Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
377/13.8TTFAR.E1
Relator: JOÃO NUNES
Descritores: FÉRIAS
VIOLAÇÃO DO DIREITO A FÉRIAS
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 06/09/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: i) Tendo a trabalhadora/recorrente alegado o não gozo de determinados dias de férias, sobre a empregadora/recorrida recaía o ónus de provar esse gozo de férias por parte daquela;
ii) não tendo a empregadora feito tal prova terá forçosamente que ser condenada no pagamento das férias em causa;
iii) são dois os requisitos do direito à indemnização por violação do direito a férias: (a) que o trabalhador não tenha gozado as férias; (b) que a isso tenha obstado, sem fundamento válido, a empregadora;
iv) por se tratar de facto constitutivo do direito, ao trabalhador compete provar que ocorreu um efectivo impedimento ao gozo de férias;
v) tal prova não se mostra efectuada se da matéria de facto apenas resulta que a Autora não gozou determinados períodos de férias a que tinha direito, não resultando da mesma matéria que a Ré adoptou qualquer conduta, por acção ou por omissão, no sentido de impedir aquela de gozar as férias.
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 377/13.8TTFAR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB (…) intentou na Comarca de Faro (Faro – Instância Central – 1.ª Secção do Trabalho – J1) a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CC, Lda. (…), pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia global de € 5.795,57, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento, sendo:
1. € 1.690,00 correspondentes a retribuição de férias;
2. € 2.430,00 referentes a compensação por violação do direito a 40,50 dias de férias;
3. € 1.065,50 referentes a dias de prestação de trabalho efectivo, que a Ré considerou indevidamente como dias de faltas;
4. € 610,20 de diferenças no subsídio de alimentação dos meses de Janeiro de 2012 a Maio de 2013.
Alegou para o efeito, muito em síntese, que foi admitida ao serviço da Ré em 10-08-2004, que a Ré a partir de 2008 e durantes diversos períodos que concretiza considerou que faltou ao trabalho, tendo-lhe efectuado o desconto na respectiva retribuição, bem como no subsídio de alimentação, quando, efectivamente, nesses períodos prestou a actividade à Ré ou esteve de férias.
Além disso, apenas gozou os seguintes períodos de férias: em 2008, 18 dias, em 2010, 13 dias, em 2011, 14,5 dias, e em 2012, 17 dias, sendo certo que tinha direito ao acréscimo/majoração de 3 dias em cada um desses anos, incluindo no ano de 2009.
Acrescentou que a partir de Janeiro de 2012 a Ré procedeu indevidamente a reduções no valor que lhe pagava a título de subsídio de alimentação.
Em consequência, pediu a condenação da Ré nos valores e com os fundamentos indicados.

Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, alegando, também muito em síntese, que a Autora faltou ao trabalho em todos os dias que indica e que, por isso, não teve direito a retribuição, bem como a majoração de férias, tendo gozado as férias devidas.
Acrescentou que a Autora, tal como outros familiares também trabalhadores da Ré, deslocava-se à sua terra natal pelo menos uma vez por ano e desde o ano de 2002 (crê-se que a indicação desta data por parte da Ré se deverá a lapso, uma vez que a Autora apenas foi admitida ao seu serviço em 2004) solicitava à Ré para prolongar as férias para além do período estipulado legalmente, o que a Ré aceitava – já que tal período correspondia a uma época de baixa de actividade no sector em que o seu estabelecimento (Parque aquático e Hotel) se integra –, mediante o acordo com a Autora de não utilizar tais faltas para fundamentar o despedimento, mas de descontar os dias das mesmas na retribuição.
Pugnou, em consequência, pela improcedência da acção e pediu a condenação da Autora como litigante de má-fé por ter alterado a verdade dos factos de forma dolosa.

Respondeu a Autora, a negar que tenha litigado de má-fé, por a factualidade por si alegada ser conforme à realidade.
E a solicitação do tribunal a quo (em conformidade com o previsto no artigo 590.º, n.º 2, alínea b) do CPC e artigo 61.º do CPT) veio concretizar os dias em que esteve de férias, afirmando também que nunca acordou com a Ré que as suas ausências ao trabalho fossem imputadas nas férias.

Foi dispensada a realização de audiência prévia, proferido despacho saneador stricto sensu, indicado o objecto do litígio e os temas de prova, e fixado valor à causa (€ 5.795,57).

Os autos prosseguiram os seus termos legais, tendo-se procedido à audiência de julgamento em 05-06-2014 (fls. 127-130), que prosseguiu em 17-06-2014 (fls. 131-132), em 02-07-2014 (fls. 144-145), em 03-09-2014 com resposta à matéria de facto e fundamentação da mesma (fls. 146-153), e em 24-10-2014 foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, sendo a parte decisória do seguinte teor:
«Em face do supra exposto julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condeno a R. CC, Lda. a pagar á A. BB, a titulo de remanescente de subsidio de alimentação relativo ao mês de janeiro a Dezembro de 2012 e janeiro a Abril de 2013, a quantia de € 610,20 (seiscentos e dez euros e vinte cêntimos) acrescida de juros vencidos, á taxa legal, desde o último dia de Abril de 2013 e dos vincendos até efectivo e integral pagamento;
b) absolvo a R. do demais peticionado;
c) custas por A. e R. na proporção do decaimento (cfr.art.527º do C.P.C. ex vi art.1º nº 2 al. a) do C.P.T.).
d) registe e notifique».

Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs recurso para este tribunal, tendo para tanto apresentado requerimento com o seguinte teor:
«BB, A. nos autos à margem melhor identificados, inconformada com a douta sentença proferida vem, nos termos do disposto no art. 79.º-A, n.º 1, do CPT, da mesma interpor recurso de apelação, juntando para tanto as alegações da recorrente, nos termos do disposto no art. 81.º do CPT».
E nas alegações apresentadas formulou as conclusões que se transcrevem:
(…)

Não consta dos autos que tenham sido apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata e efeito meramente devolutivo.
No mesmo despacho, a exma. julgadora a quo pronunciou-se sobre as arguidas nulidades da sentença, para negar a sua verificação.

Distribuídos os autos ao ora relator em 08-03-2016 e tendo, entretanto, os autos sido presentes à exma. Procuradora-Geral Adjunta para efeitos do disposto no artigo 87.º, n.º 3, do CPT, pelo mesma foi emitido douto parecer, no qual se pronunciou pelo não conhecimento das arguidas nulidades, bem como pelo não conhecimento da impugnação da matéria de facto e, quanto ao mais, pela confirmação da sentença recorrida.
O referido parecer não foi objecto de resposta das partes.

Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II. Objecto do recurso
Como é sabido, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), salvo as questões de conhecimento oficioso, que aqui não se colocam.
No caso, as conclusões da recorrente apresentam-se algo prolixas, a carecer de clareza e objectividade.
Não obstante isso, embora com um acrescido esforço, é possível aprender quais as questões essenciais suscitadas pela recorrente.
São elas:
1. apurar da nulidade da sentença;
2. saber se existe fundamento para alterar a matéria de facto;
3. saber se deve a Ré ser condenada no pagamento à Autora da retribuição pelos dias que considerou de faltas, na retribuição devida pelo período de férias, pela violação do direito a estas e pelo remanescente do subsídio de refeição.

