Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
284/17.5T8ABF.E1
Relator: MATA RIBEIRO
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
TÍTULO CONSTITUTIVO
EXPLORAÇÃO TURÍSTICA
PROPRIEDADE PLURAL
Data do Acordão: 06/07/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
1 - A aplicação do regime da propriedade plural em empreendimentos turísticos, implica a prévia existência de um título constitutivo elaborado e aprovado nos termos do Decreto-lei n.º 39/2008 de 07/02.
2 - Embora exista um empreendimento turístico integrado por vários blocos de apartamentos, o regime jurídico do aludido diploma, no que respeita às normas que regem a propriedade plural, só lhe é aplicável se título constitutivo já se encontrar aceite em depósito à data da sua entrada em vigor, senão é aplicável o disposto no Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 305/99, de 6 de agosto, 55/2002, de 11 de março, e 217/2006, de 31 de outubro, e seus regulamentos.
3 - No âmbito do regime de propriedade plural a exploração do empreendimento tem de ser feito por uma única entidade, não podendo as frações serem diretamente exploradas pelos seus proprietários, nem ser objeto de contratos que comprometam o uso turístico das mesmas, designadamente, contratos de arrendamento ou constituição de direitos de uso e habitação.
4 - Sendo o proprietário de frações integradas nos blocos de apartamentos do empreendimento a explorar diretamente no mercado de arrendamento para férias, as suas frações, tal indicia a não sujeição do empreendimento ao regime da propriedade plural.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

BB, S.A. intentou a ação declarativa com processo comum contra Cc, Lda. (…) e dd, Lda., a qual corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro (Juízo Local Cível de Albufeira) alegando, em síntese, que é proprietária de duas frações num empreendimento turístico denominado “Clube Praia da Oura” ou “Hotel Apartamento Oura Praia”, o qual se encontra constituído em propriedade horizontal, sendo os atos de gestão, administração e manutenção realizados no empreendimento pela CC, Lda., embora oficialmente a entidade exploradora do empreendimento seja a DD e que as rés no exercício dessas funções, procederam, em Setembro de 2016, à colocação de portões com dispositivo de abertura através de cartão magnético em determinados corredores exteriores e comuns de acesso à piscina e ao campo de ténis que limitam a livre circulação da autora naquelas partes comuns, não lhe tendo sido solicitada autorização para a sua colocação dos portões ou comunicada a mesma.
Concluindo peticiona a condenação das rés a destruírem os quatro portões instalados nos corredores exteriores do empreendimento (partes comuns), os quais identificou, e bem assim no pagamento, a título de cláusula pecuniária compulsória, da quantia de € 25,00 por cada dia de atraso na eliminação dos mesmos, contabilizados desde o dia em que se realizar a citação da presente ação e até à efetiva destruição.
Citadas as rés vieram contestar, pugnando pela improcedência da ação e a sua consequente absolvição do pedido. A Ré DD, Lda. alegou para o efeito, e em síntese, que o “Clube Praia da Oura” e o “Hotel Apartamento Oura Praia” são entidades distintas e que apenas tem a exploração do segundo, onde a Autora não é proprietária de qualquer fração não tendo qualquer relação com a mesma. A Ré CC, Lda. alegou para o efeito, também, em síntese, que o “Clube Praia da Oura” e o “Hotel Apartamento Oura Praia” são entidades distintas e que apenas administrou e explorou o primeiro até final de Fevereiro de 2016, sendo portanto parte ilegítima nos autos, sendo que a partir de 01/03/2016 o empreendimento passou a ser explorado pela EE, Lda., tendo mantido alguma ligação ao empreendimento até final de 2016 para efeitos de melhor transferência da exploração. Salientou, ainda, que os dois blocos onde a autora tem cada uma das suas frações estão autonomamente constituídos em propriedade horizontal, inexistindo uma propriedade horizontal constituída quanto à totalidade dos blocos que compõem o empreendimento. A piscina corresponde a um prédio independente daqueles blocos e que inexiste qualquer campo de ténis.
A autora veio requerer a intervenção principal provocada de Ee, Lda., que veio a ser admitida, tendo apresentado contestação na qual pugnou pela improcedência da ação.
No saneador, por ilegitimidade, absolveu-se da instância a ré DD, Lda.
Realizada audiência final veio a ser proferida sentença pela qual se julgou improcedente a ação e se absolveram as rés do pedido.
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Irresignada com sentença, veio a autora interpor o presente recurso e apresentar as respetivas alegações, terminando por formular as seguintes conclusões que se transcrevem:
1. A Recorrente não se conforma com a Sentença proferida nos presentes Autos, a qual julgou improcedente o Pedido, versando o presente Recurso sobre a matéria de facto e de direito que o Recorrente considera ter sido incorretamente julgada e aplicada, e, ainda, quanto à Impugnação da Matéria de Facto;
2. No que se refere à alínea c) dos factos dados como não provados, e atenta a prova carreada nos Autos, considera a Recorrente que tal factualidade foi incorretamente julgada, senão vejamos
3. Tendo presente as fotografias aéreas que se encontram juntas aos Autos ­vide Fls 54 e 299 - de onde decorre local exato onde os portões se encontram; atentando-se, ainda, aos Does. 19 junto com a PI, e 1 e 2 juntos com o requerimento probatório, da A., de 24 de Novembro de 2017, onde se vislumbra a localização dos portões; a própria confissão da Ré Polvilha no artigo 40° da Contestação que apresentou nos presentes Autos; assim como a própria fundamentação vertida na Sentença de que ora se Recorre onde se refere que os Portões visavam delimitar os Blocos da Via Pública;
4. Impunha-se que o referido ponto da matéria de facto tivesse sido dado como provado, atentos os elementos probatórios existentes nos Autos, e melhor identificados supra, visto que estamos perante corredores exteriores que permitem a entrada e a saída dos blocos A e C (ala norte) para a via pública e, como tal, não poderão deixar de ser consideradas partes comuns dos mesmos.
