Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
395/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: FLAGRANTE DELITO
EM SENTIDO ESTRITO
QUASE FLAGRANTE DELITO
PRESUNÇÃO LEGAL DE FLAGRANTE DELITO
Data do Acordão: 03/16/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA COVILHÃ - 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 256º, N.º 3, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Sumário: I - O art. 256º do CPP prevê 3 situações distintas: flagrante delito em sentido estrito (está cometendo); quase flagrante delito (acabou de cometer); e presunção legal de flagrante delito (o agente é perseguido ou, mesmo não sendo perseguido é encontrado - já não no local do crime - acompanhado de objectos ou sinais do crime).
II - Integra-se na segunda categoria o caso em que, sendo a GNR chamada ao local de um acidente onde depara com o veículo acabado de se despistar, ali detém o arguido, dono do automóvel e que se identifica como seu condutor, ainda que este, após o embate, se tivesse ausentado momentaneamente do local, onde voltou durante o tempo em que a GNR esteve a proceder, sem interrupção, ao levantamento dos dados relativos ao acidente.

III - Não definindo a lei um limite temporal para “acabou de cometer” e sendo o interesse protegido não a percepção do crime pelos agentes da autoridade, mas a “proximidade e relação evidente com o caso”, ainda que possa ter decorrido algum tempo entre o acidente e a detenção, durante o qual os agentes estiveram a proceder ao levantamento de dados, não existe obstáculo à verificação de flagrante delito, por se tratar de prolongamento da diligência.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM, EM AUDIÊNCIA, NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

Submetido a julgamento, em processo sumário, o arguido A..., melhor identificado nos autos, foi condenado:

- como autor de um crime de condenação em estado de embriaguês, p e p pelo art. 292º do C. Penal, na pena de 75 dias de multa à taxa diária de € 3,00 e na sanção acessória de 3 (três) meses de proibição do conduzir veículos motorizados.

Inconformado com tal decisão, dela recorre o arguido, apresentando, como CONCLUSÕES:

1. O recorrente foi julgado e condenado, em Processo Sumário, pela prática do Crime de condução em estado de embriaguez p.p. pelo art. 292º do C.P.

2. A aplicação do Processo Sumario encontra-se sujeita à verificação cumulativa dos requisitos descritos no art. 381º do C.P.P. (detenção em Flagrante delito; crime punível com pena de prisão cujo o limite máximo não seja superior a três anos; à detenção tiver procedido qualquer autoridade judiciaria ou entidade policia1; que a realização da audiência se realize no máximo de quarenta e oito horas, ressalvada a excepção do art. 386º).

3. Da matéria provada no ponto 1, 2 e 3 doura decisão recorrida resulta que no dia 5 de Maio de 2004, no período compreendido entre as 00:00 e as 01:00 horas, o arguido circulava no Eixo T.C.T., após se ter despistado sozinho e dado a imobilização da viatura o recorrente ausentou-se do local do acidente, regressando mais tarde onde já se encontrava uma patrulha da GNR da Covilhã sendo então submetido ao Teste de pesquisa de álcool no ar expirado.

4. À excepção da pessoa que o transportou e deixou em casa do cunhado, ninguém mais viu o recorrente no local ate ao regresso.

5. O auto de notícia foi levantado ás 3:23h., pelo que existiu um período de ausência de 2:23h a 3.23h entre a hora do despiste (00.00h e a 01.00h. e o regresso, onde encontrou a GNR e realizou o Teste de Pesquisa de Álcool (03:23h).

6.Em nossa opinião e ressalvando outra melhor, conclui-se pela não verificação do requisito de flagrante delito violando assim a possibilidade aplicação do Processo Especial Sumário previsto no art. 381º do C.P.P..

7. Da aplicação de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei resulta a nulidade insanável prevista no art. 119º al. i), sendo a mesma oficiosamente declarada pelo Tribunal em qualquer fase do processo e invocável a todo o tempo, nulidade que o recorrente aqui arguido, para todos os devidos e legais efeitos.

Acresce que,

8. São elementos tipo do crime previsto e punido pelo art. 292º do Código Penal a condução de veiculo com ou sem motor; circulação na via publica ou equiparada; uma taxa de alcoolemia igual ou superior a l,2 gr./l.