III. Factos
A) A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade:
1. A Ré tem como objeto social a exploração de atividades dos parques de diversão temáticos e zoológicos, de estabelecimentos hoteleiros, de restauração e bebidas, de empreendimentos e atividades turísticas, arrendamento e exploração de imóveis, campos de golfe, ginásios e outros espaços desportivos, bem como a compra e venda de bens imobiliários destinados a revenda.
2. A Ré tem como legais representantes os sócios gerentes DD e EE, bastando a assinatura de um dos gerentes para obrigar validamente a sociedade em todos os seus atos e contratos.
3. No âmbito do exercício da sua atividade, a Ré celebrou com a Autora um contrato de trabalho, a termo certo, com inicio em 10/08/2004, automaticamente renovável, para sob a sua ordem, direção e fiscalização, exercer a função de empregada de limpeza da R., nas suas instalações em …, integrando, por conseguinte, a Autora a organização da Ré.
4. Por força do referido contrato a Autora recebia, inicialmente, a remuneração base mensal ilíquida de 365,60€ para a prestação de trabalho durante um horário normal de 40 horas semanais, que foi actualizada todos os anos.
5. A Autora mantém-se a trabalhar para a Ré.
6.Em Outubro de 2008 a Autora auferia um vencimento base ilíquido no montante de 600,00€ e subsídio de alimentação fixo no montante mensal de € 120,00.
7. A Autora não compareceu ao serviço nos entre os dias 20 de dezembro de 2008 a 04 de Janeiro de 2009.
8. A Autora não compareceu ao serviço nos entre os dias 19 de Dezembro de 2009 e 04 de Janeiro de 2010.
9. A Autora não compareceu ao serviço nos entre os dias 21 de Setembro de 2010 até ao dia 24 de Setembro de 2010.
10. A Autora não compareceu ao serviço entre o dia 19 de Dezembro de 2010 e o dia 01 de Janeiro de 2011.
11. A A. não compareceu ao serviço entre o dia 18 de dezembro de 2011 e o dia 3 de janeiro de 2012.
12. A Autora não compareceu ao serviço entre o dia 21 de dezembro de 2012 e o dia 07 de janeiro de 2013.
13. A Autora comunicou antecipadamente à Ré as ausências referidas em 7. a 12. sendo que esta a tanto se não opôs.
14. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês de Dezembro de 2008 a Ré contabilizou 10 dias e meio de falta com perda de retribuição, no montante de €210,00, pagando-lhe, a título de subsídio de alimentação a quantia de € 79,90.
15. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês de janeiro de 2009 a Ré contabilizou 7 dias e meio de falta com perda de retribuição no montante de € 150,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de €92,00.
16. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês de Dezembro de 2009 a Ré contabilizou 15 dias de falta com perda de retribuição no montante de € 300,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de €76,00.
17. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês de Janeiro de 2010 a Ré contabilizou 7 dias de falta descontado a título de retribuição a quantia de € 140,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de €88,00.
18. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês de Dezembro de 2010 a Ré contabilizou 10 dias de falta, descontando a título de retribuição a quantia de €200,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de €88,50.
19. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês Janeiro de 2011 a Ré contabilizou 3 dias de falta com perda de retribuição no montante de € 60€, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de €108,00.
20. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês Dezembro de 2011 a Ré contabilizou 12 dias e quatro horas de falta com perda de retribuição no montante de € 250,00 e de € 60,67 a título de subsídio de alimentação.
21. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês Janeiro de 2012 a Ré contabilizou 2 dias de falta com perda de retribuição no montante de € 40,00 e de € 8,00 a título de subsídio de alimentação.
22. Aquando do pagamento da retribuição devida pelo mês Dezembro de 2012 a Ré contabilizou 17 dias de falta com perda de retribuição no montante de € 340,00 e de € 92,73 a título de subsídio de alimentação.
23.Aquando do pagamento da retribuição de Outubro de 2008 a Ré aplicou à Autora 2 dias e meio de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de € 50,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de € 110,00.
24. Aquando do pagamento da retribuição de Fevereiro de 2009 a Ré aplicou à Autora 2 dias e meio de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €30,00.
25. Aquando do pagamento da retribuição de Fevereiro de 2010 a R. aplicou à Autora 9 dias e meio de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €190,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de € 80,00.
26 Aquando do pagamento da retribuição de Outubro de 2010 a Ré aplicou à Autora 3 dias de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €60,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de € 80,00.
27. Aquando do pagamento da retribuição de Novembro de 2010 a Ré aplicou à Autora 1 dia de falta descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €20,00, pagando-lhe a título de subsídio de alimentação a quantia de € 100,00.
28. Aquando do pagamento da retribuição de Fevereiro de 2011 a Ré aplicou à Autora 7 dias de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €140,00 e, a título de subsídio de alimentação, a quantia de € 32,67.
29. Aquando do pagamento da retribuição de Março de 2011 a Ré aplicou à Autora 2 dias e 7,90 horas de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €59,75 e, a título de subsídio de alimentação,€ 9,33.
30. Aquando do pagamento da retribuição de Abril de 2011 a Ré aplicou à Autora 5 dias de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €100,00 e, a título de subsídio de alimentação, a quantia de € 23,33.
31. Aquando do pagamento da retribuição de Outubro de 2011 a Ré aplicou à Autora 2 dias de faltas descontando-lhe a título de retribuição a quantia de €40,00 e, de subsídio de alimentação,€ 9,33
32.Aquando do pagamento da retribuição de Novembro de 2012 a Ré aplicou á Autora 9 dias de falta com perda de retribuição no valor de € 180,00 e de € 49,09 a título de subsídio de alimentação.
33.À retribuição base acrescia, mensalmente, subsídio de refeição que, pelo menos, a partir de Fevereiro de 2011 era de €140,00/mês.
27. Porém, a R., por verificar que o valor que pagava era superior ao resultante do CCT da AHET, em Janeiro de 2012 reduziu, unilateralmente, o valor do subsídio de alimentação para 120,00€ mensais, em janeiro de 2013 para € 42,00 e, em Abril de 2013 para € 101,90.


IV. Enquadramento Jurídico
Delimitadas supra, sob o n.º II, as questões essenciais decidendas, é o momento de analisar, de per si, cada uma delas.

