Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
672/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS: SUA FIXAÇÃO
JUROS DE MORA
Data do Acordão: 04/12/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAÇ JUDICIAL DE SANTA COMBA DÃO - 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTºS. 496º, Nº 3, DO C. CIV. .
Sumário: I – A indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixada de forma equilibrada e ponderada, atendendo, quer haja dolo ou mera culpa do lesante, ao grau de culpabilidade do ofensor, à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, como, por exemplo, o valor actual da moeda .
II – A lei impõe que o juiz, na fixação ou concretização dos danos não patrimoniais use de todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação da realidade da vida, visando a compensação real do lesado pelo mal causado .
Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- A..., residente na Rua 4 de Julho, 42, Sobral de Ceira, em Coimbra, intenta a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, emergente de acidente de viação, contra a B..., com sede na Av. José Malhoa, 9, Lisboa, pedindo se condene a R. a pagar-lhe a quantia global 20.000.000$00, acrescida dos juros legais desde a citação e até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta este seu pedido, em síntese, num acidente de viação, ocorrido no em 14 de Janeiro de 1998, provocado pelo condutor do veículo ligeiro de passageiros de matrícula OX-27-03, C... que terá adormecido ao volante, perdendo o controlo da viatura, invadindo a berma da estrada onde se encontrava ele, A., em serviço de fiscalização do trânsito, como elemento da Brigada de Trânsito da GNR.. Como consequência do acidente sofreu as graves lesões que descreve e teve os prejuízos patrimoniais e não patrimoniais que indica e de que se quer ver ressarcido.
Pelo pagamento dos danos invocados é responsável a R. Seguradora, para quem foi transferida a responsabilidade civil derivada da circulação do veículo automóvel conduzido por aquele condutor, através da apólice nº AU-20722361.
1-2- A R. Seguradora, contestou, sustentando, também em síntese, aceitar que a culpa do acidente se ficou a dever, em exclusivo, ao condutor do veículo OX-27-03, nela segurado. Impugnou porém as lesões, tratamentos, internamentos e incapacidades que o A. terá sofrido por desconhecer esses factos.
Termina pedindo o julgamento da acção em conformidade com os factos que se provarem.
1-3- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e a base instrutória, se procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, depois do que se respondeu àquela base e se proferiu a sentença final.
1-4- Nesta considerou parcialmente procedente por provada a acção, condenado-se a R. Seguradora a pagar ao A., a quantia de global de 10.000.000$00 (49,879,78 euros ), quantia esta acrescida de juros moratórios, à taxa legal de 4% desde a presente decisão e até integral pagamento.
1-5- Não se conformando com esta sentença, dela vieram recorrer a R. Seguradora e o A, recursos que foram admitidos como apelação e com efeito devolutivo.
1-6- A recorrente Seguradora alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- A indemnização por danos não patrimoniais não se destina a alterar o status económico antes do lesado.
2ª- Mas apenas a compensá-lo pelas dores sofrimentos e situação de debilidade física em que o A. ficou como consequência do acidente.
3ª- Na sua fixação deve o julgador ser moderado e, sobretudo, não esquecer que o valor atribuído pela jurisprudência à perda do valor supremo que é o direito à vida do lesado, é na ordem dos 40.000 euros.
4ª- No caso dos autos e recorrendo a este máximo, o montante indemnizatório a fixar não deveria ser superior a 1.300.000$00 ( 6.500 euros ).
5ª- Não tendo assim decidido, a sentença violou o disposto no art. 496º do C.Civil.
1-7- Por sua vez o A. apelante também alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- Ao recorrer à equidade, a Mª Juiz não aduziu quaisquer elementos adjuvantes do cálculo da indemnização, pelo que a sua fixação não será equitativa mas sim arbitrária.
2ª- Sendo o montante indemnizatório a atribuir a um capital que deve gerar rendimento capaz de colocar o A. na situação que, previsivelmente, teria se não fosse o acidente, haverá que ter em conta, nesse cômputo, a inflação, que consumirá uma parte substancial, se não a totalidade, dos juros do capital, pelo que dificilmente se justifica qualquer dedução a esse capital para que o mesmo se esgote, no tempo de vida do lesado, pelo que o mesmo se esgotará, inelutavelmente, pela erosão provocada pela inflação.
3ª- No caso, mais do que a perda de capacidade de ganho e consequente acréscimo de esforço resultante da IPP de 10%, há uma efectiva perda de ganho superior a essa percentagem, que resulta da impossibilidade prática de o A. aceder a postos e patamares de vencimento que, se não fosse o acidente e suas consequências físicas, com toda a probabilidade alcançaria.
