Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1060/03
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. CARDOSO ALBUQUERQUE
Descritores: ACESSÃO INDUSTRIAL
LICENÇA
ACTA DE JULGAMENTO
IRREGULARIDADE
Data do Acordão: 10/21/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FERREIRA DO ZEZERE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA EM PARTE
Área Temática: DIREITO CIVIL, DIREITOS REAIS, ACESSÃO IMOBILIÁRIA
Legislação Nacional: ART.º S 159º N.1; 201º N.1 E 205º DO C.P.C.; ART.º 1317º DO C. CIVIL; D.L. N. 448/91
Sumário:
I- No caso da acta de julgamento não reproduzir com inteira fidelidade a ordem pela qual as testemunhas depuseram, ou omitir a identificação de alguma testemunha, ocorre uma nulidade secundária que deve ser arguida no prazo do art.º 205° n° 1 do C.P.C., sob pena de tal vício dever ser considerado como sanado.
II - Tais vícios, no entanto, em nada afectam as decisões judiciais proferidas, pelo que não conduzem à anulação do julgamento .II III - A viabilidade da aquisição do direito de propriedade por acessão industrial imobiliária está dependente da demonstração dos requisitos legalmente exigíveis, designadamente de alvará de loteamento.
IV - Os requisitos para a dispensa do licenciamento municipal de qualquer operação de que resulte a divisão em lotes de qualquer área de um ou mais prédios, estão definidos no art.º 5° do D.L. n.° 448/91, onde se diz que nas áreas urbanas ou nos aglomerados urbanos tem o destaque de uma parcela de prédio inscrito na matriz de, cumulativamente, não implicar mais de duas parcelas que confrontem com arruamentos públicos e dispor a construção de projecto aprovado pela Câmara Municipal, e nas áreas fora de aglomerados urbanos ou de áreas urbanas, de ser construído edifício que se destine exclusivamente a fins habitacionais e na parcela restante se observe a área de unidade de cultura fixada na lei geral para a respectiva região.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Relação de Coimbra:

I - Monique ..., viúva, reformada e residente em Valada , freguesia do Bêco , Ferreira do Zêzere, intentou acção ordinária no Tribunal Judicial de Ferreira do Zêzere em 11/12 /2000 contra Manuel ... e mulher Maria ..., também daí, pedindo a condenação destes a :
1) Reconhecerem que a A e o seu falecido marido adquiriram aos RR a parcela de terreno id. no artº 3º da p. i., com a área de 500m2, pelo preço de Esc 1.700.000$00 e que este fora integralmente pago
2) Que com contrato promessa celebrado , os RR obrigaram-se a proceder ao destaque da dita parcela de forma a autonomizar-se do artº rústico nº 67- secção H da freguesia do Bêco
3) Reconhecerem que com vista à edificação da habitação, a A e o seu marido procederam à sua delimitação e separação com um muro de blocos de cimento ficando assim duas realidades distintas,
4) E assim , serem obrigados a proceder ao destaque da mesma , já que o próprio PDM de Ferreira de Zêzere o permite
5) Reconhecerem que fora a A e seu marido que edificaram na dita parcela de terreno, o prédio urbano id. nos artºs 14º e 27º da p.i. e, por sua vez, liquidaram os RR o preço devido pela construção
6) Reconhecerem que desde Outubro de 1993, data em que o R marido deu por concluída a construção, sempre a A e seu marido , até à morte deste, em Maio de 1999, ocuparam a casa, como se dela fossem donos como na realidade são, ocupação esta que a A agora faz em exclusivo.
7) Reconhecerem , assim, caso não procedam à realização da competente escritura de destaque da parcela em causa que assiste à A o direito de a fazer sua e bem assim da habitação nela edificada , com base no instituto da acessão industrial imobiliária , liquidando a A apenas a eventual valorização da parcela de terreno.
8) E caso estes pedidos não procedam, serem condenados a restituir
à A quer o preço pago pela parcela , quer o preço pago pela habitação e o referente a todas as demais benfeitorias realizadas pela A após a sua ocupação, acrescida dos respectivos juros até efectivo e integral pagamento , com base no instituto do enriquecimento sem causa.
9) No caso de lhe ser reconhecido o direito de propriedade sobre a parcela e construção., procederem os RR à anulação da inscrição matricial na Repartição de Finanças e bem assim , ai o cancelamento de eventuais registos seu favor
10) Serem os RR condenados como litigantes de má fé, em multa e indemnização a favor da A , nunca inferior esta a Esc 1.000.000$00.
11) E serem, ainda, condenados a pagar indemnização por danos não patrimoniais a liquidar em execução de sentença.
Para o efeito , alegou , em síntese que os RR fizeram seu um bem ( casa de habitação mandada fazer e paga pela A e seu falecido marido, construida numa parcela de terreno de 500m2 que lhes compraram) que não é sua pertença, impedindo o dissolvido casal da A de legalizar a aquisição feita do terreno e da casa nele implantada, que sempre por ela e falecido marido foi possuida, man tendo-se essa posse, depois de ficar viúva.
E alegou ainda que a descrita actuação dos RR lhe causa e causou ao seu marido , antes de morrer muito sofrimento e incómodo, e no caso em apreço , por se sentir velha e doente receia vir a falecer sem ver legalizada a situação da casa, danos esses que só lhe é possível liquidar em execução da sentença que lhe reconheça aqueles direitos.
