Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
424/12.0TBELV-C.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: ALVARÁ
PENHOR MERCANTIL
Data do Acordão: 03/14/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O penhor de um alvará de farmácia, desacompanhado do respectivo estabelecimento, viola o artigo 680.º, e é nulo por força do artigo 280.º, ambos do Código Civil.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 424/12.0TBELV-C.E1

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

Nos presentes autos de insolvência, por sentença proferida em 12.09.2012, oportunamente transitada em julgado, foram declarados em estado de insolventes (…) e (…).
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No processo de verificação de créditos, foi proferida sentença que graduou os créditos da seguinte forma:
1.º - As dívidas da massa insolvente, v.g., custas e demais despesas, incluindo a remuneração do Administrador de Insolvência, a suportar pela massa falida, saem precípuas (cfr. artigos 46.º, n.º 1, 51.º, n.º 1, 172.º, n.º 1, 219.º e 232.º, n.º 3, do C.I.R.E.).
2.º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores com créditos reconhecidos pela seguinte ordem:
I - Do produto da liquidação dos bens móveis, apreendidos:
a) em primeiro lugar, os créditos dos trabalhadores identificados na lista de credores, homologada, na proporção dos respectivos montantes;
b) em segundo lugar, os créditos do Estado, provenientes de IRS, inscritos para cobrança nos últimos três anos e que estejam dentro do período previsto no art.º 97.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, e de IVA, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
c) em terceiro lugar, os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., no montante abrangido pelo privilégio mobiliário geral;
d) em quarto lugar, o crédito da credora, requerente da insolvência, (…) II – Distribuição Farmacêutica, S.A., dentro dos limites previstos no artigo 98º, nº 1, do C.I.R.E;
e) em quinto lugar, o remanescente do crédito do credor identificado na alínea anterior e os restantes créditos comuns reconhecidos, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
f) do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.
II - Do produto da liquidação do bem imóvel apreendido, como verba número Quinze:
a) em primeiro lugar, os créditos dos trabalhadores identificados na lista de credores homologada, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
b) em segundo lugar, o crédito do credor Banco (…), S.A., até ao montante máximo garantido pela respectiva hipoteca;
c) em terceiro lugar, os créditos do Estado, provenientes de IRS, inscritos para cobrança nos últimos três anos e que estejam dentro do período previsto no art.º 97.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, e de IVA, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
d) em quarto lugar, os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., no montante abrangido pelo privilégio imobiliário geral;
e) em quinto lugar, os demais créditos comuns reconhecidos, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
f) do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.
III - Do produto da liquidação dos bens imóveis afectos à actividade empresarial:
a) em primeiro lugar, os créditos dos trabalhadores identificados na lista de credores, homologada, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
b) em segundo lugar, os créditos do Estado, provenientes de IRS, inscritos para cobrança nos últimos três anos e que estejam dentro do período previsto no art.º 97.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, e de IVA, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
c) em terceiro lugar, os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., no montante abrangido pelo privilégio imobiliário geral;
d) em quarto lugar, os demais créditos comuns reconhecidos, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
e) do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.
IV - Do produto da liquidação dos restantes bens imóveis, apreendidos:
a) em primeiro lugar, os créditos do Estado, provenientes de IRS, inscritos para cobrança nos últimos três anos e que estejam dentro do período previsto no art.º 97.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, e de IVA, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
b) em segundo lugar, os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., no montante abrangido pelo privilégio imobiliário geral;
c) em terceiro lugar, os demais créditos comuns, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
d) do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.
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Desta sentença recorreu o credor (…) Banco, S.A., arguindo a nulidade da sentença com fundamento em que ela ignorou que todos os créditos reclamados pelo recorrente, no valor de € 401.933,84 se encontram garantidos pelo produto da venda do imóvel apreendido nestes autos em Maio de 2016 e que corresponde ao prédio misto denominado “Cabeço do (…)”, (…), freguesia de Colares, concelho de Sintra.
Mais invocou, na sua alegação, o penhor sobre o alvará de farmácia que não foi julgado válido na sentença.
