Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
865/19.2T8LLE-A.E1
Relator: JOSÉ MANUEL BARATA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
PRAZO DO RECURSO
DIREITO DE PERSONALIDADE
Data do Acordão: 02/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I.- A regra geral prevista no artigo 607.º/2, do CPC é a de que não pode ser interposto recurso de revisão decorridos que sejam cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão.
II.- Mas há uma exceção a esta regra geral: se a decisão respeitar a direitos de personalidade não há prazo limite para o recurso – pode ser interposto a todo o tempo.
III.- Contudo, mesmo quando estejam em causa direitos de personalidade, mantém-se a sujeição ao limite de 60 dias, contados nos termos das alíneas a) a c) do mesmo preceito legal.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Procº 865/19.2T8LLE-A.E1


Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora


Recorrente: (…)

Recorridos: (…) e (…)
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No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Central Cível de Faro – Juiz 3, (…) intentou recurso de revisão da sentença proferida na ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra si proposta por (…) e (…).
Invoca que os recorridos tinham conhecimento da sua morada correta e número de telefone, que não foi citada por má-fé destes e falsidade de junção de requerimentos, requerendo a sua condenação como litigantes de má-, em multa e indemnização.
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Os recorridos defendem a extemporaneidade do recurso, a observância das formalidades legais da citação e a improcedência do pedido de condenação como litigantes de má-fé, peticionando a condenação da recorrente nessa qualidade.
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A recorrente respondeu, concluindo pela tempestividade do recurso e pela improcedência do pedido de condenação como litigante de má-fé.
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Após instrução, procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida a seguinte decisão:
Pelo exposto, ao abrigo dos citados preceitos legais, julgo:
- Extemporâneo o recurso de revisão interposto;
- Improcedentes, por não provados, os pedidos de condenação da recorrente e dos recorridos como litigantes de má-fé e, em consequência, absolvo-os dos pedidos.
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Custas do recurso pela recorrente e dos incidentes de litigância de má-fé pela recorrente e pelos recorridos, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um dos incidentes em 1 (uma) U.C., sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido à recorrente (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil e 7.º, n.º 4, do RCP).
Registe e notifique.
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Não se conformando com o decidido, (…) recorreu da sentença, formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:

1 - A questão em que o Tribunal se baseia é no facto, do recurso ser extemporâneo por ter ultrapassado o prazo de 60 dias, sem, porém, fundamentar por que razão decide que são 60 dias.

2 - Aliás, o próprio Tribunal entende que:

O prazo do recurso de revisão se deve contar desde o momento em que a recorrente, atuando com a diligência que lhe era exigível, ficou efetivamente em condições de, através da consulta do processo ou da intervenção neste, conhecer os seus termos e, assim, também a invalidade da citação efetuada.

3 - Ora, o acesso ao processo, apenas teve lugar em 10/05/2021 (Doc. 2), sendo que o presente recurso deu entrada em 15/06/2021, isto é, menos de 60 dias previstos no artigo.

4 - Razão pela qual a data de intervenção processual da recorrente é a de 10/05/2021.

Além disso,

5 - Nos termos do disposto no suprarreferido, o prazo de 2 meses (60 dias) apenas diz respeito a direitos de personalidade, sendo o prazo geral de 5 anos.

6 - Alega a sentença recorrida que se verifica a extemporaneidade do recurso, porém, em momento algum refere qual a data em que a recorrente teve conhecimento efetivo da ação, afim de se contarem os eventuais 60 dias em caso de ser este o prazo a aplicar.

7 - Não obstante o suprarreferido, o prazo só teria início após a recorrente ter conhecimento do facto que fundamenta a revisão (Ac. STJ, de 15/12/2011 in CJ - STJ, 2011, 3.º -162 e Proc. 1065/08.dgsi.net), isto é, a contagem do prazo só teria início a partir do momento em que a recorrente consultasse o processo.

8 - Teria de lhe ser facultado o acesso ao processo, o que, efetivamente, apenas teve lugar em 10/05/2021 (Doc. 2), sendo que o presente recurso deu entrada em 15/06/2021, isto é, menos de 60 dias previstos no artigo.

Mas,

9 - Este prazo de 60 dias apenas diz respeito a direitos de personalidade.

Assim sendo,

10 - Resta o prazo de 5 anos que, por exclusão de partes, se aplica ao presente recurso.

11 - Não se entende, pois, a posição do Tribunal afirmando que o recurso é extemporâneo.

