Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
153/09.2TTPTG.E1
Relator: PAULA DO PAÇO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
CONTRATO DE TRABALHO
TRABALHO EVENTUAL
TRABALHO DE CURTA DURAÇÃO
TRABALHO OCASIONAL
READAPTAÇÃO DA HABITAÇÃO
DANOS MORAIS
Data do Acordão: 05/02/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: TRIBUNAL DO TRABALHO DE PORTALEGRE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Sumário:
I- A reapreciação e alteração da matéria de facto em sede de recurso, pressupõe que o recorrente observou o preceituado no artigo 685º-B do CPC, designadamente que identificou, nas conclusões do recurso, os pontos da matéria de facto, em relação aos quais há discordância com o decidido pela 1ª instância, bem como que indicou os meios de prova que suportam a impugnação.
II- Não é exigível que, nas conclusões de recurso, o recorrente proceda à indicação das passagens da gravação que está a tomar em consideração quando invoca o depoimento das testemunhas.
III- Todavia, já é exigível que, nas alegações de recurso, indique com exactidão as passagens da gravação do registo dos depoimentos das testemunhas em que se baseia, sob pena de imediata rejeição do recurso quanto à reapreciação da prova testemunhal.
IV- Tendo as partes processuais celebrado, entre si, um acordo verbal, no âmbito do qual o autor se obrigou a executar trabalhos agrícolas e outros serviços determinados pelo réu, em duas explorações agrícolas, na possa deste, mediante o pagamento da quantia líquida de €30,00 diários, independentemente do resultado da actividade desenvolvida, com sujeição a um horário de trabalho estabelecido pelo réu, utilização de alfaias agrícolas pertencentes ao mesmo, sendo a actividade desenvolvida dirigida e verificada pelo réu, há que concluir que, entre as partes processuais, vigorava um contrato de trabalho.
V- Realizando o autor diversas actividades (vindima e outros trabalhos relacionados com a produção de vinho, limpeza de mato, tratamento de animais) que são actividades normais e regulares de uma exploração agrícola e do tratamento de animais, não se pode considerar que as actividades desenvolvidas são eventuais ou ocasionais.
VI- Tendo o autor sido contratado em 29 de Junho de 2009 e estando a executar a actividade para que foi contratado em 4 de Setembro de 2009 (data do acidente), não se pode considerar que estamos perante um trabalho de curta duração.
VII- A eventualidade, ocasionalidade ou curta duração dos serviços prestados, traduz-se numa circunstância impeditiva da existência de um acidente de trabalho, pelo que o ónus da prova recai sobre a pessoa a quem os serviços foram prestados.
VIII- Para a atribuição do subsídio previsto no artigo 24º da LAT, compete ao sinistrado provar que já suportou ou que vai ter de suportar despesas com a necessária readaptação da sua habitação, demonstrando, assim, a verificação de um dano futuro, previsível e indemnizável.
IX- Sendo o sinistrado, à data do acidente um jovem adulto, com 18 anos de idade, com uma vida profissional, pessoal, familiar e social pela frente e que, devido ao acidente, ficou com uma incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, dependente de cadeira de rodas, dependente de terceira pessoa em termos de higiene, alimentação e vestuário, ficou impotente e não poderá ter filhos, vive isolado, sofre de ausência de discurso, tem todo o seu quotidiano modificado e determinado pelo seu estado irreversível (deslocações a hospitais e tratamentos), sofreu e sofre dores, incómodos físicos intensos, vive deprimido, triste e angustiado, revoltado e com medo, afigura-se-nos equitativamente adequado fixar em € 200.000,00 o montante de compensação pelos danos morais sofridos.

Sumário da relatora
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora
I. Relatório
V…, Autor nos presentes autos, e neles representado pelo seu progenitor, M…, instaurou a presente acção especial emergente de acidente de trabalho contra A…, na qualidade de Réu, peticionando o pagamento da quantia global de 452.848,10 €, sendo 1.757,13 € a título de despesas por si suportadas em tratamentos médicos e deslocações, 5.823,59 € a título de indemnização por Incapacidade Temporária Absoluta, 9.882,46 € a título de pensão anual e vitalícia em consequência da Incapacidade Permanente Absoluta com início em 14 de Maio de 2010, 5.400,00 € a título de subsídio por elevada incapacidade, 7.957,08 € a título de prestação suplementar vencida até 31 de Agosto de 2011, 3.880,00 € a título de prestação suplementar vincenda relativa aos meses de Setembro a Dezembro de 2011 e subsídios de férias e de Natal relativos a 2011, 5.400,00 € a título de subsídio para readaptação, 47.630,00 € para aquisição de equipamento para assistência e reabilitação funcional, 200.000,00 € a título de danos não patrimoniais, 7.957,08 € a título de pensão provisória já vencida.
Alega para o efeito e em síntese, haver celebrado com o Réu contrato de trabalho pelo qual se obrigou a proceder a trabalhos agrícolas no Monte da Turrenha, nomeadamente relacionados com a vindima e processamento das uvas. Alega ainda que, no decurso de tal actividade e enquanto se encontrava a proceder à limpeza da máquina esmagadora/desengaçadora sofreu electrocussão, da qual resultaram graves lesões neurológicas que ditaram a sua incapacidade absoluta para o trabalho.
Regularmente citado, o Réu apresentou contestação, rejeitando a existência de contrato de trabalho celebrado com o ora Autor e, bem assim, pugnando pela descaracterização do acidente de trabalho em virtude da conduta negligente do Autor. Termina pugnando pela improcedência da acção.
Foi proferido despacho saneador onde se procedeu à selecção da matéria de facto assente e da controvertida.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, o Tribunal declarou quais os factos que considerou provados e não provados, não tendo sido apresentada qualquer reclamação à sua decisão.
Foi, então, proferida sentença, cuja parte decisória, tem o seguinte teor:
“Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais supra mencionadas, decide-se:
A) Julgar a acção parcialmente procedente, e, em consequência condenar o Réu a pagar ao Autor:
- Uma indemnização por incapacidade temporária absoluta (ITA) correspondente a um período de 251 dias no valor de 7.530,00 (sete mil, quinhentos e trinta euros).
- Uma pensão, anual e vitalícia, por incapacidade permanente absoluta (IPA) no valor de 7.920,00 euros (sete mil, novecentos e vinte euros), devida desde o dia 14/05/10 e que deverá ser paga adiantada e mensalmente até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo devidas duas prestações de idêntica proporção nos meses de Maio e de Novembro.
- Um subsídio por situação de elevada incapacidade correspondente a 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos euros), pagos de uma só vez.
- Prestação suplementar devida por necessidade de assistência de terceira pessoa, correspondente à quantia de 3.325,00 (três mil, trezentos e vinte e cinco euros) relativamente ao ano 2010, 6.790,00 (seis mil, setecentos e noventa euros) relativa ao ano 2011 e 6.790,00 (seis mil, setecentos e noventa euros) relativa a 2012, a que acrescerá, nos próximos anos, o montante da remuneração mínima garantida que vier a ser fixado para os trabalhadores do serviço doméstico, durante 14 meses/ano.
- A quantia de 11.795,70 (onze mil, setecentos e noventa e cinco euros), a que acresce IVA à taxa legal em vigor, relativamente aos equipamentos de que o Autor terá que dispor em virtude da sua incapacidade, e, bem assim, a quantia anual de 14.300,00 euros referente a despesas de deslocação diárias, de 2ª a 6ª feira, entre sua casa e o Hospital de Portalegre.
- A quantia de 1.757,13 (mil, setecentos e cinquenta e sete euros e treze cêntimos) referente a despesas já realizadas pelo Autor em deslocações e em medicamentos.
- Uma indemnização por danos não patrimoniais sofridos pelo Autor no montante de 120.000,00 (cento e vinte mil euros).
- Juros vencidos e vincendos, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento das quantias mencionadas nos pontos anteriores.
B) Julgar a acção parcialmente improcedente, absolvendo-se o Ré do pagamento ao Autor do demais peticionado”.
Foi fixado à acção o valor de € 303.579,75.
Inconformado com a sentença proferida, veio o réu interpor recurso da mesma, apresentando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões:
«01ª. – Entre Réu a Autor, mesmo considerando a forma verbal, nenhum contrato de trabalho existiu;
02ª. – O Autor executou tarefas relacionadas com a vindima no Monte do Turrenho que se encontra na posse do Réu;
03ª. – As mesmas funções foram também exercidas, com início em data indeterminada, no mês de Agosto de 2009, pelas testemunhas P… (seu irmão, F… (amigo) e S… (companheira do irmão);
04ª. – Por vindima, entende-se em sentido estrito, o acto de cortar uvas;
05ª. – Nas mesmas circunstâncias de tempo e de lugar, o Autor e restantes companheiros, para além do acto de cortar uvas, por solicitação do Réu, também as transportaram em baldes e caixas da vinha para um depósito que estava montado em cima de um veículo automóvel de caixa aberta e depois, nas mesmas circunstâncias (em baldes e caixas) ajudaram o Réu a colocá-las numa máquina esmagadora / desengaçadora que estava no interior de uma dependência do Monte da Turrenha;
06ª. – O Autor em data anterior ao início da vindima (em data indeterminada no mês de Agosto) prestou outros serviços ao Réu, pelo menos, os de dar ração a duas éguas que se encontravam em outra propriedade que trazia à sua responsabilidade;
07ª. – O Autor auferia por dia a quantia líquida de 30,00 €;
08ª. – Com excepção das datas coincidentes com a vindima, nada resultou provado no que diz respeito ao cumprimento de qualquer horário de trabalho por parte do Autor;
09º. – O horário de trabalho da vindima, primeiro, das 08.00 horas ás 17.00 horas com uma hora para almoço e depois alterado por acordo entre todos, com início das 06.00 horas e termo ás 15.00 horas, também com uma hora para almoço, não foi imposto nem surgiu por ordem do Réu, mas sim por conveniência das pessoas que ali executaram tarefas, considerando a hora de calor;
10ª. – Por outro lado, é serviço que não pode ser exercido em parte nocturna do dia;
11ª. – Todas as tarefas que as testemunhas, sobretudo a testemunha, P… (irmão do Autor) diz que o viu desempenhar, fora do período de vindima e dar ração e água a éguas, tais como, esmagar a mata, cortar mata, desbravar (declarações prestadas em 24.04.2012, gravadas em cd, por trinta e três minutos e vinte e seis segundos, e roçar mato, lavrar a vinha e sulfatar as ervas (declarações prestadas no dia 21.05.2012, em cd, por vinte e um minutos e cinquenta e oito segundos), por desnecessidade, foram contrariadas pelo esclarecimento prestado pela Zona Agrária de Portalegre a fls. 564, 565 e 566 dos autos e pelas declarações do Senhor Perito nomeado pelos mesmos serviços, ouvido no dia 18.06.2012, em depoimento gravado em cd, em cinquenta e sete minutos e cinquenta e cinco segundos, concretamente, que naquele momento não era necessário cortar as ervas no meio das linhas da vinha por já não competirem com ela, e que atendendo àquela altura do ano, já nenhuma sulfatagem era adequada para ser aplicada na vinha;
12ª. – Por outro lado, nenhuma das testemunhas ouvidas a esse respeito sabe dizer a data concreta em que Autor terá iniciado os seus trabalhos (Junho???, Julho???) para o Réu, quanto ganhava (com excepção das datas que coincidiram com a vindima), sobrando apenas a tarefa de dar ração e água a duas éguas (mais nenhuma prova foi feita a este respeito, e, salvo o devido respeito, pagar 30,00 € por dia para dar ração e água a duas éguas não faz qualquer sentido;
13ª. – Mostra-se incompatível a matéria dada por provada na base instrutória sob o nº. 2, com a matéria dada por não provada sob, parte do nº. 6, nºs. 7, 8 e 9 (muito embora, o nº. 7 fosse da responsabilidade do Réu e o nº. 8, consequência do nº. 7), ou seja,
14ª. – Se se dá por provado que o Réu contratou o Autor, pagando-lhe a quantia líquida de 30,00 € por dia, considerando que entre os dois existia uma relação de entidade patronal / trabalhador, não pode deixar, pelo menos, teria o Autor direito a receber também subsídio de férias e de Natal, nada tendo resultado provado, se essa quantia 30,00 € diários já levava em linha de conta aqueles subsídios, o que até, fazendo contas, não se mostra também coincidente;
15ª. – Pode-se até admitir que o Autor, para além da vindima, nos dias em que comparecia até podia ter executado algumas das tarefas que a testemunha P… diz ter visto, mas nunca inseridas numa relação entidade patronal / trabalhador, mas sim como prestação de serviços (desbravar o mato, por exemplo);
16ª. – Resulta das regras da experiência comum, que um trabalhador agrícola indiferenciado (sem que tenha qualquer formação ou especialização, ou exerça função específica, de tractorista, por exemplo) aufira, como vencimento, valor superior ao salário mínimo nacional,
17ª. – É que, se o Autor auferisse 30,00 € por dia em 40 horas por semana, qual seria o seu vencimento ao fim do mês, considerando que a tarefa de dar ração e água ás éguas é exercida diariamente, incluindo os fins-de-semana?