5. No, mesmo sentido, e no que se refere à alínea d) dos factos dados como não provados, e atenta a prova carreada nos Autos, considera a Recorrente que tal factualidade foi incorretamente julgada, senão vejamos
6. Tendo subjacente as referências espaciais já supra aduzidas, assim como as fotografias juntas aos Autos com a PI, a fls. 37 a 40; 48 a 52; 59 a 63; 275 a 282, não se compreende que seja dado como não provada a limitação de utilização de parte comum do empreendimento;
7. A ligação feita entre a Via pública e os blocos que constituem todo o empreendimento designado como "Clube Praia da Oura" sempre foi possível, desde, pelo menos o ano de 1975, realizando-se através dos corredores exteriores aos referidos Blocos, nunca existindo qualquer tipo de restrição ao acesso a tal espaço de entrada nos Blocos;
8. Ao invés, e como decorre da confissão da R. EE, artigo 32° da sua Contestação, assim como das diversas fotografias a que se referiu supra, a colocação de portões limita, ou é suscetível de limitar, o acesso àquelas entradas / partes comuns do empreendimento / blocos habitacionais;
9. A mera colocação de um portão numa zona onde não existia qualquer obstáculo é em si mesma objetivamente limitativa, o que não se poderá deixar de alegar para os devidos efeitos legais, bastando, salvo melhor opinião, a mera suscetibilidade de ser fechado o acesso àquela parte comum, para se verificar uma limitação da utilização do espaço e violador dos direitos da Recorrente.
10. Impunha-se, pois, atenta a prova carreada nos Autos e melhor identificada supra, que tivesse sido dado como provado que: "a colocação de portões nos corredores referidos em 14. limita o livre acesso pela Autora aos corredores de ligação entre a Via Pública e os Blocos A e C" - o que não se poderá deixar de alegar para os devidos efeitos legais.
11. Em face da alteração da Matéria de Facto dada como provada, cumpria aferir, salvo melhor opinião, quanto à existência de um Empreendimento Turístico, constituído pelos diversos blocos habitacionais (A a F) - e onde se incluem as frações da Recorrente - e piscina, com a tipologia de apartamentos turísticos, conforme decorre do Registo Nacional de Empreendimentos Turísticos;
12. É em si mesmo, faticamente, um empreendimento turístico em propriedade plural, na medida em que compreende frações autónomas de um ou mais edifícios - pelos menos Blocos A a F - composto por 541 unidades de alojamento, vulgo, frações autónomas, com diversos proprietários - como é o caso da A., proprietário distinto dos restantes proprietários do empreendimento turístico.
13. Razão pela qual, e salvo melhor opinião, nunca poderia deixar de se aplicar, em face da realidade fáctica existente no Empreendimento turístico designado como Apartamentos Turísticos Clube Praia da Oura, na sua globalidade - onde se incluem frações de diversos proprietários, partes comuns como corredores e piscinas, receção e acessos ao exterior - o regime da Propriedade Horizontal;
14. A Sentença proferida pelo Tribunal "a quo", ao não considerar a existência de um empreendimento turístico em propriedade plural, violou o disposto nos artigos n.ºs 52° e 53° do Decreto-Lei n.º 39/2008; o artigo 47° do Decreto-Lei n.º 167/97; assim como o artigo 63° do Decreto-Lei n.º 39/2008 e, consequentemente, o artigo 1425° do Código Civil.
15. Em face do supra exposto, e atendendo ao objeto do litígio e aos temas da prova determinados em Despacho Saneador, cumpriria determinar, salvo melhor opinião, se os portões foram colocados em partes comuns; se a Ré EE tinha legitimidade para unilateralmente proceder a tal desiderato; e, por último, se a colocação dos Portões importou uma limitação para a Recorrente;
16. Quanto às questões a apreciar, sempre se dirá que os Portões, ao delimitarem o empreendimento, foram, necessariamente, colocados entre os corredores de acesso aos Blocos Habitacionais - partes comuns, nos termos do artigo 1421 ° do CC - e a via pública, tal como decorre da confissão da Ré EE e da fundamentação aduzida pelo Tribunal "a quo";
17. Entender-se outra realidade seria assumir que os Portões foram colocados em plena Via Pública, o que manifestamente não aconteceu, razão pela qual, apenas, se poderá entender que os mesmos foram colocados em Partes Comuns;
18. Em face do supra exposto, sempre se entenderia que a Ré EE não tinha legitimidade para, unilateralmente, proceder à colocação dos Portões, porquanto nos termos do artigo 1425° do Código Civil, dir-se-á que é inovadora toda a obra da qual resulte uma alteração quer material, de forma ou de substância, quer quanto à afetação ou destino de uma qualquer parte comum, tal como constava da conceção originária do prédio.