12 - Da análise da sentença recorrida. resulta existir falta de fundamentação quanto aos factos dados como provados, quanto à ora recorrente.

13 - E extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar, pelo conteúdo, um respeito efetivo pelo princípio da legalidade na sentença e a própria independência e imparcialidade dos juízes, uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais, mas a própria sociedade.

14 - O princípio do dever de fundamentação dos atos decisórios, trata-se de um princípio geral extensivo a todos os ramos de direito, consagrado no artigo 208.°, n.º 1, da Constituição.

15 - Os recorridos, ao contrário do afirmado na sentença, sabiam perfeitamente qual a morada correta onde a R se encontrava/residia bem como o número de telefone desta, uma vez que falavam com a recorrente.

16 - O documento que se juntou, para esta prova, é a renovação do contrato constante dos autos, documento este que serviu de base à ação de despejo, elaborada pelos AA e enviada à advogada da recorrente na altura Dra. (…) com data de junho de 2018, onde se pode ler:

(…) … Residente na Rua (…), Edifício D. (…), 1º-L, 8125-412 Vilamoura.

17 - Face ao exposto, verifica-se que nos termos e para os efeitos da disposição legal invocada – artigo 696.º, alíneas b) e e), do CPC – existe fundamento legal para o recurso de revisão que ora se requer.

18 - Os recorridos não agiram com boa-fé ao requerer a citação edital da R. e informando que desconheciam a morada, quando na verdade o sabiam, para além de também terem o contacto telefónico desta, alterando a verdade dos factos em variadas circunstâncias, colocando em causa o bom-nome da R. e da Justiça.

19 - Face ao exposto, verifica-se que, nos termos e para os efeitos da disposição legal invocada – artigo 696.º, alíneas b) e e), do CPC – existe fundamento legal para: o recurso de revisão e não é extemporâneo.

20 - Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada por violação das normas constantes dos atos (artigos 29.º, 32.º, 18.º e 208.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa e 696.º do Código de Processo Civil.

Termos em que deve ser revogada a sentença recorrida.


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Os recorridos contra-alegaram, concluindo:

1º O Tribunal a quo fundamentou corretamente, porque é que considera que o prazo de recurso de revisão é de 60 dias a contar da data em que teve conhecimento, do facto que serve de base à revisão.

2º A recorrente delimitou o âmbito do recurso de revisão dizendo que “é interposto ao abrigo das alíneas b) e e) do artigo 696.º do Código de Processo Civil.

3º É artigo 697.º, n.º 2 e alínea C do CPC que regula o prazo em que o recurso pode ser interposto, o mesmo refere: “O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo para interposição é de 60 dias, contados: (…) c) ……, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão”.

4º Não releva para a contagem do prazo, a data em que foi consultado o processo, mas sim a data em que se teve conhecimento do conteúdo da sentença vide o Acórdão do STJ, de 01.07.2004, acessível in www.dgsi.pt.

5º A sentença objeto do recurso, foi proferida em 19.10.2020; em 18.01.2021 a recorrente procedeu à entrega das chaves do locado aos recorridos, na presença das respetivas mandatárias tendo sido esta data considerada pelo Tribunal como a data, que à certeza absoluta que a Recorrente teve conhecimento da ação movida contra ela e do conteúdo da sentença.

6º Das declarações de parte da ora recorrente (…) resultou a admissão que, nessa data, o recorrido (…), lhe falou do processo e que perdeu a ação em Tribunal.

7º A 10-05-2021 a ora requerente solicitou apoio judiciário junto a à Segurança Social e o requerimento de recurso, foi apresentado em juízo em 15.06.2021, ou seja, 178 dias após o conhecimento do conteúdo da sentença.

8º Houve uma análise cuidada e bem fundamentada dos factos dados como provados e não provados, uma analise exaustiva dos documentos junto aos autos e do processo apenso ao Recurso de Revisão e da prova testemunhal e declarações de parte produzidas em audiência de julgamento e a sua submissão às leis aplicáveis.

9º ….“A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica e ponderada de todos os meios de prova produzidos, valorados na sua globalidade, tendo em consideração as regras sobre repartição do ónus da prova e as regras da experiência (artigo 607.º, nºs 4 e 5, do Código de Processo Civil).

10º “Para além dos factos essenciais alegados foram, ainda, valorados factos complementares que resultaram da discussão da causa e acerca dos quais as partes tiveram oportunidade de exercer o contraditório, mormente resultantes da prova documental e relacionados com as diligências realizadas nos autos apensos para citação da recorrente, ali ré (artigo 5.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código de Processo Civil).”

