalida que, neste caso, se aprecie a invocada ilegitimidade do Ministério Público quanto aos factos que isoladamente (ATM Centro Comercial Ar) poderiam consubstanciar a prática de um crime de burla informática simples, já que estamos perante um único crime, agravado, de natureza pública.
Pelo que, a actuação do arguido consubstancia a prática em concurso real, efectivo, de três crimes de burla informática.
Crime este cujo procedimento depende de queixa (nº.4 do art. 221º do Cód.Penal)
Contudo, nos casos previstos no nº.5 do mesmo preceito legal, o crime passa a assumir natureza pública, estabelecendo a alínea a) que, se o prejuízo for de valor elevado, o agente é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.
Considerando que a UC em 2013 se cifrava em € 102,00, por força do disposto no art. 202º a) do Cód. Penal, considera-se valor elevado o prejuízo patrimonial superior a € 5.100,00.
Ou seja, in casu, a conduta do arguido referente às ATMs instaladas em Castro Verde e em S consubstancia a prática, em concurso real e efectivo, de dois crimes de burla informática agravada, e a conduta referente à ATM instalada em Al a prática, em concurso real e efectivo, de um crime de burla informática simples.
Aqui chegados, verifica-se que relativamente a este crime de burla informática simples não foi exercido o direito de queixa pelo Banco M(banco que sofreu o prejuízo patrimonial), nem pela SIBS (proprietária do software instalado nas ATM´s), sequer pela empresa de manutenção (detentora do software de manutenção), mas sim pela E (fls. 380 e sgs.), a qual não é titular do direito de queixa atento o bem jurídico protegido (art. 113º nº.1 do Cód.Penal).
Donde, nesta parte, impõe-se a extinção do procedimento criminal por ilegitimidade do Ministério Público para a acção penal.
Quanto às situações descritas em 1.27 a 1.30, não se tendo provado ter sido o arguido o seu autor, impõe-se a sua absolvição, ficando assim prejudicada a invocada ilegitimidade do Ministério Público quanto à conduta ali descrita enquadrável no tipo de burla informática simples.

Dos pedidos de indemnização cíveis:
Estamos no domínio da responsabilidade civil por perdas e danos por crime, regulada nos artigos 129º e segs. do Código Penal.
A responsabilidade extracontratual, ou delitual, está consagrada no art. 483º, n. 1, do C.C.. Aí se dispõe: “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
De harmonia com tal preceito, o elemento básico da responsabilidade é o facto voluntário do agente, um facto objectivamente dominável e controlável pela vontade, pois só quanto a factos desta índole tem sentido a ideia da ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar o dano, sendo certo que só o homem, como destinatário dos comandos emanados pela lei, é capaz de violar direitos alheios ou de agir contra disposições legais.
Por outro lado, o citado art. 483º do Código Civil exige que o facto do agente seja ilícito, violando o direito de outrem ou a lei destinada a proteger interesses alheios.
O nexo de imputação do facto ao lesante, outro pressuposto da responsabilidade civil por factos ilícitos, traduz a necessidade de actuação com culpa do lesante. E agir com culpa significa actuar em termos de merecer a reprovação ou a censura do direito, existindo essa reprovação quando se conclui que o agente, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo.
A culpa exige um certo nexo psicológico entre o facto e a vontade do lesante, podendo assumir a forma de dolo e a forma de negligência ou de mera culpa.
A culpa deve ser apreciada de harmonia com o disposto no art. 487º, nº 2, do Código Civil, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.
Como pressuposto da obrigação de indemnizar imposta ao lesante, o art. 483º do Código Civil consagra ainda a necessidade de à violação do direito subjectivo ou da lei sobrevir um dano.
Este dano pode definir-se como «todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causado nos bens jurídicos, de carácter patrimonial ou não» - Vaz Serra, in Boletim do Ministério da Justiça, nº 84, pág. 8.
Por último, exige a lei que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima, de modo a poder afirmar-se que o dano é resultante da violação.
(…)
Quanto aos pedidos deduzidos pela G (ATM de Castro Verde), sub-rogada nos direitos do Bf (arts.592º e 593º do Cód.Civil), pelo Banco N (ATM do Hospital B) e pelo BCP (ATM do Centro Comercial Ar), todos aqueles pressupostos se mostram verificados. Actuação culposa e ilícita do arguido da qual resultaram os descritos prejuízos patrimoniais.