1. Da (arguida) nulidade da sentença
Seja nas alegações, seja nas conclusões do recurso, a recorrente argui a nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e a decisão, por ambiguidade e obscuridade, e por omissão de pronúncia.
As referidas causas de nulidade encontram-se expressamente previstas nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aqui aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do CPT.
Estipula o artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, que «[a] arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso».
Por sua vez, decorre do n.º 3 do mesmo preceito, que o juiz pode sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso.
A exigência em causa justifica-se por razões de celeridade e economia processual, que, marcadamente, inspiram o processo laboral, visando possibilitar ao tribunal recorrido a rápida e clara detecção das nulidades arguidas e respectivo suprimento.
Daí que não sendo cumprida tal exigência, não cumpra ao tribunal superior conhecer da nulidade [vide, entre muitos outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14-01-2009 (Recurso n.º 2469/08), de 25-03-2009 (Recurso n.º 2575/08), de 07-05-2009 (Recurso n.º 3363/08) e de 09-12-2010 (Recurso n.º 4158/05.4TTLSB.L1.S1), todos disponíveis em www.dgsi.pt].
É certo que se tem admitido que aquela exigência se mostra cumprida nos casos em que o requerimento e a alegação de recurso constituem uma peça única, desde que no requerimento de interposição de recurso se indique que se argui a nulidade da sentença, fazendo-se a exposição dos fundamentos da nulidade na alegação de recurso, de forma clara e autónoma, imediatamente a seguir ao requerimento de interposição do recurso (cfr. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31-10-2007, Recurso n.º 1442/07 e de 12-03-2008, Recurso n.º 3527/07, sumariados in www.stj.pt, em consonância com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 304/05, de 8 de Junho de 2005, in Diário da República, II Série, n.º 150, de 5 de Agosto de 2005).
Mas tem sido igualmente jurisprudência constante do Tribunal Constitucional não ser inconstitucional o entendimento de que o tribunal “ad quem” está impedido de apreciar as nulidades da sentença, em processo laboral, sempre que as mesmas não tenham sido expressamente arguidas no requerimento de interposição do recurso (cfr. acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 403/2000, in D.R., II Série, de 13-12-2000, quanto ao artigo 72.º, n.º 1, do CPT de 1981 e n.º 439/2003, in www.tribunalconstitucional.pt, quanto ao artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho de 1999).
Ao fim e ao resto, a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem-se pronunciado no sentido de ser desproporcionada a interpretação que não conhece da arguição de nulidade relativamente aos recursos interpostos das decisões proferidas em 1.ª instância - em que existe uma unidade formal do requerimento de interposição do recurso e das alegações -, e em que o recorrente, no referido requerimento, refere genericamente a existência do vício de nulidade, mas fundamenta o mesmo de forma clara e autónoma nas alegações de recurso: embora em tais situações não se observe inteiramente o disposto no artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, admite-se que o tribunal superior aprecie a questão da nulidade desde que na alegação de recurso, de forma clara e autónoma, a mesma se mostre explanada, permitindo assim ao juiz a imediata percepção da arguição e, assim, que sobre a mesma se pronuncie; contudo, se no requerimento de interposição do recurso não se faz qualquer referência a arguição de nulidade da sentença, o tribunal superior encontra-se impedido de conhecer a mesma.
Ora, no caso em apreciação, no requerimento de interposição do recurso a recorrente não argui qualquer nulidade, nem faz referência a qualquer nulidade, “limitando-se” a deixar consignado que não se conforma com a sentença e da mesma interpõe recurso (cfr. fls. 175): e apenas nas alegações e conclusões de recurso – mas nem sequer de forma clara e autónoma – argui a nulidade da sentença.
Por isso, tendo presente o disposto no referido artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, não pode este tribunal conhecer da arguida nulidade.
Não se conhece, pois, da arguida nulidade.
Isto sem prejuízo, naturalmente, de se poder vir a conhecer de questões que embora suscitadas indevidamente como nulidades da sentença mais não são do que (eventuais) erros de julgamento, e o tribunal não se encontrar vinculado à qualificação jurídica dada pelas partes (cfr. artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil); isto é, nada impede que sejam apreciados os fundamentos e questões objecto do recurso que, embora invocados pela recorrente como determinantes de nulidade da sentença, possam configurar, pela forma como foram explanados no texto da alegação, erros de interpretação e aplicação da lei substantiva e/ou adjectiva.

2. Da impugnação da matéria de facto
2.1. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 640.º, do Código de Processo Civil, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação realizada que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deverá ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
E nos termos do n.º 2 do mesmo preceito, quando os meios probatórios tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Não basta, pois, que o recorrente se limite a fazer uma impugnação genérica: ele tem de concretizar, e individualizar, qual a matéria que considera incorrectamente julgada, seja matéria que foi dada como provada, seja matéria que foi dada como não provada.
Importa ter presente que o recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª instância, estabeleceria os factos provados e não provados; antes se deve entender que os recursos são remédios jurídicos que se destinam a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada.
Em tal situação, o tribunal superior procede então à reanálise dos meios de prova concretamente indicados (e quanto ao segmento indicado, se for o caso) para concluir pela verificação ou não do erro ou vício de apreciação da prova e, daí, pela alteração ou não da factualidade apurada (cfr. artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Para além da indicação dos factos concretos que impugna, e da resposta que, no seu entender, deve ser dado aos mesmos, o recorrente deve também indicar, em relação a cada um desses pontos/factos quais os meios de prova que, em sua opinião, levariam a uma decisão diferente, e quando esses meios de prova tenham sido gravados o recorrente terá de indicar ainda quais os depoimentos em que fundamenta a sua impugnação, indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda.