19. Ora, a ser assim, como nos parece ser, a introdução de inovações nas partes comuns estão sujeitas a duas regras fundamentais / pressupostos objetivos, a saber: - Dependem de autorização prévia da assembleia de condóminos (ou, se se preferir, da assembleia de proprietários, conforme designa o disposto no artigo 63° do DL 15/2014, de 23 de Janeiro), aprovada, cumulativamente, por maioria numérica e a representação de 2/3 do valor total do empreendimento;
20. Conforme decorre do ponto 14. da Matéria de facto dada como provada, à A., na sua qualidade de comproprietária das partes comuns, nunca foi pedida qualquer autorização para a colocação dos portões nos corredores de acesso comuns do empreendimento, nem a mesma foi convocada para qualquer Assembleia com tal ordem de trabalhos, razão pela qual carecia a Ré EE de Legitimidade para colocar os Portões, tal como o fez.
21. Quanto à existência de limitação, bastará atentar ao que já se disse supra, porquanto a colocação de estrutura física em espaço onde nunca existiu qualquer objeto, têm em si subjacente uma limitação, ou suscetibilidade de limitar o acesso, razão pela qual sempre se deveria considerar limitado o direito da Recorrente.
22. Termos em que, verificando-se as alegações supra aduzidas, sempre se dirá que a decisão proferida pelo tribunal "a quo" violou o disposto nos artigos n.ºs 52°, 53° e 63° do Decreto-Lei n.º 39/2008; o artigo 47° do Decreto-Lei n.º 167/97; assim como os artigos 1421 ° e 1425° do Código Civil.
23. Nesta conformidade, face às motivações apresentadas, deverá o Acórdão proferido ser revogado, e substituído por outro que julgue em conformidade com o supra exposto.
Foram apresentadas contra alegações pela 1ª ré e pela interveniente nas quais pugnam pela manutenção do julgado.
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Apreciando e decidindo

Como se sabe o objeto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso (artºs 635º n.º 4, 639º n.º 1 e 608º n.º 2 ex vi do artº 663º n.º 2 todos do CPC).

Assim, em síntese, do que resulta das conclusões, caberá apreciar:
- Do erro de julgamento no que respeita à matéria de facto;
2ª - Tendo-se esse erro por verificado e em face do direito aplicável, se merece procedência a ação.
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Na 1ª instância foi considerado provado o seguinte circunstancialismo factual:
1. Encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial sob o NIPC … a firma AA, S.A., anteriormente a 24.08.2016 designada por FF, Lda.
2. Pela AP 2 de 1990/07/05, encontra-se registado na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º …, a aquisição por compra, por FF, Lda., da fração …, do Bloco A, correspondente ao segundo andar, apartamento n.º … - ….º direito, virado a norte, destinado a habitação, com uma permilagem de 1,96, denominado apartamento 803.
3. Pela AP 2 de 1990/07/05, encontra-se registado na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º …, a aquisição por compra, por FF, Lda., da fração …, do Bloco C (Ala Norte), correspondente ao primeiro andar, apartamento n.º … - ….º do lado esquerdo, virado a norte, destinado a habitação, com uma permilagem de 4,43, denominado apartamento 535.
4. O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º …, referido em 2. e 3. é um urbano situado na Praia da Oura, Areias de São João, constituído por quatro blocos (Bloco A, B, C Ala Norte e C Ala Poente) encontrando-se aí registado pela AP … de 1975/08/01 a Constituição da Propriedade Horizontal.
5. Por documento epigrafado “Constituição de Propriedade Horizontal” datado de 10.4.1975, e relativamente ao imóvel referido em 4. foi dito, entre o demais que aqui se dá por reproduzido, que “nos referidos terrenos já se encontram construídos quatro blocos de apartamentos, os quais reúnem todos os requisitos para que neles se constitua o regime de propriedade horizontal, ficando designados por Blocos “A”, “B”, “C)” (alas poente e norte): Bloco “A” Representado por um prédio urbano, no referido sítio de Areias de São João, Praia da Oura, constituído por trinta e seis apartamentos distribuídos em quatro pisos: (…) São partes comuns, as escadarias, patamares, terraços não privativos e elevadores. (…) Bloco “C” (…) formado por duas alas norte e poente, tendo a ala norte dezassete apartamentos e a ala poente oitenta e um apartamentos, todos destinados a habitação: Ala Norte (…) são partes comuns do último bloco as escadas, patamares, coberturas e elevadores (…)”.
6. As duas frações referidas em 2. e 3. localizam-se dentro do empreendimento turístico denominado “Clube Praia da Oura” que integra diversas frações dos quatro blocos referidos em 4. e ainda dos Blocos D, E e F.
7. Junto do prédio referido em 4. e no empreendimento referido em 6. encontra-se o prédio inscrito na matriz sob o n.º … a favor de GG, Lda., onde se inclui, entre o demais, uma piscina.
8. A piscina referida em 7. tem sido utilizada, para além dos utilizadores derivados da exploração do empreendimento “Clube Praia da Oura”, também, sem entrega de qualquer contrapartida, pela Autora na sua atividade de exploração da fração em mercado de arrendamento para férias.
9. O “Clube Praia da Oura” encontra-se registado no Registo Nacional de Empreendimentos Turísticos sob o n.º 4539 como “Apartamentos Turísticos Clube Praia da Oura”.