11º A Sentença não enferma de qualquer nulidade, tendo feito correta interpretação das normas aplicáveis à natureza do pedido, pelo que se impõe a improcedência de arguição de nulidade, com as legais consequências.

12º Não tem razão a recorrente quando diz que houve contradição insanável de fundamentação e erro na apreciação da prova produzida e gravada em sede de julgamento.

13º A ora recorrente fundamentou o seu pedido de revisão de sentença invocando que o requerimento que os ora recorridos apresentaram em tribunal, a informar os autos que não conheciam outra morada da ora recorrente, é falso porque segundo ela (…) conhecia outra morada, invocando a nulidade da citação.

14º Juntou a recorrente como prova apenas uma minuta de um contrato de arrendamento, sem o mesmo estar assinado, a sua veracidade foi impugnada pois não sabem quem elaborou a minuta do contrato e se a morada, constante desse contrato, foi colocada pela própria recorrente.

15º Da prova produzida em sede de Julgamento a testemunha (…) não tinha conhecimento se os ora recorridos conheciam outra morada da Recorrente, a testemunha (…) – comproprietário das lojas – objeto da ação de despejo – até 2018, referiu que não conhecia outra morada da (…) e que os recorridos também não.

16º A própria (…) em declarações de parte, quando questionada porque é que não tinha atualizado a sua morada nas diferentes bases (finanças segurança social etc.) referiu que na altura não tinha certeza se seria a sua morada definitiva, que viajava muito…

17º O ora recorrido (…) em declarações de parte, refere que desconhecia outra morada da (…), que por esta era referido que ainda não tinha residência fixa em Portugal, que ponderava ir viver para o estrangeiro, e passava muito tempo no estrangeiro.

18º Não podia o tribunal valorar um documento que foi impugnado o respetivo teor e autoria, não se encontra assinado e não foi confirmado por qualquer outro elemento de prova.

19º A citação tem que ser pessoal não é passível de ser feita por telefone.

20º O tribunal consultou todas a bases de dados (finanças segurança social etc.), a fim de apurar qual a morada da (…) e em todas elas constava como residência a morada Rua das (…), n.º 78, Vilamoura.

21º Foi frustrada a tentativa de citação nas lojas objeto da ação de despejo e na sua morada oficial, foi efetuada o contacto telefónico pela Solicitadora nomeada pelo Tribunal para efetivar a citação, e recorrente a (...) recusou-se: encontrar-se com a solicitadora facultar outra morada.

22º Foram enviadas cartas registas, pelo tribunal para as lojas arrendadas sitas no Edifício (…), Av. da (…), em Vilamoura, cartas essas que a recorrente não levantou.

23º Só houve citação edital, porque a recorrente andou a fugir à citação. Os factos suprarreferidos constam do processo apenso a ao recurso de revisão e tendo os mesmos sido utilizados como mais um elemento de prova pelo tribunal para fundamentar a sua decisão.

24º Não há contradição na fundamentação nem erro notório na apreciação da prova produzida e gravada em sede de julgamento face a prova produzida o tribunal só podia concluir como concluiu.

25º O recurso ser julgado improcedente, mantendo-se nos exatos termos a sentença recorrida.

Nestes termos, e nos melhores de direito deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se nos exatos termos a sentença recorrida, fazendo assim a costumada justiça.


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Foram dispensados os vistos.