4ª- Sendo cerca de 650 euros a diferença salarial entre os topos da carreira que o A. almejava e que, com elevada probabilidade alcançaria e aquela a que ficou confinado, será razoável, prudente e mesmo exíguo estimar uma perda média mensal ( ao longo da carreira activa e da reforma ) de 250 euros.
5ª- Assim, a indemnização por danos patrimoniais futuros deverá ser, sempre, de montante superior a 75.000 euros, a este valor se limitando, por ser o do pedido.
6ª- Também a indemnização por danos não patrimoniais foi fixada em termos inadequados e miserabilistas, pois a compensação não teve em conta o sofrimento físico passado, presente e futuro do A., mas sobretudo não teve em conta o sofrimento psíquico e frustração por se ver diminuído e impossibilitado de aceder a uma carreira que almejava e lhe seria muito gratificante e não apenas em termos materiais.
7ª- Deve ser elevado o montante atribuído a título de danos não patrimoniais.
8ª- Caso assim se não entenda e porque a indemnização por danos patrimoniais deverá exceder o valor parcelar peticionado, pois que o tribunal não está vinculado ou limitado aos valores parciais peticionados, mas apenas ao montante global do pedido, só o montante indemnizatório global deverá ser circunscrito ao limite global do pedido ( art. 661º do C.P.C. ), pelo que, ainda que com valores parcelares distintos dos peticionados, deverá a indemnização ser fixada naquele valor ( 99.759,58 euros ).
9ª- Carece ainda a Mª Juiz de razão pela não condenação em juros desde a citação, porquanto não procedeu a uma verdadeira actualização dos valores indemnizatórios ( nem tal lhe foi pedido ), sendo que, na actual redacção do art. 805º nº 3 do C.Civil, o devedor é considerado em mora desde a citação, sempre que se trate de responsabilidade por facto ilícito, como é o caso dos autos.
10º- Violou a Mº Juiz o disposto nos arts. 483º nº 1, 562º, 564º e 566º do C.Civil.
1-9- A apelada Seguradora respondeu a estas alegações, sustentando não provimento deste recurso.
Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
II- Fundamentação:
2-1- Dado que a matéria de facto dada como assente na 1ª instância não foi objecto de impugnação, nem vemos que haja qualquer motivo para a alterar, de harmonia com o disposto no art. 713º nº 6 do C.P.Civil, remete-se para os termos da decisão proferida na 1ª instância sobre essa matéria.
2-2- Como se vê pelo teor das alegações de recurso, os apelantes apenas colocam em dúvida os montantes atribuídos ao A. a título de danos patrimoniais e danos não patrimoniais e ainda o A. quanto à data a partir da qual são devidos juros em relação a esses danos.
A) Apelação da R. Seguradora:
2-3- Começando pela apelação desta R. ( que foi interposto em primeiro lugar), vemos que ela discorda em relação ao montante que foi fixado pelo tribunal, ao lesado ( A.), a título de danos não patrimoniais.
Segundo a apelante a indemnização por danos não patrimoniais não se destina a alterar o status económico antes do lesado, mas apenas a compensá-lo pelas dores sofrimentos e situação de debilidade física em que o A. ficou como consequência do acidente. Na sua fixação deve o julgador ser moderado e, sobretudo, não esquecer que o valor atribuído pela jurisprudência à perda do valor supremo que é o direito à vida do lesado, é na ordem dos 40.000 euros. No caso dos autos e recorrendo a este máximo, o montante indemnizatório a fixar não deveria ser superior a 6.500 euros.
Na douta sentença recorrida em relação aos danos não patrimoniais, considerou-se que o legislador estabeleceu que, no cálculo da indemnização por danos não patrimoniais se deve recorrer à equidade, tendo em conta os danos causados, o grau de culpa, a situação económica do lesante e do lesado e as demais circunstâncias do facto. Considerou-se depois que, atendendo ao que resultava da factualidade provada, se entendia razoável computar em 2.500.000$00 ( 12.469,94 euros ) o montante da indemnização a arbitrar ao A. a esse título.
Vejamos:
A obrigação de indemnização neste âmbito decorre do disposto no art. 496º nº 1 que estabelece que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela dos direitos ”.
Não se concretiza na disposição legal os casos de danos não patrimoniais que justifiquem uma indemnização. Refere-se tão só que esses danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Significa isto que cabe ao tribunal, no caso concreto, dizer se o dano merece ou a tutela do direito.