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Esta arguição de nulidade foi atendida em função do que se alterou a sentença nestes termos:
- adito ao dispositivo da sentença, um ponto com o número IV, passando o actual ponto IV a ser o ponto V, com a seguinte redacção:
IV - Do produto da liquidação do bem imóvel apreendido, como verba número Um do auto de Apreensão de fls. 35 do Apenso A:
a) em primeiro lugar, o crédito do credor (…) Banco, S.A., até ao montante máximo garantido pela respectiva hipoteca;
b) em segundo lugar, os créditos do Estado, provenientes de IRS, inscritos para cobrança nos últimos três anos e que estejam dentro do período previsto no art.º 97.º, n.º 1, alínea a) do CIRE, e de IVA, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
c) em terceiro lugar, os créditos do Instituto da Segurança Social, I.P., no montante abrangido pelo privilégio imobiliário geral;
d) em quarto lugar, os demais créditos comuns reconhecidos, para serem pagos, rateadamente, na proporção dos respectivos montantes;
e) do remanescente, se o houver, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no art.º 48.º do CIRE.
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Por causa disto, o recorrente veio restringir o seu recurso vem, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art.º 617.º do CPC aplicável ex vi art.º 17.º do CIRE, restringir o objeto do seu recurso à decisão que, em suma, declarou nulo o penhor constituído a favor do aqui Recorrente sobre o alvará de Farmácia denominado "Farmácia (…)", ao qual foi atribuído o n.º … (atualmente com o n.º …) pelo INFARMED, que era propriedade da insolvente, não produzindo o mesmo qualquer efeito e, consequentemente, classificou o crédito reclamado pelo (…) Banco, S.A., no valor de € 164.299,74, como crédito de natureza comum.
Junta um douto parecer do Prof. Doutor Menezes Cordeiro, subordinado ao título «O Penhor de Alvarás de Farmácias».
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Para a decisão do recurso interessam os seguintes factos:
1. Em 21.06.2004 o Banco (…), S.A., os Insolventes e (…) e (…) foi celebrado um contrato de financiamento no montante de € 300.000,00, na modalidade de abertura de crédito.
2. Da cláusula 7.ª do aludido contrato consta, além do mais que:
Penhor de Alvará
1. Para garantia do bom pagamento de todas as responsabilidades que advêm para o Cliente do não cumprimento pontual e integral de qualquer obrigação para ele resultante do presente contrato, nomeadamente, e entre outras, o reembolso do capital, o pagamento de juros remuneratórios e moratórios, despesas jurídicas e extrajudiciais, honorários de advogado e custas nem como saldos devedores de quaisquer contas bancárias de que o cliente seja titular ou contitular que tenham como origem obrigações resultantes para este do presente contrato, os Garantes dão em penhor ao Banco, livres de anteriores ónus ou encargos, os direitos para si emergentes do alvará para funcionamento da farmácia sita na Rua dos (…), Bairro da (…), em Elvas, freguesia de Caia e São Pedro, concelho de Elvas, distrito de Portalegre, ao qual foi atribuído pelo INFARMED – Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, com o número (…).
3. Da certidão emitida pelo INFARMED, consta, além do mais que:
- Por alvará número (…), datado de 01 de Agosto de 1985, foi concedida licença para o funcionamento da Farmácia (…), sita em (…), na Rua das (…), (…), freguesia de (…), concelho de Elvas, distrito de Portalegre, cuja instalação foi autorizada por despacho de 14 de Dezembro de 1984, a favor da farmacêutica Dra. (…). Daquele alvará consta […] o averbamento efectuado em 27 de Outubro de 1987, de que a farmácia foi para novas instalações sitas em Elvas, Rua dos (…) do Bairro da (…), freguesia do Caia e São Pedro, concelho de Elvas, distrito de Portalegre, por despacho superior de 31 de Outubro de 1986.
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A sentença recorrida entendeu sobre isto o seguinte:
«Importa, pois, reter que uma licença, que constitui o alvará, atribui um direito. Não tem por objecto certa coisa móvel. O seu objecto é apenas uma declaração de conformidade de uma determinada farmácia com os requisitos legais de funcionamento.
«De acordo com o disposto no artigo 680.º do Código Civil, só é admitido o penhor de direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e sejam susceptíveis de transmissão.
«Por outro lado, e face a tudo o que se expôs, a autorização de explorar um estabelecimento – o alvará – desligada(o) de um estabelecimento não tem qualquer valor ou interesse comercial para sobre ele incidir um ónus.
«Nestas situações, entende-se, com todo o respeito por opinião contrária, que não pode esse elemento componente do estabelecimento, ser autonomizado e, por conseguinte, não é possível fazer incidir sobre ele uma penhora, nem qualquer outra garantia real, como o penhor».
