Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
953/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. TÁVORA VÍTOR
Descritores: DIREITO DE PREFERÊNCIA
PROPRIETÁRIO CONFINANTE
Data do Acordão: 05/11/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FIGUEIRÓ DOS VINHOS
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Legislação Nacional: ART. 1380.º, N.º 1 DO CÓDIGO CIVIL
Sumário:

1. São elementos constitutivos do direito de preferência no caso vertente que a) ter sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à unidade de cultura. b) O preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado. c) O adquirente do prédio não seja proprietário confinante.
2. Verificado que o adquirente do prédio sobre o qual se pretende exercer o direito era já proprietário confinante quando aquele foi vendido, inexiste o direito de preferência que o Autor pretende fazer valer.
3. Para os fins de exclusão do direito de preferência a que alude a alínea a) do artigo 1 381º do código Civil (natureza ou destino do prédio a algum fim que não a agricultura) é admissível qualquer meio de prova; todavia a prova deve evidenciar actos palpáveis que traduzam uma intenção séria do fim concreto que se propõe dar ao prédio.
Decisão Texto Integral:
Apelação nº 953/04
Relator: Paulo Távora Vítor
Exmos. Desemb. Adjuntos: Drs.
Nunes Ribeiro e Hélder Almeida.

1. RELATÓRIO.
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra.
BB intentou a presente acção declarativa, com processo sumário, contra Fernanda CC e DD, DD, Lda., pedindo se declarasse que o Autor é titular de um direito real de preferência na venda dos prédios rústicos adquiridos pela segunda Ré à primeira, inscritos na respectiva matriz predial da freguesia de Aguda, Figueiró dos Vinhos, sob os números 3395 e 3398 e a consequente substituição da segunda Ré pelo Autor na titularidade do direito de propriedade sobre tais prédios.
Alegou para tanto e em resumo, ser dono de três prédios rústicos sitos na Pena, freguesia da Arruda, Figueiró dos Vinhos, inscritos na respectiva matriz sob os números 3396, 3397 e 3399, sendo que por escritura de compra e venda efectuada no Cartório Notarial de Pedrógão Grande em 16 de Junho de 1998, a primeira Ré vendeu à segunda, dois prédios rústicos sitos na Pena, freguesia da Aguda, Figueiró dos Vinhos, inscri-tos na respectiva matriz sob os números 3395 e 3398, os quais confrontam com os prédios do Autor acima aludi-dos, tra-tando-se todos de prédios rústicos, destina-dos a cul-tura e com áreas inferiores à unidade de cul-tura fixada para a região pela Portaria nº 220/70, isto é, dois hectares. Alegam, ainda, que a segunda Ré não é pro-prietária de nenhum prédio rústico que con-fronte com os adquiridos, que a primeira Ré não é pro-prietária de nenhum prédio encravado que onere prédio da segunda Ré confrontante com aquele e que a primeira Ré, aquando da alienação dos prédios 3395 e 3398, nenhuma comunicação efectuou ao Autor, sendo certo que, caso o tivesse feito, este último não teria deixado de pre-ferir na venda. O Autor teve conhecimento da mencionada aliena-ção apenas em 29 de Julho de 1998, altura em que lhe foi facultada cópia da escritura de compra e venda junto do Cartório Notarial de Pedrógão Grande.
As Rés contestaram por impugnação rejeitando a maior parte dos factos articulados pelo Autor e por excepção, alegando que os prédios imediatamente exis-tentes a sul do prédio rústico inscrito na matriz sob o artº 3398 (prédio rústico inscrito na matriz sob o artº 3394 e o prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 934 são e eram, à data da realização da escritura de compra e venda em causa nos autos, propriedade da segunda Ré. Aduziram ainda que quer os prédios da pri-meira Ré 3395 e 3398, quer o da segunda Ré, inscrito na matriz sob o artº 3394, desde há 20, 30 e mais anos que não se destinam a qualquer tipo de exploração agrícola e que, no que con-cerne aos prédios objecto da preferên-cia na presente acção (3395 e 3398), embora os mesmos se encontrem ins-critos na matriz como prédios rústicos, são há 20, 30 e mais anos, parte integrante de constru-ções urbanas erigidas pela sociedade "EE", anterior proprietária do prédio rústico ins-crito na matriz sob o artº 3394.
