Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1167/12.0TBSLV-A.E1
Relator: FRANCISCO MATOS
Descritores: CUSTAS
RECLAMAÇÃO CONTRA DESPACHO QUE NÃO ADMITIR OU RETIVER RECURSO
Data do Acordão: 11/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: A reclamação contra o despacho que não admita o recurso está sujeita ao pagamento da taxa de justiça entre 1 a 3 Ucs., a liquidar previamente pelo seu valor mínimo, sem prejuízo do pagamento do excedente, se o houver, a final.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório.
1. Na ação declarativa, com processo sumário, em que são autores AA e Christiane BB e réus CC e DD, vieram estes reclamar para esta Relação do despacho que não admitiu o recurso da decisão que não admitiu o pedido reconvencional que haviam deduzido na contestação.
A reclamação mereceu o seguinte despacho:
“Embora a reclamação apresentada pelos RR tenha sido deduzida tempestivamente, e o requerimento exponha as razões que justificam a admissão e indique os elementos com que pretende que a mesma seja instruída, não foi contudo liquidada a taxa de justiça devida, com referência a tabela II, anexa ao regulamento das custas processuais.
Acresce, que dado cumprimento ao disposto no artº 642º, nº1 do CPC (cfr. fls. 31) o reclamante nada pagou.
Nestes termos, e atento o disposto 642º, nº 2 do CPC, determino o desentranhamento da reclamação apresentada.
Notifique e após trânsito, desentranhe.”

2. É deste despacho que os réus CC e DD recorrem, formulando as seguintes conclusões:
“ A. Ao contrário que o douto despacho recorrido concluiu, não existe qualquer fundamento para mandar desentranhar, a reclamação apresentada pelos RR., pelo facto de não terem pago a taxa justiça, apesar de notificados para o efeito;
B. A reclamação contra o indeferimento da admissibilidade do recurso, não está sujeita ao pagamento de qualquer taxa de justiça pela sua apresentação;
C. Não decorre actual artigo 643.º do C.P.Civil e do anterior constante do artigo 688.° do C.P.Civil, que a reclamação contra o indeferimento da admissibilidade do recurso esteja sujeita ao pagamento prévio da taxa de justiça.
D. Assim, é manifesto que o despacho recorrido, não tem qualquer suporte legal ou processual, não assenta em nenhuma disposição legal para o efeito.
E. O despacho decorrido viola as disposições constantes dos artigos 643º e 699º do actual e anterior C.P.Civil e ainda o artigo 7.° do actual Regulamento das Custas Judicias.
F. Nestes termos e nos demais de Direito que V.Exas. mui doutamente suprirão, deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro, que mande subir a reclamação ao Exmº Senhor Doutor Juiz Desembargador Presidente do Venerando Tribunal da Relação de Évora.
Assim se fará justiça”.
Não houve lugar a resposta.
Observados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Objeto do recurso.
Considerando as conclusões da motivação do recurso, importa decidir se a reclamação contra o despacho que não admita o recurso está sujeita ao pagamento prévio de taxa de justiça.

III. Fundamentação.
1. Factos.
Releva para a apreciação do recurso os factos supra relatados em I.1.

2. Direito.
2.1. Lei processual aplicável.
A ação deu entrada em juízo no ano de 2012, encontrava-se pendente em 1/9/2013, a decisão recorrida foi proferida em 13/3/2014 e a decisão reclamada foi exarada em 18/12/2013.
Ao recurso é aplicável o Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, diploma que é igualmente aplicável à questão de mérito neste suscitada (artºs 5º, nº1, 7º, nº1 e 8º, todos da referida Lei).

