Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
90/15.1GCPTG.E2
Relator: ISABEL DUARTE
Descritores: NULIDADE DE ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
DISCORDÂNCIA COM O JULGADO
Data do Acordão: 06/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: - Mostrando-se o Acórdão, cuja nulidade é arguida, claro na sua exposição/ fundamentação, não sendo ininteligível, nem tão pouco se prestando a interpretações diferentes do que foi decidido, quanto às questões suscitados pelo recorrente, apenas se poderiam corrigir, caso existissem, erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade evidentes, no mencionado acórdão.

- Reiterando o requerente a sua discordância com o julgado, procurando demonstrar a comissão de hipotéticas nulidades, omissões e faltas, equacionando, de novo, as questões, não pretendendo, realmente, que seja esclarecida qualquer nulidade, omissão, nebulosidade ou falta de clareza, tal é pretensão que o Tribunal não pode, evidentemente, aceitar.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1ª Subsecção Criminal da Relação de Évora:

I – Relatório

1.1 - Na sequência do acórdão proferido, por este tribunal, em 28-04-2020 (proferido na sequência de anterior acórdão, por nós proferido, em 22/01/2019, determinando que os autos baixassem à 1ª instância, para cumprimento do art. 358º, n.ºs. 1 a 3, do CPP e a subsequente prolação de novo acórdão, o que ocorreu), no qual se decidiu, em síntese, negar provimento ao recurso, mantendo o decidido no acórdão recorrido, vem, agora, o arguido arguir a nulidade, e simultaneamente, solicitar a alteração daquele acórdão, concluindo, após reprodução de várias questões já suscitadas, no objecto do seu recurso, o seguinte:

“a) Do art. 5º da matéria provada da sentença recorrida, resulta a condenação do arguido num crime de coação sexual, com base na alteração dos factos da acusação, que relevam para efeitos do momento da prática dos mesmos, e em incumprimento dos artigos 358.º e 359.º do CPP.

b) Do art. 8º da matéria provada da sentença recorrida, resulta a condenação do arguido no primeiro crime de atos sexuais com adolescentes, cuja prática foi alterada de setembro de 2014 para Outubro de 2014, relevando para efeitos do momento da prática dos mesmos, e em incumprimento dos artigos 358.º e 359.º do CPP

44.

Dos 2 crimes de importunação sexual

O recorrente, invocou que os factos dados por provados eram insuficientes para concluir pela pratica desse crime, e alegou erro na apreciação da prova,

45.

Este erro é um erro grosseiro, , dos factos provados em 16., que o arguido apalpou os seios da AP, tendo de seguida tentado beijá-la na boca, o que não conseguiu , porque a AP se afastou e na segunda das ocasiões, bateu-lhe, não permitem ao tribunal concluir que a AP, por via desses factos, sentiu sofrimento, desgosto e desânimo.

E por via disso condenar o arguido a 8 meses de prisão efetiva.

46.

Trata-se claramente de uma falha grosseira e ostensiva na análise da prova, de tal forma que é rapidamente percetível, pelo homem comum, uma vez que essa decisão conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta que o tribunal violou as regras de experiencia de vida, e que ao aceitar a prova com base apenas nas palavras da ofendida adulta e mãe, conhecida como criadora de fabulas pelas testemunhas, desrespeita o valor das provas.

47.

O tribunal ao não apreciar esta questão, deste ponto de vista das provas, e também do ponto de vista da inexistência de ato sexual, e impossibilidade de subsunção dos factos 16, 17 e 18, omitiu a pronúncia devida, o que nos termos da alínea c) do nº1 do art. 379.º do CPP., torna o Acórdão nulo.