Por último, as Rés reconvieram, para o caso de a acção ser julgada procedente, pedindo se decla-rasse a união e a incorporação dos prédios inscri-tos na matriz sob os artigos 3395 e 3398 com os prédios urbanos refe-ridos no artº 21º e 23º da contestação e, consequente-mente, seja declarada a favor da segunda Ré a aquisição imobiliária industrial daqueles prédios e seja reconhe-cido à segunda Ré a titularidade do direito de proprie-dade sobre os aludidos prédios, alegando para o efeito que há mais de 30 anos a sociedade "EE” construiu com dinheiro seu um edifício e um aglomerado de tanques, construções essas que foram efectuadas em parte no terreno ins-crito na matriz pre-dial sob o nº 3394, em parte no lado mais a nascente no terreno inscrito na matriz predial rústica sob o artº 3390, em parte no lado mais a norte dos terrenos ins-critos na matriz predial rústica sob os artsº 3395 e 3398 e ainda em parte no terreno exis-tente entre estes dois últimos, propriedade de Manuel dos Reis, sendo que o valor da construção da casa e dos tanques era, à data da construção e da sua conclusão de valor não inferior a Esc. 2.000.000$00, e o valor total dos terrenos da pri-meira Ré ocupados com a referida construção era nessa altura de Esc. 20.000$00 e actual-mente de Esc. 50.000$00.
O Autor apresentou resposta à contestação refe-rindo que a segunda Ré comprou à primeira Ré quatro prédios rústicos, sendo que da respectiva escritura não resulta qualquer intenção de a compradora vir a afectar tais prédios a fins diferentes da cultura, como devia se fosse o caso e contestaram a reconvenção dizendo que a sociedade "EE, Lda." ao edifi-car as construções aludidas pelas Rés apenas ocupou o terreno afecto ao prédio identificado na repartição de Finanças de Figueiró dos Vinhos com a matriz rústica 3394 e que ainda que houvessem ocupado parte dos outros terrenos sempre tal ocupação teria ocorrido de má fé.
Por despacho de fls. 201 foi determinada a inter-venção, ao lado do Autor, do seu cônjuge Maria Cândida Batista Coudel.
No saneador conheceu-se da validade e regularidade da instância tendo sido elencados os factos provados e elaborada a BI sobre a qual incidiu reclamação deci-dida a fls. 255.
Procedeu-se a julgamento acabando por ser profe-rida sentença que julgou a acção improcedente por não provada e absolveu os RR. do pedido formulado pelos AA..
Daí o presente recurso de apelação interposto pelos AA., os quais no termo da sua alegação pediram se revogue a sentença apelada e a procedência do pedido de reconhecimento do direito de preferência, que impetra-ram.
Foram apresentadas para tanto a seguintes,

Conclusões.

1) Dos pressupostos cumulativos para atribuição do direito real de preferência a Mma. Juíza a quo só consi-derou como não provado o terceiro requisito: que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante (sendo neste caso a adquirente a segunda Ré)
2) E tal requisito foi considerado improvado por-que se considerou que a segunda Ré, quando em 16 de Junho adquiriu os prédios identificados e descritos nas alíneas “E” e “F” dos factos considerados assentes, prédios 3398 e 3395 (dos quais se requer a preferên-cia), era já “proprietária confinante em virtude de ser de sua propriedade o prédio 3394”
3) “Com efeito, se a Ré compradora era já proprie-tária, por a haver adquirido em momento anterior, de um prédio consonante com o alienado, não pode haver direito de preferência por parte de qualquer outro pro-prietário confinante” (transcrição da douta sentença).
4) Mas, de acordo com as alíneas e’, g’, h’, i’ dos factos dados como provados na sentença verifica-se que o prédio identificado com o nº 3394 propriedade da segunda Ré é “Um – prédio misto, composto de casa de rés-do-chão, primeiro andar e sótão terreno de cultura e pastagem com duas azenhas movidas a água”...
5) No prédio inscrito na matriz sob o artigo 3394, no lado mais a nascente, foi construído um prédio urbano composto de rés-do-chão, primeiro andar e sótão para instalação e exploração de um restaurante e no lado mais a poente, foram construídos vários tanques em cimento para exploração de um viveiro de trutas (res-posta aos números 20 e 21 da base instrutória)”;
6) Estas construções foram realizadas pela socie-dade “Fernando Sena & Violante, Lda”, com dinheiro seu, em data concretamente não apurada mas anterior a 1984 e posterior a 1978 Res-posta aos números 26 e 28 da base instrutória)”;
7) E o prédio esteve afecto à indústria hoteleira e piscicultura durante cerca de três anos (resposta ao número 33 da base instrutória)”.