Acrescerão ainda os juros de mora legais, a contar desde a notificação do arguido para contestar – art. 805º nº.3 do Cód.Civil.
(…)
*

Apreciando, conforme definido quanto ao objecto do recurso:

A) - da impugnação de matéria de facto:
Insurgindo-se contra a matéria de facto provada e que indica como sendo a consignada no acórdão em 1.3, 1.5, 1.9, 1.11, 1.13, 1.14, 1.15, 1.19, 1.20 e 1.24, o recorrente alega que, à semelhança da acusação, comporta conclusões e imputações genéricas, invocando, como refere, que colide com o direito ao contraditório previsto no art.º 32 da CRP, pelo que devem ter-se como não escritos por violação irreparável do contraditório e das garantias de defesa em processo penal, porquanto:
a) São feitas referências genéricas a um software não concretizado;
b) É feita referência genérica a um computador não concretizado;
c) São concluídas a existência de operações informáticas que não são concretizadas, mas se concluem não ser autorizadas.
Sustenta, ainda, que nenhuma alteração dos factos descritos na acusação foi efectuada pelo tribunal, não obstante essa possibilidade.
Já se vê, através da motivação, que esta se apresenta insuficiente para o desiderato de análise enquanto impugnação da matéria de facto com o sentido conferido pelo art. 412.º do CPP.
Com efeito, embora constitua princípio geral que as Relações conhecem de facto e de direito, nos termos do art. 428.º do CPP, a modificação da matéria de facto, sem prejuízo do disposto no art. 410.º, n.º 2, do CPP, só se poderá verificar se a prova tiver sido impugnada nos termos dos n.ºs 3 e 4 desse art. 412.º.
Esse ónus de especificação, imposto a quem, nesse âmbito, pretenda recorrer, não é, claramente, desproporcionado e, ao invés, apresenta-se justificado à luz da consagração da garantia de efectivo duplo grau de jurisdição em matéria de facto, com essa intrínseca finalidade, relativamente ao que, conforme ao Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ de 08.03.2012 (publicado in D.R. I Série, n.º 77, de 18.04.2012), os respectivos contornos ficaram devidamente explicitados.
Deste, destacam-se algumas passagens:
Nestes casos de impugnação da matéria de facto, a apreciação pelo tribunal superior - Relação - não se restringe ao texto da decisão, mas abrange a análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre a partir de balizas fornecidas pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do artigo 431.º, alínea b), do Código de Processo Penal.
Impõe-se ao recorrente a necessidade de observância de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta especificação dos concretos pontos da matéria de facto, que considera incorrectamente julgados, das concretas provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, tudo com referência ao consignado na acta, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso. Esta exigência é de entender como contemplando o princípio da lealdade processual, de modo a definir em termos concretos o exacto sentido e alcance da pretensão, de modo a poder ser exercido o contraditório.
A reapreciação por esta via não é global, antes sendo um reexame parcelar, restrito aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, necessário sendo que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam, não bastando remeter na íntegra para as declarações e depoimentos de algumas testemunhas.
Pede-se ao tribunal de recurso uma intromissão no julgamento da matéria de facto, um juízo substitutivo do proclamado na 1.ª instância, mas há que ter em atenção que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em segunda instância, não impõe uma avaliação global, não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida e muito menos um novo julgamento da causa, em toda a sua extensão, tal como ocorreu na 1.ª instância, tratando-se de um reexame necessariamente segmentado, não da totalidade da matéria de facto, envolvendo tal reponderação um julgamento/reexame meramente parcelar, de via reduzida, substitutivo.
A intromissão da Relação no domínio factual cingir-se-á a uma intervenção «cirúrgica», no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação.
Mais se justifica pela circunstância de que, como Damião da Cunha sublinha, in “A Estrutura dos Recursos”, na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 8, Abril-Julho, 1998, págs. 259 e seg., os recursos configuram-se no Código de Processo Penal como um remédio e não como um novo julgamento sobre o objecto do processo (…) Assim, ao recorrente é exigido que apresente os pontos de facto que mereçam a censura de incorrectamente decididos (…) Não basta, porém, que no recurso manifeste a discordância e, bem assim, as provas (…) que não só demonstrem a possível incorrecção decisória, mas também permitam configurar uma alternativa decisória.