Os RR contestaram, para dizer em resumo que a casa lhes pertence, embora fosse combinado que a A e o seu falecido marido, enquanto vivos fossem e quisessem estar na Valada e ao encargo da Maria Benedita, a habitariam.
Na esperança de que a A reconsiderasse a sua atitude, reconciliando-se com a R e voltasse a beneficiar dos seus serviços, a R e o seu marido ainda não exerceram o seu direito de reivindicar a casa que é sua e que a A ilegítimamente ocupa.
Toda esta situação tem causado muitos prejuízos aos RR, os quais concluem pela improcedência dos pedidos, reclamando da A a título de indemnização, a quantia de Esc.1.000.000$00
Seguiram-se mais dois articulados.
Na fase do saneador, o Mmo Juiz não admitiu o pedido reconvencional, seguindo-se a selecção dos factos assentes e dos controvertidos, com elaboração , por quesitos, da base instrutória.
E na devida oportunidade , realizou-se a audiência de julgamento, com gravação da prova , após o que se decidiu a matéria de facto objecto de instrução, sem qualquer reclamação das partes, vindo , por fim a sentenciar-se favoravelmente às pretensões da A, sendo os RR condenados a :
a) Reconhecerem que a A e o seu falecido marido lhes adquiriram, mediante contrato promessa, uma parcela de terreno com a área de 500 m2 , pelo preço de Esc. 1.700.000$00, já integralmente pago
b) Reconhecerem que a dita parcela é a destacar do artº rústico 69º, secção H da freguesia do Bêco;
c) Reconhecerem que a dita parcela adquirida pela A e seu marido corresponde ao espaço onde a habitação foi implantada e bem assim , do espaço circundante, espaço esse delimitado pelo muro edificado a blocos de cimento e circunscrito à área de 500m2, com a altura de cerca de um metro;
d) Procederem ao destaque da parcela com a área de de 500m2, uma vez que o terreno onde fora edificada a habitação se encontra abrangido pelo Plano Director Municipal;
e) Reconhecerem que com a edificação da habitação e do muro a blocos de cimento, procederam à sua delimitação e separação da parte sobrante do prédio correspondente ao artº 69º, secção H, constituindo , assim , duas realidades distintas, ficando a corresponder a tal casa a inscrição matricial com o artº 1080º da freguesia citada ;
f) Reconhecerem que desde Outubro de 1993, data em que o R.marido deu por concluída a construção, sempre a A e o seu marido até à morte deste, ocuparam e ocupa, como se dela fossem donos , como na realidade são, face ao pagamento do preço e das obras identificadas no quesito 21º
g) Reconhecerem que , caso não procedam os RR à realização da escritura de destaque da parcela adquirida do prédio referente ao artº 69, secção H, assiste à E o direito de a fazer sua e bem assim da habitação nela edificada, com base no instituto da acessão industrial imobiliária.
h) Ver declarada a anulação da inscrição matricial do prédio urbano s efectuada na Repartição de Finanças e o cancelamento do registo a favor deles, relativamente ^`a habitação e espaço circundante
i) Pagarem à A a importância que se vier a liquidar em execução de sentença , a título da danos não patrimoniais sofridos
j) Pagarem à A a importância que for fixada a título indemnização por litigância de má fé
Ainda foram os RR condenados na multa de 8 UC.s por litigância de má fé.
Irresignados , os RR recorreram de apelação, tendo dito a encerrar a peça alegatória, o seguinte :
1- A acta de julgamento não corresponde ao que efectivamente se passou no decorrer da audiência , pois a ordem pela qual as pessoas foram ouvidas não é a que consta da acta
2- A testemunha António Manuel da Conceição Pereira foi ouvida na audiência de julgamento (...), não faltou , nem foi prescindida , consta da gravação e não consta da respectiva acta.
3- A testemunha José Fernando da Conceição Ramos Antunes foi indicada apenas aos quesitos 14 e 15, como consta da respectiva gravação(...) no entanto da acta consta que foi ouvida aos quesitos 1, 2, 3, 7., 15 a 18.
4- Não foi utilizado o que dispõe o nº7 do artº 632º do CPC.
5- Assim, a acta de julgamento violou o artº 159º,nº1 do CPC
6- Não está minimamente provado ou sequer indiciado, que o local onde se encontra a casa que está na base desta acção, esteja na sua construção contemplada em zona disponível, seguindo o PDM do concelho de Ferreira do Zêzere.
7- A verificação da conclusão anterior está em contradição, nomeadamente com o decidido em b9,c),d) e g) da decisão recorrida
8- Não se encontra provado que a importância de 1.700.000$00 que cons
ta do contrato promessa, tendo sido entregue efectivamente aos RR, a título de pagamento, nomeadamente da parte do terreno nele referido.
