Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
102/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. JORGE ARCANJO
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
CONTRATO DE AGÊNCIA
Data do Acordão: 03/23/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GOUVEIA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Legislação Nacional: ART.S 1.º, 16.º E 18.º DO D.L. 178/86 DE 3/7, ART.º 19.º DO D.L.77/99 DE 16/03
Sumário:

I - O contrato celebrado entre requerente e requerido, nos termos do qual aquela se obrigou a promover a venda de um condomínio fechado, pertencente a este, recebendo uma comissão no preço por cada venda realizada das fracções, deve ser qualificado como de mediação imobiliária e não de agência.
II – Enquanto que o contrato de agência postula uma certa continuidade, constituindo-se para as relações duradouras, o contrato de mediação tem como elemento essencial a promoção de certos e determinados negócios, cessando logo que os mesmos se concluam.
III – No contrato de mediação imobiliária, se nada for convencionado em contrário, o pagamento da comissão só é devido com a conclusão e perfeição do negócio visado com a mediação (contrato de compra e venda) e não com a simples outorga do contrato promessa de compra e venda.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de COIMBRA

I – RELATÓRIO

No Tribunal Judicial da Comarca de Gouveia, a requerente AA – instaurou procedimento cautelar de arresto, contra o requerido – BB -, pedindo o arresto dos seguintes bens: (1) da casa 3, composta de rés-do-chão, 1º andar e garagem, destinada a habitação, descrita a favor do réu na Conservatória sob o n° 00847/030318-C e (2) do rés-do-chão e 1º andar com arrumos, com o n° 2, destinada a habitação, registado na Conservatória, a favor do réu, sob o nº 00814/171201-B.

Alegou, em resumo:

Em 26 de Outubro de 2000, na qualidade de promotora de vendas, celebrou com o requerido um contrato de agência ou de comissão para venda de moradias deste, nele acordando o valor das comissões ( doc. de fls.8 ).

O requerido deve-lhe a quantia de 3.935.999$00, a título de comissões, não pagas

A requerente tem o sério receio de não receber a fracção, que o requerido lhe prometeu vender, bem como o dinheiro de que é credora, uma vez que o requerido se prepara para alienar as fracções ainda não negociadas e não possui outro património penhorável, devendo ainda dinheiro a empreiteiros e fornecedores de materiais de construção.

Realizada a audiência, foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a pretensão de arresto.

Não se conformando, a Requerente interpôs recurso de agravo, concluindo, em resumo:

1º) - Não obstante o disposto no art° 18 do D.L. 178/86, as partes podem estipular que o direito às comissões e o seu pagamento seja feito antes do cumprimento definitivo do contrato pelo principal ou pelo terceiro.

2º) - No caso dos autos, requerente e requerido acordaram que esse pagamento se concretizaria com a celebração dos contratos promessa.

3º) - A requerente demonstrou que esses contratos foram outorgados, pelo que de acordo com o ponto 2 dos factos provados sempre teria direito a uma comissão de 5% ou, pelo menos, de 2,5 % sobre os respectivos valores.

4º) - A melhor prova de que a requerente era já titular de um direito de crédito é que o requerido se confessou devedor de 50% das comissões, reteve-as consigo e afectou-as ao sinal e princípio de pagamento do contrato promessa referido no ponto 8 dos factos provados.

5º) - Mesmo sem contrato de agência, este contrato promessa comporta e encerra, autonomamente, um direito de crédito da requerente sobre o requerido, designadamente depois do contrato prometido (escritura) não ter sido realizado, o que implica, pelo menos, o direito à restituição do sinal ou de 50% das comissões devidas.

6º) - De qualquer forma, está provado que o requerido vendeu, pelo menos, duas moradias através da requerente (as denominadas Carvalho e Estevão), o que sempre lhe conferia, mesmo na tese da sentença, o direito a receber as respectivas comissões.

7º) - Estão indiciariamente assentes factos que pressupõem o direito de crédito da requerente e o seu receio de perda da garantia patrimonial.

8º) - A decisão recorrida violou o disposto nos arts. 407 do CPC, 405 do CC e interpretou incorrectamente o art. 18 do D.L. 178/86.