8) “e ainda que desde 1989......tendo a segunda Ré dado entrada na Câmara Municipal de Figueiró dos Vinhos de um requerimento para licenciamento de um projecto turístico que pretende desenvolver reconstruindo e ampliando as construções existentes no prédio inscrito na matriz sob o artº 3394, projecto que está a ser objecto de estudo pelos competentes departamentos da Câmara.” (sic).
9) O artigo matricial 3394 de Figueiró dos Vinhos está inscrito na matriz como prédio misto (confrontar alínea x dos factos considerados assentes no despacho saneador).
10) O prédio identificado na matriz com o nº 3394 é na sua essência um prédio urbano, ao qual é dada uma destinação urbana, e os seus proprietários estão a ten-tar ampliar as construções nele existentes.
11) Nos termos do disposto no artigo 1 380º do C.C. gozam de preferência os proprietários de terrenos con-finantes com área inferior à unidade de cultura e nos termos do disposto no artigo 1 381º alínea a) do C.C. não gozam do direito de preferência os proprietá-rios de terrenos confinantes “Quando algum dos terrenos consti-tua parte componente de um prédio urbano ou se destine a algum fim que não seja a cultura”.
12) O prédio propriedade da segunda R. identifi-cado como artigo 3394º é por definição e essência um prédio urbano, atentos os factos provados na sen-tença, logo não susceptível de permitir a invocação de prefe-rência aos seus proprietários ou de obstar a que seja concedida preferência a terceiros proprietários de pré-dios rústicos confinantes com área inferior à uni-dade de cultura, caso dos Autores. (Contrariamente ao que foi decidido na sentença recorrida)
13) Mesmo que se considerasse que o prédio identi-ficado com o artº 3394 fosse um prédio composto por construções e algum logradouro, sempre teria de defi-nir-se qual a essência do prédio, se a parte urbana é um mero apêndice da rústica ou se a rústica é um mero apêndice da urbana.
14) A não ser assim, teríamos, ao arrepio da legislação vigente, consagrada uma preferência automá-tica para todos os prédios urbanos que tivessem um sim-ples logradouro...
15) A Mma Juíza a quo não determinou a essência do prédio, não o definiu como rústico, antes pelo contrá-rio, todas as referências a tal prédio indicam ter des-tinação urbana.
16) Logo a sua propriedade por parte da segunda R. não poderia impedir a prova de um requisito legal apto a indeferir a pretensão dos AA., porque a parte rústica de tal prédio é um mero componente do prédio urbano, e não se destina a cultura. (artigo 1381 alínea a) do C.C.)
17) E, mesmo que se entendesse que o prédio pro-priedade da segunda R. identificado como artigo 3394º tivesse uma parte rústica apta a permitir o gozo de preferência, sempre se teria (artigo 1 380º nº 2 alí-neas b) e c) do C.C.) de verificar qual o confinante capaz de obter área mais aproximada à unidade de cul-tura ou então abrir-se licitação entre vários confinan-tes.
18) Considerando que “o objectivo do artigo 1380º é fomentar o emparcelamento de terrenos a minifundiá-rios, criando objectivamente as condições que, sob o ponto de vista económico, se consideram imprescindíveis à constituição de explorações rendíveis“.
19) Nunca um prédio essencialmente urbano como o que é identificado como artigo matricial 3394º de Figueiró dos Vinhos, propriedade da segunda R., poderia afastar o direito de preferência dos AA. e então a con-finância desse prédio da R. compradora não pode ser tomada em conta para efeitos de preferência por inte-grar o disposto no artigo 1381 alínea a) do C.C.
20) A segunda R. não poderia gozar do direito de preferência, e as RR estavam obrigadas a cumprir e res-peitar o direito de preferência dos AA. na venda dos artigos matriciais rústicos 3395 e 3398 de Figueiró dos Vinhos.
21) A sentença apelada violou os artigos 1380º, 1381º, 416º, todos do C. C., uma vez que se devem con-siderar provados todos os requisitos que permitem aos AA. gozar do direito de preferência, para além de que foi lavrada em notória con-tradição com os factos consi-derados provados.