E concluiu:
«Em face do exposto, por não se tratar de coisa móvel está legalmente impossibilitada a constituição de penhor a incidir apenas sobre o alvará de funcionamento de uma farmácia, por força do disposto no artigo 680.º do Código Civil e porque, dada a sua natureza (impossibilidade de ser autonomizado do estabelecimento comercial de Farmácia em que se integra), a sua venda ou transmissão isolada violaria a lei (artigos 280.º, n.º 1 e 401.º, n.º 1, do Código Civil, declaro nulo o penhor constituído sobre o alvará da Farmácia que era propriedade da insolvente, não produzindo o mesmo qualquer efeito».
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Contra este entendimento, o recorrente, apoiando-se no acórdão da Relação de Guimarães, de 3 de Maio de 2018, bem como no referido parecer, defende que «inexiste na lei qualquer impedimento de um proprietário de um estabelecimento seja livre de o desmembrar, v. g., através da alienação de uma ou mais partes que o compõem, de tal forma que comprometa a sua unidade, i. e., o seu funcionamento enquanto universalidade».
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Sempre se entendeu que o estabelecimento comercial é uma universalidade que pode ser negociada, tal como podem ser negociadas as coisas concretas que o integram, nos termos do art.º 206.º Cód. Civil. No seu parecer, o Prof. Menezes Cordeiro defende que «cada circunstância transmissível pode circular, ao abrigo da autonomia privada» (p. 24). Como desvios a esta regra de livre transmissão dos elementos individuais do estabelecimento, admite aqueles em que, «por expressa disposição legal ou pela natureza das coisas, há elementos que não admitem transmissões isoladas». Como exemplos da segunda espécie aponta o aviamento e a clientela: «consistem em decorrências do estabelecimento; desta feita, a natureza das coisas impõe que apenas com o trespasse possam mudar de mãos» (p. 25).
Assim, existem elementos que, dada a sua íntima ligação com o estabelecimento, apenas ganham relevo, em termos comerciais, nessa ligação.
O alvará é, sem dúvida, um elemento que integra o estabelecimento mas não é um elemento que possa ser, autonomamente, objecto de negócios jurídicos. O alvará, por se tratar de uma autorização administrativa, não é um bem em si mas sim uma permissão da Administração Pública, ou seja, não é um bem válido isoladamente; ele só vale com o estabelecimento a que diz respeito. Veja-se, embora sobre outro tipo de estabelecimento comercial, o ac. do STJ, de 6 de Julho de 2011, onde se escreve que o «alvará ou licença de utilização, obrigatória para os estabelecimentos comerciais da área da restauração ou bebidas, materializa grosso modo uma autorização administrativa que faculta a sua exploração e a sua própria transmissão jurídica e integrará, por isso, um daqueles “elementos necessários” ao seu funcionamento».
Por isso, tanto o citado ac. da Relação de Guimarães, como o de Coimbra, de 27 de Abril de 2017, afirmam que o alvará não pode ser objecto autónomo de negócios, não pode ser dado de penhor. Mas as soluções dadas ao problema são diferentes em cada um deles.
O primeiro equipara o penhor do alvará ao penhor do próprio estabelecimento com o argumento de que o «acordo estabelecido só pode ser entendido como referido ao próprio Estabelecimento de Farmácia (e não apenas ao Alvará de Farmácia que, pelas razões expostas, não seria susceptível de ser autonomizado do próprio Estabelecimento Comercial de Farmácia em que se integra como elemento componente, nem podia constituir objecto de um penhor)». Em função disto, aceita o penhor do alvará e dá-lhe um sentido mais amplo (penhor do estabelecimento).
Já o segundo acórdão, apoiando-se nos art.ºs 401.º, 280.º e 680.º, Cód. Civil, decide que o penhor do alvará é um negócio nulo porque «a licença que constitui o alvará atribui um direito que não tem por objeto certa coisa móvel». E prossegue: «sendo o alvará essa declaração de conformidade do estabelecimento, ele integra a universalidade que este constitui. Sendo desta separável, o alvará perde o seu significado. Não tem interesse uma declaração de conformidade de certa farmácia ou estabelecimento para outra pessoa que não detenha aquela ou este.
«Haverá a possibilidade de negociar certos elementos do estabelecimento desde que eles tenham um valor em si mesmos».
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Olhando para o regime legal sobre esta matéria (no que se refere ao alvará), que consta do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei n.º 26/2011 e 171/2012, temos o art.º 25.º:
1 — O licenciamento de novas farmácias é precedido de um procedimento concursal que permita a pré-selecção dos candidatos que preencham os requisitos fixados no respetivo aviso de abertura.
4 — As farmácias só podem abrir ao público depois de lhes ser atribuído o respetivo alvará, emitido pelo INFARMED.