10. Até final de Fevereiro de 2016 era a Ré CC, Lda. que realizava os atos de gestão, administração e manutenção no empreendimento turístico “Clube Praia da Oura”.
11. Desde início de Março de 2016 os atos de gestão, administração e manutenção no empreendimento turístico “Clube Praia da Oura” são realizados pela Ré EE, Lda..
12. A Ré CC, Lda., mesmo após Fevereiro de 2016 continuou a manter, pelo menos até final do ano de 2016, contacto com a Ré EE, Lda. para passagem dos assuntos pendentes relativamente ao empreendimento e acompanhamento dos mesmos.
13. Em meados de 2016 foi colocado pela Ré EE, Lda., em corredores exteriores de acesso à piscina, quatro portões com dispositivo de abertura através de cartão magnético, onde nada antes existia, e mais concretamente:
Na zona sul do empreendimento
- portão no corredor de acesso, no lado sul do empreendimento (ao lado do acesso pedonal entre o empreendimento e a praia da Oura);
Na Zona da piscina do empreendimento
- portão colocado no corredor de acesso noroeste da piscina, junto à entrada norte, o qual dá diretamente para a rua (Rua Oliveira Martins);
- portão no corredor de acesso ao piso 0 do Edifício Amêndoa (bloco a norte da zona da piscina);
Na Zona norte do empreendimento
- Portão na zona norte do empreendimento, junto à rua principal.
14. Não foi pedida qualquer autorização à Autora para a colocação dos portões referidos em 13.
15. Os portões referidos em 13. foram aí colocados, delimitando os blocos que compõem o empreendimento face à via pública, por questões de segurança uma vez que os diversos blocos não se encontravam delimitados face à via pública, sendo frequente a utilização da piscina e dos corredores do empreendimento por terceiros que nenhuma relação tinham com este.
16. Em 4.11.2016 a Autora remeteu à CC, Lda. uma carta, para além do mais sobre alegadas infiltrações num das frações da Autora, nos seguintes termos “Aproveitamos a missiva para interpelar Vs. Exas. para a entrega imediata de cartões de acesso às zonas comuns – especificadamente à zona da piscina.
Ora foi por Vs. Exas. unilateralmente instalados portões de acesso à zona comum da piscina do empreendimento.
Na sequência da referida instalação não nos foi fornecido qualquer cartão de acesso à dita parte comum, mesmo após diversas interpelações por via telefónica para a Exma. Senhora Doutora Nadine … para tal desiderato.
Tal postura de Vs. Exas. é violadora da lei, vide artigos 1422.º n.º 1 e 1406.º n.º 1 ambos do Código Civil e consubstancia uma limitação abusiva e desproporcionada do direito que assiste a este comproprietário de usar a parte comum que é a piscina. (…)”.
17. Em 21.11.2016 a Autora remeteu à CC, Lda. uma carta, entre o demais que damos aqui por reproduzido, reforçando que “Contudo o local onde foram colocado os cartões de acesso inviabiliza o acesso direto às zonas comuns do empreendimento designadamente a piscina, obrigando os nossos clientes a atravessarem todo o empreendimento, para lhe aceder. Na qualidade de comproprietários das partes comuns não autorizamos (nem autorizaremos) a colocação de qualquer portão que vede o acesso direto às zonas comuns nos exatos termos que existia antes da sua colocação. Tal como referimos anteriormente a postura de Vs. Exas. é violadora da lei, (…) e consubstancia uma limitação abusiva e desproporcionada do direito que assiste a este comproprietário de usar a parte comum que é a piscina.”.

Foram considerados não provados os seguintes factos:
a) O conjunto de blocos de apartamentos que constitui o empreendimento turístico “Clube Praia da Oura” encontra-se constituído em propriedade horizontal tendo como partes comuns uma piscina, um corte de ténis e os respetivos corredores de acesso às partes comuns a partir de cada bloco de apartamentos que o compõe.
b) Nos factos referidos em 14. os corredores de acesso são também de acesso a um campo de ténis.
c) Nos factos referidos em 14. os corredores e a piscina são partes comuns do Bloco A ou C (ala norte)
d) A colocação de portões nos corredores referidos em 14. impede o livre acesso pela Autora à zona comum da piscina e campo de ténis e a livre circulação pelas partes comuns (corredores) do empreendimento.

Conhecendo da 1ª questão
A recorrente vem pôr em causa a matéria de facto, requerendo a sua alteração, salientando que dos documentos juntos aos autos (fotografias) bem como da posição assumida pela ré EE, impõe-se a alteração do julgado no que se refere aos factos não provados referidos nas als. c e d) devendo o facto constante na alínea c) ser considerado provado na sua totalidade e o aludido na d) ser também considerado provado, mas com outra redação.
No caso em apreço, no que se refere à concreta matéria que a recorrente pretende ver provada, diremos, desde já, que as respostas à matéria de facto mostram-se fundamentadas, com apreciação crítica dos depoimentos das testemunhas, bem como dos elementos documentais, não denotando, prima facie, nem arbitrariedade nem discricionariedade – v. fls. 310 a 313 dos autos.