18ª. – É assim, pois de excluir, que o Autor tivesse sido contratado, mesmo que verbalmente, por tempo completo e indeterminado, pelo Réu;
19ª. – Nunca antes comentou com as testemunhas a sua “insatisfação” por o Réu não declarado aos serviços de segurança social a sua inscrição como trabalhador;
20ª. – Não apresentou ao Réu (suposta entidade patronal) qualquer justificação pelas faltas que teve ao “trabalho” nos dias 20 e 27 de Agosto de 2009, por ter cumprido trabalho comunitário na Junta de Freguesia da Ribeira de Nisa, na sequência de um processo judicial que correu contra si no Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, por determinação do Juiz;
21ª. – O único “poder” que o Réu exerceu relativamente ao Autor, foi o de orientar no sentido de transmitir o local em que se fazia o corte das uvas, mais nenhum;
22ª. – Em exercício manifestamente insuficiente para se enquadrar nos poderes de dar ordens, de lhe dar direcção e fiscalização;
23ª. – Com excepção dos baldes, caixas, depósito e veículo automóvel, não há uma única alusão à propriedade do principal instrumento de trabalho no corte de uvas, tesoura ou navalha;
24ª. – Todas as testemunhas que foram inquiridas acerca da vindima declararam que o serviço a ser prestado tinha tido início com a vindima e que terminava com a vindima;
25ª. - Desta forma e com as características acabadas de enumerar, o tipo de serviço exercido constitui uma obrigação de resultado, cortar uvas;
26ª. – Existe erro na apreciação da matéria de facto por parte do douto Tribunal, quando dá por provado os pontos 2, 3 e 10 da matéria de facto dada por provada, uma vez que das declarações das testemunhas, ao contrário do que se afirma na resposta à matéria de facto, na respectiva fundamentação e na douta sentença, aqueles pontos deveriam ter sido dados por não provados, remetendo-se para a conclusão 11ª., a identificação dessas testemunhas, datas em que foram ouvidas e respectivas gravações;
27ª. – Daí que, entre o Réu e o Autor nenhuma relação laboral houve, pelo que, não havendo contrato de trabalho, deverá o Réu não ser responsabilizado pelo produção do acidente e todas as suas consequências;
28ª. – Ainda que assim não se considere, o artº. 8º., nº. 1 alíneas a) e b) da LAT (Lei dos Acidentes de Trabalho, Lei nº. 100 / 97, de 13 de Setembro), exclui o Réu como responsável pelas consequência de acidente, porquanto:
29ª. – A qualidade dos serviços prestados enquadram-se em serviços eventuais e de curta duração e o Réu ser uma pessoa singular na prática de actividade que não tem por objecto exploração lucrativa;
30ª. – A vindima, muito embora como se diz na douta sentença (em opinião com a qual não se concorda), representa uma fase normal de trabalho agrícola, cuja necessidade ocorre todos os anos, por contraposição com aquelas actividades imprevistas e excepcionais, não deixa de constituir uma actividade ocasional e de curta duração;
31ª. – Se assim não fosse, o seu enquadramento jurídico, sem qualquer dúvida estava sob alçada do artº. 142º., do Código do Trabalho, sob a epígrafe “Casos especiais de contrato de trabalho de muito curta duração”, uma vez que a vindima constitui actividade agrícola sazonal,
32ª. – E, para obstaculizar a duração de mais de uma semana, restando saber se essa semana é seguida ou se são cinco dias úteis e mais dois, a entidade patronal interrompia por um dia a actividade para depois a retomar no dia seguinte;
33ª. – Problema que neste caso não se põe, por todas as pessoas que exerceram funções na vinha terem dito que apenas nos dias úteis é que trabalharam,
34ª. – E não excedendo os 60 dias de trabalho no ano civil, não restava ao douto Tribunal, outra alternativa, que não classificar o presente suposto “contrato de trabalho”, como especial e de muito curta duração, nos termos do artº. 142º., do Código do Trabalho;
35ª. – Ao não ter enquadrado juridicamente a presente relação entre Autor e Réu, em termos de trabalho no artº. 142º., do Código do Trabalho, não pode o douto Tribunal deixar de o enquadrar nos termos da alínea b) do nº. 1 do artº. 8º., da LAT,
36ª. – Logrou provar o Réu que há mais de cinco anos não se encontrava inscrito no serviço de finanças como viticultor e há mais de quatro anos que não entregava a uva na Adega Cooperativa de Portalegre (fls. 650, 651, 652, 637, 638 e 639 dos autos) e que naquele ano de 2009, as uvas estavam quase todas estragadas, devendo pois os pontos 91, 92, 93 e 123, da matéria de facto ter sido considerados por provados, o que melhor resulta da inquirição das testemunhas arroladas pelo Réu, cuja transcrição se encontra acima feita;
37ª. – Por se ter a posse de uma vinha com sete hectares, na ausência de mais prova a esse respeito, não se pode presumir que o Réu tivesse intenção de a explorar economicamente com fins lucrativos;
38ª. – O recurso a mão – de obra de terceiros, excluindo a ajuda da família, nas circunstâncias da prestação de serviços ocasionais ou eventuais de curta duração, a pessoa singular que não tenham por objecto exploração lucrativa, exclui o Réu da reparação em casos de acidente;
39ª. – A douta sentença, ao considerar que entre Autor e Réu ocorreu uma relação laboral sem a enquadrar em trabalho de muito curta duração viola o artº. 142º., do Código do Trabalho;
40ª. – Por conseguinte, ao considerar que o Réu está fora da exclusão da reparação em caso de acidente, a douta sentença viola as alíneas a) e b) do nº. 1 do artº. 8º., da LAT, Lei nº. 100 / 97, de 13 de Setembro;
41ª. – A descrição do dia 04.09.2009 por parte das testemunhas P… e S…, assim como as funções específicas que cada um aí desempenhou (e até nos dias anteriores, constitui uma autêntica trapalhada);
42ª. – Ouvido na sessão de 24.04.2012, em gravação em cd, em trinta e três minutos e vinte e seis segundos, a testemunha P…, esclarece que não almoçaram: - “Sim, porque o acidente ocorreu… não me lembro/recordo bem da hora 13:15h, 13:30h, mais ou menos, e nós ainda não tínhamos almoçado nesse dia, a gente fazia uma hora de almoço, por isso se foi há 13:30h, era às 14:30h”;
43ª. – Todavia, em sessão de 21.05.2012, em gravação em cd, em vinte e um minutos e cinquenta e oito segundos, pela mesma testemunha é dito: “Depende, isso a gente… a gente almoçava dependia…se tivéssemos o tanque cheio fosse já perto da hora de almoço…. almoçávamos e depois íamos outra vez colher mais. Sim, sim. Aí às 08:30h 09:00h;- Tenho 23, foi há 3 anos atrás, tinha 21;- 11:30h 12:00h, não tenho a certeza; - Aliás aquilo para mim, nem é foi bem almoço - Almoçámos e não almoçámos, - Eu para mim o almoço, é almoçar em condições, a ente comemos 2 sardinhas e fomos outra vez … que nós até éramos para sair mais cedo - Foi o meu irmão”;
44ª. – Ou seja, no dia 24.04.2012 a testemunha P… disse que não tinham almoçado; no dia 04.09.2009, para depois em 21.05.2012 já ter dito que tinham almoçado; para depois dizer que tinham almoçado mas que não tinham almoçado;
45ª. – Muito embora pouco tenha que ver com a ocorrência dos factos propriamente ditos, facto é que discrepância de declarações em matéria tão simples, revela falta de idoneidade e de credibilidade da testemunha, que como se vai ver a seguir, introduziu factos impossíveis de se terem passado naquele dia e nos dias anteriores;
46ª. – Por o Autor necessitar de se deslocar à cidade de Portalegre afim de tratar de assunto relacionado com a sua carta de caçador e por não ter carta de condução, ficou a testemunha Pedro de o levar;
47ª. – O Réu por seu turno, considerando tal facto, acordou com o Autor, com a testemunha P… e com a testemunha S…, que da parte da tarde de 04.09.2009 não colhiam mais uvas, de modo a que aqueles se pudessem deslocar a Portalegre;
48ª. – O Réu ausentou-se momentaneamente, tendo o Autor e restantes companheiros ido almoçar;
49ª. – Almoço preparado pelo Autor, sardinha assada, que entre o acender do lume, assar as sardinhas e as terem comido, nunca poderia ter demorado menos do que 45 a 60 minutos (uma hora);
50ª. – Considerando que tinham a tarde livre, que o Réu ainda não tinha retornado ao local, tomaram a decisão, na ausência deste, de esmagar as uvas;
51ª. – Toda a versão que resulta dos depoimentos das testemunhas P… e S… é uma aproximação à realidade, cuja descrição fazem por terem visto o Réu a fazê-la, concretamente, a operação de esmagar as uvas propriamente dita, utilizando para tal a máquina esmagadora / desengaçadora,
52ª. – Tratamento dos engaços, limpeza e arrumo do local;
53ª. – As testemunhas P… e S… faltaram à verdade quando dizem que o Réu lhes havia dado ordens específicas para esmagar as uvas, tendo também faltado à verdade, quando dizem que foram contratados para executar a vindima e esmagar as uvas e que já haviam realizado esta tarefa por ordem do Réu sem a sua presença;
54ª. – O que melhor se pode ver pela completa incongruência da descrição que fazem daquelas operações, que constituem apenas uma aproximação à realidade, daquilo que pretensamente viram fazer em dias anteriores,
55ª. – Dizem então aquelas testemunhas que a lavagem da máquina esmagadora / desengaçadora era feita com baldes de água e também por vezes com uma mangueira,
56ª. – Sem que a máquina fosse retirada do local onde se encontrava, por cima do depósito para onde escorria o mosto (uva desfeita, composto de líquido e peles);
57ª. – Essa água, atirada para cima da máquina de forma indiscriminada caía para dentro daquele composto,
58ª. – Esta operação em concreto, de atirar água para dentro do mosto de forma indiscriminada, vai estragar aquele composto, o qual, deixa de se poder aproveitar com o destino para que é criado, ou seja, de fazer vinho;
59ª. – Facto que é atestado pelo Senhor Perito da Zona Agrária de Portalegre, ouvido no dia 18.06.2012, em depoimento gravado em cd, em cinquenta e sete minutos e cinquenta e cinco segundos) que mandar água para cima do mosto de forma indiscriminada é estragá-lo;
60ª. – Que a única ocasião em que se junta água ao mosto é para controlar o excesso de açúcares para que possa permitir fazer a fermentação e para desdobrar o produto e fazer baixar o teor de álcool (gravação no mesmo cd acima identificado);
