Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3402/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO MARTINS
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE SEGURANÇA
NEXO DE CAUSALIDADE
Data do Acordão: 12/14/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE VISEU - 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 18º, Nº 1, E 37º, Nº 2, DA LAT ( LEI Nº 100/97, DE 13/09) .
Sumário: I – A orientação jurisprudencial dominante vai no sentido da necessidade de se provar a violação das normas de segurança e o nexo de causalidade entre essa violação e o acidente, para se poder concluir pela responsabilidade da entidade patronal a título principal e de forma agravada, cabendo a quem invoca tais fundamentos o ónus da prova dessa violação e deste nexo causal .
II – Não existindo norma expressa a definir em que condições mínimas de segurança é que uma máquina ou prensa mecânica pode funcionar, isto é, não havendo nada a estatuir que tal máquina deveria operar com um sistema de protecção de leitura óptica ou por laser, não se pode concluir pela violação das normas do DL nº 441/91 e Portaria 53/71, ou quaisquer outras .

III – Os referidos diplomas contêm dispositivos legais genéricos ou princípios gerais, à luz dos quais devem ser interpretadas as normas que, em concreto, estabeleçam determinadas condições de segurança, higiene e saúde no trabalho .

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juizes da Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra:
I- RELATÓRIO
1. A... instaurou contra B... e C... a presente acção especial emergente de acidente de trabalho (Proc. nº 861/03.1TTVIS do 1º Juízo do Tribunal de Trabalho de Viseu ) , com base em acidente de trabalho por si sofrido ao serviço da 2ª R., no dia 04.06.2003, pedindo a condenação das RR. a pagar-lhe as seguintes quantias: € 376,60, € 347,92 e € 2 984,15 a titulo de despesas de transporte, médico-medicamentosas e indemnização por IT’s, respectivamente; a pensão anual e vitalícia que lhe vier a caber; € 50 000,00 a titulo de danos não patrimoniais; juros de mora sobre cada uma daquelas prestações e desde o seu vencimento.
Alega, em resumo, que foi vitima de acidente de trabalho, que ocorreu devido à culpa exclusiva dos responsáveis da R. entidade patronal, por não terem providenciado pela instalação e funcionamento, no posto de trabalho, dos sistemas de segurança capazes de proteger os operários que manobrassem com a máquina em causa. De tal acidente resultaram-lhe lesões que lhe provocaram ITA e ITP, de que não foi indemnizado, tendo ficado com IPP, discordando porém do valor da que lhe foi atribuída no exame médico. Além disso o A sofreu dores intensas e abalo psíquico, ainda hoje mantendo a mão dorida e tendo ficado sempre preocupado devido à incapacidade funcional que lhe limita a capacidade de ganho.
Conclui, assim, que as RR. devem indemnizá-lo por aqueles montantes e, sendo a R. entidade patronal a única e exclusiva culpada do acidente, deve ser condenada a pagar-lhe a título de danos não patrimoniais valor não inferior a € 50 000,00.
Contestou a R. seguradora pedindo que seja considerada apenas responsável subsidiariamente, por ter havido violação das regras de segurança, e apenas quanto aos valores cobertos pelo seguro.
Estriba a sua defesa no facto de o acidente só se ter verificado por haver uma total ausência de sistema de protecção adequado, conforme é imposto pela legislação, a que acresce que ao sinistrado apenas lhe foram dados dez minutos de formação para trabalhar com a máquina em causa.
Igualmente contestou a R. entidade patronal, arguindo a sua ilegitimidade e pedindo a sua absolvição da instância e, caso assim se não entenda, a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Baseia a ilegitimidade no facto de não ter violado as normas de segurança e ter transferido integralmente para a seguradora a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho.
Fundamenta a improcedência da acção invocando que o A é que alterou o sistema da máquina de manual para automático, contra instruções expressas da entidade patronal, violando assim ele as condições de segurança impostas pela entidade empregadora, o que leva à descaracterização do acidente, pelo que também não é responsável pelo pagamento dos alegados danos morais.