9. Nos termos do art. 243º do CPP, a denúncia é obrigatória sempre que uma autoridade judiciária, um órgão de polícia criminal ou outra entidade policial presenciarem qualquer crime de denúncia obrigatória.

10. O auto de Notícia que denunciou o crime de que o recorrente foi julgado e condenado, foi lavrado 3h depois da sua eventual prática, não tendo sido presenciado por autoridade judiciária, órgão de polícia criminal ou outra entidade policial, dado que só no regresso do recorrente a GNR estava no local, realizando nessa hora o teste de pesquisa de álcool.

11. Durante o tempo que se ausentou (3h), ingeriu Whisky em casa do seu cunhado.

12. Assim, o Auto de Notícia não demonstra a real taxa de alcoolémia que o recorrente apresentava no momento que conduziu não constando igualmente elementos determinantes na apreciação da prova, tais como a -ausência do recorrente e o tempo de ausência, violando o previsto na Al. c) e d) n.º 3 do art. 99º do CPP.

13. E desconhecida e impossível de determinar qual a taxa de - álcool no sangue do recorrente no momento em que conduziu.

14. Falta aqui o elemento essencial para a determinação da eventual pratica do crime, pois desconhece-se a taxa de alcoolémia do recorrente ao momento da condução.

15 O recorrente por tudo o alegado e fundamentado, o requerente crê, e quer deixar claro, que realmente pensa que não está feita a prova de que praticou o crime de condução de veículo sob o efeito do álcool, p.p. pelo art. 292º do C.P., pondo em causa a prova produzida pelo Auto de Noticia, nos termos do art. 169º do C.P.P. remissão do art. 99º n.º 4 do C.P.P..

Termos em que se deve conceder provimento ao presente recurso, declarando-se a imediata extinção do presente procedimento criminal, dado o emprego de processo especial fora dos casos previstos na lei, o que constitui nos termos do art. 119º, uma nulidade insanável, de conhecimento oficioso e invocável a todo o tempo.

E sempre, quando assim não se entenda,

Seja o processo-crime arquivado por inexistência de prova conclusiva da prática do crime de condução de veículo sob o efeito de álcool e o princípio da presunção de inocência estabelecido no art. 32º, n.º2, da Constituição da República Portuguesa

Respondeu o digno magistrado do MºPº junto do Tribunal recorrido, pronunciando-se pela improcedência de todas as questões suscitadas pelo recorrente.

No mesmo sentido se pronuncia o douto parecer.

Corridos os vistos e cumpridas as demais formalidades legais, cumpre decidir.


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A questão nuclear suscitada no recurso é a da nulidade do julgamento em processo sumário por não verificado o pressuposto da detenção em flagrante delito. E, partindo desse pressuposto, a falta de prova de que tivesse exercido a condução sob o efeito do álcool, por ter ingerido bebidas alcoólicas depois do acidente.

Assentando a fundamentação do recurso, no que concerne à nulidade invocada, na descrição da matéria provada, para a apreciação das questões suscitadas importa ter presente a matéria de facto dada como provada.

É a seguinte a matéria de facto provada:

No dia 05 de Maio de 2004, no período compreendido entre as 00:00 e as 01:00 horas, o arguido circulava no Eixo T.C.T. – Semáforos, área da comarca da Covilhã, conduzindo o veículo automóvel de matrícula VA-05-69;

Entre o período e o local acima referido o arguido despistou-se sozinho, ficando a viatura imobilizada fora da faixa de rodagem, não interrompendo a circulação.

O arguido ausentou-se do local do acidente, regressando quando já ali se encontrava uma patrulha da GNR da Covilhã, tendo-se identificado como condutor do veículo.

Submetido ao teste de pesquisa de álcool no ar expirado, através do aparelho SERES ETHYLOMETRE, modelo 679-T, acusou uma taxa de 1,99 gramas de álcool por litro de sangue.

O arguido havia ingerido uma quantidade não apurada de bebida alcoólica antes de conduzir.

Sabia ter uma taxa de alcoolémia superior a 1,20 gr./l., e quis conduzir, como o fez nos termos descritos.

O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei.

O arguido é técnico de laboratório, auferindo cerca de € 750,00 mensais, valor líquido.