2.2. No caso em apreço, se bem se extrai das extensas conclusões das alegações da recorrente, maxime do seu n.º 71, esta sustenta, ao fim e ao resto, que em relação aos factos dados como provados sob os n.ºs 7 a 12 se considere também provado que nos dias referidos nesses factos se encontrava de férias com a concordância da Ré e ainda que nos dias referidos nos n.ºs 23 a 32 da matéria de facto trabalhou.
Mais pretende que se dê como provado que a Ré obstava a que a Autora gozasse todos os dias de férias a que tinha direito, pois “dizia que havia sempre muito trabalho e não podia dar mais dias”.
Haverá que afirmar desde logo, no que respeita a esta matéria, que as alegações e conclusões da recorrente estão longe de se apresentar como paradigma em termos de observância do disposto no artigo 640.º do CPC.
Na verdade, para além de não fazer uma correspondência total entre os factos dados como provados e não provados e aqueles que pretende ver alterados, “factos” há que pretende que sejam insertos na matéria de facto que se apresentam complexos e conclusivos.
Vejam-se, por exemplo, os factos n.ºs 17 e 18 que a recorrente pretende ver aditados aos factos provados:
«17-A R., através uma atitude, eminentemente negativa, obstava a que a A. gozasse todos os dias de férias a que direito naquele ano civil, pois dizia que havia sempre muito trabalho e não podia dar mais dias;
18- A A. nunca conheceu outra realidade laboral e foi no [s]eio laboral que aprendeu português, pelo que, não conhecendo a legislação laboral portuguesa, sempre acreditou na boa-fé da R. e na conformidade da sua atuação com a lei».
Para além disso, e mais importante, a recorrente não indica, ao menos de forma clara, em relação a cada um dos pontos/factos que impugna quais os meios de prova que, em sua opinião, levariam a uma decisão diferente, antes se limita a fazer uma impugnação genérica em relação a todos esses factos, remetendo quanto aos mesmos para os documentos juntos aos autos – sem os identificar em concreto – e para os depoimentos gravados – aqui, sim, indicando, como determinado legalmente, as concretas passagens da gravação que no seu entendimento impõem decisão diversa da proferida pelo tribunal a quo –, mas quanto a todos os factos impugnados.
Não obstante o que se deixa exposto, considerando que a recorrente cumpriu os requisitos considerados mínimos que permitem conhecer do fundamento da impugnação – ao fim e ao resto, sinalizar quais os factos que pretende ver alterados, o sentido dessa alteração, e o fundamento para tal – e numa prevalência da verdade material, entende-se conhecer da impugnação da matéria de facto.
Para tanto procedeu-se à audição dos depoimentos e à análise dos diversos documentos juntos aos autos.
(…)
Assim, face ao que fica exposto, entende-se inexistir fundamento para a pretendida alteração da matéria de facto, que assim se mantém.
Improcedem, pois, nesta parte as conclusões das alegações de recurso.

3. Quanto a saber se deve a Ré ser condenada no pagamento da retribuição pelos dias que considerou de faltas, pela retribuição devida pelo período de férias, pela violação do direito a estas e pelo remanescente do subsídio de refeição
3.1. Quanto ao pagamento da retribuição pelos dias que a Ré considerou de faltas
Escreveu-se a este propósito na sentença recorrida:
«Conforme estatui o art. 258º nº 1 do Código de Trabalho a contrapartida do trabalho é a retribuição pelo que efectuando-o tem o trabalhador direito á mesma.
No caso vertente alegou a A. que, apesar de ter trabalhado em tais dias a R. em outubro de 2008 aplicou-lhe 2,50 dias de falta, em fevereiro de 2009 1,50 dias de falta, em fevereiro de 2010, outubro e novembro do mesmo ano 9,50 dias, 3 dias e 1 dia de falta e, em Fevereiro de 2011, Março de 2011, Abril de 2011 e Outubro de 2011 7 dias, 2 dias e 9h90m, 5dias e 2 dias de falta respectivamente, em Novembro de 2012 9 dias de falta, quando, na realidade, prestou serviço descontado a retribuição e o subsídio de alimentação correspondente.
Ora, constituindo a prestação do trabalho facto constitutivo do direito à retribuição (e subsidio de alimentação), impunha-se que a A. tivesse provado que nos dias supra mencionados trabalhou.
Não tendo feito tal prova não pode proceder o pedido, nesta parte».
Se bem se extrai das alegações e conclusões de recurso da recorrente, a pretensão da mesma nesta matéria tinha por pressuposto a alteração da matéria de facto.
Não logrando obter êxito em tal alteração, terá forçosamente que se manter a decisão nesta matéria.
Sem embargo do que se deixa referido, sempre se acrescenta que ao longo dos articulados as partes se limitaram a fazer afirmações/alegações genéricas, seja nesta matéria, seja até noutras, que demandavam concretização, mas sem que tal se tenha verificado.
Assim, especificamente nesta matéria o que se verifica é que de acordo com os factos n.ºs 23 a 32, aquando do pagamento da respectiva retribuição à Autora, a Ré descontou alguns dias por faltas.
E embora tal não se encontre claramente expresso na matéria de facto, a ilação que se extrai da mesma, em conjugação com o n.º 2 da matéria de facto não provada (de acordo com a qual não se provou que a Autora não tenha faltado ao trabalho noutros dias para além dos constantes dos n.ºs 7 a 12 da matéria de facto) e com a motivação da matéria de facto (de acordo com o qual o tribunal a quo se convenceu que a Autora não compareceu ao trabalho nos dias assinalados com falta) é que, efectivamente, nos dias a que se reportam os factos n.ºs 23 a 32 a Autora não compareceu ao trabalho.
Tenha-se presente que a falta envolve a ausência física da trabalhadora do seu local de trabalho (cfr. artigos 224.º do CT/2003 e 248.º, n.º 1, do CT/2009).
Competiria então a esta provar que tais faltas eram/foram justificadas e que não determinavam a perda de retribuição (cfr. artigos 230.º do CT/2003 e 255.º do CT/2009).
Não tendo logrado tal prova, terá forçosamente que improceder o pagamento da referida retribuição.