Respondeu a 1ª R. a esta contestação, para impugnar a factuologia alegada pela R. entidade patronal, relativa à não violação das regras de segurança e transferência integral da responsabilidade pelo contrato de seguro.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade. Procedeu-se de seguida à fixação da factualidade assente e à elaboração da base instrutória, sem reclamações.
2. Prosseguindo o processo os seus regulares termos veio a final a ser proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“a) - julgar a acção parcialmente procedente e provada, em relação à Ré Seguradora, e, consequentemente, condena-a a pagar ao autor o capital de € 18 180 (dezoito mil cento e oitenta euros), referente à remição da pensão anual e vitalícia de € 1 027,06 com início de vencimento em 06.01.2004; € 2 419,07 (dois mil quatrocentos e dezanove euros e sete cêntimos) como indemnização pela incapacidade temporária (sendo de € 345,58 a indemnização a que alude o art. 43º, n.º 3 do DL n.º 143/99); € 617,02 (seiscentos e dezassete euros e dois cêntimos) a título de despesas; os respectivos juros moratórios, à taxa de 4 % ao ano, a partir da data de vencimento das prestações em dívida até efectivo pagamento, calculados, no tocante à pensão e à indemnização por incapacidade temporária, segundo o quadro temporal definido pelo art. 51º do DL n.º 143/99 e atrás referido (excepto no tocante à importância de € 345,58 - calculados a partir de 06.01.2004, dia posterior ao da alta) e, relativamente à quantia de € 617,02 (alínea c)), a partir da citação, e absolve-a do mais pedido.
b) - julgar a acção improcedente, por não provada, em relação à 2.ª demandada, de cujo pedido vai absolvida.”
3. É desta decisão que, inconformada, a R. seguradora vem apelar, pretendendo que seja responsabilizada apenas subsidiariamente, sendo responsável pelo pagamento das pensões a entidade patronal, nos termos do art. 18º nº1 da Lei 100/97 de 13.09.
Alegando, conclui:
1- Atento à matéria dada como provada, a sentença recorrida não poderia, como o fez, condenar a ora Recorrente nos termos em que o fez.
2- Estão provados factos que claramente criam o nexo de causalidade entre a violação de regras de segurança e não adopção das medidas mais adequadas para o trabalho que estava ser executado e a verificação do acidente dos autos.
3- O manuseamento da prensa poderia ser feito por um dos três métodos descritos na alínea g) dos factos assentes. Ora, da analise feita aos tipos de funcionamento da prensa o Exmo. Juiz “ a quo “ deu como provado que o sinistrado quando executava a tarefa de calibragem de cornes poderia estar a utilizar o 2° e 3º sistema de funcionamento descrito na alínea g).
4- Resultou provado que o segundo sistema ali descrito (funcionamento manual) era o único que impede o contacto do corpo do trabalhador com as respectivas partes móveis da prensa uma vez que é necessária as duas mãos do trabalhador para pressionar os dois botões colocados nas extremidades da maquina.
5- Aquando do sinistro o sinistrado não se encontrava a trabalhar na prensa com o sistema manual.
6- Por exclusão de partes e atenta a matéria provada descrita na alínea g) o trabalhador estaria a trabalhar na prensa no momento do sinistro com o sistema pedal/sistema de pé.
7- Também provado ficou (alínea t) da sentença proferida) que existe um sistema de protecção -“leitura óptica ou por laser” que impede o funcionamento da coluna de prensagem sempre que as mãos do operador estejam no correspondente campo de acção.
8- Provado ficou que este mecanismo de protecção se encontrava instalado numa das máquinas da 2ª demandada (alínea t) - quesito 18°).
9- Perante todo este circunstancialismo, cremos existirem factos suficientes para acreditar, ao contrário do que entendeu o Exmo. Senhor Juiz “a quo“, que aquando do acidente o sinistrado não estava a trabalhar com esta no sistema manual de funcionamento uma vez que, como já se referiu e provado ficou, este sistema (o manual) é o único que impede o contacto do corpo do trabalhador com as respectivas parte móveis (torre/coluna).
10- Existe pois, manifesta contradição nos fundamentos na douta sentença recorrida.