9- Não se encontra provado que a casa que está na base dsesta acção tenha depois de Dezembro de 2000, o valor de 20.000.000$00
10- Também não se encontra provado que a parcela de terreno referido no quesito 4º tenha em 1992 o valor de 600.0000$00 e em Dezembro de 2000, o de 800.000$00
11- Não está provado que para pagamento da mão de obra e materiais de construção para a obra , a A e o seu falecido marido tenham entregue aos RR a importância de 19.000.000$00
12- Não está provado , nem é verdade que as importâncias constantes dos doc.s juntos aos autos foram entregues aos RR para pagamento da casa dos autos
13- - Está demonstrado que as importâncias enviadas de França para Portugal através de cheques em nome dos R.R tinha a finalidade,de possibilitar ao casal Robert, o envio de dinheiro para as suas despesas em Portugal
14- - Está provado que nessa altura , o casal Robert não tinha conta em bancos portugueses , pelo que , pelo que tinham necessidade de se socorrer da passagem de cheques e viramentos para a conta dos RR.
15- O contrato promessa que a acção se reporta teve a finalidade de possibilitar por parte do Robert o envio de dinheiro de França para Portugal
16- O problema central desta acção é a figura de compropriedade e não a de acessão.
17- Não se encontra demonstrado que o lote de terreno objecto do contrato promessa, seja propriedade da A
18- O contrato promessa «sub judice» não constitui título aquisitivo de propriedade.
19- A douta sentença fixou erradamente o objecto do litígio e não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão proferida.
20- Violou, assim, os artºs 1340º,1316º do CC e 659º e 668º do CPC, pelo que.
21- Ou deve ser anulado o julgamento ou revogada a sentença e substituida por outra que absolva os RR de todos os pedidos
Contralegou a apelada , a qual sustenta o inteiro acerto da sentença e da subjacente decisão da matéria de facto.
Nesta instância , foram corridos os vistos legais.
Cumpre, assim, decidir.

Vejamos , antes de mais os factos que foram tidos por assentes e os resultantes da decisão sobre a base instrutória:
1 – Robert Pierre Migliarini faleceu em 17 de Maio de 1997(aln A)
2 – Os RR na qualidade de 1ºs outorgantes e Robert Pierre Migliarini, falecido marido da A, na qualidade de 2º outorgante , subscreveram o documento junto aos autos a fls 16 que intitularam de “ Contrato Promessa de Compra e Venda” e do qual consta nomeadamente:
“ Pelos 1ºe outorgantes é dito que são donos e legitímos possuidores de um prédio rústico, sito no lugar de Valada, freguesia do Bêco, composto de pinhal., com a área de 1040m2, inscrito sob o artº 67,secção H.
Pelos 1ºs outorgantes é dito ainda que prometem vender aos 2ºs outorgantes –nos termos e condições do presente contrato- uma parcela de terreno com a área de 500m2, a destacar do referido prédio rústico:
1º O valor da venda é de 1.700.000$00
2º O preço da venda é pago integralmente no acto de assinatura do presente contrato
3º A escritura de compra e venda será celebrada em data e local a combinar entre os a u outorgantes,
Pelo 2º outorgante é dito que aceita o presente contrato nos termos exarados e que promete comprar a referida parcela de terreno” (aln B);
- As assinaturas constantes do documento referido em B) foram reco nhecidas presencialmente em 12/03/1992 (aln C);
- Encontra-se inscrita a favor de Manuel Ferraz, a aquisição , por partilhas por óbito de Maria Augusta Alves, de um prédio rústico sito em Valada , composto de terra de eucaliptal e o pinhal, com a área de 5.080m2, a confrontar do Norte com Herd.s de José Silva , e Manuel ª Ferreira , do Sul com estrada , , do Nascente com João de Deus Lopes e Herd.s de José da Silçva e do Poente com Manuel A Ferreira, inscrito na matriz sob o artº 69º, Secção H e descrito na Conservatória de Registo Predial de Ferreira do Zêzere, freguesia do Bêco, sob o nº 268/270592 (aln D)
- Por averbamento de 24/06/96, passou a constar da descrição do prédio referido em D), o seguinte :” Prédio misto-casa de habitação de r/c-127,35m2 – terra de eucaliptal e pinhal –4.952,65m2 (...) arts – omissa a parte urbana e 69º, Secção H rústico (aln E);
- Encontra-se inscrita a favor de Manuel Ferraz a aquisição, por partilha da herança de Maria Augusta Alves, do prédio rústico sito em Valada , composto de terra de pinhal e uma eira , com a área de 1040m2, a confrontar do Norte , Sul , Nascente d e Poente com estrada, inscrito na matriz sob o artº 67º, secção H e descrito na Conservatória sob o nº 655/240/240696 (aln F).