O agravado não contra-alegou.


II – FUNDAMENTAÇÃO


2.1. – Delimitação do objecto do recurso:

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (arts.684 nº3 e 690 nº1 do CPC), impondo-se decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (art.660 nº2 do CPC).

Como resulta das conclusões do recurso, são essencialmente duas as questões que importa decidir:

a) – Se está comprovada indiciariamente a probabilidade séria da existência do crédito da Requerente sobre o Requerido, tendo por base as comissões, em conformidade com o contrato de fls.8, celebrado entre ambos;

b) – Demonstrada a existência do crédito, se estão verificados os pressupostos do justo receio da garantia patrimonial.

2.2. – OS FACTOS PROVADOS:

1) - O requerido é dono e legítimo possuidor do prédio misto composto ele terra ele batata, vinha, centeio, pinhal e pastagem com oliveiras, com a área de 39.965 m2 e casa de habitação, dependência, lagar, palheira e casa de arrumação, com a área de 100 m2 e jardim com a área de 25 m2, sito na “Lage” ou “Rua do Chafariz”, freguesia de Lagarinhos, concelho de Gouveia, a confrontar de norte, sul e nascente com caminho e poente com CC, inscrito na matriz sob os artigos 2 rústico e 231 urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial de Gouveia sob o n 00808/261101.

2) - Requerente e requerido celebraram contrato escrito, datado de 26 de Outubro de 2000, consignando que toda a construção do condomínio fechado “Vistas da Estrela” é dado para venda, em exclusivo, à requerente. Sempre que se realizar uma venda através da requerente, este recebe 5%, sendo essa percentagem reduzida a metade no caso de a venda se efectuar através de outras agências. Em caso de “over price”, o valor será dividido a meias entre as partes.

3) - O requerido reconstruiu 6 moradias e edificou outras 8 de raiz.

4) - As seis moradias de raiz, denominou-as de “Azevinho” (3 delas), “Camélia” (2 delas), “Castanheiro”, “Carvalho” e “Estêvão”.

5) - As restantes (reconstruídas), numerou-as de 1 a 5 e chamou “Winery” a uma outra.

6) - A requerente arranjou compradores, pelo menos, para as moradias denominadas “Carvalho”, pelo preço de € 79 807,66, e “Estêvão”, pelo preço de € 72 325,70.

7) - O requerido fez entregas à requerente de, pelo menos, € 26 281,67.

8) - Por escrito particular, datado de 30 de Junho de 2001, denominado de “contrato promessa de compra e venda”, o requerido prometeu vender à requerente, prometendo esta comprar-lhe, a fracção “B” do condomínio fechado, composta de sala, 2 quartos, 3 casas de banho, arrumos e cozinha equipada, pelo preço de € 73.323,29, sendo o pagamento “ feito pela já retenção de 50% do total das comissões em dívida à segunda outorgante da 1ª fase já concluído em Maio de 2002, e 50% do total das comissões em poder do requerido, no acto das escrituras das primeiras oito fracções da segunda fase do projecto”. Mais se consignou que a escritura teria lugar até ao dia 30 de Agosto de 2003.

9) - A requerente comunicou ao requerido a marcação da escritura no Cartório Notarial de Gouveia para o dia 20 de Setembro de 2003, às 17 horas, não tendo ele comparecido.

10) - O requerido nega pagar à requerente qualquer importância devida pelo acordo outorgado entre as partes.

11) - O requerido pretende alienar a fracção “B” e uma outra fracção prometida a uma sua filha, estando a requerente a promover a venda desta última fracção.

12) - Ao requerido não é conhecido qualquer outro património.

13) - Deve ao projectista José Adelino Lopes Fernandes cerca de € 3.491,59.