11- Da leitura dos factos provados e fundamentação também parece resultar que se o sistema de protecção - “leitura óptica ou por laser“ (que impede o funcionamento da coluna de prensagem sempre que detecte as mãos do operador na sua área de acção) estivesse instalado, como estava instalado noutra máquina da entidade patronal do sinistrado o acidente não teria ocorrido. Está é a verdade absoluta dos factos.
12- O manobrador da máquina, aqui sinistrado, recebeu cerca de cinco a dez minutos de formação para trabalhar com aquela máquina.
13- Mais, a entidade patronal do sinistrado não tinha sequer qualquer manual de instruções da prensa. Tal facto, leva a concluir que nem a entidade patronal tomou conhecimento das indicações dadas pelo fabricante da referida máquina sobre as formas do seu manuseamento bem como as precauções a ter, nem o sinistrado tomou qualquer conhecimento dessas mesmas instruções.
14- Tais factos não podem, de forma alguma, ser desvalorizados ou tornados irrelevantes no conjunto dos factos que ficaram provados e que levaram à verificação do acidente.
15- Inexistindo manual de instruções ou quaisquer outros elementos sobre o sistema operativo da máquina de que terão valido os cinco ou dez minutos de formação que o sinistrado recebeu para trabalhar com aquela máquina?
16- Qual a base com que tal instrução ou formação foi ministrada ao sinistrado?
17- O acidente ocorreu por um lado porque ao trabalhador não foram dados pela entidade patronal conhecimento técnicos e formação suficiente para manobrar com a referida máquina e por outro lado, não existia naquela máquina (mas já existia noutra maquina da entidade patronal do sinistrado) nenhum sistema de protecção “ leitura óptica ou por laser “ que impedia o funcionamento da coluna de prensagem sempre que as mãos do sinistrado se encontrassem no campo de acção daquele sistema.
18- Há (na opinião da ora recorrente) que responsabilizar, sem receio, as entidades patronais (empresas) que violem as regras de segurança. O caso dos presentes autos é um típico caso de violação de regras de segurança por parte da entidade patronal.
19- De facto, a pouca ou quase nenhuma formação ministrada ao trabalhador para manobrar aquela maquina, a inexistência de um manual de instruções, acrescida do facto de a entidade patronal não ter tido o cuidado de colocar (lembramos que já existia em outra maquina) na prensa o sistema de protecção “leitura óptica ou por laser“, que teria evitado o acidente dos autos são factos claramente demonstrativos da violação das regras e normas de segurança por parte da entidade patronal nomeadamente do estabelecido no artigo 8° do DL 441/91 de 14.11; artigos 3º, 40º, 44° e 45º da Portaria 53/71 de 03.02 com a redacção dada pela Portaria 702/80 de 27.09, Cap. III, Secção 1; Artigo 7° e 8° do DL 331/93 de 25.09.
20- Assim, nos termos do artigo 18° n° 1 da Lei 100/97 de 13.09 é a entidade patronal a responsável pelo pagamento das pensões reclamada pelo Autor, respondendo apenas subsidiariamente a ora recorrente por esse pagamento.
4. Nas contra-alegações o A bateu-se pela inexistência de contradições na sentença recorrida e conclui que deve manter-se tal decisão.
5. Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II- FUNDAMENTAÇÃO
1. De facto
Da factualidade assente e da decisão de fls. 250/3, que decidiu a matéria de facto, e da qual não houve reclamações, é a seguinte a matéria de facto provada:
a) – No dia 04.06.2003, cerca das 18.30 horas, em Colmieiras, Tondela, o A. foi vítima de um acidente quando, mediante a retribuição mensal de € 374.10, acrescida de subsídios de férias e de Natal, € 54,78 x 14 de subsídio de turno e € 3,40 x 22 x 11 de subsídio de alimentação, trabalhava por conta e sob a autoridade, direcção e fiscalização da 2.ª demandada. (A)
b) – Em consequência do referido evento o A. sofreu diversas lesões que o tornaram portador de ITA (incapacidade temporária absoluta) desde o acidente até 30.10.2003 e de 13.11.2003 a 05.01.2004 e de ITP (incapacidade temporária parcial) de 40 % de 31.10.2003 a 12.11.2003. (B)
c) – A responsabilidade emergente de acidentes de trabalho encontrava-se transferida para a Ré Seguradora, na modalidade de “prémio variável”, pela retribuição dita em a), através de contrato titulado pela apólice n.º 95022292. (C)
d) – O autor nasceu em 03.3.1983. (D)
e) - O acidente aludido em a) consistiu em o A., ao laborar numa prensa mecânica, ter sofrido um entalão na mesma, que lhe originou o esfacelo da mão direita. (1º)
f) – E dele lhe resultaram diversas lesões, nomeadamente rigidez da articulação metacarpo-falângica do dedo indicador e rigidez ligeira da articulação interfalângica proximal, amputação do terceiro raio pela base do metacárpico, amputação do quarto dedo pela articulação interfalângica distal, pseudo-artrose do escafoide cárpico e hipostasia do dedo indicador. (resposta ao quesito 2º)
g) – A máquina dita em e) é constituída por um volante com um sistema mecânico e uma coluna de prensagem accionável e funcionando em cada um dos seguintes sistemas: 1) contínuo/automático - a coluna de prensagem (“torre”) é accionada em ritmo constante (principalmente em “actividade de corte”), utilizando-se para o efeito um comando accionado mediante a rotação duma chave; 2) manual - o operador pressiona com os dedos das mãos, em simultâneo, os dois botões colocados nas extremidades da frente da máquina e por debaixo da mesa da prensa (cfr. documento de fls. 241), realizando a mencionada coluna um único movimento no sentido da mesa da prensa e retornando à posição inicial; 3) pedal/sistema de pé – o operador calca um pedal acoplado à máquina para o efeito, realizando a coluna um único movimento como se refere em 2). Cada movimento completo da coluna de prensagem (sentido descendente e retorno à posição inicial) demora 3 a 4 segundos. Apenas aquele 2º sistema de funcionamento (“manual”) impede o contacto do corpo do trabalhador com as respectivas partes móveis (“torre”/”coluna”). O A. realizava então uma tarefa de calibragem de cornes, trabalho que podia e devia ser executado utilizando um dos sistemas de funcionamento referidos em 2) e 3). (resposta aos quesitos 3º, 14º, 15º, 16º, 17º e 22º)
h) - Devido às lesões decorrentes do acidente o A. esteve internado/hospitalizado três vezes e sofreu dores intensas. (resposta ao quesito 4º)
i) - Ainda hoje se mantendo a sua mão direita dorida, o que lhe provoca mal-estar físico. (resposta ao quesito 5º)
j) – Ficou abalado psíquica, física e animicamente, devido às dores e à visão da sua mão desfeita na máquina com que trabalhava. (resposta ao quesito 6º)
l) - Com este acidente o A. ficou preocupado com o seu futuro devido à desfiguração da sua mão e à incapacidade funcional que lhe reduz a sua capacidade de trabalho e dificulta a sua posição no mercado de trabalho. (resposta ao quesito 7º)
m) – Sentindo-se ainda hoje inferiorizado e psiquicamente abalado, inclusive perante os seus colegas e amigos. (resposta ao quesito 8º)
n) – O A. despendeu importância não inferior a € 250 (duzentos e cinquenta euros) nas deslocações para as Clínicas ou Unidades Hospitalares em Coimbra, o Hospital de São Teotónio de Viseu e a receber tratamento médico-medicamentoso e de fisioterapia, bem como para o Tribunal. (resposta ao quesito 9º)
o) – Despendendo ainda € 19,10 (dezanove euros e dez cêntimos) em transportes que realizou com uma deslocação a Coimbra de comboio e várias deslocações a Viseu de autocarro e táxi. (10º)
p) – E a importância de € 347,92 (trezentos e quarenta e sete euros e noventa e dois cêntimos) com a assistência médica e medicamentosa que lhe foi prestada em consequência das sequelas provocadas pelo acidente. (11º)
q) - O esmagamento supra referido foi provocado pela compressão entre dois planos da máquina, um deles móvel (“torre”), o qual inevitavelmente gerou as lesões e a amputação dos dedos. (12º)
r) – A 2ª demandada não possuía manual de instruções ou quaisquer outros elementos sobre o sistema operativo da aludida prensa mecânica, adquirida em 1996 no estado de usada. (resposta ao quesito 13º)
s) – O A. recebeu cinco/dez minutos de “formação” para trabalhar com aquela máquina e nela executara tarefas idênticas nos dias anteriores ao acidente. (resposta ao quesito 19º)
t) – Existe um sistema de protecção – “leitura óptica ou por laser” – que impede o funcionamento da coluna de prensagem sempre que as mãos do operador estejam no correspondente campo de acção, mecanismo de protecção que se encontra instalado numa das máquinas da 2ª demandada. (resposta ao quesito 18º)
u) – Em consequência do aludido evento o A. ficou portador de sequelas traduzíveis numa IPP (incapacidade permanente parcial) de 21,4912 %.
