Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | VIRGÍLIO MATEUS | ||
Descritores: | EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA LAUDO FALTA DE ASSINATURA NULIDADE | ||
Data do Acordão: | 10/02/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 61.º, 2 E 3; 62.º DO CÓDIGO DAS EXPROPRIAÇÕES DE 1999; ARTIGO 201.º, N.º 2 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
Sumário: | Tendo sido apresentado um só laudo, assinado por quatro dos cinco peritos nomeados, não deve ser proferida sentença sem que antes se colha a assinatura que falte ou o perito minoritário apresente o seu laudo, conforme o caso. | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM O SEGUINTE: I- Relatório: Nos presentes autos de expropriação litigiosa, por utilidade pública, em que são expropriante o Município da Figueira da Foz e expropriados A.., entretanto falecido, e B..., residentes na Rua de Trás da Misericórdia, nº 17, Buarcos, Figueira da Foz, foi adjudicada ao expropriante, nos termos do artigo 51º nº1 e 5 do Código das Expropriações (aprovado pela Lei 168/99 de 18 de Setembro) a propriedade de uma parcela (nº3), com a área de 25.080 m2, que fazia parte do prédio rústico sito no Vale Sra. da Encarnação, freguesia de Buarcos, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 1000 e descrito na Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz sob o nº 1305 da freguesia de Buarcos, destinando-se a expropriação, declarada por deliberação da Assembleia Municipal publicada no DR, 2ª s., de 17-7-2000, à construção do troço de ligação do Nó 2 da RU (rodovia urbana) à Rua do Montalto. O acórdão arbitral classificou o solo como apto para a construção e considerou os seguintes elementos para a justa indemnização que fixou em Esc. 29 998 517$00: a) Parte em espaço urbano (U4): 1640 m2, com o índice de utilização bruto de 0,8, custo de construção de área bruta 80 000$00/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 12,7%, factor correctivo 15%: daí o valor de 11 330 432$00; b) Parte em espaço urbanizável periurbano I (PU 1): 3400 m2, com o índice de utilização bruto de 0,25, custo de construção de área bruta 80 000$00/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 12,7%, factor correctivo 15%: daí o valor de 7 340 000$00; c) Parte em espaço natural e de protecção de grau II (EN II): 20 040 m2, com o índice de utilização bruto de 0,05, custo de construção de área bruta 80 000$00/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 10%, factor correctivo 15%: daí o valor de 6 813 685$00; d) Desvalorização da parte sobrante com 9600 m2 = 9600 x 3135$00 x 15% = 4 514 400$00. Do acórdão arbitral recorreram os expropriados, pretendendo que o justo valor indemnizatório é de € 407 488,06 mais o das benfeitorias (€ 5000) mais o prejuízo derivado do corte de árvores (€ 1222,05), ou seja, o total de € 413 710,11. E com o recurso os expropriados juntaram o relatório de um perito, Arq. Sérgio Sousa. Foi realizada avaliação, tendo os peritos nomeados pelo tribunal e o da expropriante subscrito o relatório de fls. 487 a 491 e os esclarecimentos escritos a fls. 505 a 507, onde se classificou o prédio como solo apto para a construção e se consideraram os seguintes elementos para a justa indemnização de € 220 597,76 à data da DUP: a) Parte em espaço urbano (U4): 1640 m2, com o índice de utilização bruto de 0,8, custo de construção de área bruta € 351,50/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 14,5%: daí o valor de 1640 x € 40,77 = € 66 862,80; b) Parte em espaço urbanizável periurbano I (PU 1): 3400 m2, com o índice de utilização bruto de 0,25, custo de construção de área bruta € 351,50/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 14,5%: daí o valor de 3400 x € 12,74 = € 43 315,58; c) Parte em espaço natural e de protecção de grau II (EN II): 20 040 m2, com o índice de utilização bruto de 0,05, custo de construção de área bruta € 351,50/m2, incidência do valor do terreno sobre o custo de construção 14,5%: daí o valor de 20 040 x € 2,55 = € 51 109,52; d) Arvoredo (madeira e lenha) = € 3882,30; e) Área