Feitos estes esclarecimentos, o recorrente apenas indica esses pontos de factos, que considera incorrectamente julgados, sem menção alguma a provas que impliquem decisão diversa.
A perspectiva que apresenta tem em vista, tão-só, afinal, que tais factos não devam persistir, por se configurarem como eminentemente genéricos.
No acórdão, embora em sede de aplicação do direito, aludiu-se a essa problemática:
Insurgiu-se o arguido, na sua contestação escrita, contra a acusação deduzida pelo Ministério Público por entender que a mesma não enunciava factos, mas sim referências vagas e conclusões, não identificando em concreto quais os específicos meios e programas informáticos por si utilizados.
Como é óbvio, o Tribunal não se deixou impressionar por tal alegação, nem lhe atribuiu qualquer mérito porquanto, se assim o tivesse entendido, tinha à sua disposição prova bastante para, com uma simples alteração não substancial de factos, “compor” a acusação. E não lhe atribuiu mérito porque o tipo de crime não exige uma tal concretização.
Vejamos.
As considerações gerais trazidas pelo recorrente, por referência à jurisprudência do STJ nesse âmbito, são plenamente aceites, em parte aqui se transcrevendo:
Não são "factos" susceptíveis de sustentar uma condenação penal as imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem a motivação, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado.
As afirmações genéricas (…) não são susceptíveis de contradita (…). Por isso, a aceitação dessas afirmações como "factos" inviabiliza o direito de defesa que aos mesmos assiste e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art. 32º da Constituição” - (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-05-2004 - Proc. 04P908, Rel. Cons. Santos Carvalho).
O princípio ou cláusula geral estabelecido no n.º 1 do art. 32.º da CRP significa, ao aludir a todas as garantias de defesa, que ao arguido, como sujeito processual, devem ser assegurados todos os direitos, mecanismos e instrumentos necessários e adequados para que possa, em plena liberdade da vontade, defender-se, designadamente para que possa contrariar a acusação ou a pronúncia, através de um julgamento imparcial, realizado com total independência do juiz, em procedimento leal e justo, sendo certo que a individualização e clareza dos factos objecto do processo são indispensáveis para que o arguido possa valida e eficazmente contraditar a acusação ou a pronúncia, única forma de se poder defender”- (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-02-2007 - Proc. 06P4341, rel. Cons. Oliveira Mendes).
Não se podem considerar como “factos” as imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem a motivação, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado, pois a aceitação dessas afirmações para efeitos penais inviabiliza o direito de defesa e, assim, constitui uma grave ofensa aos direitos constitucionais previstos no art.º 32.º da Constituição. Por isso, essas imputações genéricas não são “factos” susceptíveis de sustentar uma condenação penal” - (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Acórdão do STJ de 15-11-2007 - Proc. 07P3236, rel. Cons. Santos Carvalho).
Como vem sendo afirmado pela jurisprudência dominante do STJ, as imputações genéricas (…), sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou (…) e do tempo e lugar em que tal aconteceu, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado, não podem servir de suporte à qualificação da conduta do agente.
Por isso, será de ter por não escrita aquela imputação genérica (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02-04-2008 (Proc. 07P4197, rel. Cons. Raul Borges).
Com efeito, só perante factos concretos, delimitados nos aspectos aludidos, a defesa pode ser exercida na sua plenitude, uma vez que, a não ser assim, não é viável que as garantias inerentes sejam efectivas.
Todavia, embora o acerto daquelas considerações jurisprudenciais, não se afigura que ao recorrente assista razão.
Na verdade, conforme o Ministério Público na sua resposta refere, provou-se quando, onde, como e de quanto o arguido se apropriou, resultando, pois, as datas em que as suas acções aconteceram, como se verificaram e em que locais, incluindo os contornos objectivos que revestiram e as consequências daí decorrentes.
É mencionada a posse, pelo aqui recorrente, de um computador portátil onde estavam instalados os programas específicos para tratamento de dados relativos a ATM’s, através dos quais efectuou intervenções informáticas, consubstanciadas em ordenar que as máquinas expelissem dinheiro e, na circunstância, não autorizadas.
Não se vê que maior concretização fosse necessária para que o recorrente se pudesse convenientemente defender.