PELO EXPOSTO, DEVERÁ ESTA RECLAMAÇÃO SER ACEITE, E POR VIA DA SUA APRECIAÇAO,

A) VIR ESTA ESTE TRIBUNAL A APRECIAR E A DECIDIR O PEDIDO DE ALTERAÇÃO À DECISAO DA MATERIA DE FACTO, NOS PONTOS 5 A 18. DA MATERIA PROVADA

B) APRECIAR E DECIDIR QUE OS FACTOS 16, 17, E 18, SÃO INSUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO DO ARGUIDO PELO CRIMES DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL

C) E APRECIAR E DECIDIR QUE OS FACTOS PROVADOS 16,17, E 18, NÃO CONSITITUEM ACTOS SEXUAIS DE RELEVO, NEM CONSTITUEM OFENSA À AUTODETERMINAÇAO SEXUAL DA OFENDIDA ADULTA, NÃO SENDO SUBMISSIVEIS AO ART. 170º DO CP,

C) DEVERÃO AINDA OS AUTOS BAIXAR À 1ª INSTÂNCIA PARA DAR CUMPRIMENTO AO ART. 358.º N.º1 DO CPP, NA ALTERAÇÃO AOS FACTOS DA ACUSAÇÃO.”

1.2 - Os autos foram à conferência, com dispensa de vistos.

1.3 - Cumpre decidir

II - Fundamentação

2.1 - Nas conclusões da motivação do recurso o recorrente havia suscitado, de forma expressa, as diversas questões, enunciadas no ponto 2.3, do acórdão aludido, proferido por este tribunal, resultantes das alíneas A) n.ºs. 1 a 10, B) nºs. 11 a 30, C) nºs. 31 a 33 e D nºs. 34 a 38, das respectivas conclusões de recurso.

No mencionado acórdão, cuja nulidade é, agora, arguida, nos pontos 2.4.1, 2.4.2 e 2.4.4, são, expressa, pormenorizada e fundamentadamente, tratadas todas essas questões.

Portanto, a simples leitura, daqueles diversos excertos do mencionado acórdão, demonstra que este tribunal se pronunciou, de forma cabal, sobre toda a temática do objecto do recurso.

No aresto aclarando, todas as premissas e dados factuais e jurídicos, bem como, o discurso lógico-discursivo e decisório correspondente, se encontram inequivocamente enunciados, analisados e descritos, ou explicado o motivo e as repercussões do conhecimento de questões suscitadas, relativamente a outras.

Apenas se dirá, a título de exemplo, que consta, do acórdão em causa, de forma detalhada e pormenorizada, a análise ou explicação do afloramento de todas as questões suscitadas, nomeadamente.

No seu aludido ponto 2.4.1 é analisada e ouvida toda a prova gravada, e explicitado, de modo detalhado e fundamentado, o motivo pelo qual a pretensão da impugnação da matéria de facto, não procedeu;

No ponto 2.4.2 é esclarecido, de modo preciso, o afastamento do alegado vício de erro notório na apreciação da prova;

No ponto 2.4.4. é efectuada a subsunção dos factos ao direito, com análise de todos os respectivos elementos do tipo legal dos crimes em causa, designadamente, o de importunação sexual, onde são discriminadas posições doutrinais e jurisprudenciais sobre o mesmo, integrando o comportamento do arguido, no conceito de acto sexual de relevo e na previsão do art. 170º, do CP.

Portanto, como já afirmado, “todas essas premissas e dados factuais e jurídicos, bem como o discurso lógico-discursivo e decisório correspondente, se encontram inequivocamente enunciados e descritos no aresto aclarando.”

No acórdão está plasmado o que deve estar.

Parece-nos, pois, que tudo quanto havia a apreciar foi efectivamente apreciado e nenhuma questão ficou por resolver.

Portanto, não se vislumbra a existência de nulidade do acórdão por não se ter pronunciado, de forma clarividente, sobre questões que devia apreciar (artigo 379° n.º 2 do C.P.P.) ou violação do art.º 374º, n.º 2, do CPP, porquanto, foram apreciadas todas questões suscitadas, essenciais e determinantes, para a boa decisão da causa.

Concluindo, este tribunal pronunciou-se, de forma clara, precisa e compreensível sobre as referidas matérias.