No caso vertente parece-nos que, pela sua gravidade, os danos sofridos pela A. e que adiante identificaremos, merecem ser indemnizados.
No que toca ao quantum indemnizatório estabelece o art. 496º nº 3 que “o montante da indemnização será fixado equitativamente, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º ”. Isto é, a indemnização por danos não patrimoniais, deve ser fixada de forma equilibrada e ponderada, atendendo em qualquer caso ( quer haja dolo ou mera culpa do lesante ) ao grau de culpabilidade do ofensor, à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, como por exemplo, o valor actual da moeda.
Como dizem Pires de Lima e Antunes Varela “ o montante de indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas de criteriosa ponderação da realidade da vida ” ( C.Civil Anotado, volume 1º, pág.501, 4ª edição ).
No caso dos autos, as lesões que o lesado sofreu foram muito graves. Concretamente sofreu diversos ferimentos na cabeça e no joelho direito, com rotura do menisco interno e externo, padecendo de muitas dores. Sofreu internamentos hospitalares, teve de se submeter a consultas médicas e a tratamentos de fisioterapia durante um período dilatado de tempo, os quais eram muito incómodos e dolorosas. O A. esteve incapacitado totalmente por longo período. Apresenta hoje dores no joelho direito, sobretudo em mudança de tempo, descidas e esforço prolongado O joelho direito não permite ao A. a flexão total da perna, não lhe permitindo a corrida, saltos e alguns movimentos em carga. O A. apresenta hipotrofia da coxa direita de três centímetros. Após o acidente, por causa das consequências deste, é impossível ao A. realizar, pelo menos, as provas físicas referidas nas alíneas a) e d) de 29 dos factos provados, bem como ficou impossibilitado de praticar todos os desportos aludidos em 31 desses mesmos factos. O A., quer devido a ver-se semi-inválido na sua idade, quer devido a sentir-se impossibilitado de fazer o curso de sargentos e progredir na carreira profissional, teve grande sofrimento psíquico. Sofrendo grande desgosto por não poder praticar todos os desportos que antes do acidente praticava. As sequelas definitivas do acidente correspondem a uma incapacidade permanente de 10%.
Tudo estas circunstâncias indiciam patentes transtornos, contrariedades e sofrimentos, tratando-se de uma pessoa ainda jovem que se viu parcialmente incapacitada para o resto dos seus dias. O facto de se sentir impossibilitado de progredir na carreira profissional, com a correspondente frustração, constitui dano moral considerável.
Evidentemente que não desconhecemos a dificuldade que existe, neste campo, em concretizar em algo de material, aquilo que é imaterial ou espiritual, realidades tais como “dor”, “desgosto”, “sofrimento”, “contrariedades”, “preocupações”, “frustrações”. Mas a lei impõe que assim seja, devendo o juiz na fixação ou concretização de tais danos, como já se disse, usar de todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas de criteriosa ponderação da realidade da vida.
Por outro lado e respondendo directamente ao entendimento da apelante, de que o julgador deve ser moderado na fixação da indemnização neste âmbito, temos vindo a entender que o valor de uma indemnização neste campo, deve visar compensar realmente o lesado pelo mal causado, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance expressivo e não ser meramente simbólico.
Ponderando em todos os elementos salientados e ainda no valor actual da moeda, bem como no facto de o lesado em nada ter contribuído para o acidente de que foi vítima, somos em crer que a indemnização fixada, neste âmbito, na 1ª instância, peca até por defeito. Assim e porque o recorrente A. também impugna tal valor, entendemos adequado fixá-la em 15.000 euros.