5 — A alteração da propriedade ou a transferência da localização da farmácia dependem de averbamento no alvará.
6 — O INFARMED indefere os pedidos de emissão ou averbamento de alvará que não cumpram o preceituado no presente decreto-lei.
Acresce que o trespasse ou cessão de exploração da farmácia deve ser averbado no alvará (art.º 18.º, n.º 7).
Resulta destes preceitos que o alvará é um acto administrativo de autorização para o exercício de dada actividade sem o qual se não pode constituir um estabelecimento comercial para este ramo nem, sequer, transmiti-lo. Como se escreve na sentença, no trecho acima transcrito, o alvará desligado de um estabelecimento não tem qualquer valor ou interesse comercial para sobre ele incidir um ónus, tal como não tem valor ou interesse uma farmácia sem alvará. A mesma natureza das coisas que leva a considerar incindíveis do estabelecimento o aviamento e a clientela, leva a que também se considere como tal o alvará de uma farmácia.
O Prof. Menezes Cordeiro, quando trata do penhor do alvará de farmácia (pp. 32 e segs.), afirma que «as partes podem, ao abrigo da sua autonomia privada, retirar, do estabelecimento, os elementos que entenderem», dando como exemplos os casos do direito ao arrendamento e a firma». Mas «isto sucede por via de normas expressas (…) claramente excepcionais e que se justificam por fortes razões de fundo».
Ou seja, para afirmar a livre transmissão do alvará socorre-se apenas das disposições legais sem entrar em consideração com a natureza das coisas a que antes aludiu. Afirma o seguinte:
«A transação de uma farmácia tem, em regra, a ver com o alvará. Por isso, o seu valor ultrapassa o das instalações e demais existências, que podem mesmo representar cifras negativas. Para quê obrigar à transmissão de coisas descaracterizadas, para facultar a do alvará? Não se entende, em pleno século XXI, semelhante formalismo e, sobretudo: semelhante exigência que nenhuma lei prevê ou, muito menos, impõe».
Salvo o muito e devido respeito, não podemos concordar. A transmissão do estabelecimento a se não se destina a facultar a do alvará; simplesmente, o estabelecimento não pode funcionar sem ele. Não se trata de qualquer formalismo bizantino mas sim da natureza intrínseca que o alvará tem no conjunto do estabelecimento, como elemento sem o qual ele pode exercer a sua actividade. O alvará acompanha o estabelecimento e não tem valor por si só.
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E, por fim, temos a navalha de Ockam que é o art.º 680.º, Cód. Civil: só é admitido o penhor de direitos quando estes tenham por objecto coisas móveis e sejam susceptíveis de transmissão. Se, como pretende o recorrente, o alvará é independente do estabelecimento, ou dele pode ser separado, importa perguntar sobre que bem ele incide. O recorrente indica algum? Nenhum.
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Resulta do que antecede que aceitamos como melhor solução a tese do ac. da Relação de Coimbra em detrimento da do ac. da Relação de Guimarães. Neste, repare-se, começa-se por concordar com o carácter incindível do alvará perante a farmácia:
«Ora, um desses elementos componentes que não pode ser separado do estabelecimento comercial – e nas Farmácias ainda com maior pertinência, como iremos ver – é “o direito de alvará do estabelecimento” que só releva em conexão com a exploração daquele.
«Nestas situações não pode, assim, esse elemento componente ser autonomizado do estabelecimento comercial, não sendo possível fazer incidir sobre ele uma penhora, nem podendo sobre ele ser constituído uma garantia real (como o penhor)».
Não obstante esta afirmação de princípio, o ac. acaba por converter um penhor sobre um direito (o alvará) em um penhor sobre uma coisa móvel (o estabelecimento). Não se trata já de interpretação do contrato de penhor pois que o seu resultado extravasa em muito o seu texto, assim violando o disposto no art.º 238.º, n.º 1, Cód. Civil; trata-se antes de uma autêntica conversão que não vemos lei ou raciocínio jurídico que tal permita.
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Assim, o contrato de penhor invocado pela recorrente para qualificar o seu crédito como provido de garantia real é nulo e não produz qualquer dos seus efeitos típicos, como é próprio da nulidade.
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Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso.
Custas pelo recorrente.
Évora, 14 de Março de 2019
Paulo Amaral
Rosa Barroso
Francisco Matos

Sumário: o penhor de um alvará de farmácia, desacompanhado do respectivo estabelecimento, viola o artigo 680.º, e é nulo por força do artigo 280.º, ambos do Código Civil.