da parte sobrante = 32 460 m2; f) Desvalorização da parte sobrante por fraccionamento do prédio base: 0,15 x 57 540 m2 x 0,126 x € 351,50 x 0,145 = € 55 427,46; g) Justa indemnização total à data da DUP = a+b+c+d+f = € 220 597,76. Foi efectuada inspecção judicial ao local, com o resultado que consta a fl. 536. Foram inquiridas testemunhas em audiência de julgamento. Seguiu-se a sentença de fls. que fixou a justa indemnização total à data da DUP em € 220 597,76 e procedeu à actualização ( Dos autos não consta que, concluídas as diligências de prova, tenham sido facultadas as alegações escritas a que se refere o art. 64º do CE/99.). Os expropriados recorrem para esta Relação, apresentando a sua alegação as seguintes conclusões: 1ª - Para que o relatório dos peritos pudesse considerar-se válido, ter-se-ia de considerar o que o Perito dos ora Recorrentes declarara no por si apresentado aquando da interposição do processo, o que foi completamente ignorado pelo Tribunal “ a quo” que inclusive refere na Sentença Recorrida a unanimidade dos peritos na avaliação efectuada, desconsideração que importa a falta do laudo de um dos peritos, o que torna nula a avaliação, por violação do artigo 61º nº2 do C.E. e 463º nº1 do C.P.C.( Refere-se na alegação: «a Sentença Recorrida, ao não se debruçar sobre o laudo do perito dos expropriados, ignorando-o e fundamentando toda a sua decisão no parecer dos restantes, afirmando ter sido proferido por unanimidade, tratando-se de uma perícia colegial (tem que ser realizada por 5 peritos), aquela desconsideração importa a falta do laudo de um dos peritos, o que torna nula a avaliação, conforme foi decidido, de entre outros, pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 6/12/2005, por violação dos artigos 61º nº2 do C.E. e 463º nº1 do C.P.C.» ). 2ª- Conforme consta da avaliação efectuada pelo Perito dos Recorrentes, o índice de construção a considerar, no que ao Espaço U 4 respeita, tinha de ser de 1,7, pois insere-se em espaço urbanizável de expansão, ao abrigo do disposto no artigo 28º da Portaria nº 519/95 de 31 de Maio (Regulamento do Plano de Urbanização), o que fora invocado mas não foi conhecido na Sentença Recorrida. 3ª- Pronunciava-se ainda aquele perito sobre as parcelas sobrantes, afirmando que ficam muito retalhadas e condicionadas no seu aproveitamento pelas zonas non-aedificandi e acessibilidades, concluindo dever considerar-se prejudicada em pelo menos 40% do seu potencial, mas, não obstante a confirmação de tal evocação resultante da prova produzida, a Sentença Recorrida apoiando-se exclusivamente no Relatório dos restantes Peritos, que afirma ter sido proferido por unanimidade, não colocou em crise o atribuído por estes, sem no entanto o justificar que não fosse por tal unanimidade, que não se verifica. 4ª- Também a atribuição de 10% do custo para construção é extremamente baixo atentas as potencialidades do local, tendo em conta os critérios estabelecidos no nº6 do art. 26º do C.E., sendo certo que o Relatório do Perito dos Recorrentes apontava para 12% e, pelos motivos já sobreditos, a Sentença Recorrida não fundamenta a sua decisão sobre a discrepância entre os dois relatórios. 5ª- Ao invés de se ter atribuído factor correctivo de 15% pela inexistência de risco de esforço, conforme vem previsto legalmente, constava do Relatório do Perito dos Recorrentes e foi corroborado pela prova testemunhal, reduziu-se o valor da avaliação com base nesse mesmo factor, em clara violação do nº 10º do art. 26º já referido. 6ª- Aceitando-se o Relatório do Perito dos aqui Recorrentes, deve o mesmo vir a ser tido em conta na decisão a proferir e, porque o mesmo tem suporte documental e está devidamente fundamentado, conjugados os elementos nele apontados, com a prova produzida, deve vir a alterar-se a Decisão recorrida vindo a atribuir-se como justo valor da indemnização devida aos aqui expropriados o montante de 408.710, 11 € (quatrocentos e oito mil setecentos e dez euros e onze cêntimos), acrescida da actualização de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor nos termos da lei. O expropriante, na contra-alegação, reconheceu «que o perito indicado pelos recorrentes, Arq. Sérgio Sousa, foi notificado a fls. 312 para prestar juramento como perito, o que fez a fls. 369 dos autos, porém nunca apresentou qualquer relatório, quer em separado, quer em conjunto com os restantes peritos». Acrescentou que «o Juiz deve atender ao laudo maioritário se o mesmo não puder ser obtido por unanimidade, cfr. entre outros os Acórdãos da R.L. de 1/03/2005 e 28/9/2004 respectivamente Proc. n.