B) Apelação do A:
2-4- No recurso, o apelante começa por dizer que discorda do dano patrimonial futuro que a 1ª instância fixou porque não aduziu quaisquer elementos adjuvantes do cálculo da indemnização, pelo que a sua fixação não será equitativa mas sim arbitrária. Acrescenta que concorda com o princípio expresso na sentença de que o montante indemnizatório a atribuir, deverá corresponder a um capital que deve gerar rendimento capaz de colocar o A. na situação que, previsivelmente, teria se não fosse o acidente. Haverá, porém, que ter em conta, nesse cômputo, a inflação, que consumirá uma parte substancial, se não a totalidade, dos juros do capital, pelo que dificilmente se justifica qualquer dedução a esse capital para que o mesmo se esgote, no tempo de vida do lesado, pelo que o mesmo se esgotará, inelutavelmente, pela erosão provocada pela inflação. Acrescenta que no caso vertente, mais do que a perda de capacidade de ganho e consequente acréscimo de esforço resultante da IPP de 10%, há uma efectiva perda de ganho superior a essa percentagem, que resulta da impossibilidade prática de o A. aceder a postos e patamares de vencimento que, se não fosse o acidente e suas consequências físicas, com toda a probabilidade alcançaria. Sendo cerca de 650 euros a diferença salarial entre os topos da carreira que o A. almejava e que, com elevada probabilidade alcançaria e aquela a que ficou confinado, será razoável, prudente e mesmo exíguo estimar uma perda média mensal ( ao longo da carreira activa e da reforma ) de 250 euros. Assim, a indemnização por danos patrimoniais futuros deverá ser, sempre, de montante superior a 75.000 euros, a este valor se limitando, por ser o do pedido
Na douta sentença recorrida sobre o assunto, em síntese, referiu-se que, optando-se por qualquer dos critérios usados para cálculo dos danos patrimoniais futuros, o essencial é que na fixação da indemnização por danos futuros se tenha presente que a quantia a atribuir ao lesado há-de ressarci-lo, durante o tempo provável da sua vida activa ( período laboralmente útil ), de forma a representar um capital produtor do rendimento que cubra a diferença entre a situação anterior e a actual até final desse período, que por não ser possível averiguar o seu valor exacto teremos de recorrer a um juízo de equidade. Entendeu depois usar a tabela financeira que é usual utilizar-se para esse efeito, considerando para tal avaliação, ao provável tempo de vida activa do lesado ( de forma a representar um capital produtivo de um rendimento que cubra a diferença entre a situação anterior á lesão e a actual até final desse período, por modo a que, findo este, se extinga por completo ) e os rendimentos auferidos, à data do evento, pelo lesado. Considerou depois que o A. auferia o vencimento mensal de cerca de Esc. 200.000$00 líquidos mensais, tinha 32 anos de idade, sendo previsível que, pelo menos, até aos 70 anos de idade, pudesse desempenhar as suas funções, ponderando ainda no facto de se ter provado que está impossibilitado de progredir na carreira profissional, designadamente, de ascender ao curso de furriéis e sargentos. Chegou assim ao montante de 7.500.000$00 ( 37.409,84 euros ), quantia que considerou equitativa.
Vejamos:
Logo numa primeira análise ao recurso do apelante e face aos elementos que focamos do douto aresto recorrido, não é certo que não se tenha aduzido quaisquer elementos adjuvantes do cálculo da indemnização. Com efeito esses elementos focaram-se, concretamente referiu-se que deveria, para o cômputo final ( através da mencionada fórmula financeira ) atender-se ao vencimento mensal do requerido, à sua idade, até que idade se deveria referir o cálculo, considerando-se ainda a circunstância da impossibilidade de progredir na carreira profissional. Implicitamente atendeu-se também ao grau de incapacidade de ficou a padecer definitivamente o A..
A nossa jurisprudência tem vindo a entender que a indemnização neste âmbito deve ser calculada, em atenção ao tempo provável da vida activa do lesado, de forma a representar um capital produtor de rendimento que cubra a diferença entre a situação anterior e a actual até ao fim desse período, segundo as tabelas financeiras usadas para determinação do capital necessário à formação de uma renda periódica correspondente ao juro de 2,5% ( taxa considerada a mais ajustada, dado o período de estabilidade monetária - neste sentido, entre outros, Ac. do STJ de 6-7-00, Col. Jur. 2000, II, 144 ).
A nosso ver, é de aceitar em termos genéricos esta posição. Porém entende-se que a tabela financeira deve ser usada como critério meramente indicativo, devendo ser os seus resultados alterados, caso se mostrem desajustado ao caso concreto.