- Ao fazerem constar do documento junto –aln B – “ o prédio inscrito sob o artº 67, Secção H, “ os RR pretendiam na realidade reportar-se ao prédio referido na aln D) (resp. ao quesito 1º)
- Aquando da subscrição do doc. referido em B), a A e o seu falecido marido entregaram aos RR a quantia de Esc.1.700.000$00 (resp. ao quesito 2º)
- A título de preço da parcela de terreno de 500m2 ( resp. ao q. 3º)
- Em data posterior a 12/03/1992, os AA ( aliás a A e o seu falecido marido) construiram um muro de blocos de cimento com cerca de 1 m. de altura, à volta da parcela de 500m2 do imóvel referido em D)( resp. ao q. 4º)
- ~Parcela de terreno que desta forma ficou individualizada em relação ao restante terreno do imóvel descrito em D) (resp. ao q.5º)
- E que ficou a confrontar do Nascente e Sul com a estrada e do Norte e *Poente com os RR (resp.ao q. 6º)
- Nessas paz<recela, , o Rmarido construiu , a solicitação daA e seu falecido marido , uma casa para estes( resp.ao qw. 7º)
- A habitação é composta por uma casa de rés do chão, com dois quartos, um salão, uma cozinhas , duas casas de banho, uma despensa , um corredor e um, sótão o pequeno, com a superfície cobrtaz de v127,35 m2 e um pequeno anexo para arrrecadaçã´( resp. aol q. 8º)
- Para pagamento dos materiais mão –de –obra referentes à cons trução da habitação, a A e o seu falecido marido entregaram ao R. marido 19,.000.000$00(rep.ao q,9º)
- O R. marido procedeu à inscrição em seu nome da dita habitação (resp. ao q. 10º)
- Ficando a corresponder a tal casa e inscrição matricial com o artº1080º da Freguesia do Bêco(resp0. ao q.11º)
- Em Outubro de 1993, a A e o seu falecido marido passaram a habitar na sobredita casa (resp. ao q.12º)
- E após a data referida em A), a A passou a habitar sozinha tal casa ( resp. ai o q. 13º)
- A parcela de terreno referida no quesito4º situa-se dentro do perímetro urbano (resp. ao q.15º)
- Essa parcela tinha em Março de 1992, um valor de 600.000$00(resp. ao q. 16º)
- E em Dezembro de 2000 , um valor aproximado de 800.000$00
- A habitação tinha em Dezembro de 2000, um valor aproximado de 20.000.000$00, incluindo o logradouro(resp.ao qusoito 18º)
- A actuação dos RR têm causado à A sofrimento, desgostos e incómodos (resp.ao q. 19º)
- A ª receia vir a falecer sem que a habitação supra esteja inscrita em seu nome (resp. ao q. 20º)
- Após Outubro de 1993, a A . colocou na habitação, caleiras , persianas de janelas gradeamentos exteriores na parte traseira e procedeu a várias pinturas (resp. ao q. 21º)
A apreciação e decisão do presente recurso. delimitado , como bem se sabe , pelas conclusões da alegação dos apelantes ( aertºs 684º,nº3 e 690º,nº1 do Cod. De Proc .Civil) passa pela anélise das seguintes questões nela colocadas a este Tribunal:
1º Nulidade da acta de julgamento
2ª Modificação da decisão relativa à matéria de facto
3ª Nulidade da sentença por não especificação dos fundamentos de facto e de direito
4ª -Inexistência de título aquisitivo de propriedade pela A da parcela de terreno e casa de habitação por ela construida e ocupada desde 1993
Vejamos cada uma dessas questões.
1ª Questão
Os apelantes começam por se insurgir contra o que qualificam de irregularidades da acta de audiência que não reproduz a ordem exacta porque depuseram as testemunhas, constante da gravação que foi integralmente reproduzida nos ab nexos, o que segundo dizem suscitará alguma confusão.
Referem ainda que foi ouvida uma testemunha António Manuel da Conceição Pereira , omitida na acta e cujo depoimento foi , não obstante sopesado pela Sra Juiza, na fundamentação da decisão da matéria de facto, ficando , assim a duvida se o seu depoimento foi de facto tido em devida conta
E por último vem também dizer – estamo-nos a reportar também ao «corpus » da douta alegação - que não d ficou a constar da acta a tentativa de acordo, nem o requerimentio feito pela A da aditamento à matéria sobre que ele R marido iria depôr..
E daí impetrarem a anulação do julgamento
Na sua contraalegação , A A reconhece existirem divergências na ordem porque depuseram as testemunhas e a que ficou a constar da acta , bem como na indicação dos quesitos a que respondeu a testemunha José Ramos Antunes
Mas entende que tais lapsos de modo algum justificam a arguição apontada, já que os depoimentos estão todos devidamente gravados e foram objecto aliás de transcrição integral, sendo com base nestes, conjugados com os documentos juntos que a Sra Juiza decidiu a matéria de facto.
Que dizer?
Os apelantes devem bem saber que são coisas distintas a nulidade da decisão da matéria de facto a que alude o artº 712º nº4 do CPC e que pode constituir fundamento para o recurso da sentença final e as simples nulidades de actos processuais que devem ser objecto de reclamação no respectivo prazo legal, perante o tribunal «a quo».
Estas nulidades reconduzem-se a desvios do formalismo processual prescrito na lei (Manuel de Andrade , Noções Elementares, 1956, 156) e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidade mais ou menos extensa de actos processuais.
Mas das nulidades do processo , umas são principais , típicas ou nominadas , sendo-lhes aplicável a disciplina fixada nos artºs 193º a 200º e 202º a 204º e outras são secundárias , atípicas oiu inominadas e têm a sua regulamentação genérica no nº1 do artº 1 201º, estando a sua arguição sujeita ao regime previsto no artº 205º, obviamente do mesmo CPC.