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2. De direito
Como decorre do estatuído nos artºs 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil (Adiante designado abreviadamente de CPC.) e é jurisprudência pacifica, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, transitando assim em julgado as questões nelas não contidas.
Decorre do exposto que as questões que importa dilucidar e resolver se podem equacionar da seguinte forma:
a) Existe manifesta contradição nos fundamentos da decisão recorrida?
b) Houve, por parte da entidade patronal, violação das regras de segurança, tendo o acidente ocorrido em virtude de tal violação, pelo que a responsabilidade da seguradora é apenas a título subsidiário?
Vejamos pois.
a) Contradição nos fundamentos da decisão recorrida
Se bem interpretamos as alegações da recorrente, esta contradição consistiria no facto de na decisão recorrida se ter entendido que o sinistrado, no momento do sinistro, estava a trabalhar na prensa em sistema manual, quando, pelas características de funcionamento do sistema manual, não podia estar a trabalhar nesse sistema e, por exclusão de partes, então teria de estar a trabalhar no sistema pedal/sistema de pé.
Analisada a decisão recorrida conclui-se que ela não enferma deste apontado vicio.
Na verdade, em termos de factualidade provada, não se deu como provado que o A estivesse a laborar com a máquina em qualquer um dos aludidos sistemas, ou até num terceiro, funcionamento contínuo/automático, em que também a dita máquina podia funcionar. Apenas e tão só se deu como provado que para levar a cabo a tarefa que naquele momento realizava – calibrar cornes – o A podia e devia executá-lo utilizando um daqueles dois sistemas, manual ou de pedal (v. al. g) da fundamentação de facto).
Aquela factualidade, tomada em consideração na sentença recorrida, foi o resultado, entre outras, das respostas à matéria de facto perguntada nos nºs 17, 20 e 21, da base instrutória, onde era questionado o uso dos três descritos sistemas de funcionamento da máquina em causa.
Acresce ser de salientar que é bem elucidativa a fundamentação das respostas à matéria de facto no sentido de que ficaram dúvidas no tribunal “a respeito, designadamente, do sistema de funcionamento utilizado pelo A aquando do sinistro” – v. fls. 255.
Desta forma, não tendo sido utilizada fundamentação de facto que seria inconciliável logicamente - dando como pressuposto esta perspectiva da recorrente que ocorria tal inconciliabilidade, o que não temos como certo - com a solução de direito encontrada, não existe qualquer vicio da decisão recorrida, nomeadamente a causa de nulidade prevista no art. 668º nº 1 al. c) do CPC, se é que se refere a tal a conclusão 10ª das alegações da recorrente.
Mas se a perspectiva da recorrente é diferente, ou seja, se está subjacente àquela conclusão o raciocínio de que existe uma incorrecta apreciação da prova, por entender que o acidente só poderia ter ocorrido estando o sinistrado a laborar em sistema de pedal ou de pé, então a questão foi mal enquadrada pela recorrente, pois se trataria de saber se é de modificar ou não a decisão da matéria de facto, nos termos previstos no art. 712º do CPC.
Dir-se-á desde já, para atalhar razões, que não vemos que este tribunal possa proceder à alteração da matéria de facto decidida pela 1ª instância, pois não se verifica qualquer das circunstâncias previstas nas diversas alíneas do nº 1 do art. 712º citado, nem o raciocínio da recorrente tem apoio na factualidade apurada.