61ª. - Deitar água para dentro de mosto que se destina a fazer vinho, de forma descontrolada e indiscriminada (conforme resulta das declarações proferidas pelas testemunhas P… e S…), sem se consultarem tabelas existentes para esse efeito, é estragar;
62ª. – A introdução do elemento água por estas testemunhas, na fase de processo de fabricação do vinho nas circunstâncias atrás descritas, torna os seus depoimentos completamente à margem do possível, aproximado à realidade, da forma como julgam ter visto o Réu fazer,
63ª. – Tendo de recorrer a elas para justificar que o Réu lhes havia dado instruções nesse sentido, concretamente, para autonomamente, sem a sua presença, procederem ao esmagamento das uvas e limpeza da máquina, em matéria que não foi provada, assim como aquela que precedeu o esmagamento das uvas, concretamente, quem ligou uma ponta dos fios ao quadro eléctrico;
64ª. - Este último facto é autonomamente referido pelo douto Tribunal, na parte final da resposta à matéria de facto de 13.07.2012, refª. 262953, último parágrafo, tendo a testemunha F… declarado que o mesmo cabo se ligava a uma tomada eléctrica que estava por detrás do frigorífico, quando as testemunhas P… e S… dizem que o mesmo se ligava directamente ao quadro eléctrico;
65ª. – Não resultou provado quem executou essa tarefa em concreto, quem procedeu à ligação do cabo eléctrico directamente ao quadro, parecendo, salvo o devido respeito, que foi mais uma iniciativa do Autor e restantes companheiros;
66ª. – No dia 04.09.2009, por cerca das 13.15 horas, o Autor, o seu irmão P… e a companheira deste, S…, tomaram a decisão de proceder à operação de esmagamento de uvas e limpeza da máquina sem que para isso lhes tivesse sido dadas quaisquer instruções;
67ª. – Fizeram-no à revelia do Réu, sem que até esse momento tivessem procedido a essas tarefas sem a presença daquele;
68ª. – Era o Réu quem sempre directamente procedeu a essas tarefas, limitando-se o Autor e restantes companheiros a lhe fazerem chegar ás mãos as uvas;
69ª. – No sentido de se despacharem, por a tarde lhes ter sido concedida para se deslocarem à cidade de Portalegre (para o Autor tratar da sua carta de caçador e não ter carta de condução e ter que ser o seu irmão a levá-lo), decidiram de livre iniciativa proceder ás tarefas de esmagar as uvas e limpar a máquina;
70ª. – Tarefas essas que nunca até então ali tinham feito sem que o Réu estivesse presente, pois era esta quem as executava;
71ª. – Foi essa decisão concreta que levou o Autor e seus companheiros a executarem tarefas para as quais não estavam preparados, para as quais não estavam autorizados a executá-las de forma autónoma e sozinhos, pois que sempre até aí, fora o Réu a executá-las, a ele lhe pertencendo as uvas;
72ª. – Sendo até visível a forma como as testemunhas “constroem” a sua versão, ou seja, contratados para fazer… a vindima…, mas depois, acrescentam-lhe também, o esmagamento das uvas e a limpeza de máquinas;
73ª. – A tarefa específica da vindima é o corte de uvas, não o seu esmagamento e limpeza de máquinas;
74ª. – Factos que não obstaculizam a que dentro da vindima se pratiquem outras tarefas complementares, tais como, carregar as uvas e descarregá-las;
75ª. – A tarefa concreta de esmagamento de uvas carece de conhecimentos técnicos no processo de fabricação de vinho, que as testemunhas revelam não possuir, nem nunca terem possuído, não comportáveis com o acto de vindimar nem tão pouco com as tarefas complementares que acima se fizeram alusão;
76ª. – O Autor não tinha conhecimentos técnicos para proceder à tarefa de esmagamento de uvas e limpeza da máquina, dentro do processo de fabricação de vinho, necessitando as testemunhas de acrescentar ás tarefas ali exercidas, também as de esmagar as uvas e limpar a máquina por forma a justificarem os factos ocorridos no dia 04.09.2009;
77ª. – Com o conhecimento inclusivamente que tinham do estado do cabo e restantes ligações eléctricas, para além de terem tido possibilidade de terem recusado a prestação, a execução em concreto daquela tarefa, não se vislumbra como viável a possibilidade real do Réu ter dito a todos que tivessem cuidado, por as ligações provocarem um pequeno formigueiro (declarações prestadas pela testemunha P…, já acima transcritas), como se fosse possível controlar a intensidade de um choque eléctrico por forma a fazer menos mal e não provocar danos de maior;
78ª. – Face ao que se deixa dito, considerando as alterações à matéria de facto que se apontou e que foi dada por provada, mas que deveria ter sido dada por não provada, à outra que foi dada por não provada, mas que deveria ter sido dada por não provada,
79ª. – Alterações essas que apontam para a falta da existência de relação laboral entre o Autor e o Réu, da responsabilidade pela produção do acidente exclusivamente para o Autor e restantes companheiros,
80ª. – Da violação das normas jurídicas também já apontadas, concretamente, artº. 142º., do Código do Trabalho, alíneas a) e b) do nº. 1 do artº. 8º., da Lei nº. 100 / 97, de 13 de Setembro,
81ª. – Matéria de facto e de direito que apontam para a alteração da presente decisão em sentido contrário,
82ª. – Absolvendo-se o Réu, Meritíssimos Juízes Desembargadores é fazer-se a costumada boa justiça».
Contra-alegou o autor, pugnando pela improcedência do recurso.
Interpôs, ainda recurso subordinado, apresentando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões:
«I) Do subsídio para readaptação da habitação:
1. Dispõe o artigo 24º da LAT que, “A incapacidade permanente absoluta confere direito ao pagamento das despesas suportadas com a readaptação de habitação, até ao limite de 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data do acidente.”;
2. A referência a “despesas suportadas” deve ser interpretada em sentido lato, por forma a abranger as despesas que o sinistrado venha a suportar com a readaptação da habitação;
3. Interpretação que não acolha tal entendimento viola o disposto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa;
4. Assim, deve o Réu ser condenado a pagar ao Autor a quantia de 5.400,00€, nos termos peticionados na al. h) da p.i.;
II) Das despesas que venha a efectuar com assistência médica e outras:
5. A douta sentença recorrida deu como provado que o Autor necessitará, até ao final da sua vida: de tratamentos de fisioterapia para reabilitação funcional, de assistência médica incluindo elementos de diagnóstico e de tratamento e de assistência farmacêutica; de transportes para observação, tratamento e comparência a actos judiciais; de fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação; e de assistência psíquica;
6. Em consequência deverá o Réu ser condenado a pagar, para além das despesas já efectuadas, as despesas que o Autor, por causa do acidente, eventualmente venha a efectuar para os fins acima descritos, conforme peticionado na al. m) da p.i.;
III) Do valor da indemnização por danos não patrimoniais:
7. Conforme resulta da douta sentença recorrida, o Réu é responsável pelo pagamento da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor;
8. Para a quantificação de tais danos deverá ser levada em conta, designadamente, a matéria dada como provada nos pontos 51 a 67 da Fundamentação de Facto;
9. Os factos constantes de tais pontos 51 a 67 impõem, salvo melhor opinião, que a indemnização por danos não patrimoniais seja de valor não inferior a 200.000,00€, conforme peticionado na al.j da p.i..
Termos em que, e nos do douto suprimento de VV. Exªs., deve ser dado provimento ao presente recurso, alterando-se, em conformidade, a douta sentença recorrida.
porque assim se mostra ser de Direito e de Justiça».
Notificado das contra-alegações do recorrido, e por nas mesmas ter sido invocado a não observância do disposto no artigo 685º-B, nº1 do Código de Processo Civil, veio o réu/recorrente, a fls. 848 e segs. dos autos, indicar as horas, minutos e segundos, bem como os dias em que foram prestados os depoimentos gravados das testemunhas, cuja reapreciação pretende.
No exercício do princípio do contraditório, veio o recorrido requerer que, ao abrigo do artigo 265º, nº1 do Código de Processo Civil, seja indeferida a junção da peça processual apresentada pelo recorrente e que seja ordenado o seu desentranhamento.
A fls. 855 e segs. dos autos, veio o recorrente apresentar as suas contra-alegações em relação ao recurso subordinado, concluindo pela improcedência deste recurso, face à procedência do recurso por si apresentado.
O Tribunal de 1ª instância admitiu os recursos, respectivamente, como apelação e recurso subordinado, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Por despacho de fls. 864, ficou consignado que não se apreciaria o requerimento apresentado pelo recorrido a solicitar o desentranhamento do requerimento apresentado pelo recorrente, a fls. 848/850, por se considerar que a apreciação de tal questão é da competência do tribunal ad quem.
Neste Tribunal, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de:
- ser liminarmente indeferido o recurso quanto à impugnação da matéria de facto, por falta de observância do disposto no artigo 685º-B, nºs 1, alínea b) e 2 do Código de Processo Civil;
- julgar-se improcedente o recurso, relativo à matéria de direito;
- julgar-se improcedente o recurso subordinado.
Tal parecer mereceu resposta do réu/recorrente, que, no essencial, reproduziu, na íntegra, o seu requerimento de fls. 848/850, quando o recorrido tomou a mesma posição do Ministério Público, quanto à impugnação da matéria de facto.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Questão Prévia
O Tribunal de 1ª instância não apreciou o requerimento apresentado pelo recorrido, a fls. 853, no âmbito do qual se solicitava o indeferimento da junção da peça processual apresentada pelo recorrente a fls. 848 a 850 dos autos e respectivo desentranhamento, por considerar que tal apreciação competiria ao tribunal ad quem.
Ora, considerando que tanto o requerimento do recorrido como o requerimento do recorrente, haviam sido dirigidos ao Juiz de Direito do Tribunal do Trabalho de Portalegre, é manifesto que a competência para decidir sobre o requerido pertencia ao tribunal de 1ª instância.