3.2. Quanto ao pagamento da retribuição pelo período de férias
Sobre esta problemática, a Autora, aqui recorrente, alegou na acção, no essencial e de forma algo confusa, que gozou alguns dias de férias e que a Ré não lhe pagou a respectiva retribuição (não estando em causa o pagamento do subsídio de férias).
E alegou também que nos anos de 2008, 2010, 2011 e 2012 apenas gozou alguns períodos de férias a que tinha direito: em 2008, 18 dias, em 2010, 13 dias, em 2011, 14,5 dias, e em 2012, 17 dias, acrescentando que nesses anos tinha direito à majoração de 3 dias prevista nos artigos 213.º, n.º 3, do CT/2003 e 238.º, n.º 3, do CT/2009.
E a final pediu o pagamento não só da retribuição do período de férias gozadas, como também a compensação pela violação do direito a férias.
Existem, por isso, dois pedidos (e causas de pedir) distintos: (i) um, referente à retribuição do período de férias que a Autora diz ter gozado, e a que se reportam os factos n.ºs 7 a 12 da matéria de facto; (ii) outro, referente às férias que a Autora alega não ter gozado e em relação ao qual sustenta ter havido violação do direito a férias.
Haverá que analisar separadamente cada um desses pedidos.
Quanto ao não pagamento da retribuição das férias, não tendo a Autora logrado provar ter gozado as férias nos períodos em causa e em que não lhe foi paga a retribuição, terá, forçosamente, que soçobrar o pedido a esse respeito formulado, não importando, aqui e agora, face ao pedido e à causa de pedir, apurar o concreto período em que essas férias terão sido gozadas e se foi paga a retribuição.
Tenha-se presente que a oficiosidade da condenação extra vel ultra petitum prevista no artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho só ocorre se estiverem em causa preceitos inderrogáveis de lei ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e quando os factos em que se funda tal condenação se encontrem provados no processo ou de que o juiz se possa servir nos termos do artigo 412.º do CPC.
Ora, como se disse, nada no processo foi alegado nem se mostra provado no sentido de os dias de férias em causa terem ou não sido gozados noutros períodos e, bem assim, de ter ou não sido pago o correspondente subsídio de férias.

Em relação aos períodos de férias não gozados, considerando que se mostra provada a existência do contrato de trabalho (como facto jurídico genético de direitos e obrigações para as partes) e, por via dele, o direito a férias da trabalhadora (cfr. artigos 211.º a 213.ºe 255.º, n.º 1, do CT/2003 e 237.º, 238.º, 240.º e 264.º, n.º 1, do CT/2009), à empregadora, como facto extintivo do direito daquela, competia provar que a Autora gozou as férias que alegou não ter gozado (artigo 342.º, n.º 2, e 769.º do Código Civil).
Isto é, tendo a trabalhadora/recorrente alegado o não gozo de determinados dias de férias, sobre a empregadora/recorrida recaía o ónus de provar esse gozo de férias por parte daquela.
Ora, da matéria de facto não se extrai que a recorrida tenha feito essa prova, pelo que não poderá deixar de ser condenada no pagamento das férias em causa.
Porém, embora a Autora tenha alegado que tinha direito a férias majoradas, o que é certo é que não provou tal direito (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil).
Assim, para apurar as férias em falta terá que se partir do direito da Autora a 22 dias anuais de férias e abater aqueles que a Autora alegou ter gozado.
Nesta sequência:
a) tendo a Autora alegado que em 2008 gozou 18 dias de férias, encontram-se em falta 04 dias de férias;
b) tendo em relação a 2009 alegado que gozou 22 dias férias, tal significa o gozo do total das férias;
c) em relação a 2010 alegou que gozou 13 dias de férias, pelo que tem direito ao remanescente de 09 dias;
d) em relação a 2011 alegou ter gozado 14,5 dias de férias, pelo que tem direito ao remanescente de 7,5 dias;
e) e em 2012 alegou ter gozado 17 dias de férias, pelo que tem direito ao remanescente de 05 dias.