Se é verdade que na fundamentação da matéria de facto – que não na factualidade dada como provada, como já atrás se salientou - ainda o tribunal chegou a tecer considerações no sentido de que os elementos disponíveis apontariam para o A estar a usar o sistema manual, logo aí foi explicito o Mº Juiz “a quo” ao afirmar que se desconhecia “a circunstância que desencadeou a (inesperada) descida da coluna de prensagem quando o A tinha a mão na zona de prensagem” – v. despacho de fls. 255. Assim tal circunstância bem pode ser qualquer uma das aventadas nas contra-alegações do A, ou seja, avaria da máquina e mudança acidental – por contacto involuntário do A com os joelhos ou com as mãos na chave/botão de conexão - do sistema de funcionamento da máquina para o automático e não, necessária e logicamente, apenas porque o A. estava a manobrar com a máquina em sistema de pedal ou de pé.
Desta forma se conclui que improcedem as conclusões 5, 9 e 10 das alegações da recorrente, conexionadas com esta questão.
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b) Violação das regras de segurança, nexo de causalidade entre tal violação e o acidente e responsabilidade, principal ou subsidiária, da R. seguradora
Como ponto prévio cabe referir, considerando a data em que ocorreu o acidente, 04.06.2003, que a legislação aplicável é a Lei 100/97 de 13.09 (Adiante designada abreviadamente de LAT (Lei dos Acidentes de Trabalho)) e o DL 143/99 de 30.04 (Adiante designado abreviadamente de RLAT (Regulamento da Lei dos Acidentes de Trabalho)) , atento o disposto no art. 71º nº 1 deste último diploma legal, na redacção dada pelo art. 1º do DL 382-A/99 de 22.09.
Dispõe o art. 18º nº 1 da LAT que “Quando o acidente … resultar de falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, as prestações fixar-se-ão segundo as regras seguintes: a) Nos casos de incapacidade absoluta, permanente ou temporária, e de morte, serão iguais à retribuição; b) Nos casos de incapacidade parcial, permanente ou temporária, terão por base a redução de capacidade resultante do acidente” (o itálico é obviamente da nossa autoria).
Por sua vez, preceitua o art. 37º nº 2 do mesmo diploma legal, que nesta situação, a responsabilidade prevista naquele art. 18º “… recai sobre a entidade empregadora, sendo a instituição seguradora apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na presente lei”.
Impõe-se pois averiguar se houve falta de observação das regras sobre segurança no trabalho e, no caso afirmativo, se essa inobservância foi causal do acidente. É o que temos como certo em face da própria letra da lei, o art. 18º citado, e tendo em conta os termos legais, acima salientados em itálico.
Sobre esta temática cremos que a orientação jurisprudencial, se não uniforme, pelo menos largamente maioritária, vai também no sentido da necessidade de se provar a violação das normas de segurança e o nexo de causalidade entre essa violação e o acidente, para poder concluir pela responsabilidade da entidade patronal a titulo principal e de forma agravada, cabendo a quem invoca tais fundamentos o ónus da prova daquela violação e deste nexo causal. Citam-se, a título exemplificativo, os Acórdãos do STJ de 06.07.2004 e 03.05.2001, o Ac. da Relação de Lisboa de 11.06.2003 e os Acórdãos da Relação do Porto de 14.07.2003 e 10.12.2003 (Publicados na C.J.-Ac. do SJT, Ano XII, tomo II, pág. 289, Ano IX, tomo II, pág. 269 e C.J., Ano XXVIII, tomo III, pág. 156, tomo IV, pág. 219 e tomo V, pág. 241, respectivamente.) .
Tendo presentes as disposições legais citadas e as asserções acima expostas, debrucemo-nos sobre o caso em análise.
Para já importa relembrar que a R. seguradora atribui a culpa na produção do acidente à R. entidade patronal, por ter havido por parte desta violação das regras de segurança, nomeadamente do estabelecido no art. 8º do DL 441/91, artºs 3º, 40º, 44° e 45º da Portaria 53/71 de 03.02 com a redacção dada pela Portaria 702/80 de 27.09 e artºs 7° e 8° do DL 331/93 de 25.09.