Tendo-se considerado incompetente e tendo tal despacho transitado, nada mais há a apreciar em relação ao requerido pelo recorrido a fls. 853, uma vez que nenhum requerimento dirigido a este tribunal foi apresentado.
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III. Objecto do Recurso
De harmonia com o disposto nos artigos 684º, nº3 e 685º-A, nº1 do Código do Processo Civil aplicável ex vi dos artigos 1º, nº2, alínea a) e 87º, nº1, ambos do Código do Processo de Trabalho, é consabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso.
Em função destas premissas, são as seguintes as questões que importa apreciar e conhecer:
1. em relação ao recurso de apelação:
1ª impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
2ª da invocada inexistência de contrato de trabalho entre as partes processuais;
3ª da invocada exclusão do acidente em apreço nos autos do conceito de acidente de trabalho;
4ª da descaracterização do acidente.
2. em relação ao recurso subordinado:
1ª do subsídio para readaptação da habitação;
2ª das despesas que venha a efectuar com assistência médica e outras;
3ª do valor da indemnização por danos não patrimoniais.
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IV. Matéria de Facto
O Tribunal de 1ª instância considerou assentes os seguintes factos:
1 - No ano de 2009, o Réu, A…, tinha na sua posse o prédio denominado Monte do Turrenho, sito entre a Vargem e Carreiras, no qual exercia actividade agrícola.
2 - No ano de 2009, o Réu explorava uma vinha, com cerca de 7ha, existente no prédio rústico denominado Monte do Turrenho.
3 - No ano de 2009, o Réu tinha na sua posse o prédio denominado Quinta das Cruzes, sito na freguesia da Ribeira de Nisa, onde mantinha 2 equídeos.
4 - Mercê do descrito em 1 e 2, em meados de Agosto de 2009, o Autor, V…, procedeu à vindima das uvas e à sua colocação em caixas de plástico que eram carregadas em carrinha de caixa aberta disponibilizada pelo Réu.
5 - No dia 4 de Setembro de 2009, cerca das 13h30m, o Autor procedia à limpeza do esmagador/desengaçador de uvas, dela retirando restos de engaço.
6 - Aquando do descrito em 5), o esmagador/desengaçador de uvas tinha o interruptor, que se encontra na própria máquina, accionado na posição de desligado.
7 - Aquando do descrito em 5), o esmagador/desengaçador encontrava-se parado.
8 - Aquando do descrito em 5) e após alguém ter diligenciado pelo desligamento do quadro da energia eléctrica, o Autor caiu para o chão, inanimado.
9 - Aquando do descrito em 8), o Autor sofreu uma electrocussão, seguida de paragem cardíaca e encefalopatia anóxica.
10 - Na sequência do referido em 9), o Autor foi transportado para o hospital de Portalegre onde ficou internado no Serviço de Cuidados Intensivos até dia 26 de Outubro de 2009.
11 - Em 17 de Setembro de 2009, o Autor foi sujeito a provas de Neurofisiologia no Hospital de S. José.
12 - Em 26 de Outubro de 2009, o Autor foi transferido para o Centro de Medicina de Reabilitação do Sul, em S. Brás de Alportel, onde esteve 2 dias.
13 - Em 27 de Outubro de 2009, o Autor apresentou quadro febril e infecção respiratória com diminuição das saturações de O2, com agravamento da situação clínica, pelo que foi transferido para o Hospital de Faro onde ficou internado em Cuidados Intensivos até ao dia 3 de Novembro de 2009.
14 - Em 3 de Novembro de 2009, o Autor foi transferido para o Hospital de Portalegre.
15 - No dia 2 de Dezembro, o Autor foi transferido para o Centro de Medicina Física e Reabilitação em Alcoitão, onde permaneceu até 13 de Maio de 2010, data em que teve alta para o domicílio.
16 - Mercê do referido em 9), o Autor esteve em situação de Incapacidade Temporária Absoluta durante 251 dias, entre 5 de Setembro de 2009 e 13 de Maio de 2010.
17 - O esmagador/desengaçador de uvas referido em 6) era utilizado pelo Réu nas actividades descritas em 1) e 2).
18 - O Autor nasceu a 29 de Março de 1991.
19 - Aquando do descrito em 5), o Autor tinha 18 anos de idade.
20 - A mãe do Autor é M...
21 - No prédio rústico identificado em 1) existe uma adega onde o Réu transformava as uvas provenientes da vinha identificada em 2).
22 - Em 29 de Junho de 2009, o Réu celebrou acordo verbal com o Autor, segundo o qual este executaria trabalhos agrícolas e outros serviços determinados pelo Réu nos prédios identificados em 1) e 3), no interesse e sob as ordens, instruções e controlo do Réu (direcção e fiscalização), e mediante o pagamento de uma quantia fixa mensal.
23 - Mercê do descrito em 22), e por determinação do Réu, o Autor trabalhava das 8 horas até às 17 horas, com uma hora de intervalo para almoço, durante 5 dias por semana.
24 - Mercê das condições atmosféricas, o horário descrito em 23) foi alterado no mês de Agosto para um horário das 6 horas às 15 horas, com uma hora de intervalo para almoço.
25 - A hora do almoço referida em 22) e 23) ocorria, em regra, por volta das 12 horas.
26 - Mercê do descrito em 22) o Réu pagava ao autor a quantia líquida de 30,00 euros por dia.
27 - Mercê do acordo referido em 22) e após ordem do Réu, o Autor procedeu à limpeza do mato na Quinta das Cruzes.
28 - Mercê do acordo referido em 22) e após ordem do Réu, o Autor ao tratamento de 2 éguas que o Réu mantinha na Quinta das Cruzes, às quais dava água, ração e palha.
29 - Mercê do acordo referido em 22) e após ordem do Réu, o Autor procedeu, no Monte do Turrenho, a trabalhos não concretamente determinados na vinha e relacionados com a produção de vinho.
30 - Mercê do acordo referido em 22), após realizar o descrito em 4), o Autor transportava, na mesma carrinha, por si conduzida, as caixas para a adega, sita no Monte do Turrenho.
31 - Mercê do acordo referido em 22), após o referido em 30), o Autor procedia a trabalhos de esmagamento das uvas e de limpeza do esmagador/desengaçador das uvas.
32 - Em meados de Agosto de 2009, F…, S… e P… passaram a desempenhar funções agrícolas no prédio identificado em 1), no interesse e sob as ordens, instruções e controlo do Réu, mediante o pagamento de uma retribuição fixa diária.
33 - As pessoas indicadas em 32) procediam à apanha das uvas e à sua colocação em caixas.
34 - O Réu dirigia e verificava os trabalhos descritos de 27) a 31) e em 33).
35 - A máquina identificada em 5) – esmagador/desengaçador de uvas - funciona com energia eléctrica.
36 - O cabo eléctrico do esmagador/desengaçador de uvas encontrava-se conectado a uma tomada de corrente.
37 - Aquando do descrito em 5), o Autor agarrou a borda superior do receptáculo do esmagador/desengaçador de uvas e sofreu uma descarga eléctrica, ficando “agarrado” à máquina.
38 - Acto contínuo ao descrito em 37), o Autor gritou para desligarem a máquina da corrente.
39 - Mercê do descrito em 37) e 38), S… correu ao quadro da luz, que se encontrava fora da Adega, sita no Monte do Turrenho.
40 - Após o descrito em 9), S… chamou uma ambulância.
41 - O cabo eléctrico que ligava o esmagador/desengaçador à corrente, utilizado aquando do descrito em 5), não se encontrava devidamente isolado.
42 - O esmagador/desengaçador de uvas e o cabo eléctrico que o ligava à corrente, utilizados aquando do descrito em 5), transmitiam a corrente eléctrica.
43 – Mercê do descrito em 41) e 42), o Autor sofreu a electrocussão referida em 9).
44 - A instalação eléctrica utilizada pelo Réu no esmagamento das uvas apresentava cabos com enxertos efectuados com fita adesiva de características não concretamente apuradas.
45 – O cabo eléctrico utilizado para alimentar o esmagador/desengaçador vinha da dependência imediatamente contígua à adega, pelo chão, passando pelo exterior até à adega, onde estava ligado, através de um dos referidos enxertos, ao cabo eléctrico de uma tomada tripla.
46 – A falta de isolamento do cabo eléctrico nos termos consignados em 41) a 44) foi, juntamente com a existência de líquido proveniente do esmagamento das uvas no esmagador/desengaçador, causa da descarga eléctrica referida em 37).
47 - O Autor e o Réu conheciam o estado do esmagador/desengaçador de uvas descrito em 41) e 42).
48 - O Réu não celebrou qualquer acordo de transferência da responsabilidade decorrente de eventuais sinistros ocorridos com o Autor durante as funções exercidas por conta do acordo referido em 22).
49 - Após dia 13 de Maio de 2010, o Autor tem feito tratamentos de medicina Física e Reabilitação no Hospital de Portalegre.
50 - Após dia 13 de Maio de 2010, o Autor tem feito tratamentos de terapia ocupacional e terapia da fala no Hospital de Portalegre.
51 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor apresenta encefalopatia anóxica e tetraparésia espástica, com alterações cognitivas, ausência de capacidade de equilíbrio, ausência de discurso, disfagia ligeira, falta de controlo de esfíncteres, não tem controlo vesical e necessita do uso de supositório para funcionamento dos intestinos.
52 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor está dependente de terceira pessoa para comer, deslocar-se, fazer a higiene pessoal, mudar as fraldas, deitar-se, vestir-se e despir-se, tendo perdido a sua privacidade.
53 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor tem de ser transportado em cadeira de rodas.
54 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor ficou impotente e não poderá ter filhos nem constituir família.
55 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor passou a viver ansioso e com instabilidade de humor.
56 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor passou a viver sem capacidade de concentração.
57 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor sofreu e continua a sofrer dores intensas.
58 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor sofreu e continua a sofrer incómodos físicos intensos.
59 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o quotidiano do Autor consiste em deslocações ao Hospital e a permanecer em casa sentado ou deitado.
60 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor vive deprimido, triste e angustiado, revoltado e com medo.
61 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), o Autor está impossibilitado de conviver com os amigos, vivendo isolado.
62 - A consolidação médico-legal das lesões que determinaram o internamento do Autor após o descrito em 8) ocorreu a 13 de Maio de 2010.
63 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52) o Autor está, desde 14 de Maio de 2010, em situação de Incapacidade Permanente Absoluta para todo e qualquer tipo de trabalho.
64 - As lesões descritas em 51) são irreversíveis.
65 - Aquando do descrito em 5), o Autor era alegre, dinâmico, confiante e com enorme vontade de viver e tinha um temperamento afável e generoso, o que lhe permitia manter bom relacionamento com as outras pessoas.
66 - Aquando do descrito em 5), o Autor era pessoa trabalhadora e activa, praticando ciclismo, futebol, natação e motociclismo, nos seus tempos livres.
67 - Aquando do descrito em 5), o Autor fazia parte do Grupo de Forcados Amadores….
68 - Para utilização nos Centros de Medicina de Reabilitação identificados em 12) e 15), o Autor teve de adquirir vestuário e calçado adequado, no valor de 480,33 €.
69 - Durante o período nos Centros de Medicina de Reabilitação identificados em 12) e 15), o Autor despendeu, em medicamentos e produtos farmacêuticos, a quantia de 575,23 €.