Por conseguinte, não assiste razão ao recorrente.

2.2 - Acresce que, qualquer dos interessados pode, no processo penal (cfr. citado art.º 380º, nºs 1 al. b), do CPP, requerer ao tribunal que proferiu a decisão o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que ela contenha, mas a intervenção do Magistrado Judicial não pode ir mais além, sob pena de violação das regras limitativas do seu poder jurisdicional, que nessa altura se encontra esgotado (cf. Ac. do STJ, de 6/1/94; B.M.J., 433, 423).

E adianta, o Ac. do STJ, de 1/6/00, proc. n.º 76/2000-5ª, SASTJ, n.º 42, 60: “...a correcção para que a lei aponta e que o referido art.º 380º n.º 1, al. b), do CPP autoriza só pode ser ditada por erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade +evidentes, já que de outro modo estaria aberta a porta a um ínvio caminho conducente à alteração do decidido quando o poder jurisdicional se encontra esgotado, com risco para a segurança das decisões.”

Não nos parece, salvaguardando sempre o devido respeito por opinião contrária, que o mencionado acórdão desta Relação padeça de alguma obscuridade e/ou ambiguidade, tendo o mesmo analisado todas as questões de acordo com o objecto de recurso, delimitado pelas respectivas conclusões do recorrente/requerente.

Com efeito, o mesmo mostra-se claro na sua exposição/ fundamentação, não sendo ininteligível, nem tão pouco se presta a interpretações diferentes do que foi decidido, quanto às questões suscitados pelo recorrente.

Apenas se poderiam corrigir, caso existissem, o que não ocorre, erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade evidentes, no mencionado acórdão.

Só existe, com efeito, obscuridade quando o tribunal proferiu decisão cujo sentido um tal destinatário não possa alcançar. A ambiguidade só relevará se vier a redundar em obscuridade, ou seja, se for tal que do respectivo texto ou contexto não se tome possível alcançar o sentido a atribuir ao passo da decisão que se reclama de ambíguo. Se dessa reclamação ressaltar à evidência que o reclamante compreendeu bem os fundamentos da decisão e apenas com os mesmos não concordou, bem como com o sentido decisório final, não ocorre a reclamada obscuridade/ambiguidade - vide, neste sentido, o Ac. do STJ de 28-3-00, in – Sumários - n.º 39, pág. 22.

Ora, atendendo ao significado dessas expressões e à simples leitura do acórdão cuja reforma se pretende, não vislumbramos qualquer correcção ou aclaração a efectuar.

Portanto, a simples leitura de excertos do mencionado acórdão, para os quais se remete, demonstra que este tribunal se pronunciou, de forma cabal, sobre todas as questões equacionadas nas conclusões do recurso.

Por esse motivo, o acórdão reclamado, decidiu em conformidade com os preceitos legais aplicáveis, não se verificando qualquer nulidade ou lapso ou imprecisão passível de rectificação ou aclaração a efectuar, sendo de indeferir o requerimento do recorrente.

E o raciocínio no mesmo plasmado revela-se perfeitamente cristalino e clarividente para qualquer destinatário normal e médio, que é o suposto ser querido pela ordem jurídica.

No caso “sub judice”, parece-nos que o requerente reitera a sua discordância com o julgado, procurando demonstrar a comissão de hipotéticas nulidades, omissões e faltas, equacionando, de novo, as questões, não pretendendo, realmente, que seja esclarecida qualquer nulidade, omissão, nebulosidade ou falta de clareza, pretensão que este Tribunal não pode, evidentemente, aceitar.

III - Decisão

Em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste tribunal em indeferir as mencionadas arguições e pretensões.

Custas do incidente pelo arguido, fixando a taxa de justiça em 2Ucs.

(Este texto foi por mim, relatora, elaborado e integralmente revisto, antes de assinado).

Évora, 23/06/2020

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(Maria Isabel Duarte de Melo Gomes)

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(José Maria Simão)