E no caso em apreço torna-se claro que estamos perante uma nulidade secundária e que se traduz em a acta de julgamento não reproduzir com inteira fidelidade a ordem porque as testemunhas depuseram em audiência e omitirem a identificação de uma das testemunhas que consta do respectivo registo da gravação, presume-se que por mero lapso da Sra funcionária que a redigiu, infringindo-se , com isso , o disposto no artº 159ºnº1 do CPC.
No entanto, verifica-se que os RR, ora apelantes depois de notificados da decisão da matéria de facto lida conforme a acta de fls 352 , no dia 9 de Outubro de 2002, já tinham requerido no dia 4 , cópia da gravação , o que foi defirido por despacho de 17 do mesmo mês, de imediato notificado , e sendo os autos remetidos para o Círculo Judicial de Tomar em 8 de Novembro seguinte , para a prolação da sentenças que ocorreu em 19 do mesmo mês.
Os RR , por seu turno vieram interpôr recurso por requerimento de fls 380 a 29 de Novembro, e as alegações foram apresentadas apenas a 24 de Janeiro findo.
Segundo o disposto no artº 205º, nº1 do CPC, a regra geral do prazo da arguição de qualquer nulidade dita secundária é da que elas devem ser arguidas no momento em que forem cometidas se a parte estiver presente , por si ou por mandatário e fora desses casos, o prazo para a sua arguição conta-se da data em que depois de cometida a nulidade , a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificado para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tiveram conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer , agindo com a devida diligência
Ora no caso vertente, torna-se claro que o prazo de arguição das apontadas inexactidões da acta, a entender-se que dela se não deu conta o seu ilustre mandatário enquanto decorriam os trabalhos da audiência , teria de começar a contar-se da data em que em que ela interveio na derradeira sessão do julgamento , ou seja , a leitura dos quesitos ou pelo menos quando ele foi notificado para entregar na secretaria as cassettes da gravação,.
Mas não, os apelantes deixaram que decorresse mais de dois meses para só em sede de alegações de recurso se insurgirem contra a falta de correspondência entre a gravação e o teor da acta.
Julgamos assim que tal arguição se mostra de todo extemporânea, além de repete-se dever ter sido dirigida ao tribunal «a quo».
Ainda que assim se não considere, as aludidas divergências aliás de mero pormenor de modo algum poderiam conduzir à nulidade do julgamento.
Na verdade a prática de um acto que a lei não admita , bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame e decisão da causa –nº1 do artº 201º do CPC.
Ora independentemente de ter sido trocada a ordem por que depuseram as testemunhas por inadvertência da sra Funcionária e omitida a identificação de uma única das testemunhas inquridas , tal em nada pode ter afectado a decisão proferida, justamente porque todos depoimentos foram gravados, aludindo o Mmo Juiz na sua fundamentação ao depoimento prestado justamente pela testemunha que por lapso não ficou registado em acta.
Deste modo seria um perfeito contrasenso anularmos um julgamento apenas por da acta constarem algumas inexactidões sem o menor reflexo no julgamento da matéria de facto e que, além do mais, não impediram os apelantes de a impugnarem de cima abaixo, socorrendo-se das gravações que transcreveram integralmente.
Improcedem , portanto , as cinco primeiras conclusões
2ª Questão
Insurgem –se, igualmente os apelantes contra as respostas que foram dadas aos quesitos 15º ( A parcela de terreno referida no quesito 4º situa-se no perímetro urbano ) 2º ( Aquando da subscrição do documento referido em b), a A e o seu falecido marido entregaram aos RR a quantia de Esc, 1700.000$00), 3º ( A título de preço da parcela de terreno de 500m2 ), 18º ( A habitação referida no quesito 8º tinha em Dezembro de 2000, , um valor aproximado de Esc. 20.000.000$00, incluindo neste valor também o logradouro ) 16º ( a parcela de terreno referida no quesito 4º tinha em Março de 1992, um valor de Esc. 6.000.000$00) 17º ( a mesma parcela de terreno tinha em Dezembro de 2000, um valor de Esc.800.000$00) e 9º ( para pagamento dos materiais e mão –de – obra respeitantes à construção da habitação referido na resposta ao quesito 8º, a A e o seu falecido marido entregaram ao R marido 19.000.000$00).
E outrossim , pretendem ter ficado demonstrado que as importâncias entregues aos RR por cheques enviados de França tinham a finalidade de possibilitar ao casal o envio de dinheiro para as suas despesas , pois que estes não tinham conta aberta em bancos portugueses e que o contrato promessa apenas teve por finalidade justificar por parte do Robert , o envio de dinheiro de França para Portugal.
Convenhamos desde logo que as conclusões 6º a 15ª não obedecem ao esquema traçado na lei para a impugnação da matéria de facto.
Na verdade , o normativo aplicável é perfeitamente claro.