70 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor necessita de ajudas técnicas e tratamentos de fisioterapia para evitar e/ou diminuir as complicações e agravamentos decorrentes da sua situação clínica.
71 – Na sequência do descrito em 70), o Autor necessita de cadeira de rodas de comando eléctrico com capacidade para subir e descer escadas e de rampas em alumínio de valores não concretamente apurados.
72 - Na sequência do descrito em 70), o Autor necessita de cadeira de rodas eléctrica no valor de 2.160,00 euros, cadeira de rodas simples no valor de 200,00 euros, sofá eléctrico no valor de 607,60 euros, cama articulada no valor de 954,90 euros, colchão anti-escaras no valor de 348,40 euros, assento de duche rebatível no valor de 94,50 euros, almofada de gel no valor de 80,00 euros, grua de transferência no valor de 1012,90 euros, Standing frame no valor de 861,40 euros, sistema aumentativo de comunicação e ajuda técnica no valor de 5.476,00 euros, a que acresce IVA à taxa legal em vigor.
73 - O Autor não tem viatura própria.
74 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37) o Autor tem de se deslocar diariamente, de 2ª a 6ª feira, da sua residência ao Hospital de Portalegre, para os tratamentos de fisioterapia, terapia ocupacional e da fala, aproveitando essas deslocações para, sempre que necessário, fazer as consultas médicas.
75 – O custo do transporte de sua casa ao Hospital, ida e volta, em ambulância, é de 55,00€/dia, ou seja, 275,00€/semana, ou seja, 275,00€ x 52 semanas = 14.300,00€/ano.
76 - Desde que teve alta hospitalar, o Autor é acompanhado pela sua mãe.
77 - Aquando do descrito em 5), a mãe do Autor explorava, por conta própria, um estabelecimento de pastelaria, sito no Centro Comercial Fontedeira, Av. do Movimento das Forças Armadas, em Portalegre.
78 - Mercê do descrito em 8) a 16) e de 49) a 52), a mãe do Autor teve de abdicar da sua vida profissional para prestar assistência ao Autor, passando a ter como única ocupação a prestação de assistência ao Autor, tarefa que lhe ocupa as 24 horas do dia.
79 - Durante os internamentos em S. Brás de Alportel, Faro e Alcoitão, a mãe do Autor acompanhou-o, para lhe prestar assistência, tendo efectuado, por esse motivo, despesas no valor de 160,67 €, devidas por combustível nos trajectos Portalegre/Algarve/Portalegre (134,92 €) e portagem referente aos mesmos trajectos (25,75 €).
80 - No período de 2 de Dezembro de 2009 até 13 de Maio de 2010, a mãe do Autor acompanhou-o para lhe prestar assistência, tendo ficado alojada em casa de amigos, em Rio de Mouro, deslocando-se, por vezes a Portalegre.
81 - Mercê do descrito em 80), a mãe do Autor teve despesas no valor global de 540,90 € devidas por combustível nos trajectos Rio de Mouro/Alcoitão/Rio de Mouro e Portalegre/Rio de Mouro/Portalegre (311,00 €) e Portagens referentes aos mesmos trajectos (229,90 €).
82 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor necessitará, até ao final da sua vida, de tratamentos de fisioterapia para reabilitação funcional, de assistência médica incluindo elementos de diagnóstico e de tratamento e de assistência farmacêutica.
83 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor necessitará, até ao final da sua vida, de transportes para observação, tratamento e comparência a actos judiciais.
84 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor necessitará, até ao final da sua vida, de fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação.
85 - Mercê do descrito em 8), 9) e 37), o Autor necessitará, até ao final da sua vida, de assistência psíquica.
86 - Aquando do descrito em 5), o Réu encontrava-se ausente do Monte do Turrenho.
87 - O Réu é técnico de oficial de contas de profissão, encontrando-se inscrito na respectiva Ordem.
88 - O Réu encontra-se em situação laboral de desemprego.
*
V. Impugnação da matéria de facto no âmbito do recurso de apelação
O recorrente pretende que o tribunal ad quem reaprecie prova testemunhal produzida nos autos, por discordar da apreciação que o tribunal a quo fez da mesma.
Nos termos do artigo 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 1.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida.
Esta norma estabelece que, quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados [n.º 1, alínea a)] e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [n.º 1, alínea b)]. Neste último caso, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
“A efectivação do segundo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não implica a repetição do julgamento pelo tribunal de 2.ª instância – um novo julgamento, no sentido de produzir, ex novo, respostas aos quesitos da base instrutória – mas, apenas, verificar, mediante a análise da prova produzida, nomeadamente a que foi objecto de gravação, se as respostas dadas pelo tribunal recorrido têm nas provas suporte razoável, ou se, pelo contrário, a convicção do tribunal de 1.ª instância assentou em erro tão flagrante que o mero exame das provas gravadas revela que a decisão não pode subsistir” – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Junho de 2007 (disponível em www.dgsi.pt, processo 06S3540).
Assim, as disposições em causa não visam propriamente a concretização de um segundo julgamento que inclua a reapreciação global e genérica de toda a prova, tendo antes em vista um segundo grau de apreciação da matéria de facto, de modo a colmatar eventuais erros de julgamento, nos concretos pontos de facto que o recorrente assinala.
Importa ter presente a prevalência do princípio da liberdade de julgamento, consagrado no artigo 655.º do Código de Processo Civil e que tem inteira aplicação no âmbito do processo de trabalho, nos termos do qual o tribunal aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto controvertido; não invalida a convicção do tribunal o facto de não existir uma prova directa e imediata da generalidade dos factos em discussão, sendo legítimo que se extraiam conclusões em função de elementos de prova, segundo juízos de normalidade e de razoabilidade, ou que se retirem ilações a partir de factos conhecidos.
Por isso, a alteração da matéria de facto pela Relação deve ser realizada ponderadamente, em casos excepcionais e pontuais; só deverá ocorrer se, do confronto dos meios de prova indicados pelo recorrente com a globalidade dos elementos que integram os autos, se concluir que tais elementos probatórios, evidenciando a existência de erro de julgamento, sustentam, em concreto e de modo inequívoco, o sentido pretendido pelo recorrente.
Todavia, para que seja possível a reapreciação da matéria de facto, nos termos supra assinalados, mostra-se necessário que o recorrente dê cumprimento ao preceituado no artigo 685º-B, nºs 1 e 2, sob pena de rejeição do recurso.
No caso dos autos, nas conclusões de recurso, o recorrente assinala os factos cuja decisão sobre os mesmos questiona (embora de uma forma algo confusa).
Refere ainda que baseia a sua discordância com a decisão proferida sobre a matéria de facto, nos depoimentos prestados pelas testemunhas que identifica, indicando genericamente o dia em que os depoimentos foram prestados e o tempo de duração dos depoimentos.
Idêntica referência é feita nas alegações de recurso.
Ora, competia-lhe explicitar, pelo menos nas alegações de recurso, os concretos momentos da gravação correspondentes aos excertos dos depoimentos que, em seu entender, deveriam ter levado a uma decisão diferente da que foi tomada pelo tribunal de 1ª instância. Tanto mais, que a exacta indicação das passagens da gravação em que se fundamenta era-lhe perfeitamente possível, por ser visível na reprodução do registo a indicação do momento, até ao segundo.
Assim, não tendo o recorrente indicado com exactidão as passagens da gravação que está a tomar em consideração quando invoca o depoimento das testemunhas, e tendo procedido a transcrições parciais e incompletas de tais depoimentos, sem os localizar na gravação, consideramos que o recorrente não deu cumprimento integral ao disposto no artigo 685º B, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, pelo que, nos termos deste dispositivo legal se rejeita o recurso na parte que visava a reapreciação da prova.
*
VI. Da invocada inexistência de contrato de trabalho entre as partes processuais
Em sede de recurso, o recorrente insurge-se contra a circunstância de se ter entendido, na sentença sob recurso, que existia um contrato de trabalho entre as partes processuais.
Apreciemos então a questão, considerando a matéria de facto dada como assente pelo tribunal recorrido.
À situação em apreço nos autos é aplicável o Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei nº7/2009, de 12 de Fevereiro.
De harmonia com o disposto no artigo 11º do referido Código:
“Contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas”.
São pois características fundamentais do contrato de trabalho:
- a tipicidade (é um contrato dotado pela lei de um nomen juris e objecto de um regime legal privativo, composto em grande parte por regras injuntivas);
-a consensualidade (em regra, vigora o princípio da liberdade de forma, bastando o simples consenso das partes);
-a bilateralidade (é um contrato sinalagmático, ou seja, com obrigações para ambos os contraentes, havendo entre elas uma relação de correspectividade);
-a onerosidade (ambas as partes suportam esforços económicos, de acordo com uma equivalência pré-estabelecida);
-durabilidade (é um contrato tendencialmente duradouro).
Estas características, todavia, nem sempre são suficientes para distinguir o contrato de trabalho de outras figuras contratuais, que também as possuem.
Assim, a maior parte da doutrina e da jurisprudência, tem defendido que, para que se reconheça a existência de um contrato de trabalho, é fundamental que se verifique a subordinação jurídica do trabalhador.
Segundo Monteiro Fernandes, a subordinação jurídica, consiste “numa relação de dependência necessária da conduta pessoal do trabalhador na execução do contrato face às ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem”, (Dir. do Trabalho, 10ª ed., p.121).
Pela celebração do contrato de trabalho o trabalhador coloca-se, pois, “sob a autoridade e direcção ” da empregadora, a qual tem o poder de direcção da actividade do trabalhador- art. 97º do CT, a que corresponde o dever de obediência por parte deste - art. 128º, nº1, al.e) e nº2 do CT.
No contrato de trabalho é ao empregador que cabe programar, organizar e definir como, quando e com que meios deve cada trabalhador executar a sua actividade, de modo a melhor contribuir para os fins empresariais em vista (cfr. Galvão Teles, BMJ, 83, pag.165).
É que o conteúdo da prestação obrigacional é indeterminado, havendo sempre lugar a uma especificação pelo empregador, no que toca à modalidade concreta pretendida do serviço abstractamente prometido no contrato. E esta possibilidade do empregador moldar, organizar e dirigir a actividade do trabalhador , dentro dos termos do contrato e das normas que o regem , é que constitui a especificidade típica do contrato de trabalho.
Existem, contudo situações de particular complexidade, em que as ideias de subordinação e de autonomia se apresentam mais esbatidas e que coincidem, regra geral, com actividades de conteúdo muito técnico exercidas ou trabalhadores que não recebem sistematicamente ordens do empregador, pautando o exercício das suas funções mais por objectivos estabelecidos.
Mazzoni, citado por Monteiro Fernandes (ob. Cit., p.122), refere:
“Quanto mais o trabalho se refina e assume carácter intelectual, mais difícil é estabelecer uma nitída diferenciação , porque a subordinação tende a atenuar-se cada vez mais, na relação de trabalho subordinado, e a avizinhar-se daquela genérica supervisão , por parte do empregador, que se encontra também na relação de trabalho autónomo (...)”.