Salienta o Julgador a quo na sua motivação relativamente aos factos que integram o pomo da discórdia:
“… o provado de 8. a 15. e o correspondentemente não provado em d), resultou da produção da prova testemunhal conjugado com a análise das fotografias juntas nos autos a fls. 37 a 40, 48 a 52, 59 a 63, 225 a 231, 235 a 241, 275 a 282 e fotografias aéreas do empreendimento a fls. 54 e 299.
Foram essenciais neste circunspecto as testemunhas Fernando … e Alexandre … mercê da sua razão de ciência.
Com efeito, a primeira testemunha, por trabalhar diretamente para a Ré CC desde 2012, já antes conhecendo o empreendimento e desde 2016 prestando serviços através de outra empresa para a Ré EE, demonstrou um conhecimento privilegiado e circunstanciado do empreendimento, seu modo de funcionamento e gestão, inclusivamente na transição entre as empresas de gestão aqui Rés, o que revelou num depoimento que não nos levantou qualquer desconfiança quanto à sua isenção e objetividade limitando-se a descrever os factos de que tem conhecimento direto e na medida do que lhe é possível lembrar. Pôde assim caracterizar a composição do empreendimento físico e ao nível dos proprietários; o modo de exploração e de utilização da piscina sem pagamento de contrapartidas pelos proprietários cujas frações não são afetas à exploração do empreendimento turístico mas antes exploradas pelos próprios a titulo privado ou empresa como é o caso da Autora; os motivos que levaram à colocação dos portões; respetiva colocação dos mesmos; circulação dentro do empreendimento e disponibilização de cartões de acesso.
Por sua vez, aquela segunda testemunha, arquiteto que desempenhou funções para ambas as Rés, diretamente, ou através de outra empresa, foi a pessoa que prestou o apoio técnico na colocação dos portões em causa nos autos, cuja localização aliás não é discutida pelas partes (apenas se discute se estão ou não numa parte comum). Esta testemunha pôde explicar ao Tribunal quem colocou de facto os portões, a sua colocação por fases, a necessidade da sua colocação delimitando os blocos que compõem o empreendimento da via pública dissuadindo assim a entrada de terceiros no empreendimento que utilizavam abusivamente as suas facilidades ou importunavam diretamente os seus utilizadores e a forma de circulação dentro do mesmo após a sua colocação. Esta testemunha também relatou a conversa tida com representantes da Autora em que lhes foram disponibilizados cartões de acesso aos portões e que esta não aceitou. Também este depoimento não nos levantou qualquer dúvida quanto à sua isenção e credibilidade tendo-se demonstrado muito espontâneo e seguro na análise fotográfica que fez nos autos e cujo conhecimento funcional era absolutamente manifesto.
A testemunha Miguel … confirmou a existência do episódio em que, enquanto representante da Autora, esteve com representantes da Ré no empreendimento, apesar de não saber de qualquer entrega de cartões embora admitindo que tal pudesse ter acontecido com o colega que o acompanhava. O mesmo também contribuiu para a formação da convicção do Tribunal quanto à não prova do facto d) uma vez que também confirmou que a porta da receção está aberta e uma vez dentro do empreendimento se consegue aceder a qualquer ponto do mesmo sem cartão para o efeito, o que aliás foi ao encontro do que disseram as testemunhas anteriormente referidas e com melhor conhecimento do mesmo.
Estranha-se contudo que esta testemunha tenha dito que uma vez tentou ir ver o estado dos apartamentos (sendo que para aceder aos mesmos era necessário que tivesse a respetiva chave), mas dissesse não ter conseguido entrar no empreendimento sem ter cartão para esse efeito. Ora, ficou claro pelas referidas testemunhas que o portão da receção está sempre aberto e o mesmo é junto do bloco C onde está um dos apartamentos da Autora; que a receção do empreendimento é 24 horas; que apesar da colocação das vedações (especialmente em pontos chave de confinância dos blocos com a via pública e com efeito dissuasor de utilização abusiva do empreendimento – o que também resulta da consulta das próprias fotografias) existem pontos em que se pode entrar; que existe um ponto muito acessível a pé junto ao parque estacionamento ao lado do bloco A (cfr. fotografia de fls. 279 onde se verifica que no passeio nada impede a passagem de peões) onde fica o outro apartamento da Autora. Nesta medida, se a testemunha quisesse mesmo entrar no empreendimento para aceder aos apartamentos com a respetiva chave por algum ponto o conseguiria fazer.
O que resultou para o Tribunal manifesto é que o empreendimento era usado abusivamente por terceiros, pois que a inexistência de qualquer barreira física que balizasse os blocos que compõem o empreendimento e principalmente a piscina (cfr. por exemplo fls. 275, 276, 279 e 280) eram um convite a que qualquer um utilizasse propriedade privada alheia sem qualquer tipo de controlo, considerando especialmente os meses de Verão junto a uma das praias mais conhecidas e movimentadas do Algarve, que claramente era necessário por termo por algum meio.