Dir-se-á desde já, no que tange aos artºs 7º e 8º do DL 331/93 invocados pela recorrente, que não são aplicáveis ao caso dos autos, pois versam sobre a obrigação de consulta dos trabalhadores e informação e formação a prestar aos mesmos pela entidade patronal, mas apenas no que tange às regras de segurança e de saúde relativas à “movimentação manual de cargas”, pois é esse o âmbito do diploma em causa, como decorre do estatuído no art. 1º do decreto lei citado.
Ora, não estando em causa, como não está, acidente de trabalho que tenha por base uma situação em que o mesmo ocorreu na sequência de “movimentação manual de cargas”, o DL 331/93 não tem qualquer aplicação ao caso em análise.
Também se nos afigura que os artºs 44º e 45º da Portaria 53/71 não têm qualquer aplicação ao caso presente, pois o primeiro prescreve as características que devem possuir os protectores e resguardos das máquinas e o segundo estabelece que para fins de reparação ou regulação das máquinas é possível a retirada temporária daqueles protectores e resguardos. Ora, a factualidade apurada não se enquadra, manifestamente, nestas situações, pois não estamos perante uso de protectores ou resguardos sem as características devidas ou numa situação em que os protectores ou resguardos tenham sido retirados. Isto mesmo admitindo, por hipótese de raciocínio, a aplicabilidade da Portaria 53/71, o que cremos não é possível afirmar, em face da factualidade alegada ser insuficiente para nos permitir tal conclusão, como adiante se fundamentará.
Duas outras notas prévias que não podemos deixar de salientar.
A primeira vai para o facto de, tendo o art. 8º do DL 441/91 seis nºs e em dois destes várias alíneas, bem como o art. 3º da Portaria 53/71 várias alíneas, pena foi que a R. recorrente não tenha identificado concretamente qual o segmento ou segmentos dos referidos preceitos que entende violados.
A segunda nota reporta-se ao facto de, salvo melhor opinião, a recorrente não ter alegado nem ter feito prova de a co-R., entidade patronal, se dedicar a uma das actividades constantes da tabela anexa ao Decreto nº 46 924 de 28.03.1966, pois só aos estabelecimentos industriais que tenham por base tais actividades é que são aplicáveis as normas da Portaria 53/71, tendo em consideração o seu campo de aplicação, delimitado no art. 2º de tal Portaria, na redacção dada pela Portaria 702/80. Ora, cremos que a denominação comercial da co-R, entidade patronal, é pouco para concluir pela actividade económica que desenvolve e pode nem sequer haver coincidência entre o que o nome sugere e a actividade efectivamente desenvolvida.
Nesta medida é até de concluir que a recorrente não fez prova dos pressupostos de aplicabilidade da Portaria 53/71, e competia-lhe fazê-lo face ao ónus de prova que lhe incumbe, pelo que nem seria de averiguar da possível violação das normas constantes de tal portaria.
Mesmo apesar destas duas notas, não deixaremos de nos questionar da violação de tais dispositivos, na interpretação que se afigura a mais adequada a tal tese e em função do caso em análise.
E da interpretação que fazemos do art. 8º do DL 441/91, aparentemente poderá questionar-se da violação do principio geral estabelecido no nº 1 que impõe ao empregador a obrigação de “assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho”, devendo para o efeito aplicar as medidas necessárias, tendo em conta como princípios de prevenção, além de outros, o previsto na al. a) do nº 2 do mesmo preceito, que lhe impõe “Proceder, na concepção … dos … processos de trabalho, à identificação dos riscos previsíveis, combatendo-os na origem, anulando-os ou limitando os seus efeitos, por forma a garantir um nível eficaz de protecção”. Ainda do nº 3 daquele art. 8º decorre que se impõe ao empregador, na aplicação daquelas medidas de prevenção, a obrigação de “mobilizar os meios necessários, nomeadamente nos domínios … da formação e da informação, … bem como o equipamento de protecção que se torne necessário utilizar, tendo em conta, em qualquer caso, a evolução da técnica”.