Por isso para se apreender a existência da subordinação jurídica, nestes casos, recorre-se a métodos aproximativos , baseados na interpretação de factores de indiciação: a vinculação a um horário, a execução da prestação em local definido pelo empregador, a existência de um controle externo do modo de prestação, a obediência a ordens e sujeição à disciplina da empresa; a retribuição em função do tempo de trabalho, a propriedade dos instrumentos de trabalho, a exclusividade da actividade laborativa, o pagamento dos subsídios de férias e de Natal, o gozo de férias, os regimes fiscais, de segurança social e a sindicalização do trabalhador.
Ensina, porém, Monteiro Fernandes:
Cada um destes elementos tomados per si , reveste-se de patente relatividade. O juízo a fazer, nos termos expostos, é ainda e sempre um juízo de globalidade, conduzindo a uma representação sintéctica da tessitura jurídica da situação concreta . Não existe fórmula que pré-determine o doseamento necessário dos indíces de subordinação, desde logo porque cada um desses indíces pode assumir um valor significante muito diverso de caso para caso” , (ob.cit., p. 133 e 134).
Feitas estas considerações sobre os critérios que têm vindo a ser utilizados para a qualificação e distinção do contrato de trabalho de outros contratos, importa referir que o artigo 12º do Código do Trabalho veio consagrar uma presunção de laboralidade, baseada nos principais elementos indiciadores do contrato de trabalho que já vinham sendo apontados pela Jurisprudência.
Escreveu-se no Livro Branco das Relações Laborais, 2007, pags 101 e 102, que, em face das insuficiências e controvérsias geradas pelas anteriores redacções do artigo 12º do Código de 2003 (a originária e a consagrada na Lei nº 9/2006, de 20/3), “a Comissão preconiza que a presunção legal adopte alguns dos indícios já consagrados pela jurisprudência, que, de acordo com as regras da experiência, correspondam a elementos mais frequentemente verificados nas relações de trabalho subordinado”.
Esta recomendação da Comissão foi levada em linha de conta, dando origem ao normativo inserto no artigo 12º do Código do Trabalho de 2009.
Foi assim intenção do legislador, que o ordenamento jurídico português consagrasse os indícios de laboralidade que a jurisprudência já vinha utilizando.
Mostra-se estipulado no aludido normativo, o seguinte:
“1-Presume-se a existência de contrato de trabalho quando, na relação entre a pessoa que presta uma actividade e outra ou outras que dela beneficiam, se verifiquem algumas das seguintes características:
a) A actividade seja realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado;
b) Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertençam ao beneficiário da actividade;
c) O prestador da actividade observe horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma;
d) Seja paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador da actividade, como contrapartida da mesma;
e) O prestador de actividade desempenhe funções de direcção ou chefia na estrutura orgânica da empresa”.
Da redacção deste normativo, resulta assim, que, para que esteja preenchida a presunção, mostra-se necessário que estejam reunidos alguns dos elementos referidos nas alíneas do nº1.
Utilizando a lei a palavra “alguns”, tal significa que, pelo menos, têm de estar reunidas duas das circunstâncias previstas no nº1 do artigo 12º.
A Doutrina portuguesa tem-se pronunciado sobre a presunção de laboralidade prevista neste normativo.
João Leal Amado, (Contrato de Trabalho, 2ª edição, Coimbra Editora, págs 80-81), escreveu:
«A lei selecciona um determinado conjunto de elementos indiciários, considerando que a verificação de alguns deles (dois?) [] bastará para a inferência da subordinação jurídica. Assim sendo, a tarefa probatória do prestador de actividade resulta consideravelmente facilitada. Doravante, provando o prestador que, in casu, se verificam algumas daquelas características, a lei presume que haverá um contrato de trabalho, cabendo à contraparte fazer prova em contrário» […] Tratando-se de uma presunção juris tantum (art. 350.º do CCivil), nada impede o beneficiário da actividade de ilidir essa presunção, demonstrando que, a despeito de se verificarem aquelas circunstâncias, as partes não celebraram qualquer contrato de trabalho. Mas, claro, o ónus probandi passa a ser seu (dir-se-ia que a bola passa a estar do seu lado, pelo que, não sendo a presunção ilidida, o tribunal qualificará aquele contrato como um contrato de trabalho, gerador de uma relação de trabalho subordinado [].».
Também Maria do Rosário Palma Ramalho, (Direito do Trabalho, Parte II, 3ª edição, Almedina, págs 48-49), opinou sobre o normativo em apreciação, mencionando:
«Ainda com referência à qualificação do contrato de trabalho a partir dos indícios de subordinação jurídica, cabe uma nota sobre a presunção da existência de contrato de trabalho []. Esta presunção foi instituída, após sucessivas tentativas [], pelo Código do Trabalho de 2003 (art. 12.º), foi alterada, ainda na vigência deste Código, pela L. n.º 9/2006, de 20 de Março [], e consta agora, como significativas modificações, do art. 12.º do Código do Trabalho de 2009.
A utilidade do estabelecimento desta presunção no Código do trabalho é a inversão do ónus da prova da existência do contrato de trabalho, nos termos do art. 350.º do CC []; na presença dos indícios enunciados no art. 12.º do CT, o trabalhador fica dispensado de demonstrar, nos termos gerais do art. 342.º do CC, que desenvolve uma actividade laborativa retribuída para o empregador e que se encontra numa posição de subordinação, para lograr a qualificação do negócio como um contrato de trabalho [].
Naturalmente, sendo a presunção ilidível, como é de regra, a qualificação laboral do negócio pode ser afastada (art. 350.º, n.º 2 do CC), se o empregador provar a autonomia do trabalhador ou a falta de outro elemento essencial do contrato de trabalho []. Além disso, a presunção não é impeditiva de que o trabalhador possa fazer prova da existência do contrato de trabalho com recurso directo ao art. 11.º da LCT, se não puder fazer valer os requisitos da presunção [].».
Em suma, em face da presunção estabelecida pelo artigo 12º do Código do Trabalho, ao reclamante da qualidade de trabalhador, basta-lhe apenas provar a verificação de, pelo menos, duas das situações previstas nas diversas alíneas do nº1 do preceito, para que beneficie da presunção de contrato de trabalho.
Tal presunção é porém ilidivel, pois trata-se de uma presunção juris tantum (artigo 350º do Código Civil), cabendo à parte contrária demonstrar que, não obstante a verificação das circunstâncias apuradas, existem factos e contra-indícios indicadores de autonomia, que sejam quantitativa e qualitativamente significativos para permitirem a descaracterização.
Posto isto, apreciemos o caso concreto.
E, com relevo, resultou provado, no essencial que, em 29 de Junho de 2009, as partes processuais celebraram, entre si, um acordo verbal, no âmbito do qual o autor se obrigou a executar trabalhos agrícolas e outros serviços determinados pelo réu, no Monte do Turrenho e na Quinta das Cruzes, prédios na posse do réu.
Como contrapartida da actividade desenvolvida, o réu obrigou-se a pagar ao autor a quantia líquida de € 30,00, diários.
Ou seja, por acordo, entre as partes, o autor passou a desenvolver uma actividade determinada pelo réu, pela qual recebia uma contrapartida monetária, independentemente do resultado dessa actividade.
Para o exercício da actividade desenvolvida, o autor estava sujeito, por determinação do réu, ao cumprimento de um horário de trabalho.
O réu determinava, dirigia e verificava os trabalhos executados pelo autor.
Para a actividade a que se obrigou, o autor utilizava as alfaias agrícolas necessárias existentes nos prédios, isto é, o autor utilizava instrumentos de trabalho pertencentes ao réu.
Deste modo, resulta da factualidade assente que, entre as partes processuais, existia um verdadeiro contrato de trabalho subordinado. O autor obrigou-se, mediante retribuição, a prestar uma actividade ao réu, mediante a autoridade e fiscalização por este exercida, numa verdadeira expressão da existência de subordinação jurídica.
Tendo a sentença sob recurso decidido neste sentido, nenhuma censura nos merece a mesma quanto à concreta questão analisada.
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VII. Da invocada exclusão do acidente em apreço nos autos do conceito de acidente de trabalho
No âmbito das alegações de recurso, o apelante insurge-se contra a circunstância do tribunal recorrido, não ter enquadrado a relação entre as partes como de trabalho de muito curta duração, nos termos previstos pelo artigo 142º do Código do Trabalho, o que excluiria qualquer responsabilidade pela reparação do acidente, nos termos previstos pelo artigo 8º, nº1, alíneas a) e b) da Lei dos Acidentes do Trabalho (doravante designada apenas por LAT).
Cumpre apreciar.
Ao caso concreto é aplicável o regime jurídico previsto pela Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, uma vez que o acidente em discussão ocorreu em 4 de Setembro de 2009.
De harmonia com o disposto no artigo 8º, nº1 da LAT, são excluidos do regime jurídico previsto neste diploma:
a) Os acidentes ocorridos na prestação de serviços eventuais ou ocasionais, de curta duração, a pessoas singulares em actividades que não tenham por objecto exploração lucrativa;
b) Os acidentes ocorridos na execução de trabalhos de curta duração se a entidade a quem for prestado o serviço trabalhar habitualmente só com membros da sua família e chamar para o auxiliar, acidentalmente, um ou mais trabalhadores.
Estas exclusões, porém, não abrangem os acidentes que resultem da utilização de máquinas e de outros equipamentos de especial perigosidade, nos termos previstos pelo nº2 do normativo.
Conforme refere Carlos Alegre, in “Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais”, 2ª edição, pág. 66, “ a eventualidade ou ocasionalidade e a curta duração são os dois elementos, pedra de toque, para a exclusão do acidente do conceito de acidente de trabalho; pelo contrário, mesmo que se verifique a eventualidade ou a ocasionalidade e a curta duração, mas desde que os serviços sejam prestados em actividade que tenha por objecto exploração lucrativa, ou se a entidade empregadora (que na circunstância só pode ser uma pessoa singular) trabalhar habitualmente só ou com membros da sua família, ou se forem utilizadas máquinas ou outros equipamentos de especial perigosidade, os acidentes ocorridos já serão qualificados de trabalho”.
Serviço eventual ou ocasional é aquele cuja necessidade surge, imprevista e excepcionalmente, em determinada ocasião, não sendo de exigir a sua periodicidade - Carlos Alegre, obra citada, pág. 66.
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27-2-91,
in BMJ nº 404 pág. 316, ao debruçar-se sobre o trabalho de curta duração, ocasional ou eventual, refere que há prestação de serviços eventuais quando estes se apresentam como contingentes, de inserção temporal indeterminável, ainda que previsíveis e há prestação de serviços ocasionais quando estes sejam fortuitos, de verificação imprevisível.
Quanto ao conceito de “curta duração”, o mesmo não se mostra definido por lei, pelo que tem sido deixado à jurisprudência o critério da sua determinação.

No acórdão do Supremo tribunal de Justiça de 20-3-87, in BMJ 365, pág. 509, aceitando no que toca à curta duração, a noção trazida pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12-7-49, considera-se que é serviço eventual ou ocasional de curta duração o que dure menos de uma semana.
O artigo 142º, nº1 do Código do Trabalho também acolhe a duração temporal de uma semana para a definição de contrato de trabalho de muito curta duração.
A eventualidade, ocasionalidade ou curta duração dos serviços prestados, traduz-se numa circunstância impeditiva do direito invocado pelo que o ónus da prova recai sobre a pessoa a quem os serviços são prestados, nos termos do nº 2 do artigo 342º, do Código Civil.