O que foi colocado não impede absolutamente a entrada de terceiros mas constitui uma barreia dissuasora de maiores abusos e não impede qualquer proprietário de aceder ao seu apartamento, o que também aqui não era a questão da Autora, nem sequer a utilização da piscina ou dos corredores de acesso à mesma pois que resultou manifesto que qualquer ponto do empreendimento é perfeitamente acessível do seu interior. O que acontece é que agora, por força da delimitação dos blocos face à via pública, e sem o cartão de acesso, os clientes da Autora (provenientes da sua exploração em regime de arrendamento para férias do apartamento de que é proprietária) para acederem à piscina (tolerância de uso pela sua proprietária ou pelo menos da entidade gestora) pelo caminho mais curto têm de obter cartões junto da receção do empreendimento. Veja-se sobre isto o que espontaneamente foi transmitido pela testemunha Garcia no acompanhamento que faz aos clientes da Autora que arrendam o apartamento. Quando anteriormente ia diretamente ao apartamento com os clientes e lhes mostrava todos os acessos, desde que foram colocados os portões, e já agora em 2017, passou a ir primeiro com os clientes à recepção fazer o registo dos mesmos (os quais aliás vão usufruir pelo menos de uma piscina e demais espaços que são propriedade e de gestão por terceiros e para os quais a Autora não contribui) sendo-lhes atribuído um cartão que têm de devolver e que com o mesmo continuam a ter os mesmos acessos à piscina e praia como se aquelas barreiras lá não existissem, apesar de não ter sido isso que sucedeu no ano de 2016.
Por tudo isto se conclui que a colocação dos portões nos corredores de acesso à piscina não impede que a Autora tenha livre acesso à zona da piscina (que usa por tolerância de terceiros) e circule pelos corredores do empreendimento mesmo sem os cartões.
A testemunha Ana …, pelas funções que desempenha no departamento de arrendamento de uma empresa do grupo da Autora, pôde também confirmar o uso que esta dá à fração, em consonância com a testemunha Garcia, tendo ambos apontados meados do ano de 2016 como a altura em que os portões apareceram colocados.
Quanto aos factos não provados em a), b) e c) os mesmos resultaram desde logo da confissão pela Autora no início da audiência de julgamento da inexistência de um campo de ténis e por outro lado por falta de prova sobre tais factos. Com efeito a Autora, para além da escritura pública de constituição de propriedade horizontal sobre cada um dos blocos A, B e C (facto provado em 5.) não fez prova de outras partes comuns dos blocos para além das ali discriminadas ou de qualquer outro documento que sustentasse a constituição de uma propriedade horizontal sobre um conjunto de edifícios que constituem o empreendimento turístico em causa e por via do mesmo. Na dita escritura, que também não constituiu uma propriedade horizontal para o conjunto de blocos, nem a Autora juntou documento com constituição posterior, não se fala de que qualquer um dos blocos ou mesmo todos eles tenham como parte comum uma piscina e corredores de acesso a piscina.”
Analisada a prova em que a recorrente alicerça a sua posição no sentido da modificação da matéria de facto, diremos que tais elementos probatórios não consentem a pretendida modificação, pois, deles não se pode retirar a conclusão de ter havido erro de julgamento, por parte do Julgador a quo, erro esse traduzido na desconformidade flagrante entre os elementos probatórios e a decisão, pelo que, sem margem para dúvidas, há que corroborar quer o sentido da decisão sobre os factos em causa, quer a motivação que lhe subjaz.
No que respeita ao facto não provado aludido em c), efetivamente não há qualquer elemento de prova relevante para se afirmar, como faz a autora, que os referidos corredores e piscina junto dos portões referenciados nos pontos 14 e 13 dos factos provados sejam partes comuns dos Blocos A e C, nos quais a autora é proprietária de frações, antes pelo contrário.
Não podemos olvidar a caraterização dos imóveis constituídos em propriedade horizontal que nos é dada pelo título constitutivo dessa propriedade, que é em termos de prova o meio relevante para fazer prova de factos atinentes às características da propriedade no regime da propriedade horizontal.
Da certidão do registo predial e do título constitutivo da propriedade horizontal (fls, 131 a 180 dos autos) resulta que o Bloco A é composto por trinta e seis apartamentos distribuídos por quatro pisos, todos destinados a habitação, sendo partes comuns as escadas, patamares, terra­ços não privativos e elevadores, e o Bloco C é composto por duas alas, tendo a ala norte dezassete apartamentos e a ala poente oitenta e um apartamentos, todos destinados a habitação, sendo partes comuns as escadas, patamares, coberturas e elevadores, não se aludindo a qualquer integração dos corredores em cuja delimitação da via pública foram colocados portões, nas partes comuns dos Blocos.
E por isso também foi dado como não provado, o que não foi posto em crise pela recorrente, que o conjunto de blocos de apartamentos que constitui o empreendimento turístico “Clube Praia da Oura” e que se encontra constituído em propriedade horizontal tenha como partes comuns uma piscina, um corte de ténis e os respetivos corredores de acesso às partes comuns a partir de cada bloco de apartamentos que o compõe (cfr. al. a) dos factos não provados).
No que se refere à redação preconizada pela recorrente no sentido de dar como provado o facto vertido na al. d) dos factos não provados, diremos que a autora nunca alegou que a colocação dos portões, nos sítios onde se encontram, limitasse o livre acesso aos corredores de ligação entre a via pública e os Blocos A e C onde é proprietária das frações, não constituindo, por isso, objeto do litígio a limitação ou impedimento na circulação entre os Blocos e a via pública, mas tão só, a limitação ou impedimento à zona da piscina e campo de ténis que a autora invocou como sendo partes comuns e que levou a que nos temas da prova fosse consignado como relevante o apuramento sobre a limitação e impedimento do uso dessas partes comuns pela autora, em consequência da instalação desses portões. O que, aliás é reconhecido expressamente na sentença (v. relato supra citado) quando o Julgador refere, na alusão à colocação, dos portões que “o que foi colocado não impede absolutamente a entrada de terceiros mas constitui uma barreia dissuasora de maiores abusos e não impede qualquer proprietário de aceder ao seu apartamento, o que também aqui não era a questão da autora.”