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As questões que importa decidir são as de saber:
1.- O prazo para interposição do recurso e a sua tempestividade.
2.- A falta de fundamentação da sentença e o erro na apreciação da prova.
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Não tendo sido impugnada a matéria de facto nos termos preconizados pelo artigo 640.º/1 e 2, do CPC, considera-se provada a matéria de facto fixada na 1ª instância, que é a seguinte:
Factos Provados
Produzida a prova, resultaram provados, com relevo para a decisão a proferir, os seguintes factos:
1- No dia 20.03.2019 os recorridos propuseram contra a recorrente ação declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo que fosse decretada a cessação do contrato de arrendamento, por resolução, relativamente ao locado e esta condenada a pagar as rendas em falta e a despejar imediatamente o locado e a entregá-lo livre e devoluto, nas condições em que o recebeu, com fundamento na falta de pagamento das rendas, na realização de obras que alteram a estrutura sem autorização, e na cedência não comunicada do arrendamento do estabelecimento comercial – cfr. fls. 1/21 dos autos apensos.
2- Foi indicada na petição inicial como morada da recorrente a Av. Da (…), Edifício (…), Lojas 6 e 7, 8125 Vilamoura – cfr. fls. 4 dos autos apensos.
3- Em 25.03.2019 foi enviada carta para citação da recorrente nesta morada, a qual foi devolvida com a menção “Encerrado” – refª Citius 112682112 e fls. 22 dos autos apensos.
4- Em 24.04.2019 foi tentada a citação por contato pessoal, a realizar pela Agente de Execução (…) na referida morada, deslocando-se ao local onde encontrou o bar “(…) Bar” fechado – cfr. fls. 23 dos autos apenso.
5- Após essa deslocação a Agente de execução ligou para o número de telemóvel da recorrente (…) para tentar realizar a citação por contato pessoal, mas esta não deixou explicar o pretendido, remeteu qualquer assunto a tratar para a sua advogada e desligou – cfr. fls. 23 dos autos apensos.
6- Em 24.05.2019 os recorridos informaram nos autos não ter conhecimento de outra morada da recorrente e requereram a sua citação edital – cfr. fls. 24/26 dos autos apensos.
7- Em 29.05.2019 foi determinada pesquisa nas bases de dados para apurar alguma morada alternativa da recorrente – cfr. fls. 27 dos autos apensos.
8- Nas pesquisas efetuadas nas bases de dados da Segurança Social, Identificação Civil e das Finanças foi encontrada a morada Rua das (…), n.º 78, 8125-449 Quarteira – cfr. fls. 28/31 dos autos apensos.
9- Em 04.06.2019 foi enviada carta para citação da recorrente nesta morada, a qual foi devolvida com a menção “Mudou-se” – cfr. refª Citius 113435282 e fls. 32 dos autos apensos.
10- Em 14.06.2019 os recorridos informaram nos autos não ter conhecimento de outra morada da recorrente e requereram a sua citação edital – cfr. fls. 33/35 dos autos apensos.
11- Em 19.06.2019 foi determinada a citação por contato pessoal da recorrente da morada encontrada Rua das (…), n.º 78, 8125-449 Quarteira – cfr. fls. 36 dos autos apensos.
12- Em 09.09.2019 foi tentada a citação por contato pessoal, a realizar pela Agente de Execução (…), na referida morada, indicando esta que foi informada por (…) que reside no local desde setembro de 2018 e que não conhece a recorrida – cfr. fls. 37 dos autos apensos.
13- Em 23.09.2019 os recorridos informaram nos autos não ter conhecimento de outra morada da recorrente e requereram a sua citação edital – cfr. fls. 39/42 dos autos apensos.
14- Em 02.10.2019 foi determinada a citação edital da recorrida – cfr. fls.43 dos autos apensos.
15- Em 08.10.2019 foi realizada a afixação de edital na morada Rua das (…), n.º 78, 8125-449, Vilamoura, no edifício do Tribunal e a publicação de anúncio – cfr. refª. Citius 114498965 e 114691953 e fls. 45 dos autos apensos, cujo teor se dá por reproduzido.
16- Em 23.01.2020 foi citado o Ministério Público para deduzir contestação – cfr. ref.ª Citius 115678038.
17- Em 19.10.2020 após realizado julgamento foi proferida sentença que, julgando a ação parcialmente procedente, declarou resolvidos os contratos de arrendamento celebrados com a ré tendo por objeto as frações autónomas identificadas nos pontos 1 e 4 dos factos provados; condenou a entregar as referidas frações autónomas, livres de pessoas e bens; condenou a pagar o valor das rendas vencidas até àquela data e que se cifravam em € 43.330,00 e desde essa data e até trânsito em julgado da decisão no montante mensal de € 1.170,00; absolveu a recorrente do demais peticionado – cfr. fls. 62/75 dos autos apensos.
18- Em 18.01.2021 a recorrente procedeu à entrega das chaves do locado aos recorridos.
19- Pelo menos nessa data teve conhecimento que os recorridos haviam intentado contra si uma ação e que havia sido determinado pelo Tribunal a entrega do locado.
20- Em 10.05.2021 a recorrente apresentou junto dos serviços de segurança social requerimento com vista à concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo para intentar recurso de revisão – cfr. fls. 6vº/7 dos presentes autos.