2.3. – O DIREITO:

Como estatui o art.406 nº1 do CPC, o procedimento cautelar de arresto depende da verificação cumulativa de dois requisitos: a probabilidade da existência do crédito e o justo receio da perda da garantia patrimonial.
A requerente fundamentou o direito de crédito, no montante de 3.935.999$00 / €19.632,68, nas comissões devidas pelo requerido, em virtude do acordo celebrado, através do documento escrito de fls.8, que designou por contrato de agência ou de comissão, cuja factualidade consta do ponto 6) dos factos provados.
A sentença recorrida, qualificando o contrato como de agência, regulado pelo Decreto-Lei nº178/86, de 3 de Julho, julgou improcedente o arresto, com base em dois tópicos argumentativos:

a) - A requerente não adquiriu ainda o direito às comissões acordadas, nos termos do art.18º, por não estar demonstrado o cumprimento dos contratos, ou seja, a outorga das escrituras públicas de compra e venda;

b) – O contrato promessa de compra e venda da fracção “B”, celebrado com a Requerente, não constitui fundamento autónomo do direito de crédito.

Através do contrato de fls.8 (cf. ponto 2 dos factos provados), as partes convencionaram a remuneração sob a forma de comissão, mas porque ela não é somente apanágio do contrato de agência, impõe-se, apesar da escassez da matéria de facto, caracterizar correctamente o negócio jurídico outorgado entre as partes, o que postula, antes de mais, um problema de interpretação do contrato.
Segundo o artigo 266 do Código Comercial, " Dá-se contrato de comissão quando o mandatário executa o mandato mercantil sem menção ou alusão alguma ao mandante, contratando por si e em seu nome, como principal e único contraente".

A comissão reconduz-se, assim, a um “ mandato comercial não representativo ”, ficando o comissário directamente obrigado com as pessoas com quem contrata, como se o negócio fosse seu (art. 268).

Os factos provados (cf. ponto 2)), afastam a possibilidade deste contrato, tanto mais que no acordo de fls.8, se menciona ser a requerente “ promotora das vendas “, sendo por sua conta “ toda a divulgação, publicidade e acompanhamento dos clientes ao local do condomínio “.

O regime jurídico do contrato de agência ou de representação comercial foi instituído pelo DL 178/86 de 3/7, modificado pelo DL 118/93 de 13/4, em conformidade com a Directiva 86/653/CEE de 18 de Dezembro.
Face à definição conceitual de agência inscrita no art.1º nº 1, constituem elementos essenciais do contrato, (1) a obrigação do agente promover a celebração de contratos; (2) a actuação por conta de outra parte, defendendo os interesses do principal; (3) a autonomia do agente, pois que apesar de integrado na rede de distribuição do principal, tem a possibilidade de organizar livremente o seu próprio trabalho; (4) o carácter de estabilidade da relação contratual entre as partes, sendo um contrato duradouro; (5) a remuneração paga pelo principal ao agente, sendo, por isso, um contrato oneroso.
A principal característica do contrato de agência, e que realça a sua função económico-social, traduz-se em o agente promover a celebração de contratos, integrando-se, assim, na categoria mais ampla dos chamados " contratos de gestão "
Como refere PINTO MONTEIRO - " É esta a obrigação fundamental do agente, envolvendo toda uma complexa e multifacetada actividade material, de prospecção do mercado, de angariação de clientes, de difusão dos produtos e serviços, de negociação, etc., que antecede e prepara a conclusão dos contratos, mas na qual o agente já não intervém(...) " (Contrato de Agência, 1993, pág.34).
O contrato de agência não confere, por si só, ao agente poderes para celebrar contratos, excepto se lhe tiverem sido concedidos os indispensáveis poderes para tal.
A atribuição de poderes de representação para a celebração de contratos tem um carácter acessório ou complementar em relação à actividade do agente que é essencialmente uma actividade de promoção, diferenciando-se, por isso, do contrato de mandato comercial, e porque o agente actua com independência e autonomia, também se distingue do contrato de trabalho.
No contrato de agência, a comissão é normalmente constituída por determinado valor ou percentagem sobre o volume de negócios obtido pelo agente, podendo cumular-se com qualquer importância fixa, eventualmente acordada entre as partes, enquanto garantia mínima de pagamento ou seja, independentemente dos resultados alcançados.
Com efeito, o agente tem direito a ser remunerado, recebendo comissões pelos contratos celebrados entre a vigência do contrato de agência e pelos contratos celebrados num prazo razoável após o termos desta relação, se a conclusão dos mesmos resultar principalmente da sua intervenção (art.16º do DL 178/86).
Enquanto que a norma do art.16 do DL 178/86 enuncia os contratos que conferem ao agente o direito à comissão, o art.18 do mesmo diploma determina o momento da aquisição desse direito (PINTO MONTEIRO, loc.cit., pág.71 e 75).
Parece, no entanto, que a qualificação do negócio jurídico celebrado entre as partes melhor se coaduna com o contrato de mediação imobiliária, pois não obstante algumas afinidades com o de agência, o certo é que a Requerente foi contratada para promover a venda do condomínio fechado “ VISTAS DA ESTRELA “, propriedade do Requerido.
É que enquanto o contrato de agência postula uma certa continuidade, constituindo-se para as relações duradouras, o contrato de mediação tem como elemento essencial, a promoção de certos e determinados negócios, cessando logo que os mesmos se concluam, como parece resultar do contrato outorgado entre as partes.
O contrato de mediação pressupõe, essencialmente, a incumbência, a uma pessoa, de conseguir interessado para certo negócio, feita pelo mediador, entre o terceiro e o comitente e a conclusão do negócio, entre estes, como consequência adequada da actividade do mediador.