Tem o 12º ano de escolaridade

Confessou a prática dos factos e demonstrou arrependimento.

Antes da condução tinha estado numa Quinta de Teixoso com colegas de trabalho a jantar e a ver o jogo de futebol do F.C. do Porto, altura em que ingeriu bebidas alcoólicas, nomeadamente vinho, segundo referiu, na altura, ao Sr. Agente da GNR

Não tem condenações registadas


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Sustenta o recorrente que não se verificou, no caso, a detenção em flagrante delito, pressuposto de aplicação do Processo Sumário, pelo que se verifica a nulidade insanável prevista no art. 119º al. i) do CPP.

Deve dizer-se liminarmente que se trata de uma questão sobre a qual a defesa não suscitou qualquer dúvida, durante a audiência de discussão e julgamento, como resulta da respectiva acta.

Não foi assim uma questão sobre que o tribunal recorrido tivesse sido chamado a pronunciar-se. Pelo contrário, como evidenciam quer a acta quer, agora, as alegações de recurso, durante a audiência a defesa conformou-se com o formalismo seguido. E só depois, à posteriori, em sede de recurso, veio questionar esse formalismo a que assistiu, devidamente assistido por defensor, sem suscitar qualquer reparo, designadamente o que é agora objecto de recurso. Numa perspectiva que desresponsabiliza a defesa de tudo o que se passa durante a audiência de discussão e julgamento, para depois, quando verifica, a posteriori, que daí pode retirar dividendos, se insurgir contra aquilo que na altura, em acto público, aceitou pacificamente.

O conceito de flagrante delito é assim definido pelo 256º do CPP:

1. É flagrante delito todo o crime que se está cometendo ou se acabou de cometer.

2. Reputa-se também flagrante delito o caso em que o agente for, logo após o crime, perseguido por qualquer pessoa ou encontrado com objectos ou sinais que mostrem claramente que acabou de o cometer ou nele participar.

Da análise do texto legal resulta que a lei distingue 3 situações distintas: flagrante delito em sentido estrito – “está cometendo”, previsão da 1ª parte do n.º1; quase flagrante delito – “acabou de cometer”, prevista na 2ª parte do n.º1; e presunção legal de flagrante delito n.º2) – em que o agente é perseguido ou, mesmo não sendo perseguido é encontrado (já não no local do crime), acompanhado de objectos ou sinais do crime.

Como salienta Cavaleiro Ferreira, Curso de PP, II, 389 não é inteiramente exacta a noção de flagrante delito que o confunde com a prova directa do crime; trata-se de actualidade, não de visibilidade da infracção.

Não sendo pois necessário que os agentes da autoridade “presenciem” o crime, bastando que procedam à detenção do agente numa situação que, de foram imediata, evidencie a sua relação com o caso, em qualquer das três circunstâncias referidas.

Sendo certo que a lei não define, desde logo, um limite temporal para que se possa considerar que o agente “acabou de cometer” o crime. Supondo, na previsão do n.º1, que o agente seja encontrado no local do crime acabado de cometer e em relação ao qual o agente surge numa relação evidente de autoria.

Ora, no caso, tendo havido um despiste de um automóvel na via pública, tal facto foi comunicado à GNR, que chamada a tomar conta da ocorrência, como lhe compete, se deslocou ao local. E nesse local deparou com a viatura que acabara de se despistar, apresentando-se o arguido como seu proprietário e condutor assumido da mesma no momento do despiste que acabara de ocorrer.

É certo que resulta do elenco da matéria provada que após o despiste o arguido se ausentou do local, onde regressou quando a patrulha da GNR já ali se encontrava a tomar conta da ocorrência. Mas não há dúvida de que foi identificado no local, tendo sido submetido, em acto imediato, ao teste de detecção de álcool, por essa patrulha que estava a tomar conta da ocorrência, enquanto procedia à recolha de dados relevantes sobre o acidente/despiste para que acabara de ser chamada e que ainda se encontravam no local.