Sendo importante a forma como executava as suas acções, o conjunto dos factos em apreço fornece percepção dessa realidade, sem que a designação de modelo do computador e/ou de programas informáticos seja tida por essencial, já que, implicitamente, se entende que eram idóneos para as suas acções e adequados para a finalidade prosseguida, estando essas acções pormenorizadas quanto baste.
Acresce que a fundamentação decisória é esclarecedora nos aspectos suscitados.
Por um lado, apelou ao relatório de exame pericial de fls. 924 a 948, segundo o qual “num dos dispositivos de hardware apreendidos ao arguido (disco externo HDD WD S.N WCAV2CA34619) foram encontrados dois programas (NMD100 e o MATRIX) que, citando a conclusão do referido relatório, «Estes programas são as ferramentas comuns que são utilizadas pelos técnicos de manutenção de ATMs. Estas permitem realizar testes de dispensação e, portanto, quando utilizadas maliciosamente podem ser utilizadas em ataques de dispensação.
Foi confirmado que a ferramenta “NMD 100” analisada era rigorosamente igual à ferramenta que nos foi informado pela empresa de manutenção.
Quanto à ferramenta “Matrix” analisada foi concluído que continha diferenças quando comparado com a ferramenta informada pela empresa de manutenção. Este facto poderá resultar de se tratar de uma versão diferente.
Foram ainda identificados manuais técnicos sobre os ATMs e manuais com procedimentos de manutenção que são comuns no contexto dos técnicos de manutenção de ATMs.»”.
Bem como, também, aos depoimentos de LM e Luís Bugalho, afirmando «que aqueles são softwares disponibilizados pelas empresas de manutenção e, concretamente no que respeita aos modelos CS 9320 e 9110, que permitem intervenções no “dispensador” das ATM´s, designadamente dar “ordens” a tal dispositivo para expelir notas», bastando a ligação à máquina, ou directamente ao dispensador, com um computador portátil.
Por outro lado, ao depoimento de Cristina Rocha da Eira que referiu que “aquelas intervenções não foram solicitadas por esta entidade (SIBS), nem foram programadas, sequer conhecidas, por qualquer das empresas responsável pela sua manutenção”, conjugado com o de RSA, para concluir que “a intervenção do arguido naquelas máquinas não foi autorizada ou sequer conhecida da SIBS, dos bancos em causa ou da empresa de manutenção para a qual trabalhava.”.
Além disso, resulta do provado em 1.1 e 1.2 que o recorrente trabalhou para empresa especializada, com funções de instalação, manutenção e reparação de máquinas de ATM, tendo-lhe sido disponibilizado equipamento informático idóneo (programas de software específico para o necessário tratamento dos dados).
Objectivamente conhecedor da temática em discussão no julgamento, o recorrente não viu diminuídas as suas garantias de defesa, nem é visível que, perante aquele conjunto de factos provado contra o qual ora se insurge, o seu significado enquanto acontecimento plasmado a escrito só se torne apreensível com pormenores técnicos, puramente informáticos, que aparentemente pretenderá assinalar.
Discorda-se, pois, da perspectiva de que se trata de afirmações genéricas, pelo que inexiste motivo para infirmar esse elenco factual.
Quanto à invocada violação do contraditório (art. 32.º, n.º 1, da Constituição), a mesma perde, assim, sentido.
Acresce que, apesar de não suscitado pelo recorrente, é manifesto que a decisão não padece de vício (art. 410.º, n.º 2, do CPP), o que redunda em que a matéria de facto - a indicada pelo recorrente e a restante - tem de manter-se inalterada, dando-se por assente.
Apresenta-se cabalmente fundamentada, com apoio na prova examinada e produzida em audiência, criticamente analisada à luz das regras da normalidade e da experiência, com inteligível substrato do raciocínio trilhado pelo tribunal e sem padecer de incompatibilidade ou incongruência lógica.

B) - da ausência de factos para preenchimento dos imputados crimes:
Ao nível jurídico do enquadramento dos factos, o recorrente preconiza que estes são insuficientes para a subsunção a crimes de burla informática, p. e p. pelo art. 221.º do CP.