Quando se impugne a decisão da matéria de facto, diz o artº 690º-Ado CPC no seu nº1 que o recorrente deve obrigatoriamente especificar , sob pena de imediata rejeição quais os concretos pontos da matéria de facto que considere incorrectamente julgados, ónus que os apelantes cumpriram e quais os concretos meios probatórios , constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada que imponham decisão sobre esses mesmos pontos diversa da recorrida , ónus que apenas no «corpus » da alegação , observaram, posto que de forma deficiente, o que em rigor deveria dar azo a um convite para o aperfeiçoamento do conclusório, conforme a jurisprudência mais benevolente.( perfilhada , entre outros pelos Ac.s do Supremo de 1/10/1998, BMJ 480º, 348 e de v14/(05/(2002, Agr nº 1353/02v –1ª Sumários 5/2002 e de 12/11/2002, Rev Nº2876/02- 6ª Sumários 11/2002)
De todo o modo, e sempre com a prevenção de que a reanálise por este tribunal da prova produzida não pode deixar de respeitar os príncipios da oralidade, imediação, concentração e livre apreciação da prova, devendo o uso dos poderes conferidos naquele preceito em conjugação com o artº 712º nº1 aln a) restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão nos concretos pontos questionados, iremos apreciar, quesito por quesito se procedem ou não os reparos feitos à justeza da convicção espelhada nas respectivas respostas.
- Quanto aos quesitos 2º e 3º
Os recorrentes discordam das respostas dadas pelo tribunal atinentes ao pagamento pelo dissolvido casal da importância de 1.700.000$00 na ocasião em assinaram com eles o contrato promessa e aludem a algumas discrepâncias dos depoimentos prestados pelas testemunhas Joaquim Pereira Gonçalves e mulher Benilde Simão
. Ora as apontadas discrepâncias em nada por si mesmo podem a levar a concluir pela desvalorização dos ditos depoimentos
Anote-se que sobre esta matéria depuseram várias testemunhas e entre elas, com realce, sem dúvida, os citados Joaquim Gonçalves e mulher Benilde Simão sendo que um e outra, que entendem o francês, pois estiveram emigrados e a que o Mmo Juiz atribuiu a máxima credibilidade, devidamente justificada na fundamentação, foram muito peremptórios em dar fé das inúmeras vezes vezes em que a A e o falecido marido lhe referiram a as circunstâncias da compra do lote aos RR nos termos do contrato promessa junto aos autos e pronto pagamento do preço, aliás algo inflaccionado nele mesmo declarado.
De resto , nem a própria literalidade do documento permite inferir outra coisa não convencendo , nem tendo suporte razoável em quaisquer outros depoimentos que tal documento de que consta que «o preço é pago imediatamente no acto de assinatura do presente contrato» constituisse mero e artificioso expediente para facilitar transferências de fundos de França para Portugal
Òbvio , pois que nada há alterar a tal resposta, atenta a conjugação daqueles depoimentos com o documento junto e face também a todo o contexto do caso, a A eo falcido marido dada a sua idade e isolamento familiar estavam na altura muito dependentes da assistência doméstica que lhes era prestada em França pela Rmulher e pretendiam fixar.-se junto destes em Portugal, aqui construindo casa própria com o produto das suas poupanças.
Quanto ao quesito 9º
Concerne a este quesito ao pagamento aos RR da importância de 19.000.000$00 pelos materiais e mão –de –obra respeitantes à construção da casa de habitação reterida no quesito 8º.
Alegam os recorrentes não saber em que se baseou o tribunal para fixar este valor e dar por adquirido o seu embolso pelo R marido que tomou a seu cargo a construção.
Estrnha-se esta dúvida ante o desfiar dos depoimentos todos integramente transcritos, por escrito dactilografado, prestados a esse propósito por aquelas duas testemunhas e não só.
De facto e se é verdade que a testemunha Joaquim aludiu a pagamentos que calculou rondarem os 14 000 ou 15000 contos , a mulher Belnilde não teve dúvidas em afiançar que além do 16.000 contos , o recorrente pedira ao falecido marido da A mais 3.000 contos equivalente a 10.000 francos, sendo que todos esses pagamentos foram feitos por cheques, aliás apontados em livro de que a A sempre registava as respectivas despesas.
Ora esta factualidade não foi posta em causa de forma convincente por outros depoimentos, a não ser pelas filhas do próprio recorrente, antes corroborada , entre outros, pela testemunha Joaquim Antunes que foi quem marcou a casa e fez os desaterros e fundações, apercebendo-se de que esta se destinava à A e marido que suportavam o inerente encargo.
Quanto ao quesito 15º
Suscita-nos algumas dúvidas a natureza deste quesito, no qual se perguntava se a zona de implantação da casa se inseria no perímetro urbano não se sabe de que localidade.
Ora o certo é que a A tão pouco alegou que existisse um perímetro urbano antes sim dizendo que o PDM permitia o destaque da parcela para efeitos de construção.
Com efito estamos perante uma noção de direito de urbanismo, ligado à existência de determinadas infraestruturas , conforme os planos municipais em vigor e que como tal nem deveria figurar na base instrutória, mas antes e quando muito ser objecto de prova documental mediante a exibição das plantas atemnentes aos planos aprovados e em vigor , tanto o plano director municipal, vulgo PDM, como o de urbanização ou de pormenor.
Donde ser verdade que sobre esta questão nenhuma testemunha se pronunciou em termos de identificar tal realidade, aludindo vagamente à existência de uma ou outra casa de habitação nas proximidades das parcela e de e de dispor a mesma de acesso rodoviário e de redes de abastecimento de água e electricidade.
Deste modo , entendemos mais avisado não considerarmos a resposta positiva do Tribunal por encerrar matéria conclusiva, nada porém obstando a que em lugar de tal conceito se diga , de acordo com a generalidade da prova testemunhal que a parcela é servida de estrada e dispõe de redes de electricidade e de abastecimento de água .