No caso dos autos deve-se atender ao vencimento que o lesado auferia (200.000$00 - 1000 euros x 14 meses ), à idade que tinha à data do acidente ( 32 anos, já que nasceu a 17-11-65 - doc. de fls. 22 -) , ao tempo de vida activa ( até aos 70 anos, isto é, 38 anos )11 Temos vindo a considerar, no cálculo respectivo, o tempo provável de vida do lesado ( que ficcionamos em 70 anos ) e não ao tempo provável de vida activa , dado que a diminuição da perda do ganho, não acaba, como é notório, com a idade da reforma mantendo-se até à morte do lesado ( neste sentido se tem orientado, segundo cremos, a mais recente jurisprudência, v.g. Ac. do STJ de 13-3-2003 in AJ 47º e 48º, 33 )., à incapacidade permanente de que ficou a padecer ( 10% ) e à dita taxa de juro, o que, aplicando a dita fórmula financeira, dará uma quantia à volta de 34.060 euros2A fórmula financeira usada é a seguinte: C= Px ( 1/i - 1+i/ ( 1+ i) Nx i) + P x ( 1+i )- N, sendo que C é o capital a depositar no 1º ano, P é prestação a pagar anualmente ao lesado, o i é a taxa de 2,5% e o N é o número de anos de vida activa e em que a prestação se manterá - vide Ac. do STJ de 4-2-93, Col. Jur. Ano I, Tomo I, pág. 130-., que se arredonda para 35.000 euros, quantia que, de resto, se nos afigura equilibrada.
No caso vertente haverá ainda que atender à circunstância específica de se ter provado que após o acidente, por causa das consequências deste, é impossível ao A. realizar, pelo menos, as provas físicas referidas nas alíneas a) e d) de 29. dos factos provados, o que o impossibilitará de ascender na carreira profissional, nos termos definidos nos factos assentes.
Evidentemente que a inerente queda dos rendimentos, derivados deste circunstancionalismo, deverá ser também indemnizável. Aqui, todavia, a fixação do respectivo quantitativo, afigura-se ainda mais difícil, dado que se desconhece a forma e o momento de progressão na carreira por parte do A.. Atendendo, porém, aos quantitativos aludidos no nº 34 dos factos provados, somos em crer que uma quantia à volta dos 10.000 euros se afigura ajustada.
Temos assim que o A. terá direito a receber, a título de danos patrimoniais futuros/lucros cessantes, a quantia global de 45.000 euros.
Respondendo à objecção do A. de que, no cômputo da indemnização, através da tabela financeira, a inflação consumirá uma parte substancial, se não a totalidade, dos juros do capital, pelo que se não justifica qualquer dedução ao capital encontrado, diremos que tudo estará na forma como o lesado o aplicar a quantia monetária, recebida por inteiro, logo de imediato. Por isso, entendemos aplicar tal fórmula sem a ressalva a que se refere o apelante.
2-5- O apelante discorda ainda do montante indemnizatório que lhe foi atribuído, a título de danos não patrimoniais.
Já acima nos referimos ao assunto, concluindo que a quantia ajustada, a nosso ver, neste âmbito, será de 15.000 euros.
Remete-se para o que acima se disse sobre a questão.
2-6- Sustenta ainda o apelante que a Mª Juiz carece de razão pela não condenação em juros desde a citação, porquanto não procedeu a uma verdadeira actualização dos valores indemnizatórios ( nem tal lhe foi pedido ), sendo que, na actual redacção do art. 805º nº 3 do C.Civil, o devedor é considerado em mora desde a citação, sempre que se trate de responsabilidade por facto ilícito, como é o caso dos autos.
Não tem razão aqui o apelante.
É que no que toca aos danos não patrimoniais e aos danos patrimoniais futuros, visto que os respectivos montantes foram actualizados nesta decisão, incidirão juros, à taxa legal, mas tão só a partir da decisão que os fixou, como decidiu o Ac. do S.T.J. Unificador de Jurisprudência nº 4/2002 de 9-5-02, publicado no DR 1ª série A de 26-6-02, pondo fim a polémica que antes existia sobre o momento a partir do qual os juros, deveriam ser contabilizados, quando tivesse havido uma decisão actualizadora. Com efeito, este acórdão fixou a seguinte jurisprudência: “sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do nº 2 do art. 566º do C.Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos arts. 805º nº 3 ( interpretado restritivamente ) e 806º nº 1 também do C.Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação”.
Serão pois devidos, em relação àquelas indemnizações, os juros moratórios a partir desta decisão ( que os fixou ).
III- Decisão:
Por tudo o exposto, nega-se provimento à apelação da R. Seguradora.
Dá-se, porém, parcial provimento ao recurso do A. e, em consequência, condena-se a R. Seguradora nos seguintes montantes:
45.000 euros a título de danos patrimoniais futuros/lucros cessantes.
15.000 euros a título de danos não patrimoniais.
O A. terá pois, direito a receber da R. Seguradora, a quantia global de 60.000 euros, acrescida de juros moratórios à taxa legal, a partir da data desta decisão e até integral e efectivo pagamento.
Custas na acção e nas apelações, pelo A. e Seguradora, na proporção dos respectivos vencimentos.