Reporta-se ao que designa do “quarto elemento” contido no tipo legal, acerca da execução em causa, exigindo “intervenção por qualquer modo não autorizado no processamento”, dizendo que «subentende um conceito indeterminado que procura a sua concretização nos modos de acção descritos no tipo, meramente exemplificativos, por força da cláusula geral consagrada «in fine», e que surgem em relação de alternatividade ou de conjugação, enquanto modos concretos de execução da acção principal» e que «A cláusula geral inserida “a final” confere ao crime uma “tipologia aberta”, atribuindo-lhe uma indeterminabilidade de formas de cometimento da “acção acessória”, e funciona como válvula de segurança de modo a evitar uma provável inoperatividade resultante das continuadas e incessantes evoluções tecnológicas e assim evitar a possibilidade de constantes revisões da lei penal.».
Mais refere que «as “acções típicas acessórias” são modos ou exemplos de intervenção no resultado do tratamento de dados, portanto, o cibercriminoso pode interferir no resultado do tratamento de dados mediante estruturação incorrecta de programa informático, fazendo uso incorrecto ou incompleto de dados e utilizando dados sem autorização. Todos estes modos, sem esquecer a cláusula geral, são exemplos de intervenção no resultado do tratamento de dados.».
E, ainda, «Portanto, o legislador português optou por concretizar alguns modos de acção típica e, desde logo, estabeleceu uma certa determinabilidade para a expressão “intervindo”, uma acção que comporta a introdução, alteração, eliminação, supressão ou utilização de dados informáticos, em qualquer fase do processamento desde que com interferência no resultado.».
Tudo isso para, em síntese, considerar que:
«O crime de burla informática é um crime informático, logo, para que o mesmo possa ser imputado objetivamente ao agente, dever-se-á descrever o processo executivo do crime, o que, comprovadamente, não acontece na Acusação ou na Douta Decisão recorrida.
Desconhece-se dos factos provados:
A) qual a ação do agente e qual o processo executivo levado a cabo pela máquina;
B) Se existiu uma outra ação prévia ou contemporânea à ação do agente perpetrada por um terceiro ou pela própria máquina, de forma autónoma e automática, capaz de interromper o processo causal que sequer se demonstra ou prova;
C) qual o risco que em último lugar contribuiu para o resultado, pois desconhecemos a acção do agente ou se a mesma criou, aumentou ou não diminuiu um risco proibido ou se esse risco sequer se concretizou;».
A alegação do recorrente acaba por entroncar naquela que apresentou em sede da visada impugnação factual, consistindo em preconizar falta de elementos quanto ao processo executivo que teria conduzido, na sua perspectiva de forma errada, à integração das suas acções.
Contudo, não relevam para o efeito eventuais dúvidas acerca dos factos que se deram como assentes, designadamente da sua participação e/ou da ausência de intervenção de terceiros que influenciasse a sua conduta.
Ora, para além do fundamentado no acórdão no tocante à caracterização do tipo legal da burla informática, que aqui se subscreve, sublinhe-se que, sem que o recorrente ponha em causa a “utilização e manipulação abusiva de programas informáticos” que consta da decisão, não se aceita que, perante o acervo de factos apurado, necessário fosse uma maior pormenorização relativamente ao modo como as suas acções se desenvolveram.
A circunstância de se tratar de um crime de execução vinculada restringe-se à exigência de que a lesão do património se produza através de meios informáticos (Almeida Costa, in “Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial”, Coimbra Editora, 1999, tomo II, pág. 329), realizada por alguma das acções descritas no preceito incriminador.
Ou seja, no sentido de que a lesão do património se produz através da intromissão nos sistemas e da utilização em certos termos de meios informáticos (sumário do acórdão do STJ de 20.09.2006, no proc. n.º 06P1942, rel. Cons. Henriques Gaspar).
O comportamento do recorrente consubstanciou-se em, de modo não autorizado, aceder às máquinas ATM por via informática, servindo-se de programas específicos que permitiram que as mesmas expelissem dinheiro, de que se apropriou, em prejuízo de outrem.
A intromissão e utilização informáticas, levadas a cabo pelo recorrente, estão descridas nos factos provados de modo plenamente compreensível, sem que se descortine, pese embora as suas considerações, que o preenchimento do ilícito se apresente incorrecto.
Contrariamente ao aduzido pelo recorrente, o iter criminis revela-se em que, não estando autorizado a fazê-lo e dispondo de programas específicos para o tratamento dos dados em causa, fez com que as máquinas lhe fornecessem o dinheiro, assim tendo utilizado dados e intervindo no processamento das mesmas, inevitavelmente servindo-se da informática.
