Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | SÍLVIO SOUSA | ||
Descritores: | CONVERSÃO DA EXECUÇÃO NORMA EXCEPCIONAL | ||
Data do Acordão: | 03/23/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | A conversão da execução, consagrada no artigo 867º, n.º 1, do Código de Processo Civil é uma norma excecional; como tal, não admite aplicação analógica, nomeadamente, aos caos em que a coisa objeto da “execução especifica” tenha sido apreendida e entregue ao exequente, ainda que “vandalizada, inutilizada e desvalorizada”. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Évora: Relatório Fundamentação A - Despacho recorrido “Vieram os Exequentes requerer a conversão da presente execução para entrega de coisa certa, para entrega de quantia certa, com a liquidação do respetivo valor do veículo automóvel Jeep Opel Frontera. Para o efeito, alegam que o veículo Jeep Opel Frontera, que foi penhorado e apreendido nos presentes autos, se encontra totalmente vandalizado, inutilizado e desvalorizado, pelo que entendem que a “coisa” que lhe deveria ter sido entregue, não foi encontrada. O executado veio opor-se ao incidente alegando a sua falta de fundamento legal (…). (…) De facto, compulsados os autos declarativos, constata-se que a sentença aí proferida, que foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Évora (e, assim, transitou em julgado) condenou o aqui executado “a restituir o Jipe no estado em que o mesmo se encontra, conjuntamente com a declaração de venda apta a transferir a sua propriedade”, absolvendo-o de tudo o mais que foi pedido pelos exequentes, sendo que estes tinham pedido a restituição do automóvel no estado em que se encontrava à data do negócio e, subsidiariamente, em perfeito estado de funcionamento e completamente reparado. Dos autos consta ainda que, realizado o registo de penhora do automóvel (fls. 12-13), foi o mesmo aprendido pela GNR em 9.6.2015 e procedeu-se à sua entrega ao exequente (auto de apreensão de fls. 18), sendo que, citado que foi o executado após a realização da penhora e remoção, não foi apresentada qualquer oposição à execução. Deste modo, não só não resulta dos autos que a coisa não foi encontrada (pelo contrário, o veículo automóvel encontra-se já na posse dos exequentes), como atento o título executivo de que dispõem (sentença que ordena a entrega do automóvel no estado em que se encontra), os exequentes não podem pretender conseguir, através da execução, o que não lograram alcançar com a ação declarativa, ou seja receber o valor da coisa à data do negócio. Daí que, sem necessidade de mais, e porque, tendo o automóvel objeto da execução sido penhorado e entregue aos exequentes, não estão reunidos os pressupostos de aplicação do disposto, no artigo 867ºº., nº 1 do CPC, indefere-se liminarmente o requerido incidente de conversão da execução. (…)”. B - O direito/doutrina -“Diversamente da ação executiva para pagamento de quantia certa, a ação executiva para entrega de coisa certa não se traduz na efetivação de direitos sobre o património do devedor. Por ela, o credor faz valer, não a garantia patrimonial do seu crédito, mas sim a faculdade de execução específica, mediante a apreensão da coisa que o devedor está obrigado a prestar-lhe” [2]; -“Para realizar o direito exequendo, o tribunal procede à apreensão da coisa e à sua imediata entrega ao exequente, após efetivação das buscas e outras diligências que forem necessárias” [3]; -“Só se a coisa não puder ser entregue, se procederá à execução por equivalente, transformando-se a execução para entrega de coisa certa em execução para pagamento de uma indemnização pecuniária” [4]; - “Quer dizer, diante da impossibilidade de encontrar a coisa devida o órgão executivo não desarma, não capitula; desiste de conseguir para o exequente precisamente a prestação a que ele tinha direito, mas trata de lhe obter uma outra prestação, senão equivalente no aspeto económico, ao menos equivalente no aspeto jurídico. O exequente não recebe a coisa que lhe era devida, mas recebe a indemnização de perdas e danos pela falta de entrega da coisa, Frustrou-se o fim específico da ação executiva; inicia-se nova execução com outro fim: o de indemnizar o credor do prejuízo que sofreu” [5]; - A impossibilidade de “execução específica” pode verificar-se, “por algum dos seguintes motivos: a) a coisa ter deixado de existir, b) a coisa não ser encontrada, apesar de continuar a existir; c) sobre a coisa incidir direito de terceiro que, por oponível ao exequente, obsta ao investimento material ou jurídico na posse” [6]; - O campo de aplicação do artigo 10º. do Código Civil estende-se “a todos os ramos do direito. Se o caso for omisso, haverá que recorrer, em primeiro lugar, à norma reguladora dos casos análogos, sendo a analogia determinada, não pela simetria formal das situações, mas pela identidade substancial dos fundamentos da estatuição” [7]; - As normas excecionais não comportam aplicação analógica[8]; - “Uma norma diz-se excecional em relação a outra, quando o seu regime é, sob os mesmos pressupostos, distinto ou oposto ao que esta última estabelece”; “as normas em causa - a geral e a excecional - estabelecem regimes distintos, de tal modo que o regime da hipótese excecional se resolve na aplicação da norma excecional, com exclusão do regime fixado para as demais hipóteses do mesmo género pela norma geral” [9]. C - Aplicação do direito aos factos A coisa - veículo automóvel Jeep Opel Frontera - objeto de “execução específica” foi encontrada e entregue aos recorrentes/exequentes A... e B…. Como tal, não se frustrando o fim da presente ação executiva para entrega de coisa certa, vedado está aos referenciados receber uma “indemnização de perdas e danos pela falta de entrega da coisa”. Por outro lado, mesmo admitindo que o veículo automóvel a entregar foi “vandalizado, inutilizado e desvalorizado”, após o trânsito em julgado da sentença condenatória - título executivo -, esta circunstância não permite aos ditos recorrentes/exequentes iniciar uma nova execução, com o fim de os indemnizar pelos prejuízos sofridos, decorrentes, não já da falta de entrega, mas, sim, resultantes de danos causados, entretanto, na coisa a entregar. Na verdade, a conversão da execução, consagrada no artigo 867º., nº 1 do Código de Processo Civil - desistir “de conseguir para o exequente precisamente a prestação a que ele tinha direito”, para “obter uma outra prestação, senão equivalente no aspeto económico, ao menos equivalente no aspeto jurídico” - contraria a regra geral de que não há execução sem prévio título, uma vez que é este que determina, nomeadamente, o seu fim. Equivale isto a dizer, que o referido normativo é uma norma excecional, que, por isso, não comporta uma aplicação analógica. Em síntese[10]: a conversão da execução, consagrada no artigo 867º, nº 1 do Código de Processo Civil é uma norma excecional; como tal, não admite aplicação analógica, nomeadamente, aos caos em que a coisa objeto da “execução especifica” tenha sido apreendida e entregue ao exequente, ainda que “vandalizada, inutilizada e desvalorizada”. Decisão Pelo exposto, decidem os Juízes desta Relação, julgando o recurso improcedente, manter o despacho recorrido. Custas pelos recorrentes. ******* Évora, 23 de Março de 2017 __________________________________________________ |