3.3. Quanto à violação do direito a férias
Sustenta a recorrente que a recorrida violou o seu direito a férias, pelo que deve ser condenada no pagamento da retribuição em triplo, face ao disposto no artigos 238.º, 240.º, 241,º e 246.º, todos do CT/2009.
Adiante já que não se sufraga tal entendimento.
Como decorre do disposto nos artigos 222.º do CT/2003 e 246.º, n.º 1, do CT/2009, caso o empregador obste culposamente ao gozo das férias o trabalhador tem direito a uma compensação correspondente ao triplo da retribuição em falta.
Assim, são dois os requisitos do direito à indemnização por violação do direito a férias:
(i) que o trabalhador não tenha gozado as férias;
(ii) que a isso tenha obstado, sem fundamento válido, a empregadora (neste sentido, por todos, acórdãos do STJ de 19-10-2005 e de 12-02-2009, recursos n.ºs 1761/05 e 2683/08, respectivamente, disponíveis em www.dgsi.pt).
E para beneficiar do referido direito indemnizatório compete ao trabalhador provar que ocorreu um efectivo impedimento ao gozo de férias, visto tratar-se de um facto constitutivo do direito que se arroga (por todos, o referido acórdão do STJ de 19-10-2005 e ainda o acórdão do mesmo tribunal de 16-12-2010, recurso n.º 314/08.1TTVFX.L1.S1 - 4.ª Secção, também disponível em www.dgsi.pt).
Ora, no caso em apreço, face ao alegado pela Autora e aos factos provados apenas é possível concluir que a Autora não gozou determinados períodos de férias a que tinha direito.
Porém, da mesma matéria de facto não se retira qualquer elemento que permita concluir que a Ré/empregadora adoptou qualquer conduta, por acção ou por omissão, no sentido de impedir aquela de gozar as férias.
Não decorrendo o direito à indemnização por violação do direito a férias da mera constatação de que a trabalhadora não gozou (algumas) férias, impõe-se concluir que a Autora não tem jus à peticionada indemnização, mas tão só ao pagamento da retribuição em relação às férias em falta.
Assim:
a) no ano de 2008 tem direito à importância de € 109,08 a título de retribuição de férias em falta (€ 600,00 : 22 x 04);
b) no ano de 2010 tem direito à importância de € 245,45 a título de retribuição de férias em falta (€ 600,00 : 22 x 09);
c) no ano de 2011 tem direito à importância de € 204,55 a título de retribuição de férias em falta (€ 600,00 : 22 x 7,5);
d) no ano de 2012 tem direito à importância de € 136,36 a título de retribuição de férias em falta (€ 600,00 : 22 x 05).
No total e a este título, tem a Autora/recorrente jus a receber a título de retribuição por férias não gozadas a importância de € 695,44 (€ 109,08 + € 245,45 + € 204,55 + € 136,36).
Procedem, por isso, nesta parte, mas apenas parcialmente, as conclusões das alegações de recurso.