Aliás, a previsão do ilícito abarca modus operandi que se reconduza a essa utilização idónea a interferir no resultado do tratamento de dados, a ser efectivada “por qualquer modo”, compatível com as razões que o tribunal refere terem presidido à criação do tipo legal, em contrário à perspectiva do recorrente de pormenorização meramente técnica, que se tornaria fácil caminho para o esvaziamento da tipicidade.
Isso não significa, todavia, que esse processo de execução, em concreto, deva ser descurado.
Bastará, porém, que, na sua essencialidade seja suficientemente detectável, com o sentido de inteligível para qualquer cidadão, o que, no caso, se verifica.
O operado enquadramento jurídico não merece censura, ficando afastada a pretendida absolvição.

C) - da ausência de fundamento para condenação em indemnização a favor de G, Lda.:
O recorrente contesta que tivesse sido condenado no pagamento de indemnização a G, Lda., invocando que o tribunal a considerou assente em sub-rogação legal nos termos do art. 592.º do Código Civil (CC), mas sem que, como alega, se verifiquem os pressupostos para tanto, uma vez que, como refere, o que resultou provado, foi que o pagamento efectuado pelo G ao Bf foi apenas e tão-só o cumprimento do contrato entre o G e o Bf e não o cumprimento pelo G da obrigação que cabia ao arguido.
Ora, a sub-rogação constitui, segundo Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, 2.ª edição, vol. II, pág. 295, a substituição do credor na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento.
Assume a forma voluntária quando decorre de manifestação expressa da vontade do credor ou do devedor nos termos dos arts. 589.º, 590.º e 591.º do CC, situação que, ao caso, não interessa.
Por seu lado, a forma legal, que opera por determinação da lei, verifica-se, segundo aquele art. 592.º, seu n.º 1, nas circunstâncias em que “Fora dos casos previstos nos artigos anteriores ou noutras disposições da lei, o terceiro que cumpra a obrigação só fica sub-rogado nos direitos do credor quando tiver garantido o cumprimento, ou quando, por outra causa, estiver directamente interessado na satisfação do crédito”.
A condenação em favor de G assentou nessa forma legal, por via de que, como se provou, “No âmbito de um contrato de prestação de serviços, a demandante G vinculou-se para com o Bf a proceder à recolha e tratamento de valores daquele banco em diversos locais, incluindo a ATM de Castro Verde” e “Ao abrigo desse mesmo contrato a G pagou ao Bf a referida quantia de € 8.000,00”.
Afastado, em concreto, o requisito de que alguma garantia de cumprimento onerasse G, subsistirá a análise do pressuposto legal de se estar, ou não, perante um seu interesse directo no assumido cumprimento.
Tê-lo feito ao abrigo daquele contrato de prestação de serviços, que decorreu da inerente responsabilidade por via da outorga do mesmo, concretamente de acordo com o n.º 5 do seu art. 5.º (fls. 1168) como resultante de qualquer ocorrência que se verifique durante o período em que os valores estão à guarda ou sob custódia, não colide com a natureza de que esse interesse se deva revestir.
Se é certo que, conforme Antunes Varela, ob. cit., pág. 304, «a lei quis restringir o benefício da sub-rogação ao pagamento efectuado por quem tenha um interesse próprio na satisfação do crédito, excluindo os casos em que o cumprimento se realize no exclusivo interesse do devedor ou por mero interesse moral ou afectivo do solvens», não é menos verdade que se configura o interesse directo e próprio de G em relação ao pagamento que efectuou, porque motivado em causa legítima, bem como no posterior ressarcimento do valor respectivo, apurada que foi a responsabilidade na prática dos factos.
Aliás, a seguir-se a posição do recorrente, o interesse de G não ficaria convenientemente acautelado e a exigência de que a indemnização revertesse em favor do Bf sempre dependeria de que este estivesse privado desse valor, acabando, pois, através da condenação e na forma como ficou decidida, por obter-se o efeito de ressarcimento patrimonial que se pretende.
Por isso, não deve ser alterada.
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3. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se:
- negar provimento ao recurso interposto pelo arguido/demandado e, em consequência,
- manter integralmente o acórdão recorrido.

Custas (criminais e cíveis) pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em soma equivalente a 4 UC.
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Processado e revisto pelo relator.
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(Carlos Jorge Berguete)
(João Gomes de Sousa)