21- Em 10.05.2021 a Mandatária da recorrente teve acesso aos autos principais – cfr. ref.ª Citius 120165890.
22- Em 15.06.2021 a recorrente apresentou em juízo o recurso de revisão – cfr. fls.1 destes autos.
23- A morada da recorrente que consta atualmente nas bases de dados da Segurança Social e de Identificação Civil é Rua (…), Edifício (…), 1.º-L, 8125-412 Quarteira – cfr. fls.59/60 destes auto.
24- O recorrido (…) possuía o contato telefónico da recorrente.
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Factos não provados
Não se provou, com relevo para a decisão, que:
a) Os recorridos tinham conhecimento da morada onde a recorrente se encontrava e que residia na Rua (…), Edifício (…), 1.º-L, 8125-412 Vilamoura;
b) Os recorridos falavam com frequência com a recorrente.
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Conhecendo.
1.- O prazo para interposição do recurso e a sua tempestividade.
A recorrente interpôs o recurso de revisão, em causa nos autos, ao abrigo do disposto no artigo 696.º, b) – (falsidade, cuja matéria não foi discutida) e e) – (nulidade ou irregularidade da citação) do CPC.
Alega a recorrente que o prazo para interposição do recurso é de 5 anos e não de 60 dias, uma vez que este prazo diz respeito apenas aos direitos de personalidade.
Para além disso, o prazo de 60 dias apenas se iniciou no momento em que a recorrente consultou o processo – 10-05-2021 – e, tando o recurso sido interposto em 15-06-2021, é tempestivo.
Por sua vez os recorridos alegam que a sentença foi proferida em 19-10-2020 e a recorrente procedeu à entrega das chaves dos locados (objeto de ação de despejo) em 18-01-2021.
O que implica terem decorrido mais de 60 dias desde esta data (em que a recorrente tomou conhecimento da ação de despejo) e interposição do recurso de revisão – 15-06-2021.
Quid iuris?
Quanto aos prazos para a interposição dos recursos de revisão estipula o artigo 697.º/2, do CPC: O recurso não pode ser interposto se tiverem decorrido mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão, salvo se respeitar a direitos de personalidade, e o prazo é de 60 dias contados:
a) No caso da alínea a) do artigo 696.º …
b) No caso das alíneas f) e h) do artigo 696.º …
c) Nos outros casos, desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão.
No caso dos autos é aplicável o regime da alínea c), uma vez que estamos em presença de dois dos outros casos previstos no artigo 696.º do Código de Processo Civil.
Ora, da matéria de facto provada resulta que a sentença que se pretende rever foi proferida em 19-10-2020, onde foram declarados resolvidos dois contratos de arrendamento de que a recorrente era arrendatária.
E que, em 18-01-2021, a arrendatária procedeu à entrega das chaves dos locados aos proprietários.
A recorrente interpôs o presente recurso de revisão no dia 15-06-2021, tendo, por isso, decorrido mais de 120 dias após a entrega das chaves.
A solução a dar à questão prende-se com a interpretação do citado artigo 697.º/2, do Código de Processo Civil.
A regra geral ali prevista é a de que não podem ser interpostos recurso de revisão decorridos que sejam mais de cinco anos sobre o trânsito em julgado da decisão.
Mas há uma exceção a esta regra geral.
Se a decisão respeitar a direitos de personalidade não há prazo limite para o recurso – pode ser interposto a todo o tempo.
Contudo, mesmo quando estejam em causa direitos de personalidade – o que não é o caso dos autos –, mantém-se a sujeição ao limite de 60 dias, contados desde que o recorrente obteve o documento ou teve conhecimento do facto que serve de base à revisão, como é o caso dos autos – No mesmo sentido cfr. Rui Pinto, CPC Anotado, Vol. II, 2018, pág. 409.
Ora, resulta da matéria de facto provada, como acima se disse, que a recorrente teve conhecimento de que havia sido objeto de uma ação de despejo das frações de que era arrendatária, no momento em que entregou as chaves aos proprietários.
Defender que nem neste momento a recorrente tomou conhecimento da ação de despejo – no momento em que foi despejada – é lutar contra uma evidência que não pode sofrer contestação.
Assim sendo, tendo decorrido desde esta data até à interposição do recurso mais de 60 dias, o recurso é extemporâneo, pelo que bem andou o tribunal a quo em recusar a sua admissão.
Assim sendo, a apelação é improcedente nesta parte, o que implica o não conhecimento das restantes questões porque dependentes da procedência da tempestividade do recurso.
Em consequência, deve manter-se a sentença recorrida.
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Sumário:

(…)


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DECISÃO.

Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma a sentença recorrida.

Custas pela recorrente – artigo 527.º CPC
Notifique.

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Évora, 10-02-2022

José Manuel Barata (relator)

Conceição Ferreira

Emília Ramos Costa