Contra-alegaram os apelados pugnando pela confir-mação da sentença.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. FUNDAMENTOS.
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2.1. Factos.
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Os factos que interessam à decisão da causa cons-tam a fls. 461 ss da sen-tença apelada.
Assim, não tendo sido impugnada a matéria de facto nem havendo tão pouco qualquer alteração a fazer-lhe, nos termos do preceituado no artº 713º nº 6 do Código de Processo Civil, dá-se aqui a mesma por reproduzida.
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2.2. O Direito.
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Nos termos do precei-tuado nos artsº 660º nº 2, 684º nº 3 e 690º nº 1 do Código de Pro-cesso Civil, e sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, as conclusões da alegação de recurso deli-mitam os poderes de cognição deste Tribunal. Nesta conformi-dade e conside-rando também a natureza jurídica da maté-ria versada, cumpre focar os seguintes pontos:
- O caso vertente.
- Da confinância do prédio da Ré nº 3394, sua afec-tação e invocado o direito preferência
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2.2.1. O caso vertente.
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Os A. BB intentou a presente acção de preferência com processo sumário contra os RR. Fernanda CC "DD Lda.", preten-dendo preferir na compra que a segunda Ré efectuou à primeira dos prédios inscritos na respectiva matriz predial da freguesia de Aguda, Figueiró dos Vinhos, sob os números 3395 e 3398 e a consequente substituição da segunda Ré pelo Autor na titularidade do direito de propriedade sobre tais prédios.
Estatui o artigo 1 380º nº 1 do Código Civil - Diploma a que doravante pertencerão os restantes norma-tivos citados sem menção de origem – que "Os proprietá-rios de terrenos confinantes, de área inferior à uni-dade de cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência nos casos de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédios a quem não seja pro-prietário confinante". Tem este normativo por escopo permitir o progressivo ordenamento dos terrenos para fins agrícolas em unidades de dimensões consideradas rentáveis; Assim se compreende que "não gozem do direito de preferência - nomeadamente alínea a) do artigo 1 381º - os proprietários de terrenos confinan-tes quando a) algum dos terrenos constitua parte compo-nente de um prédio urbano ou se destine a algum fim que não seja a cultura".
Para que o Autor tivesse obtido ganho de acção seria necessário que tivesse provado que:
- Fora vendido ou dado em cumprimento um pré-dio com área inferior à unidade de cultura.
- O preferente fosse dono de prédio confinante com o prédio alienado.
- O adquirente do prédio não fosse proprietário con-finante.
A Sra. Juiz considerou provados o primeiro e segundo requisitos. Todavia já não considerou provado o terceiro requisito, entendendo que o adquirente do pré-dio e ora Autor, proprietário do prédio nº 3394, não é confinante.
Além do mais chama o Autor apelante em apoio da sua tese a alegada natureza urbana do prédio nº 3394 do 2º Réu.
Apreciemos pois estas questões em pormenor.
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2.2.2. Da confinância do prédio da Ré nº 3394, sua afectação e invocado o direito preferência.
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Flúi da letra do artigo 1 380º nº 1 última parte que o direito de preferência do proprietário confinante com o alienado só pode exercer-se em relação a quem não seja proprietário confiante.
Neste sentido propenderam Pires de Lima e Antunes Varela, os quais expressamente entendem ser pressuposto para o exercício do direito de preferência previsto na Lei que o adquirente do prédio não seja proprietário confinante; a idêntica conclusão chega Galvão Telles quando sustenta que quem alegar o direito de preferên-cia terá que provar além do mais o seguinte: "fazer qualquer dos proprietários ou propor-se fazer a venda ou dação em cumprimento do seu terreno a um ter-ceiro que não seja proprietário confinante" Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela "Código Civil Anotado" III, 2ª edição, pags. 270 e 271 e Galvão Telles in "O Direito" 106 a 109. Na Jurisprudência cfr. Acs. do S.T.J. de 7-7-1994 (P. 85 130) in Col. de Jur., 1994, 3, 52; de 7-7-1994 (P. 85 130) in Bol. do Min. da Just., 439, 562; de 13-10-1993 (P. 83 525) in Col. de Jur., 1993, 3, 64. . Ora como se vê dos factos provados, a 2ª Ré era já proprietária do prédio nº 3 394 confinante com o alienado, em vir-tude de o haver adquirido num momento anterior mais concre-tamente em . Bastaria esta circunstância para afastar o direito de preferência invocado pelo Autor.
