Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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Relator: | ANA BACELAR CRUZ | ||
Descritores: | CRÉDITO DE CUSTAS PRESCRIÇÃO | ||
Data do Acordão: | 04/24/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO | ||
Sumário: | O tribunal não pode conhecer oficiosamente da prescrição do crédito de custas. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I. RELATÓRIO No processo comum n.º 1262/97.4JAFAR, do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Faro, R, divorciada, nascida a 3 de dezembro de 1938, em Calcutá,... residente ...em Santa Bárbara de Nexe, concelho de Faro, foi condenada: i) como autora material de um crime de violação de domicílio, previsto e punido pelo artigo 190.º, n.ºs 2 e 3, do Código Penal, na pena de 280 (duzentos e oitenta) dias de multa, à taxa diária de 830$00 (oitocentos e trinta escudos), perfazendo o total de 232.400$00 (duzentos e trinta e dois mil e quatrocentos escudos), com a alternativa de 186 (cento e oitenta e seis) dias de prisão; ii) a pagar a António E. a quantia de 300.000$00 (trezentos mil escudos), acrescida de juros, à taxa anual de 7%, até integral pagamento; iii) nas custas da parte crime e cível. Entretanto, foi proferida decisão a declarar prescritas as custas. Inconformado com tal decisão, o Ministério Público dela interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões [transcrição]: «A) O presente recurso visa sindicar o decidido no despacho proferido nos presentes autos, incorporado a fls. 196 e 197, na parte em considerou prescritas as custas processuais, ao abrigo do disposto no artigo 123.º do Código das Custas Judiciais. B) Ora, preceituava o artigo 123°, n.º 1, do Código das Custas Judiciais que, “o crédito de custas prescreve no prazo de 5 anos". C) Tal diploma veio a ser revogado e substituído pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Setembro (alterado e rectificado pela Declaração n.º 22/2008, de 24 de Abril), que aprovou o Regulamento das Custas Processuais. D) Porém, no que concerne à prescrição o aludido o regime jurídico não sofreu qualquer alteração. E) Preceituando o actual artigo 37.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais que, “[o] crédito por custas e o direito à devolução de quantias depositadas à ordem de quaisquer processos prescreve no prazo de cinco anos, a contar da data em que o titular foi notificado do direito de requerer a respectiva devolução, salvo se houver disposição em contrário em lei geral”. F) E, como refere Salvador da Costa, em anotação ao referido normativo legal (in Regulamento das Custas Processuais, Anotado e Comentado, Almedina, 2011, p. 437),“[e]stamos perante dois direitos de crédito que prescrevem, ou seja, o de custas, em regra da titularidade do Estado lato sensu, e o de particulares relativo a quantias depositadas por referência a quaisquer processos judiciais. Quanto ao segundo, a lei indica o início do prazo de prescrição, mas quanto ao primeiro, nada refere a propósito, pelo que importa determinar tal início, de harmonia com a lei geral. Não tendo sido instaurada a acção executiva por dívida de custas, o prazo prescricional conta-se do termo do prazo do seu pagamento voluntário a que se reporta o artigo 32° deste Regulamento”. G) Aplicando-se idêntico entendimento ao regime decorrente do anterior Código das Custas Judiciais vigente à data da condenação da arguida. H) É certo que, no caso vertente, tendo a arguida sido notificada para proceder ao pagamento voluntário, cujo termo ocorreu em 11 de Abril de 2002, há muito que decorreu o mencionado prazo prescricional. I) Contudo, não podemos olvidar que, nos termos do disposto nos artigos 303.º e 304.º, n.º 1 do Código Civil, “… o tribunal não conhece, neste sede, oficiosamente da prescrição, sendo o executado quem tem a faculdade, completado o respectivo prazo, de recusar o oferecimento da prestação” – cfr. Salvador da Costa, in Regulamento das Custas Processuais, Anotado e Comentado, Almedina, 2011, p. 438. J) Não podendo, pois, o Tribunal suprir, de ofício, a prescrição, mas ao invés, necessitando aquela, para ser eficaz, de ser invocada pela parte a quem aproveita – cfr. artigo 303.º, do Código Civil, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4.10.2007, in www.dgsi.pt. K) Mostram-se, pois, postergadas as normas contidas nos artigos 303.º e 304.º, ambos do Código Civil L) E, em suma, devendo a douta decisão ser revogada e substituída por outra que não declare a prescrição do crédito de custas processuais. Porém, Vossas Excelências, farão, como é habitual, a melhor Justiça!» Não houve resposta. v O recurso foi admitido. Não foi feito uso da faculdade prevista no n.º 4 do artigo 414.º do Código de processo Penal. v Enviados os autos a este Tribunal da Relação, o Senhor Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso. Observou-se o disposto no artigo 417.º, nº 2, do Código de Processo Penal. Apresentou-se o Demandante Civil a responder, revelando «entender que a prescrição atinente às custas devidas em processo criminal – ao arrepio das custas devidas em processo civil – é de conhecimento oficioso (…). À cautela (…) vem (…) invocar a PRESCRIÇÃO das custas em causa, requerendo que a mesma seja declarada pelo tribunal.» Efetuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência. Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995[[1]], o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. O objeto do recurso interposto pelos Arguidos, delimitado pelo teor das suas conclusões, reconduz-se a saber se tem ou não natureza oficiosa o conhecimento da prescrição do crédito de custas. O teor da participação do Demandante Civil, nesta fase do processo, impõe se decida quem pode invocar a prescrição do crédito de custas, se se considerar que o seu conhecimento não tem natureza oficiosa. A decisão recorrida, na parte que agora releva, tem o seguinte teor [transcrição]: «Por sentença proferida nos presentes autos, transitada em julgado em 05 de Maio de 2000, foi a arguida condenada na pena de 280 dias de multa, à razão diária de € 830$00, num total de 232.400$00, pena que a arguida ainda não cumpriu até à presente data. O prazo de prescrição da pena aplicada à arguida é de 4 anos (art. 122º, nº 1, al.d) do Cód. Penal). Não ocorreu qualquer causa de interrupção ou suspensão da prescrição a que aludem os arts. 125º e 126º do Código Penal durante o referido período de 4 anos. Mostra-se, assim, decorrido o prazo de prescrição da pena. Assim sendo, declara-se extinta, por efeito de prescrição, a pena de multa a que a arguida, R foi condenada nos presentes autos (art. 122º, nº 1, al. d) do Cód. Penal). Notifique e, após trânsito, remeta boletim ao registo criminal. * Igualmente se declaram prescritas as custas, uma vez que decorreram mais de 5 anos sobre a data do trânsito em julgado da sentença sem que se mostrem pagas (art. 123º, nº 1 do CCJ).» v Conhecendo. Diz-se no artigo 123.º do Código das Custas Judiciais[[2]] que: «1 – O crédito de custas prescreve no prazo de cinco anos. 2 – Arquivada a execução nos termos do n.º 2 do artigo anterior, o prazo conta-se da notificação do despacho de arquivamento.» Relativamente à prescrição, consta do artigo 37.º do Regulamento das Custas Processuais[[3]]: «1 – O crédito por custas e o direito à devolução das quantias depositadas à ordem de quaisquer processos prescreve no prazo de cinco anos, a contar da data em que o titular foi notificado do direito a requerer a respectiva devolução, salvo se houver disposição em contrário em lei especial. 2 – Arquivada a execução nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 35.º, o prazo prescricional conta-se a partir da data do arquivamento.» Pode, pois, dizer-se que o regime da prescrição se manteve inalterado – a diferença entre as normas acabadas de citar encontra-se na inclusão, na última, de regulamentação relativa ao direito à devolução de quantias depositadas à ordem de quaisquer processos. Todavia, porque os presentes autos se iniciaram antes de 20 de abril de 1009, é-lhes aplicável o disposto no Código das Custas Judiciais. Ao regime da prescrição do crédito de custas aplicam-se as regras constantes do Código Civil relativas à prescrição, nomeadamente a do artigo 303.º – «O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público.» Ou seja, da articulação desta norma com o que dispõe o n.º 1 do artigo 304.º do mesmo Código – e como refere Salvador da Costa, in “Código das Custas Judiciais, Anotado e Comentado”, em anotação ao artigo 123.º - «o tribunal não conhece, nesta sede, oficiosamente, da prescrição, sendo o executado quem tem a faculdade de, completado o prazo prescricional, recusar o oferecimento da prestação (…).» Neste sentido, também o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 16 de novembro de 2010, proferido no processo n.º 84/98.0GTSTB.E1 e acessível em www.dgsi.pt E aqui chegados, estamos em condições de concluir. Assiste razão ao Recorrente, não podendo a Senhora Juíza conhecer oficiosamente da prescrição do crédito de custas. Porque a prescrição do crédito de custas não aproveita ao Demandante Civil, não produz qualquer efeito a invocação que dela faz. O recurso procede. III. DECISÃO Em face do exposto e concluindo, decide-se conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a decisão recorrida, que deve ser substituída por outra que mantenha a tramitação dos autos com vista à cobrança das custas neles devidas. Sem tributação. v Évora, 2011 Junho 7 (processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora) ______________________________________ (Ana Luísa Teixeira Neves Bacelar Cruz) ______________________________________ (Edgar Gouveia Valente) __________________________________________________ [1] Publicado no Diário da República de 28 de dezembro de 1995, na 1ª Série A. [2] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 91/97, de 22 de abril. Alterado pela Lei n.º 59/98, de 25 de agosto, pelos Decretos-Lei n.º 304/99, de 6 de agosto, n.º 320-B/2000, de 15 de dezembro, n.º 323/2001, de 17 de dezembro, n.º 38/2003, de 8 de março, e n.º 324/2003, de 27 de dezembro, e pelas Leis n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro e n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro. E revogado pela Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro. [3] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, e alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de agosto, pelas Leis n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, e n.º 3-B/2010, de 28 de abril, pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, e pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro. |