Assim , em lugar da resposta dada , decide-se em jeito de reposta restritiva / explicativa considerar apenas provado que:
A parcela em causa é marginada por estrada e dispõe de rede de abastecimento de água e electricidade.
Quanto aos quesitos 16º , 17º e 18º
Todos estes quesitos se reportam aos valores de mercado aproximados da parcela , antes e depois da construção nela incorporada, nos anos de 1992 e depois em Dezembro de 2000 que os recorrentes também discutem, de novo e a nosso ver sem argumentação convincente
Com efeito várias testemunhas, alguns ligados à construção civil e conhecedores da zona apontaram tais valores , nada permitindo duvidar da razoabilidade dos mesmos, tanto com referência ao tempo da celebração do ajuste para a sua compra , como para o ano em que a acção foi proposta.
Assim , nada temos que modificar nesta matéria, sequer os recorrentes justificando em que meios de prova consistentes se estribaram para contestar a convicção firmada sobre a justeza desses valores
Improcede, portanto, e neste ponto também, a pretensão dos recorrentes.
3ª Questão
Também os recorrentes vêm invocar , embora de forma não muito explícita a nulidade da sentença enquanto não especifica os fundamentos de facto de e de direito justificativos da decisão proferida –conclusão 19º .
Dispõe , com efeito o artº 668º nº 1 aln b) do CPC que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Ora a sentença não deixou de fundamentar, embora possa ser discutível se o fez com inteiro acerto quanto a toda a panóplia de pedidos formulados pela A a solução jurídica que adoptou, tendo em conta os factos apurados a aplicando aos mesmos os príncipios legais atinentes à aquisição pela A da propriedade sobre a casa de habitação e logradouro que os RR fizeram inscrever em seu nome na matriz e no registo.
Não descortinamos , pois , em que parte da sentença falte a respectiva fundamentação por forma a não se tornar inteligível o discurso decisório e tanto que os recorrentes o criticam nas conclusões 16ª a 18ª.
Improcede, consequentemente, a mencionada arguição.
4ª Questão
Como atrás vimos, decidiu o Mmo Juiz que procediam todos os pedidos formulados pela A, estribando –se desde logo no disposto no artº 830ºdo CC, bem como no instituto da acessão industrial imobiliária, o qual como se sabe , não tem que incidir necessariamente sobre a totalidade de um prédio, podendo abranger tão só, como é o caso, uma parcela do mesmo , desde que dela resulte uma unidade económica independente ( neste sentido , os acs da RP de 3/04/95, BMJ 446º, 344 e de 6/12/1990, CJ 1990, T5 ,212, desta Relação de de 25/05/1999, CJ 1999, T 3º, 30 e do Supremo de 17/02/2000, CJ/S, , 2000, T.1º, 105).
Cremos, porém , terem nesta parte alguma razão, os recorrentes.
Com efeito , a A pretende ver reconhecida pelos RR a sua qualidade de proprietária afinal de parte de um prédio destes, onde existe uma casa de habitação, invocando a sua compra, com o pagamento imediato do preço e a obrigação assumida pelos vendedores de procederem ao respectivo destaque, bem como a posse que sobre ela exerce, desde 1993, agora sozinha e do antecedente com o marido antes do passamento deste.
Em parte alguma ela formulou um pedido expresso para a sentença declarar, nos termos do artº 830º do Ccivil a efectivação do contrato prometido,de compra e venda, de resto nem faria sentido o pedido para que os RR outorgassem uma escritura para o destaque da parcela que sequer corresponde ao prédio mãe naquele identificado.
Mas mais , nem que fosse possível retirar do grupo dos seis primeiros pedidos essa interpretação , ela podia proceder, dada a inviabilidade de suprir o tribunal uma declaração negocial condicionada e dependente a actos a praticar pelos RR, ou seja o destaque do seu prédio, eles mesmo viabilizadores da legalidade do acto de venda.
De resto , não foi isso o que a A pediu, antes sim o reconhecimento de que a A adquirira a propriedade da parcela e construção nela efectuada por a ter adquirido aos RR e pago o respectivo preço além de a possuir como se dona fosse , desde 1993.
Ora este pedido, com semelhantes fundamentos nunca podia proceder, o que equivaleria a tratar como uma compra definitiva, alíás nula por inobservância de forma, um mero contrato promessa, podendo até questionar-se a legitimidade da R que não deduziu nenhuma habilitação na petição inicial como única e legítima herdeira de seu marido, enquanto promitente comprador, de requerer a execução específíca do mesmo.
De facto e como bem se sabe, com a entrada em vigor da actual versão do CPC, deixou de vigorar o Assento do Supremo de 1/02/63, pelo que a declaração genérica feita no saneador sobre a legitimidade das partes, como aconteceu no caso vertente, nunca poderia constituir caso julgado formal( v. ,entre outros , o Ac. do Supremo de 3/05/2000, CJ/S – 2000, T. 2º , 41)
Cremos pois inexistir neste contexto, qualquer base legal para para o pedido de reconhecimento da propriedade de tal parcela de terreno.