2.2. Se a reclamação contra o despacho que não admita o recurso está sujeita ao pagamento prévio de taxa de justiça.
Dispõe o artº 1º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo DL n.º 34/2008, de 26/2 (sucessivamente alterado pela Lei n.º 43/2008, de 27/8, DL n.º 181/2008, de 28/8, Lei n.º 64-A/2008, de 31/12, Lei n.º 3-B/2010, de 28/4, DL n.º 52/2011, de 13/4, Lei n.º 7/2012, de 13/2, Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, DL n.º 126/2013, de 30/8 e Lei n.º 72/2014, de 02/9) que:
“1- Todos os processos estão sujeitos a custas, nos termos fixados pelo presente Regulamento.
2 - Para efeitos do presente Regulamento, considera-se como processo autónomo cada ação, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria”.
A regra, é pois, a sujeição a custas de todos os processos.
Como ensina Manuel de Andrade, “o processo (em sentido jurídico) é um verdadeiro procedimento, traduzido num encadeamento de atos destinados a desembocar em certo fim (providência jurisdicional)” [Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pá. 4].
A reclamação contra o despacho que não admite o recurso tem início com um requerimento do recorrente dirigido ao tribunal que seria competente para dele conhecer, o recorrido pode responder à reclamação, a reclamação é autuada por apenso aos autos principiais, instruída com o requerimento da interposição do recurso, as alegações, a decisão recorrida e o despacho objeto de reclamação e, após distribuída, é apresentada ao relator, que profere decisão a admitir o recurso ou a manter o despacho reclamado decisão que, por sua vez, é suscetível de reclamação para a conferência (artºs 643º, nºs. 1 a 4 e 652º, nº3, ambos do CPC).
A reclamação contra o despacho que não admite o recurso comporta, assim, um encadeamento de atos destinados à apreciação e reconhecimento da admissibilidade do recurso constituindo um processo em sentido jurídico e, como tal, sujeito a custas.
E estando sujeita a custas é devida a taxa de justiça, cujo pagamento é obrigatório (artº 642º, nº1, do CPC) pelo impulso processual do interessado (artº 6º, nº1, do RCP) “que demande na qualidade de autor ou réu, requerente ou requerido, recorrente e recorrido (artº 530º, nº1, do CPC).
Pelo impulso processual da reclamação é, pois, devida taxa de justiça.
Os recorridos divergem deste entendimento na consideração que nem o artigo 643.º do C.P.Civil vigente, nem o artigo 688.° do C.P.Civil pregresso ou o artº 7º do RCP preveem a sujeição da reclamação ao pagamento prévio da taxa de justiça.
A sujeição ou imunidade da reclamação ao pagamento de taxa de justiça há-de encontrar-se nas regras relativas às custas processuais e não em normas do processo civil que disciplinam o próprio procedimento pelo que, não se estranhará, a sua não inclusão nas normas processuais anotadas pelos recorrentes.
O mesmo, porém, não se dirá do artº 7º do RCP, donde resulta, que:
1 - A taxa de justiça nos processos especiais fixa-se nos termos da tabela i, salvo os casos expressamente referidos na tabela ii, que fazem parte integrante do presente Regulamento.
2 - Nos recursos, a taxa de justiça é fixada nos termos da tabela i-B e é paga pelo recorrente com as alegações e pelo recorrido que contra-alegue, com a apresentação das contra-alegações.
3 - Nos processos de expropriação é devida taxa de justiça com a interposição do recurso da decisão arbitral ou do recurso subordinado, nos termos da tabela i-A, que é paga pelo recorrente e recorrido.
4 - A taxa de justiça devida pelos incidentes e procedimentos cautelares, pelos procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, pelos procedimentos anómalos e pelas execuções é determinada de acordo com a tabela ii, que faz parte integrante do presente Regulamento.
5 - Nas execuções por custas, multas ou coimas o executado é responsável pelo pagamento da taxa de justiça nos termos da tabela ii.
6 - Nos procedimentos de injunção, incluindo os procedimentos europeus de injunção de pagamento, que sigam como acção, é devido o pagamento de taxa de justiça pelo autor e pelo réu, no prazo de 10 dias a contar da data da distribuição, nos termos gerais do presente Regulamento, descontando-se, no caso do autor, o valor pago nos termos do disposto no n.º 4.
7 - Quando o incidente ou procedimento revistam especial complexidade, o juiz pode determinar, a final, o pagamento de um valor superior, dentro dos limites estabelecidos na tabela ii.
8 - Consideram-se procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas.
Prevê o nº4 deste artigo que a “taxa de justiça devida pelos incidentes é determinada de acordo com a tabela ii, que faz parte integrante do presente Regulamento” e nos termos da tabela II os incidentes/procedimentos anómalos estão sujeitos a uma taxa de justiça entre 1 e 3 Ucs.
Como anota Salvador da Costa, “grosso modo, o incidente normal envolve uma sequência de atos processuais tendentes à resolução de questões relacionadas com o objeto do processo em causa, mas que, pela sua particularidade, extravasa a sua tramitação normal” [Regulamento das Custas Processuais, 4ª ed. pág. 245] e escrevendo noutro local, o “ incidente processual é (…) a ocorrência extraordinária, acidental, estranha, surgida no desenvolvimento normal da relação jurídica processual, que origine um processado próprio, isto é, com o mínimo de autonomia, ou noutra perspetiva, a intercorrência processual secundária, configurada como episódica e eventual em relação ao processo próprio da ação principal ou do recurso” [Os Incidentes da Instância, 5ª ed., pág. 10].
Como supra referido, a reclamação contra o despacho que não admite o recurso, origina um processado próprio, autónomo do recurso cuja admissibilidade visa provocar, colocando uma questão acessória e prejudicial ao conhecimento deste constituindo, neste sentido, um incidente da instância do recurso.
Por configurar um incidente, pelo seu impulso é devida uma taxa de justiça entre 1 a 3 Ucs. (tabela ii A, ex vi do nº4, do artº 7º do RCP), a liquidar pelo seu valor mínimo, sem prejuízo do pagamento do excedente, se o houver, a final, (artº 6º, nº6, do RCP) ou da sua sujeição a uma taxa sancionatória excecional (artº 531º, do CPC e artº 10º, do RCP) [no sentido que na reclamação há lugar ao pagamento prévio da taxa de justiça cfr. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, pág. 104].
Solução que, aliás, representa uma continuidade do regime pregresso; os artºs 23º, nº1 e 24º, nº1, al. d) do Código das Custas Judiciais, aprovado pelo D.L. nº 224-A/96, de 26/11, previam o pagamento da taxa de justiça inicial, na reclamação do despacho de não admissão ou retenção do recurso, no prazo de 10 dias a contar da notificação da manutenção do despacho reclamado e também o artº 104º, nº3, do Código das Custas Judiciais, aprovado pelo D.L. nº 44329, de 8/5/1962, na alteração do D.L. nº 387-D/87, de 29/12, previa a efetivação do preparo nas reclamações do despacho que rejeitasse ou retivesse o recurso, no prazo de 7 dias, a contar da notificação do decisão que mantivesse o despacho reclamado.
Concluindo, a reclamação contra o despacho que não admita o recurso está sujeita ao pagamento prévio de taxa de justiça, tal como acontecia na legislação vigente (e anterior a esta) à data de entrada em vigor do RCP.
Improcede, pois, o recurso, restando confirmar a decisão recorrida.
IV. Dispositivo:
Delibera-se, pelo exposto, na improcedência do recurso, em confirmar a decisão recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes.
Évora, 19/11/2015

Francisco Matos

Manuel Bargado

Elisabete Valente