Ora, tendo o arguido sido identificado no próprio local e logo submetido ao teste, sendo detido de imediato, não se trata sequer de situação de “presunção legal de flagrante delito”, prevista no nº2 do preceito nos termos acima referidos, que pressupõe que o agente é autuado “fora” do local, após perseguição ou tendo consigo objectos do crime. Isto porque o arguido foi detido, no próprio local, junto do automóvel despistado, sem causa aparente, que declarou pertencer-lhe e conduzir no momento do despiste, tudo em acto seguido ao acidente e durante as normais diligências de identificação da viatura e do respectivo condutor.

Situação de imediação a que as circunstâncias previstas no n.º 2 dão consistência, no caso, dentro do que é normal processar-se em tais circunstâncias, sabido que a recolha dos dados relevantes, no local, se prolonga por algum tempo, devido à necessidade de identificação dos condutores, dos veículos, identificação de documentos de uns e outros, tomada de medidas e recolha de vestígios, tempo necessário para dactilografar o próprio auto.

O recorrente questiona a existência de flagrante delito com base na diferença entre a hora a que a sentença dá como provado ter ocorrido o despiste e a hora que consta do auto de notícia como sendo a da ocorrência dos factos ou da realização do teste.

Ora não colhe o argumento de que entre o acidente e o teste de pesquisa de álcool teriam decorrido mais de 3 horas. Desde logo porque tal facto não consta do elenco da matéria provada. Nem que o arguido apenas tivesse regressado ao local tanto tempo depois. E uma coisa é a hora a que o auto foi lavrado, outra, diferente, aquela em que os agentes se deslocaram ao local e procederam à identificação do arguido com vista a submetê-lo ao teste para detecção de álcool, de preceito.

Não resulta provado, de forma alguma, que o seu afastamento temporário do local tenha demorado todo aquele referido período de tempo. Muito menos aquilo onde o recorrente quer chegar, ou seja que tivesse ingerido as bebidas alcoólicas após o acidente, em casa de um cunhado. Aliás no local não foi visto nem se apresentou ninguém como tendo estado na companhia do arguido durante esse tempo. Nem tal pessoa foi arrolada, sequer, como testemunha.

O que o preceito legal em questão acautela não é a coincidência entre a detenção e a hora em que é lavrado o auto. Mas antes que não haja interrupções relevantes entre o acidente e a detenção em si – no caso no local da ocorrência acabada de verificar.

De onde que, ainda que se provasse que decorreu um período de tempo mais ou menos dilatado, durante o qual a GNR tenha estado a proceder ao levantamento dos dados relativos ao acidente, não haveria obstáculo à existência de flagrante delito, por se tratar de prolongamento da diligência.

A hora constante relevante, no caso, é aquela em que se atesta ter procedido à realização do teste para a detecção de álcool no sangue. E o recorrente não questiona que o teste tenha sido efectuado na hora ali indicada. Dando-se o caso de o teste ser realizado, frequentemente, já na esquadra, para onde o agente é conduzido por aí se encontrar o equipamento necessário à realização do teste, bem como para lavrar o respectivo expediente, que também leva o seu tempo a escrever. Sendo certo ainda que quanto mais tempo decorrer até à realização do teste, mais beneficiado fica o arguido, dada a progressiva assimilação do álcool pelo organismo.

Assim tendo-se deslocado a patrulha da GNR para o local do acidente acabado de ocorrer, logo que tomou conhecimento do despiste, onde o arguido que se apresentou como condutor do automóvel sinistrado, que lhe pertencia, tendo procedido de imediato à sua detenção, procedendo, em acto que logo se seguiu, ao teste para detecção de álcool no sangue, que revelou uma taxa acima de 1,20 gr./l., se conclui pela existência de flagrante delito.

Improcedendo assim a invocada nulidade de emprego indevido da forma de processo sumário.

Diga-se a este respeito que, caso processe a referida nulidade, o efeito daí resultante não seria “a total e imediata extinção do procedimento criminal”, como pretende o recorrente.

A nulidade apenas importaria a anulação do acto, como resulta do art. 122º, n.º1 e 2 do CPP. O que implicaria a anulação do julgamento e a remessa dos autos para inquérito, com a subsequente repetição dos termos do processo.

***

A nulidade acabada de apreciar acaba por radicar num pressuposto - não demonstrado - de que “durante o tempo que se ausentou ingeriu Whisky em casa do seu cunhado”.