Mas dito isto , nada haveria a objectar que os factos dados por provados enquadrassem todos os requisitos para a A fazer valer, a título subsidiário, a propriedade dessa nova unidade predial formada pela vivenda e logradouro que a envolve, já materialmente delimitada e isolada do restante prédio, no exercício do direito potestativo de acessão, o qual opera automáticamente como ensinam os autores, com a introdução das obras em terreno alheio, e de boa fé, já que com a inteira aquiescência dos RR, donos deste.
Acontece que se coloca aqui um obstáculo intransponível, qual seja a da impossibilidade de permissão de que pela via da acessão industrial imobiliária se obtenha o que por via negocial não seria possível conseguir, acaso faltem os requisitos sem cuja verificação seriam inválidos os respectivos actos constitutivos negociais.
De facto e como bem se sabe, a criação de novos prédios , bem como a simples divisão de um prédio rústico para se formarem novos prédios urbanos estão sujeitos a diverdsas limitações legais que têm como consequência a invalidade dos respectivos contratos quando se não verifiquem os requisitos pertinentes.
E daí o entendimento perfilhado no recente Acórdão do Supremo de 4/02/2003, CJ /S, T.I, 76 e que segue de perto o estudo de Quirino Soares, na CJ /S, T.I, 11, sobre acessão e benfeitorias, que a viabilidade deste modo de aquisição derivada do direito de propriedade estar dependente da demonstração dos requisitos legalmente exigíveis, designadamente alvará de loteamento.
Ora no caso vertente e ocorrendo a incorporação da edificação no terreno e a autorização dada pelos donos deste, que constituem os factos relevantes para a aquisição do direito de propriedade por acessão , por força do disposto no artº 1317 aln d) do CC, no ano de 1993, é à luz do Dec Lei nº448/91 que temos da aferir a conformidade legal do pretendido destaque do prédio rústico dos RR da parcela onde foi edificada a casa de habitação ocupada pela A, formando este um novo prédio urbano.
Ora os requisitos para que pudesse ser dispensado o licenciamento municipal de qualquer operação de que resulte a divisão em lotes de qualquer área de um ou mais prédios estão definidos no seu art 5º, onde se diz que nas áreas urbanas ou nos aglomerados urbanos , tem o destaque mas de apenas uma parcela de prédio inscrito na matriz de, cumulativamente, não implicar mais de duas parcelas que confrontem com arruamentos públicos e dispor a construção de projecto aprovado pela câmara municipal e nas áreas fora de aglomerados urbanos e das áreas urbanas, de ser construida edifício que se destine exclusivamente a fins habitacionais e na parcela restante se observe a área de unidade de cultura fixada na lei geral para a respectiva região.
Logo se vê que no caso dos autos, a A sequer se deu ao cuidado de alegar a verificação de todos estes requisitos, tanto para a hipótese da casa se incluir em área urbana, em que seria exigível a aprovação do projecto pela câmara, como na hipótese de se inserir em área não urbana, sendo certo que o prédio rústico onde a mesma se implantou não comporta a àrea da unidade de cultura fixada para a zona e que é de 4 HÁ para os terrenos de sequeiro ( trata.-se de um pinhal com apenas 5.000m2 – aln d) da especificação) ónus que em exclusivo lhe incumbia, bem como nada adiantou quanto à verificação de todas as condições para eventualmente beneficiar da existência de um plano de urbanização ou de pormenor para a zona, por forma a ser-lhe aplicável o regime específico de isenção a que alude o nº 5 do dito artº 5º.
Decorre do exposto que por razões que nada têm que ver com os fundamentos invocados este tribunal não pode portanto dar guarida a esta pretensão subsidiária da A, isto por não bastar para a acessão poder validamente operar, a autonomia económica da parcela a destacar, exigindo-se também a autonomia jurídica.
Desta sorte procede o recurso no tocante à impossibilidade também por via da acessão , da A ver reconhecida a propriedade sobre o prédio urbano que ocupa e de obter, por arrastamento cancelamento do seu registo pelos RR
Assim, a A apenas poderá ter direito a reclamar dos RR , a título de enriquecimento sem causa, e nos termos do artº471º, nº2 do CCivil as importâncias que lhe adiantou para pagamento do preço da parcela de terreno e da vivenda nela edificada, o que totaliza a importância global de 20.700.000$00, bem como as benfeitorias por ela efectuadas de quantitativo não determinado e que por isso deverá ser relegado para execução de sentença, tudo sem prejuizo dos juros legais a contar da citação.
Nos termos e pelas razóes expostas, decide-se, com parcial provimento do recurso em:
A) Absolver os RR dos pedidos de reconhecimento de propriedade da parcela e casa nela edificada constantes e especificados nas alns A) a H) da douta sentença
B) Condenar, contudo, os mesmos a restituirem à A , a título de enriquecimento sem causa, o montante global de 20.700.000$00 e ainda o valor da benfeitorias feitas na casa de habitação que ela ocupa, descriminadas na resposta ao quesito 21º, a liquidar em execução de sentença, acrescido dosd jurod s legais de mora
C) Manter as condenações das alns i) e J), não objecto de específica impugnação
As custas do recurso serão pagas por ambas as partes na proporção de metade, pagando os RR as da acção por decaímento na acção.
Coimbra , 21 de Outubro de 2003