O Apelante espraia-se de seguida em considerações acerca da natureza do prédio do 2º Réu adquirente refe-rindo que o mesmo não é rural, motivo por que não pode ser afastado o direito de preferência que invoca. É que foram realizadas no mesmo pela sociedade Ré obras com vista à exploração de hotelaria e piscicultura de um complexo urbano ali edificado sendo certo que a preten-são da "DD Lda." é de as ampliar sobre os prédios adquiridos. A parte rústica do prédio a existir seria mero componente de um prédio urbano; e ainda que a parte rústica do prédio confinante com o prédio vendido viabilizasse o exercício do direito de preferência por parte da 2ª Ré, seria necessário que para tanto se apu-rasse qual o confinante (A. ou 2ª Ré) capaz de obter a área mais aproximada da unidade de cultura para a zona.
A sentença apelada teria pois, na tese do ape-lante, vio-lado o artigo 1 381º alínea a) de harmonia com o qual não gozam do direito de preferência os pro-prietários de terrenos confinantes quando algum dos terrenos consti-tua parte componente de um prédio urbano ou se destine a algum fim que não seja a cultura".
O Autor apelante não tem qualquer razão; na ver-dade o que o mesmo faz é uma manobra de inversão de situações colo-cando a 2ª Ré na qualidade de preferente que obviamente não tem, já que o é apenas do Autor. Com releva para a sua tese, teria o A. que provar que o prédio da 2ª Ré nº 3 394, não era confinante e como verificámos, não conseguiu fazê-lo. No entanto adiante-se, que tal como se bem se explanou em primeira instân-cia, tudo indica que as parcelas compradas pela 2ª Ré não se destinam a quaisquer fins agrícolas mas antes à construção com vista à ampliação das instalações da mesma, facto que o próprio Autor até sustenta – se bem que para afastar o alegado direito de preferência da 2ª Ré apelada, o qual como vimos, não está em causa. São elementos indicado-res do destino a dar aos prédios adquiridos pela Ré A prova do destino dos prédios pode fazer-se por qualquer meio, como tem entendido nomeadamente o Supremo Tribunal de Justiça – Cfr Acs. de 21-6-1994 (P. 85 358) in Col. de Jur., 1994, 2, 154; de 23-5-1996 (P. 39/96) in Bol. do Min. da Just., 457, 370.

, a natureza desta última como socie-dade por quotas cujo objecto social (construção civil reconstrução e explo-ração directa de locais turísticos de hotelaria e afins), o facto de o prédio 3394 ser ocupado primor-dialmente com construções afec-tas à hotelaria e desde 1989 não se haver praticado qualquer actividade agrí-cola não só no prédio acima aludido, como nos prédios nsº 3395 e 3398, objecto do direito de preferência. A reforçar a tese da vocação não rural dos prédios adquiridos saliente-se que a 2ª Ré deu entrada de um projecto na Câmara Municipal de Figueiró dos Vinhos, para licenciamento de um projecto turístico que pretende desenvolver, construindo e ampliando as construções existentes no prédio inscrito na matriz sob o artigo 3 394, projecto que está a ser alvo de estudo pelos departamentos competentes daquela Câmara.
Nesta conformidade as objecções que o Autor coloca à improcedência da acção ficam sem cabimento, pelo que o aresto irá confirmado.

Poderá assim concluir-se o seguinte:

1) São elementos constitutivos do direito de pre-ferência no caso vertente que a) ter sido vendido ou dado em cumprimento um prédio com área inferior à uni-dade de cultura. b) O preferente seja dono de prédio confinante com o prédio alienado. c) O adquirente do prédio não seja proprietário confinante.
2) Verificado que o adquirente do prédio sobre o qual se pretende exercer o direito era já proprietário confinante quando aquele foi vendido, inexiste o direito de preferência que o Autor pretende fazer valer.
3) Para os fins de exclusão do direito de prefe-rência a que alude a alínea a) do artigo 1 381º do código Civil (natureza ou destino do prédio a algum fim que não a agricultura) é admissível qualquer meio de prova; todavia a prova deve evidenciar actos palpáveis que traduzam uma intenção séria do fim concreto que se propõe dar ao prédio.
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3. DECISÃO.
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Pelo exposto decide-se o seguinte:
- Julga-se a apelação improcedente e confirma-se a sentença apelada.
Custas pelo Autor apelante.