Acresce que não tendo a autora feito prova, como lhe competia que os corredores adjacentes aos portões que foram colocados fossem partes comuns, designadamente dos Blocos onde é proprietário de frações não se pode reconhecer que a colocação dos mesmos nos sítios em que o foram constitua limitação ou impedimento do acesso a partes comuns.
Nestes termos, entendemos não haver motivo para proceder a qualquer modificação da factualidade que vem dada como provada e não provada, permanecendo, assim, imutável.
Improcede, nesta vertente, o recurso.

Conhecendo da 2ª questão
Defende a recorrente que perante a alteração da matéria de facto dada como provada, nos termos por si propugnados, havia que reconhecer estar-se perante a realidade de empreendimento turístico em propriedade plural em que se têm por comuns os “corredores e piscinas, receção e acesso ao exterior” e como tal nunca poderiam ser implantados portões em zonas comuns, sem autorização e aprovação da assembleia de condóminos.
Como não foi reconhecido a existência de erro de julgamento no que respeita à matéria de facto, a qual se mantém inalterável é nosso entendimento que haverá que manter, também, em termos de direito, a solução dada à causa pelo Tribunal a quo, até porque a impugnação do julgado de direito assentou também no pressuposto da modificação da matéria de facto decorrente da verificação de erro de julgamento o que permitira a integração do acervo factual em outras normas jurídicas, diversas das que foram consideradas.
Por isso, bem andou o Julgador a quo em salientar na sua fundamentação:
«(…) A Autora socorreu-se do regime da compropriedade sobre as partes comuns de um prédio em regime de propriedade horizontal em que é proprietária de uma fração, para afirmar que nessas partes comuns, sem a sua autorização ou consulta, foram introduzidas obras que consubstanciam uma inovação, por aí anteriormente não existirem, e as quais estão a interferir com o seu direito de compropriedade sobre as partes comuns não concordando com essa colocação.
Nesta medida, competia à Autora, como fundamento base para a sua pretensão, provar, entre o demais, que os portões cuja remoção pretende que as Ré sejam condenadas a fazer estão colocados em partes comuns dos prédios em que é proprietária de uma fação, designadamente em corredores comuns de acesso à piscina também parte comum. Fosse por via da existência de uma propriedade horizontal constituída sobre o conjunto de blocos fosse por via da propriedade horizontal constituída sobre cada um dos blocos individualmente o que, desde logo, não conseguiu fazer (cfr. facto não provado em c)).
No caso, tendo em conta a data do título constitutivo da propriedade horizontal (cfr. facto provado em 5.), verificamos que o regime da propriedade horizontal em causa é constate nos artigos 1417.º e ss do Código Civil na sua redação anterior à redação introduzida pelo DL n.º 267/94, de 25 de Outubro. É na medida especificamente do art.º 1421.º do Código Civil com essa redação e do título constitutivo em causa nos autos que se definem as partes comuns de cada um dos Blocos, no que ao caso importa, Bloco A e Bloco C (Ala Norte), e não resultou provado que corredores de acesso à piscina ou a própria piscina fossem partes comuns daqueles blocos.
O que resultou provado (cfr. facto provado em 7.) é que junto dos blocos em causa nos autos e no empreendimento que é o Clube Praia da Oura onde se inserem também os aqueles blocos, existe o prédio inscrito na matriz sob o n.º 3487 a favor de FF, Lda., no qual se inclui, entre o demais, uma piscina. Todavia não apurámos nos autos que os corredores de acesso a essa piscina e a mesma fossem partes comuns daqueles blocos ou antes tudo fazendo parte do prédio que é a piscina.
Acresce que à data da constituição da propriedade horizontal em causa ainda não existia o disposto no art.º 1438.º-A do Código Civil, apenas introduzido com o DL n.º 267/94 de 25 de Outubro que passou a prever a possibilidade de se criar, pelo mesmo meio e com as mesmas regras que a propriedade horizontal para um edifício, também uma única propriedade horizontal para conjuntos de edifícios contíguos ou funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afetadas ao uso de todas ou algumas unidades ou frações que os compõem. Nestes autos, contudo, nada se alegou ou muito menos se provou quanto a uma propriedade horizontal constituída para o conjunto de blocos em momento posterior àquele título constitutivo de propriedade horizontal individual de cada bloco (cfr. facto provado em 5.) e que nada previa quanto a uma piscina ou corredores de acesso à piscina.
Trouxe então a Autora à colação o regime estabelecido no DL n.º 15/2014, de 23 de Janeiro, que procedeu a mais uma alteração ao Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março (cuja última alteração foi introduzida com o Decreto-Lei n.º 80/2017 de 30 de Junho), o qual estabeleceu o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, e por via do qual poderíamos ter constituída uma propriedade horizontal para o empreendimento o que também se diga, não conseguiu provar (cfr. facto não provado em a))
Vejamos melhor.