Querendo com tudo isto o recorrente significar que o estado de alcoolemia resultou de acto posterior ao exercício da condução.

A este respeito (para além de não ter sido referenciada a presença, no local, do suposto cunhado, nem o mesmo ter sido arrolado sequer como testemunha) verifica-se que a decisão recorrida ponderou a questão, tendo-a enunciado e apreciada na respectiva fundamentação da decisão - cfr. fls. 15.

Depois de proceder à sua apreciação o tribunal recorrido julgou improcedente essa defesa, pelas razões ali referenciadas – designadamente pela circunstância de o alegado cunhado não ter sido invocada na altura da ocorrência.

Sendo certo que o arguido nem sequer arrolou esse suposto cunhado como testemunha, nem tão-pouco requereu que fosse chamado a depor (nunca o tendo identificado nem referido a sua morada), para poder ser confrontado com tal “história” e para se averiguar, por exemplo, se o arguido foi a pé ou de carro, a distância a que fica a casa, por que forma podia ter-se deslocado, quanto tempo podia ter levado a deslocação.

Ora o local adequado para a produção de provas é a audiência de discussão e julgamento – cfr. art. 355º do CPP que proíbe expressamente a valoração de provas não produzidas em audiência.

De onde resulta não só que não faria qualquer sentido, como pelo contrário seria ilegal, que se desse como provado determinado facto com base num suposto testemunho não produzido em audiência, nem arrolado, sequer como meio de prova.

Aliás, em termos de senso comum seria de todo descabido que o arguido, depois de se ter despistado com o automóvel que conduzia – sozinho, depois de ter estado a beber com amigos enquanto assistia a um desafio de futebol - fosse, a seguir, ingerir bebidas alcoólicas. Mais seria contra tudo o que á razoável que o arguido voltasse ao local do despiste, sabendo que ali se deslocaria a GNR, se “entretanto” tivesse ingerido wysky. Mais ainda para se assumir como dono e condutor do veículo acidentado. Esquecendo-se de, logo na hora, ou pelo menos quando teve que “soprar no balão”, clamar que bebera só depois do acidente. E nunca tendo convocado o nome de quem quer que fosse que pudesse ter assistido ao despautério, a fim de que pudesse ser chamado dar a cara, em público, por ele.

O que seria ainda mais indesculpável para o arguido, atenta a sua profissão - técnico de laboratório, convivendo diariamente com análises laboratoriais.

Acresce, a este propósito, que, tendo os sujeitos processuais sido informados de que podiam requerer a documentação, nos termos do art. 389º do CPP, nada requereram, tal como consta da respectiva acta – cfr. fls. 11.

Pelo que não tendo havido registo da prova, sempre estaria vedada a reapreciação da decisão da matéria de facto em via de recurso, nunca podendo o tribunal de recurso substituir-se na decisão de tal facto ao tribunal recorrido.

Sendo certo que o recorrente nem arrolou qualquer testemunha que pudesse ter corroborado essa versão. E ele próprio reconheceu, como resulta da decisão recorrida, em matéria não questionada, ter bebido durante o jantar/convívio com amigos/ assistência ao jogo de futebol do F.C. do Porto e se despistou sozinho, sem que haja qualquer referência a factores alheios à pessoa do condutor que pudessem ter causado o despiste.

Sustenta ainda o recorrente que o Auto de Notícia não demonstra a real taxa de alcoolémia que o recorrente apresentava no momento que conduziu o veículo. Afirmação que se insere na alegação já apreciada de que teria consumido as bebidas alcoólicas em casa do cunhado “depois” do despiste. Não questionando que do exame efectuado tenha efectivamente resultado a taxa revelada no teste.

Assim, o que se questiona é que o tribunal não tenha dado como provada a alegada ingestão de bebida após o acidente. O que, pelas razões já enunciadas, não tem suporte legal.

Pelo que também nesta perspectiva o recurso tem que improceder.

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Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, com a consequente manutenção da decisão recorrida. -----

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça [atenta a extensão, grau de complexidade, total vencimento, situação económica do arguido – artigos 513º, n.º1 do CPP e 82º, n.º1 e 87º, n.º1, al. b) do CCJ], em 9 (nove) UC.