Ao contrário do agente, que actua por conta do principal – “representando-o” economicamente -, o mediador age com imparcialidade, no interesse de ambos os contraentes, sem estar ligado a qualquer deles por relações de colaboração, de dependência ou de representação.

Por isso, o mediador é uma pessoa independente, a quem qualquer outra pode recorrer, em determinado momento, cessando a relação contratual, em regra, logo que concluído o negócio, o que não sucede com o agente, por estar ligado ao principal por relações de colaboração duradoura, sendo a estabilidade um elemento essencial da agência.

No caso concreto configura-se, portanto, um contrato de mediação imobiliária, regulado pelo DL 77/99 de 16/3.

A circunstância da Requerente não estar autorizada a exercer a actividade de mediador, uma vez que só as empresas (sociedades comerciais ou outra forma de cooperação de sociedades) o podem fazer, mediante prévio licenciamento e registo (arts.3º, 5º e 8º), não torna nulo o contrato estabelecido com o Requerido (cf., por ex., Ac RP de 21/5/96, www dgsi).

Na vigência do DL 285/92 de 25/9, algumas dúvidas se suscitavam no sentido de saber o momento em que nasce a obrigação de o cliente remunerar o mediador, sustentando a jurisprudência ser necessário uma relação de causa/efeito entre a actividade do mediador e o negócio realizado, exigindo-se que o negócio se concluísse como consequência adequada da actividade do mediador (por ex., Ac da RL, 24/06/93, C.J. ano XVIII, tomo III, pág.139, Ac da RE, 24/03/94,C.J. ano XIX, tomo II, pãg.260, Ac do STJ, 31/05/01, C.J., ano IX, tomo II, pág.109.).
Por isso, o DL 77/99, entre cujas motivações esteve a de “ clarificar o momento e estabelecer as condições em que é devida a remuneração pela actividade de imediação imobiliária" (Preâmbulo), veio estabelecer no seu art. 19, nº1 que "a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação".
Continua, assim, a ser válida a orientação jurisprudencial que exigia o nexo causal entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio.
De resto, também para os restantes contrato de mediação se entende que a conclusão do negócio é condição essencial para que o mediador tenha direito à remuneração (MANUEL SALVADOR, Contrato de Mediação, pág.93 e 94).

Sustenta a Agravante que, por força do contrato, o pagamento das comissões era devido com a celebração dos contratos promessa e tendo demonstrado que esses contratos foram outorgados, de acordo com o ponto 2 dos factos provados, sempre teria direito a uma comissão de 5% ou, pelo menos, de 2,5% sobre os respectivos valores.

Todavia, sem consistência fáctico-jurídica, pois, para além de não haver sido acordado que a comissão era devida com o contrato promessa de compra e venda, mas sim com a realização da venda (“ sempre que se realize uma venda através da promotora “), só com a conclusão do negócio lhe assiste o direito de receber as respectivas comissões.

Por isso, o facto de haver arranjado compradores, pelo menos, para as moradias denominadas “Carvalho”, pelo preço de € 79 807,66, e “Estêvão”, pelo preço de € 72 325,70, por si só não lhe confere o direito à comissão.