º 2738/04 e n.º 1996/04, mas, no caso presente, a Mma. Juiz a quo considerou como laudo a avaliação inicial efectuada pelo perito dos recorrentes», como «resulta duma leitura atenta da sentença», pois que «a fls. 550 dos autos consta da sentença “o Tribunal, sem descurar a existência de um laudo divergente, não pode deixar de dar relevo ao facto de um deles ser subscrito por cinco peritos”, sendo óbvio que a Mma. Juiz pretendia escrever quatro peritos». Conclui que «nenhuma razão se vislumbra para que o relatório de avaliação elaborado pelos senhores peritos (os três nomeados pelo Tribunal e o indicado pelo recorrido) não seja integralmente valorizado, tendo servido de suporte à Douta Sentença recorrida que deverá ser confirmada». Correram os vistos legais. Nada obsta ao conhecimento do objecto do recurso. II- Fundamentos: De facto: A 1ª instância considerou assentes os seguintes elementos para fixar a indemnização devida: 1- É objecto de expropriação uma parcela de terreno, com a área de 25.080 m2, que fazia parte do prédio rústico sito no Vale Sra. da Encarnação, freguesia de Buarcos, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 1000 e descrito na Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz sob o nº 1305 da freguesia de Buarcos, a favor dos expropriados, destinada à ocupação com a obra de construção do troço de ligação do Nó 2 da RU à Rua do Montalto – Parcela nº3. Qualquer das hipóteses de omissão (de assinatura ou de apresentação de laudo) configura nulidade: a de omissão de assinatura, por analogia com a norma dal. a) do nº1 do art. 668º do CPC; a de omissão de apresentação de laudo, nos termos do art. 201º nº 1 do CPC por a falta do laudo ser susceptível de influenciar a decisão da causa. Na 1ª hipótese a nulidade supre-se com a recolha da assinatura do perito em falta, no lugar próprio do laudo. Se for esse o caso, suprida a falta, todo subsequente processado (incluindo a sentença e o recurso interposto) se convalidará, havendo que proferir-se depois novo acórdão com os mesmos juízes para conhecimento das restantes questões. Se não puder ser suprida a falta, terá de proceder-se à substituição do perito (com anulação do pagamento de despesas e honorários cujo pagamento lhe foi deferido) e a nova avaliação, nova sentença... Na 2ª ou na 3ª hipóteses, a nulidade supre-se com a apresentação do laudo divergente pelo perito dos expropriados, não podendo considerar-se desnecessário apresentar laudo por supostamente valer como tal o relatório apresentado com o recurso da arbitragem. Este relatório irreleva, não apenas porque o perito ao elaborá-lo ainda não prestara juramento. Irreleva também porque, devendo os 5 peritos efectuar conjuntamente a inspecção do prédio aonde se terão deslocado, a análise dos diversos elementos (do processo ou provindos das entidades oficiais) e a discussão e deliberação próprias do funcionamento de órgão colegial, o laudo divergente há-de fazer ressaltar os pontos de divergência e a razão da divergência. De outro modo, subverter-se-ia o regime legal de funcionamento do órgão colegial de 5 peritos avaliadores e seria um logro a apresentação de “nota de despesas e honorários” no processo, pois que com esta nota não se visa compensar e remunerar serviço efectuado por conta dos expropriados antes do juramento como perito avaliador. Sendo caso de apresentação do laudo em falta, e apresentado, a sentença proferida fica anulada e deve ser proferida nova sentença. Verifica-se pois uma nulidade que deve ser suprida, ficando prejudicado conhecimento das restantes questões. |