No caso concreto, apesar do réu ter alegado que a uva resultante da vinha existente na Quinta do Turrenho se destinava ao consumo doméstico e que as vindimas eram feitas com auxílio de pessoas da família, designadamente do seu filho, tal matéria factual não foi dada como provada.
O que se provou foi que o autor foi contratado 29 de Junho de 2009 e, em 4 de Setembro do mesmo ano (data do acidente), ainda se encontrava a executar os trabalhos para que foi contratado, o que exclui de imediato a possibilidade de se considerar que se está perante um trabalho de curta duração, uma vez que se ultrapassa em muito a duração de uma semana que tem sido entendida como “curta duração” ou de 60 dias, prevista no nº 2 do artigo 142º do Código do Trabalho.
Mais se provou que, desde a data do início do contrato até ao dia do acidente, o autor prestou as seguintes tarefas:
-procedeu à vindima das uvas da vinha existente no Monte do Turrenho; à sua colocação em caixas de plástico; carregamento dessas caixas para a carrinha de caixa aberta disponibilizada pelo réu; conduzia a carrinha com as caixas até à adega existente no Monte do Turrenho; aí, procedia a trabalhos de esmagamento das uvas e de limpeza do esmagador/desengaçador das uvas. Também procedeu a trabalhos não concretamente determinados na vinha e relacionados com a produção de vinho;
- procedeu à limpeza do mato na Quinta das Cruzes;
- procedeu ao tratamento de duas éguas que o réu mantinha na Quinta das Cruzes, às quais dava água, ração e palha.
Ora, as actividades desenvolvidas não se podem considerar eventuais ou ocasionais. Não são actividades que surgiram de uma forma imprevista ou ocasional. São, antes, actividades normais e regulares de uma exploração agrícola e do tratamento de animais.
Além disso, o acidente ocorrido com o autor resultou da utilização de uma máquina (emagador/desengaçador de uvas), com que o autor tinha de operar no exercício das funções para que foi contratado.
Acresce que, para proceder à apanha das uvas, o réu contratou mais três trabalhadores, o que permite concluir que o trabalho não era efectuado só com membros da família do réu.
Em face de toda esta factualidade, é manifesto que o réu não logrou provar a verificação de qualquer uma das causas de exclusão previstas no artigo 8º da LAT.
Logo, não há fundamento para se excluir o acidente que vitimou o autor, descrito nos autos, do regime jurídico de reparação de acidentes de trabalho, previsto pela Lei nº 100/97.
Destarte, mostra-se improcedente, o recurso, na parte agora analisada.
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VIII. Da descaracterização do acidente
Em sede de recurso, veio o apelante invocar que a responsabilidade da produção do acidente é exclusivamente do autor (conclusão 79.)
Com tal imputação da responsabilidade ao sinistrado, no fundo, pretende o recorrente que o tribunal ad quem descaracterize o acidente ou reconheça que o mesmo não dá direito a qualquer reparação, nos termos previstos pelo artigo 7º da LAT.
Esta pretensão do recorrente estava dependente da alteração da matéria de facto que não se verificou.
Mesmo assim, iremos apreciar os factos assentes e concluir, como veremos, pela improcedência deste fundamento de recurso.
O artigo 7º da LAT exclui o direito à reparação do acidente em caso de responsabilidade do trabalhador pela sua ocorrência ou em caso de força maior.
As diversas situações em que se considera que há responsabilidade do trabalhador vêm previstas nas alíneas a) a c) do nº1 do aludido artigo 7º.
Vejamos, então, se no caso em apreço nos autos, se mostra verificada alguma das situações legalmente previstas.
Resultou provado, com relevo para a apreciação da questão, o seguinte:
- o esmagamento das uvas e a limpeza do esmagador/desengaçador integravam as funções a que o autor estava obrigado. Na altura do acidente, o autor procedia à limpeza do esmagador/desengaçador de uvas, dela retirando os restos de engaço;
- no dia 4 de Setembro de 2009, o autor agarrou a borda superior do receptáculo do esmagador/desengaçador de uvas e sofreu uma descarga eléctrica, ficando “agarrado” à máquina. De imediato gritou para desligarem a máquina da corrente. Quando alguém desligou o quadro eléctrico o autor caiu para o chão. O autor sofreu uma electrocussão, com as consequências descritas na factualidade dada como assente;
- a descarga eléctrica ocorrida, deveu-se à falta de isolamento do cabo eléctrico, juntamente com a existência de líquido proveniente do esmagamento das uvas no esmagador/desengaçador;
- o esmagador/desengaçador tinha um cabo eléctrico que o ligava à corrente. Tal cabo eléctrico vinha de uma dependência imediatamente contígua à adega, (onde se situava o esmagador/desengaçador), pelo chão, passando pelo exterior até à adega onde estava ligado, através de cabos com enxertos efectuados com fita adesiva, ao cabo eléctrico de uma tomada tripla;
- na altura do acidente, o esmagador/desengançador tinha o interruptor que se encontrava na própria máquina, accionado na posição de desligado e a máquina estava parada.
Ora, em face deste contexto factual, não se pode considerar que a ocorrência do acidente se deveu a actuação dolosa ou negligente do autor.
Não há qualquer acto da vítima que deliberadamente tenha querido a ocorrência, conformando-se com todas as suas consequências.
Também não se verifica qualquer violação dos deveres de cuidado a que estava obrigado no manuseamento da máquina ou qualquer outra actuação ou omissão grave e indesculpável, que tenha criado ou potenciado a verificação do evento lesivo.
Não se provou que o autor tivesse ordens e instruções específicas dadas pelo réu para operar com a máquina ou fazer a limpeza da mesma, de modo diferente daquele com que actuou.
Era, à entidade empregadora que competia adoptar, no local do trabalho, todas as medidas legalmente impostas para garantir a segurança e saúde no trabalho (artigo 127º, nº1, alínea h) do Código do Trabalho).
E, conforme Doutamente se referiu na sentença sob recurso:
“Não venha, por outro lado, argumentar-se que, tendo conhecimento do estado em que se encontrava o cabo eléctrico, deveria o Autor, por moto próprio, ter recusado a prestação laboral em tais circunstâncias, pois não se coloca sobre o trabalhador o ónus de verificar as condições de segurança dos equipamentos de trabalho previamente à sua utilização, impondo-se sim à entidade empregadora o dever de assegurar a prestação laboral em condições de segurança, salubridade e higiene, o que não se verificou de todo nos presentes autos”.
Em suma, consideramos, que em face dos factos assentes, não resulta demonstrada a verificação de qualquer uma das situações previstas nas alíneas a) a c) do nº1 do artigo 7º da LAT, por forma a concluir-se que o acidente em apreço nos autos, ocorreu por responsabilidade do sinistrado.
Deste modo, mostra-se improcedente o recurso, na parte agora analisada.
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IX. Recurso subordinado – do subsídio para readaptação
No âmbito do recurso subordinado interposto, veio o autor invocar que o réu deve ser condenado no pagamento da quantia de € 5.400,00, peticionada na alínea h) da petição inicial, relativa às despesas que terá de suportar com a readaptação da habitação, pois, em seu entender, o artigo 24º da LAT deve ser interpretado em sentido lato, sob pena de violação do disposto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
Apreciemos a questão suscitada.
Dispõe o normativo inserto no artigo 24º da LAT:
“A incapacidade permanente absoluta confere direito ao pagamento das despesas suportadas com a readaptação de habitação, até ao limite de 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data do acidente”.
Esta prestação em dinheiro foi introduzida no nosso ordenamento jurídico precisamente pela Lei nº100/97, aplicável ao caso concreto (cfr. artigo 10º, alínea b) da LAT).
O diploma regulamentar desta Lei, mostra-se absolutamente omisso quanto à especificação das condições para a atribuição deste subsídio, nomeadamente, quem determina a necessidade de obras de “readaptação” da habitação do sinistrado, quem avalia os aspectos técnicos específicos dessas obras, quem verifica os custos, o tempo necessário ou limite para a realização dessas obras, se já têm de estar feitas para serem ressarcidas ou se basta demonstrar a necessidade da sua realização.
Assim tem sido à jurisprudência que, mais uma vez, cabe explicitar aquilo que o legislador não consagrou.
No caso concreto, a questão que se suscita tem a ver com a interpretação da expressão “despesas suportadas”, contemplada no artigo 24º da LAT.
Será que para a atribuição do subsídio em discussão, o sinistrado tem que provar que já suportou o custo das obras de readaptação da sua habitação, que se mostravam necessárias ?
Ou, será que tem apenas de demonstrar que tais obras se mostram necessárias e o custo previsível das mesmas?
Afigura-se-nos que a resposta afirmativa à segunda questão é a mais correcta, pois se o sinistrado demonstrar a verificação de um dano futuro, previsível e indemnizável nos termos do artigo 564º, nº2 do Código Civil, tal dano é abrangido pela responsabilidade pela reparação do acidente e integra-se na prestação em dinheiro prevista nos artigos 10º, alínea b) e 24º da LAT (neste sentido, veja-se o Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/11/2007, P. 07S2716 e Acordão da Relação de Lisboa, de 21/3/2007, P. 23/2007-4, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
Posto isto, resta apreciar se o autor logrou provar, no caso concreto, como consequência do acidente, o dano futuro, previsível e indemnizável consubstanciado na necessidade de realizar obras de readaptação da sua habitação.
Com relevo para a apreciação da questão, resultou apenas provado que, em consequência do acidente de trabalho sofrido, o autor tem de ser transportado em cadeira de rodas.
Todavia, não logrou o autor demonstrar que necessitava de realizar obras de readaptação da sua habitação à sua nova situação dependente de cadeira de rodas e o custo de tais obras.
Logo, em face da factualidade assente, não resultou provado que o autor tenha necessidade de readaptar a sua habitação, assim como que já a tenha readaptado ou qual o montante que tem necessidade de despender para a readaptar.
Em suma, não se encontra demonstrada a situação legalmente prevista para a atribuição do subsídio consagrado no artigo 24º da LAT, pelo que o autor não tem direito ao pedido formulado na alínea h) da petição inicial.
O decidido prejudica, naturalmente, o conhecimento da invocada violação do artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos, improcede o recurso subordinado, quanto à questão agora analisada.
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X. Recurso subordinado – das despesas que venha a efectuar com assistência médica e outras
Invoca o recorrente que o réu deve ser condenado a pagar, para além das despesas já efectuadas, as despesas que o autor, por causa do acidente, eventualmente venha a efectuar e que se provaram ser necessárias, conforme peticionado na alínea m) da petição inicial.
Cumpre apreciar.
De harmonia com o disposto no artigo 10º, alínea a) da LAT, o direito à reparação compreende, nos termos que vierem a ser regulamentados, as seguintes prestações em espécie: prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quasiquer outras , seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida activa.
O artigo 23º do Decreto-Lei nº 143/99, de 30/4, consagra as modalidades das prestações em espécie previstas no aludido artigo 10º, alínea a).
Na alínea m) do pedido formulado na petição inicial, o autor havia solicitado que o réu fosse condenado a:
“pagar ao Autor as despesas que ele eventualmente venha a efectuar com assistência médica e cirúrgica, geral ou especializada, incluindo todos os necessários elementos de diagnóstico e de tratamento e a assistência psíquica; assistência farmacêutica; enfermagem; hospitalização e tratamentos termais; hospedagem; transportes para observação; tratamento ou comparência a actos judiciais; fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação e reabilitação funcional”.