A sentença recorrida afastou, assim, o direito às comissões, por considerar que a Requerente não fez prova em como as escrituras públicas de compra e venda já tenham sido outorgadas, ou seja, que os contratos tivessem sido concluídos.

Por conseguinte, quer se qualifique o contrato como de agência ou como de mediação, no caso concreto a remuneração (comissões) da Requerente sempre estaria dependente da conclusão dos contratos de compra e venda referentes às moradias e fracções do condomínio “ VISTA ALEGRE “.

Objecta, no entanto, a Agravante que a melhor prova de que já era titular de um direito de crédito é que o requerido se confessou devedor de 50% das comissões, reteve-as consigo e afectou-as ao sinal e princípio de pagamento do contrato promessa referido no ponto 8 dos factos provados.

Na verdade, sendo o preço acordado de 14.700.000$00, as partes convencionaram que - “ o pagamento será feito pela já retenção de 50% do total das comissões em dívida à segunda outorgante da 1ª fase já concluída em Maio de 2002, e 50% do total das comissões em poder do requerido, no acto das escrituras das primeiras oito fracções da segunda fase do projecto ” ( cláusula 3ª ).

Numa primeira observação, impõe-se advertir que, tendo o contrato promessa sido outorgado em 30 de Junho de 2001, não se compreende como é que as comissões se possam reportar à “ 1ª fase já concluída em Maio de 2002”.

Ainda que se admita erro de escrita, também não está suficientemente explicitado o alcance desta cláusula, assim redigida (o que é que foi concluído na 1ª fase?)

Se as partes pretenderam referir-se à 1ª fase da construção de oito moradias (cf. documento de fls.17), não se entende que já então houvessem comissões em dívida, mesmo na tese da Agravante, para quem a aquisição de tal direito nascera com a celebração dos alegados contratos promessa.

Em todo o caso, e não obstante estas perplexidades, mesmo que se admita a confissão de dívida do Requerido, nos termos dos arts.352 e 258 nº2 do CC (confissão extrajudicial em documento particular), o certo é que o correspondente crédito da Agravante (promitente compradora) foi, por acordo das partes, afectado ao sinal e princípio de pagamento.

Ora, destinando-se o sinal a confirmar/garantir, em primeira linha, a obrigação daquele que o constitui, e dado o seu efeito real, translativo da propriedade (cláusula real quoad effectum), embora dependente de uma espécie de condição, ou resolutiva (o incumprimento contratual de quem o recebeu) ou suspensiva (o incumprimento do contraente que o entregou ou o cumprimento do contrato) (cf. ANA PRATA, O Contrato Promessa e o Seu Regime Civil, pág.770 a 774), já se vê que a Requerente não pode fundamentar nele o direito de crédito, ou seja, as alegadas comissões em dívida.

Deste modo, não se demonstrando a existência provável do crédito, baseado no direito às comissões, restaria indagar de tal probabilidade quanto ao crédito consubstanciado na restituição do sinal em dobro ( art.442 nº2 do CC), pelo não cumprimento do contrato por parte do Requerido ( promitente vendedor )

Contudo, a Requerente não fundamentou o pedido de arresto neste hipotético crédito, ou seja, não assentou nele a causa de pedir, e muito embora tenha alegado o incumprimento do contrato promessa pelo Requerido ( cf. arts.23º a 30º da petição inicial ) fê-lo, designadamente, para concluir que lhe assiste “ o direito de adquirir para si o direito de propriedade da fracção “ B” “( cf. art.30º ), o que equivale a dizer o direito à execução específica do contrato ( art.830 do CC ).

Comprovado que está que o Requerido se prepara para alienar a fracção “ B”, constante do contrato promessa, pode a Requerente acautelar esse direito através de outra via, que não a do arresto.

Na medida em que a decisão impugnada não violou as normas jurídicas invocadas, improcede o recurso.


III – DECISÃO


Pelo exposto, decidem:

1)

Negar provimento ao agravo e confirmar a sentença recorrida.

2)

Condenar a Agravante nas custas.

++++

COIMBRA, 23 de Março de 2004 (processado por computador e revisto).