3.4. Quanto ao pagamento do subsídio de alimentação
Na acção a Autora peticionou, entre o mais, a condenação da Ré a pagar-lhe (à Autora) «o remanescente do subsídio de alimentação dos meses de Janeiro de 2012 a Maio de 2013, devido a violação do princípio da irredutibilidade da retribuição, no montante de € 610,20».
A sentença recorrida condenou a Ré no pagamento de diferenças no subsídio de alimentação no montante de € 610,20 referente ao período de Janeiro de 2012 a Abril de 2013.
Ou seja, a sentença recorrida condenou a Ré nos termos peticionados!
Para tanto respiga-se da referida sentença a seguinte fundamentação:
«No caso vertente, atendendo às regras da experiência no que respeita ao custo da alimentação, os valores apurados a respeito do subsídio de refeição, não permitem concluir que a R., com tal pagamento, visava compensar alego mais do que aqueles. Por isso inexiste fundamento para integrar o subsídio de alimentação na retribuição. Assim, não constituindo tal prestação retribuição, não está a mesma abrangida pelo princípio da irredutibilidade da retribuição previsto no art.129º nº 1 al. d) do Código de trabalho.
Não obstante, porque (quando não previsto em instrumento de regulamentação colectiva) se fixado ao abrigo da liberdade contratual das partes que o previram, o seu pagamento está sujeito à regulamentação geral das obrigações, não pode uma das partes reduzir o seu valor sem o acordo da outra ou por força da alteração superveniente das circunstâncias.
No caso vertente apurou-se que, em Fevereiro de 2011, o subsidio de alimentação era de € 140,00.
A R., por verificar que o valor que pagava era superior ao resultante da CCT da AHETA, em janeiro de 2012 reduziu-lhe o subsidio de alimentação para € 120,00, em Janeiro, Fevereiro e Março de 2013 fixou o subsídio de alimentação na quantia mensal de 42,00€ mensais e, em Abril e Maio de 2013 a R. fixou o subsídio de alimentação na quantia mensal de 101,90€ mensais.
(…)
Sucede que as alterações operadas ao dito acordo publicadas no BTE nº38 não se referem ao subsídio de alimentação e, por isso, no que à situação em análise concerne, tal convenção também lhe não é aplicável.
Não poderia, por isso, a entidade patronal ter reduzido o valor do subsídio de alimentação e, por isso, tem a A. direito à diferença entre o recebido e o devido.
Tendo-se apurado que aquando do pagamento da retribuição de Novembro de 2012 a R. aplicou á A. 9 dias de falta, dias que a A. não provou ter trabalhado, que a mesma se ausentou até ao dia 3 de Janeiro de 2012 e desde o dia 21 de Dezembro de 2012 ao dia 07 de janeiro de 2013 então, considerando as quantias pagas pela R., a título de remanescente do subsidio de refeição teria a A. direito às seguintes quantias, acrescida de juros de mora vencidos, à taxa legal, (cfr.art.804º, 805º e 806º do Código Civil) e dos vincendos até efectivo e integral pagamento:
- € 15,00 (i.e. € 127,27 – 112,00) a titulo de remanescente de subsidio de alimentação relativo ao mês de janeiro de 2012;
- €20,00 x 9, a titulo de remanescente a título de remanescente de subsidio de alimentação relativo aos meses de fevereiro a outubro de 2012;
- € 11,82 (i.e. € 82,73 – 70,91) a título de remanescente a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de Novembro de 2012;
- 74,55 (i.e. € 101,82 - 27,27) a título de remanescente a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de Dezembro de 2012;
- € 72,55 (i.e. € 114,55 - €42,00) a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de janeiro de 2013;
- €98,00 (noventa e oito euros) a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de fevereiro de 2013;
- € 98,00 (noventa e oito euros) a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de Março de 2013;
- € 38,10 (trinta e oito euros e dez cêntimos) a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de Abril de 2013;
- € 38,10 (trinta e oito euros e dez cêntimos) a título de remanescente de subsídio de alimentação relativo ao mês de Maio de 2013;
Sucede que, cifrando-se o total das quantias supra indicadas em € 626,12, a A. liquidou o seu pedido, no que às mesmas se refere, em € 610,20. Por isso, em face do principio do pedido, o Tribunal apenas condenará em tal montante.».
Da referida fundamentação retira-se que a sentença recorrida concluiu que não poderia a Ré ter reduzido o valor do subsídio de alimentação e, por isso, que tem direito às diferenças entre o subsídio devido e o recebido, condenando a Ré no valor a tal título peticionado pela Autora.
Isto é, e dito de outra forma: o tribunal a quo acolheu a pretensão da Autora, no que ao subsídio de alimentação diz respeito.
Assim sendo, a Autora não ficou vencida quanto a tal questão, pelo que não tem legitimidade para interpor recurso sobre a mesma (cfr. n.º 1 do artigo 631.º do CPC).
Se bem se interpreta a pretensão da recorrente, esta sustenta que deveria a recorrida ter sido condenada no pagamento do remanescente do subsídio de alimentação peticionado até à data em que esta retomar o pagamento da quantia de € 140,00 mensais.
No entanto, por um lado, não foi isso que peticionou na acção, uma vez que apenas pediu a condenação no pagamento das diferenças no subsídio até Maio de 2013; por outro, não obstante o disposto no artigo 74.º do CPT, o certo é que nenhuns elementos probatórios constantes dos autos permitem alargar a condenação a período posterior àquele.
Improcedem, por consequência, também nesta parte as conclusões das alegações de recurso.

3.5. Assim, e em síntese, deverá o recurso ser parcialmente procedente, condenando-se a Ré/recorrida a pagar à Autora/recorrente a importância de € 695,44 a título de retribuição por férias não gozadas nos anos de 2008, 2010, 2011 e 2012.
E tendo as partes obtido parcial provimento, as custas devem ser suportadas, em ambas as instâncias, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 4/5 para a Autora/recorrente e em 1/5 para a Ré/recorrida.

V. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em conceder parcial provimento ao recurso interposto por BB, e, em consequência, condena-se a Ré/recorrida CC, Lda., a pagar àquela a quantia de € 695,44 a título de retribuição por férias não gozadas nos anos de 2008, 2010, 2011 e 2012.
Quanto ao mais, mantém-se a sentença recorrida, designadamente quanto à condenação da Ré no pagamento à Autora da quantia de € 610,20 a título de remanescente do subsídio de alimentação.
Custas pela Autora/recorrente e pela Ré/recorrida, na proporção do respectivo decaimento, fixando-se em 4/5 para aquela e em 1/5 para esta.

Évora, 09 de Junho de 2016
João Luís Nunes (relator)
Alexandre Ferreira Baptista Coelho (1.º adjunto)
Joaquim António Chambel Mourisco (2.º adjunto)