Em relação a este pedido, o tribunal decidiu condenar o réu a pagar ao autor:
“- A quantia de 11.795,70 (onze mil, setecentos e noventa e cinco euros), a que acresce IVA à taxa legal em vigor, relativamente aos equipamentos de que o Autor terá que dispor em virtude da sua incapacidade, e, bem assim, a quantia anual de 14.300,00 euros referente a despesas de deslocação diárias, de 2ª a 6ª feira, entre sua casa e o Hospital de Portalegre.
- A quantia de 1.757,13 (mil, setecentos e cinquenta e sete euros e treze cêntimos) referente a despesas já realizadas pelo Autor em deslocações e em medicamentos.
Para tanto, baseou-se no seguinte:
“Compulsados os autos, verifica-se ter resultado provado que o Autor necessita, mercê do acidente de trabalho por si sofrido e das lesões físicas daquele decorrentes de: cadeira de rodas de comando eléctrico com capacidade para subir e descer escadas e rampas em alumínio de valores não concretamente apurados, cadeira de rodas eléctrica no valor de 2.160,00 euros, cadeira de rodas simples no valor de 200,00 euros, sofá eléctrico no valor de 607,60 euros, cama articulada no valor de 954,90, colchão tratamento de escaras no valor de 348,40 euros, assento de duche rebatível no valor de 94,50 euros, almofada de gel de 4Kg no valor de 80,00 euros, grua de transferência no valor de 1.012,90 euros, standing frame para verticalização no valor de 861,40 euros, sistema aumentativo de comunicação e ajuda técnica 5.476,00 euros, tudo computado no valor global de 11.795,70 euros, a que acresce IVA à taxa legal em vigor,
O Autor tem ainda direito às despesas que irá suportar com deslocações diárias, de 2ª a 6ª feira, entre sua casa e o Hospital de Portalegre, as quais se computam em 55,00 euros por dia e se cifram na quantia anual de 14.300,00 euros (55 x 5 = 275 x 52 = 14.300,00).
Acrescem ainda as despesas já realizadas pelo Autor em deslocações e em medicamentos e afins, por causa do acidente sofrido, as quais se computam em 1.757,13 € e a que o Autor tem, igualmente, direito”.
Ou seja, o tribunal condenou apenas o réu nas concretas prestações, cuja expressão pecuniária foi possível apurar na factualidade dada como assente.
Contudo, para além das necessidades e despesas constantes dos factos assentes relevadas para efeitos de condenação da ré, também resultou provado que o autor necessitará, até ao final da sua vida, de tratamentos de fisioterapia para reabilitação funcional, de assistência médica, incluindo elementos de diagnóstico e de tratamento, de assistência farmacêutica; de transportes para observação, tratamento e comparência a actos judiciais; de fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação; e de assistência psíquica (factos 82 a 85).
Deste modo, o autor logrou provar que, em consequência do acidente, sofrerá danos futuros previsíveis.
Tais danos estão abrangidos pelo direito à reparação do acidente.
Ora, considerando o pedido formulado na alínea m) da petição inicial, a factualidade assente e o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 10º, alínea a) da LAT e 23º do Decreto-Lei nº 143/99, não poderia o tribunal deixar de condenar o réu a satisfazer os tratamentos de fisioterapia para reabilitação funcional, a assistência médica, incluindo elementos de diagnóstico e de tratamento, a assistência farmacêutica, os transportes para observação, tratamento e comparência a actos judiciais, o fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação e a assistência psíquica que o autor venha a necessitar, em consequência do acidente, até ao final da sua vida.
Pelo exposto, procede, nesta parte, o recurso subordinado interposto, pelo que há que revogar a sentença recorrida, no sentido de condenar, também, o réu nas prestações em espécie mencionadas.
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XI. Recurso subordinado – do valor da indemnização por danos não patrimonias
No âmbito do recurso subordinado interposto, veio o autor discordar do quantum indemnizatório fixado pelo tribunal a quo, para ressarcimento dos danos morais.
Na petição inicial apresentada, o autor pediu a condenação do réu no pagamento de uma indemnização não inferior a € 200.000,00, pelos danos morais sofridos.
Na sentença sob recurso considerou-se justo e adequado fixar a peticionada indemnização no montante de € 120.000,00, tendo em conta a idade do autor, o grau de incapacidade sofrido e o nível de dependência daí adveniente.
Cumpre apreciar.
É consabido que os danos não patrimoniais são aqueles que não sendo susceptíveis de avaliação pecuniária, apenas podem originar uma compensação material visando, dentro do possível, equilibrar ou atenuar os efeitos produzidos por esses danos.
O artigo 496º, nº1 do Código Civil, admite a indemnização dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
No caso concreto, resultou provado, considerando a factualidade descrita nos pontos 51 a 67, que o autor, em consequência do acidente de trabalho em apreço nos autos, sofreu diversos danos não patrimoniais, de extrema gravidade e que irão perdurar no tempo.
O autor, à data do acidente era um jovem adulto, com 18 anos de idade, com uma vida profissional, pessoal, familiar e social pela frente e que, devido ao acidente, ficou com uma incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, dependente de cadeira de rodas, dependente de terceira pessoa em termos de higiene, alimentação e vestuário, ficou impotente e não poderá ter filhos, vive isolado, sofre de ausência de discurso, tem todo o seu quotidiano modificado e determinado pelo seu estado irreversível (deslocações a hospitais e tratamentos). Sofreu e sofre dores, incómodos físicos intensos, vive deprimido, triste e angustiado, revoltado e com medo.
Os danos sofridos são, de harmonia com o disposto no artigo 496º do Código Civil, indemnizáveis.
O montante da indemnização terá de ser fixado com equidade, nos termos previstos pelo nº3 do aludido artigo 496º.
Para apreciação do quantum indemnizatório a fixar, torna-se importante fazer um termo de comparação com casos semelhantes ao dos autos, que já tenham sido apreciados em termos jurisprudenciais.
Nessa tarefa comparativa, muito nos auxilia o recente Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/2/2013, P. 4072/04.0TVLSB.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt, onde se expõem as decisões mais recentes daquele Tribunal Superior quanto aos montantes indemnizatórios atribuidos, com referência aos danos não patrimoniais.
Aí se escreveu:
“Assim, sem preocupação de exaustão, temos os seguintes montantes compensatórios aqui fixados, sempre com referência aos danos não patrimoniais (sendo a alusão às sequelas feita de modo muito sumário, com possibilidade fácil de consulta detalhada no referido sítio, esta exceto quanto aos dois arestos indicados no fim):
De € 400.000 – lesada de 19 anos de idade, com tetraplegia, diminuição acentuada da função respiratória, incapacidade total para o trabalho, perda de sensibilidade do pescoço para baixo, com exceção dos ombros, necessidade de assistência permanente de outras pessoas - Ac. de 2.3.2011, processo n.º1639/03.8TBBNV.L1;
De € 120.000 (que, por razões processuais, se não podia majorar, tendo o Tribunal referido expressamente que esta quantia “nada peca por excesso, antes pelo contrário”) – menor de 10 anos, com tetraplegia, incapacidade permanente para o trabalho de 80%, necessidade de apoio permanente de terceiro especializado e dores em grau muito elevado - Ac. de 6.3.2011, processo n.º 1879/030TBACAB.C1.S1;
De € 150.000 – lesado de 28 anos, com hemiparésia direita, incapacidade de se manter em pé sozinho, incapacidade permanente geral de 80%, necessidade de ajuda de terceira pessoa para se lavar, vestir e calçar – Ac. de 07.10.2010, processo n.º 839/07.6TBPFR.P1.S1
De € 250.000 – lesado de 23 anos de idade, com paraplegia, dependente de cadeira de rodas (sem conseguir mesmo manter-se sentado muito tempo) e necessidade de ajuda de terceira pessoa para todas as tarefas - Ac. de 7.06.2011, processo n.º 524/07.9 TCGMR.G1.S1.
De € 180.000 – lesada de 29 anos, com encurtamento do membro inferior esquerdo de 4cm, cicatrizes exteriores dispersas, grande dificuldade em caminhar, impossibilidade de se agachar na posição de cócoras e ajoelhar, grande dificuldade da realização de todas as atividades normais da via diária, claudicação acentuada da marcha e risco de fazer episódios de embolias pulmonares e cerebrais – Ac. de 23.10.2008, processo n.º 08B2318;
De € 150.000 (estando apenas em questão, por razões processuais, a minoração deste montante que já vinha da Relação) – lesado de 32 anos, com paraplegia, perda de sensibilidade abaixo da cintura, deslocação em cadeira de rodas e necessidade de ajuda de terceira pessoa – Ac. de 7.6.2011, processo n.º 3515/05.0TBLRA.E1.S1.
De € 350.000 (com redução em 50% por o sinistrado ter contribuído, nessa proporção, para os danos) – lesado de 28 anos, para sempre totalmente impossibilitado de exercer a sua atividade principal ou qualquer outra, acamado e dependente, com incontinência urinária e fecal, sem possibilidade de resposta mesmo a pequenas frases, sem posse das suas capacidades cognitivas, com necessidade constantemente do apoio de terceira pessoa para satisfação das suas necessidades diárias, com deslocação em cadeira de rodas, quantum doloris de grau máximo (7), dano estético em grau 5 numa escala também até 7 e em grau máximo (5) o prejuízo de afirmação pessoal e sexual – Ac. de 24.3.2011, revista n.º 36/2007, da 2.ª secção”.
Ora, considerando este padrão geral a ter em conta para a compensação deste tipo de danos não patrimoniais, afigura-se-nos que, considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, supra explanadas, se mostra equitativamente adequado fixar em € 200.000,00 o montante da compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo autor.
Pelo exposto, mostra-se procedente o recurso subordinado, na parte agora analisada.
Em consequência, impõe-se a revogação da sentença recorrida em relação ao quantum indemnizatório fixado pelos danos não patrimoniais sofridos pelo autor.
Concluindo, o recurso subordinado, mostra-se parcialmente procedente.
Custas pelas partes, na proporção do respectivo decaimento (artigo 446º do Código de Processo Civil), sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
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XII. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar improcedente o recurso de apelação e parcialmente procedente o recurso subordinado, e em consequência, revogam parcialmente a sentença recorrida, condenando o réu no pagamento ao autor:
a) Das despesas que até ao final da vida o mesmo venha a efectuar, em consequência do acidente de trabalho, com tratamentos de fisioterapia para reabilitação funcional, de assistência médica, incluindo elementos de diagnóstico e de tratamento, de assistência farmacêutica; de transportes para observação, tratamento e comparência a actos judiciais; de fornecimento de aparelhos de prótese, ortótese e ortopedia, sua renovação e reparação; e de assistência psíquica;
b) De uma indemnização por danos não patrimoniais sofridos pelo autor, no montante de € 200.000,00;
c) No mais, mantém-se a sentença recorrida.
Custas pelas partes, na proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Notifique.
Évora, 2 de Maio de 2013
(Paula Maria Videira do Paço)
(Acácio André Proença)
(José António Santos Feteira)