Resultou da factualidade provada que “Clube Praia da Oura” é um empreendimento turístico que se encontra registado no Registo Nacional de Turismo de Portugal sob o n.º 4539 como “Apartamentos Turísticos Clube Praia da Oura”.
Os empreendimentos turísticos podem à luz daquele Diploma legal ter várias tipologias, entre elas a aqui em causa de “Apartamentos Turísticos” – cfr. art.º 14.º.
As normas de exploração e funcionamento destes empreendimentos encontram-se previstas naquele Diploma no art.º 41.º e seguintes, prevendo o art.º 46.º quais são os deveres da entidade exploradora, que no caso foi a CC, Lda. e posteriormente a EE, Lda..
No caso, contudo, entende a Autora que estaríamos perante um caso especial de propriedade plural em empreendimentos turísticos, por pretender aplicar o art.º 53.º do Diploma que manda aplicar às relações entre os proprietários dos empreendimentos turísticos em propriedade plural o disposto nesse decreto-lei e, subsidiariamente, o regime da propriedade horizontal.
Todavia, a aplicação deste regime implicava, para além da prova da existência fáctica de uma propriedade plural para efeitos desse Diploma (cfr. art.º 52.º), a prévia existência de um título constitutivo elaborado e aprovado nos termos do referido Decreto-lei (cfr. art.º 54.º) sendo que nenhuma prova foi feita no sentido de existir tal documento pelo que também por esta via não é possível proceder à aplicação deste Diploma.»
Embora estejamos em face de um empreendimento turístico denominado “Clube Praia da Oura” integrado por vários blocos de apartamentos (v. facto provado n.º 6) o qual está registado no Registo Nacional de Turismo de Portugal, conforme reconhecem as rés tendo como ano de abertura 1981 (cfr. doc. de fls 116 a 118) não pode o tribunal á mingua de factos que a autora cabia desde logo alegar e depois demonstrar proceder a aplicação de normas inerentes à realidade da propriedade plural em empreendimentos turísticos.
É certo, que se consideram empreendimentos turísticos em propriedade plural aqueles que compreendem lotes e ou frações autó­nomas de um ou mais edifícios, em conformidade com o que dispõe o art. º 52º do Decreto-Lei n.º 39/2008 de 07/02, mas as normas deste diploma que regem a Propriedade plural em empreendimentos turísticos, constantes do seu capítulo VIII, não se aplicam aos empreendimentos turísticos em propriedade plural cujo título constitutivo já se encontre aceite em depósito à data de entrada em vigor do presente decreto-lei, sendo-lhes aplicável o disposto no Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 305/99, de 6 de agosto, 55/2002, de 11 de março, e 217/2006, de 31 de outubro, e seus regulamentos (cfr. artº 64º n.º 1 do Dec. Lei 39/2008).
Por isso, nada sendo alegado relativamente à existência ou à data em que foi constituído o título constitutivo do empreendimento, não poderá com a certeza que se impõe, no caso concreto, saber qual a legislação que verdadeiramente se deve aplicar.
No entanto, dir-se-á que, quer se aplique a legislação mais recente (Dec. Lei 39/2008) ou mais antiga (Dec. Lei 167/97 e alterações subsequentes), no âmbito do regime de propriedade plural o regime da exploração tem de ser feito por uma única entidade, não podendo as frações serem diretamente exploradas pelos seus proprietários, nem ser objeto de contratos que comprometam o uso turístico das mesmas, designadamente, contratos de arrendamento ou constituição de direitos de uso e habitação (v. artº 45º do Dec. Lei 39/2008 e 44º do Dec. Lei do Dec. Lei 167/97 na redação introduzida pelo Dec. Lei 55/2002), sendo que, no caso, o que se evidencia do facto provado 8 é que a autora sempre tem vindo a explorar diretamente no mercado de arrendamento para férias as suas duas frações, pelo que desde logo, por aí, não se pode reconhecer a aplicação do regime de exploração em propriedade plural e dele retirar as conclusões que a recorrente pretende com vista a fazer valer a sua pretensão.
E o mesmo se dirá, se tivermos em conta a aplicação do regime da propriedade horizontal, já que as obras decorrentes da implantação de portões, para serem reconhecidas como inovações, na previsão do disposto no artº 1425º do CC, deviam incidir sobre coisas comuns, ou seja, serem levadas a cabo nas partes comuns da coisa em regime de propriedade horizontal,[1] o que não se provou ter acontecido no caso em apreço, já que não resultou provado, como se salientou, que os portões tivessem sido implantados em partes comuns do prédio descrito na CRP de albufeira sob o n.º ….
Nestes termos, irrelevam as conclusões da apelante, não se mostrando violadas as normas legais cuja violação foi invocada, sendo de julgar improcedente a apelação e de confirmar a sentença recorrida.
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DECISÂO
Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Apelante (cfr. artº 527º n.º 1 e 2)


Évora, 07 de junho de 2018
Mata Ribeiro
Sílvio Teixeira de Sousa
Manuel Bargado

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[1] - cfr. Francisco Pardal e Manuel Dias da Fonseca in da Propriedade Horizontal, 6ª edição, 254; Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil Anotado, 3.º volume, 2ª edição, 434; Ac. do STJ de 17/02/2011 no processo 881/09, disponível em www.dgsi.pt; Ac. do STJ de 20/03/2012 na Revista 470/04 in Sumários do STJ, março/2012, 68.