Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3831/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERREIRA DE BARROS
Descritores: HONORÁRIOS
TRIBUNAL COMPETENTE
Data do Acordão: 01/17/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE AVEIRO
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 76.º, N.º 1 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Sumário: 1. Para a acção de honorários de mandatários judiciais é materialmente competente o tribunal de competência genérica ou de competência específica em matéria cível.
2. O art. 76º, nº1 do CPC prevê uma competência territorial por conexão, nada relevando quanto à competência material.

3. Só após a definição da competência material é que operam as regras em função do território.

Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I)- RELATÓRIO
A..., Advogado, intentou, no Tribunal Judicial de Aveiro, acção de honorários Distribuída ao 3º Juízo Cível contra B..., pedindo a condenação da Ré ao pagamento da quantia de € 1.361,93, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a entrada da acção em Tribunal até integral pagamento.
Para o efeito, alegou, em síntese, ter sido mandatado, na sua qualidade de Advogado, para intervir em representação da Ré nos Processos n.ºs 918, 918-A e 918-B, relativos a Regulação e Incumprimento do Poder Paternal e Execução Sumária, que correram termos no 1º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Aveiro. Cumpriu o mandato, estando em dívida honorários.
Após contestação, onde a Ré concluiu pela improcedência da acção, foi proferido despacho a julgar incompetente o Tribunal onde a acção foi instaurada e a ordenar a remessa dos autos ao 1º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Aveiro.
Inconformado com tal decisão, agravou o Autor a pugnar pela competência do Tribunal Judicial de Aveiro, assim rematando a sua alegação, em resumo:
1ª-O processo emerge dos honorários não pagos ao advogado, nos processos 918, 918-A e 918-B que correu seus termos, até decisão final, transitada em julgado, no Tribunal de Família e Menores de Aveiro;
2ª-Sendo assim, a regra do art.76º, n.º1 não é aplicável, mas aplicável o art. 74º, n.º1, por conjugação com o art. 85º, ambos do CPC;
3ª-Os Tribunais de Família e Menores não têm competência material para conhecerem das acções de honorários, cuja causa de pedir é o patrocínio forense que neles correram termos;
4ª-Sendo assim, o tribunal competente para apreciar o processo é o Tribunal Judicial de Aveiro e não o Tribunal de Família e Menores de Aveiro.

Não foi apresentada contra-alegação, tendo sido mantido o despacho impugnado.
II)- O DIREITO
Analisadas as conclusões da alegação a delimitar, em princípio, o objecto do recurso (arts. 690º, n.º e 684º, n.º3, ambos do CPC), importa apenas dirimir a questão de saber se o 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Aveiro é ou não o competente para conhecer da acção de honorários de mandatário judicial.
Como acima se relatou, o Autor, Advogado, alegou ter sido mandatado pela Ré para intervir, em sua representação, em processos que correram seus termos no 1º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Aveiro.
Par decidir nos termos sobreditos, a 1ª instância escudou-se na disciplina decorrente do n.º1 art. 76º do CPC, onde se proclama no que “para a acção de honorários de mandatários judiciais ou técnicos e para a cobrança das quantias adiantadas ao cliente, é competente o tribunal da causa na qual foi prestado o serviço, devendo aquela correr por apenso a esta”.
Não sofre dúvida que a acção de honorários de mandatário judicial não cabe na competência material dos Tribunais de Família e de Menores, enquanto tribunais de competência especializada (art. 81º a 83º Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro -Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais).
O art. 76º do CPC tem a sua inserção sistemática na parte atinente à competência territorial, nada relevando, pois, quanto à competência em razão da matéria do tribunal. Prevê tal norma uma competência territorial por conexão. Ou seja, o tribunal onde correu a causa onde foi prestado o serviço só será competente em razão do território para a acção de honorários, se for competente em razão da matéria, correndo a acção por apenso. Só após a definição da competência material é que operam as regras em função do território. Se não for competente em razão da matéria o tribunal onde correu a causa onde foi prestado o serviço, então a acção de honorários terá de ser intentada no tribunal de competência genérica ou de competência específica.
Na lição de Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 1º, p. 204, “ é manifesto que o art. 76º nada tem a ver com o problema da competência em razão da matéria; tem unicamente por fim resolver o problema da competência territorial, supondo, por isso, já resolvidos os problemas que logicamente estão antes deste, e consequentemente, o problema da competência em razão da matéria. Sendo assim, é bem de ver que se o tribunal perante o qual foi exercido o mandato ou prestada a assistência técnica não é o competente, em razão da matéria, para conhecer da acção de honorários, o preceito do art. 76º não pode funcionar”.
Já a jurisprudência tem tomada posição nesta controvérsia, propendendo maioritariamente Em sentido contrário veja-se acórdão desta Relação, publicado na CJ 2000, 3º, p. 33; os acórdãos da Relação de Lisboa, publicados na CJ 1998, 2º, p. 158 e na CJ 1999, 3º, p. 157. a seguir a tese que se deixou sublinhada na esteira dos ensinamentos de Alberto dos Reis, como se vê dos acórdãos do STJ, de 12.07.00 publicado no BMJ n.º 499º, p. 236, e de 28.05.02, acessível in http:www.dgsi.pt, Proc. n.º 02A327, acórdãos da Relação do Porto publicado na CJ 2003, 4º, p. 161,e sumariado no BMJ n.º 469º, p. 647, acórdão desta Relação, sumariado no BMJ n.º 346º, p. 313, acórdão da Relação de Lisboa, sumariado no BMJ n.º 413º, p. 598. Se é inegável a vantagem para o julgamento da acção de honorários a directa percepção da causa onde foi prestado o serviço, também nada obsta, e até recomendável, que seja pedida a remessa deste processo, a título devolutivo.
Sem necessidade de mais amplas considerações, é de concluir que assiste razão ao Agravante, não podendo subsistir, pois, o despacho impugnado que defere, indevidamente, a competência material ao 1º Juízo do tribunal de Família e Menores de Aveiro para conhecer da acção de honorários de mandatário judicial. O Tribunal recorrido é, pois, o competente, em razão da matéria, para conhecer da acção, sendo inaplicável o art. 76º do CPC.


III)- DECISÃO

Nos termo e pelos motivos expostos, acorda-se em:
1-Conceder provimento ao agravo.
2-Revogar, em consequência, o despacho impugnado que deve ser substituído por outro a dar seguimento ao processo.
3- Sem custas (alínea g) do n.º1 do art. 2º do Código das Custas Judiciais).
COIMBRA,

(Relator- Ferreira de Barros)

(1º Adj.- Des. Helder Roque)

(2º Adj.- Des. Távora Vítor)