Dos artºs 3º e 40º da Portaria 53/71, com a redacção que lhes foi dada pela Portaria 702/80, extraem-se para a entidade patronal, em síntese útil para o caso, os seguintes deveres ou obrigações gerais:
“Adoptar as medidas necessárias, de forma a obter uma correcta organização e uma eficaz prevenção dos riscos que podem afectar a vida, integridade física e saúde dos trabalhadores ao seu serviço” – al. b) do citado art. 3º;
“Informar os trabalhadores dos riscos a que podem estar sujeitos e das precauções a tomar, …” – al. g) do mesmo art. 3º;
“… todas as partes perigosas das máquinas que accionem devem estar protegidas por dispositivos de segurança, a menos que a sua construção e localização sejam de molde a impedir o seu contacto com pessoas ou objectos” – nº 1 do art. 40º citado;
“As máquinas antigas, construídas e instaladas sem dispositivos de segurança eficientes, devem ser modificadas ou protegidas sempre que o risco existente o justifique” – nº 2 do mesmo art. 40º.
Vejamos pois.
Não retiramos que do facto de não possuir manual de instruções ou quaisquer elementos sobre o sistema operativo da aludida prensa mecânica a R. não tenha tomado conhecimento das indicações dadas pelo fabricante da referida máquina e sobre as formas do seu manuseamento, bem como das precauções a ter, nem que o sinistrado não tenha tomado conhecimento dessas mesmas instruções.
Tais conclusões da recorrente partem de pressupostos de facto não demonstrados, como sejam ser a máquina em causa modelo único a laborar no estabelecimento da R., e aparentemente não o era pois a R. tinha montado um sistema de leitura óptica ou laser numa outra maquina, e não ter a R tomado conhecimento das formas de manuseamento e precauções a ter por forma verbal, assim as transmitindo também ao sinistrado. O manual de instruções não é, necessariamente, o único meio para obter tais conhecimentos.
Questiona-se também a recorrente não só sobre a validade dos cinco ou dez minutos de formação que o sinistrado terá recebido, como ainda com que base é que tal formação foi ministrada.
Não nos custa, em termos teóricos e abstractos, admitir que aquele tempo de formação possa ser escasso. Porém isso é em termos teóricos. Porque em termos práticos, a formação, sem manual e por aquele período de tempo, pode ser plenamente válida e suficiente. Aliás é de notar que o sinistrado tinha executado, naquela máquina, tarefas idênticas nos dias anteriores ao acidente – v. al. s) da fundamentação de facto – pelo que, aprioristicamente, se a formação tivesse sido escassa ou insuficiente, então tinha mais sentido que o acidente tivesse ocorrido anteriormente e não quando já tinha mais experiência.
Já quanto ao sistema de protecção de leitura óptica ou por laser, que impede o funcionamento da coluna de prensagem sempre que as mãos do operador estejam no correspondente campo de acção e que a máquina em causa não tinha, não nos custa aceitar que se estivesse instalado na máquina com que ocorreu o sinistro, este não se teria verificado.
Porém, a questão é que os mencionados dispositivos legais não impõem expressamente que o tipo de máquina em causa para operar tivesse que ter instalado tal sistema de protecção.
No fundo, trata-se de uma questão de aceitabilidade do risco e, aparentemente, ao não se exigir expressamente a instalação daquele tipo de protecção o legislador acabou por aceitar que era aceitável o risco de operar com mecanismo de protecção menos eficiente. E em termos sociológicos é compreensível que assim seja, desde logo porque o conceito de risco é uma construção social, mas considerando vários outros factores como a competitividade económica e questões de mercado de trabalho. Acrescem a esses factores que, como bem refere Manuel M. Roxo (Segurança e Saúde do Trabalho: Avaliação e Controlo de Riscos, Liv. Almedina, 2004, pág. 188/9) , “os padrões de risco aceitável definidos pela lei ou pelos sistemas de normalização técnica – cujo processos de definição sofrem, também, do mesmo tipo de problemas (“Tenham-se presentes as polémicas recentes sobre a fixação da taxa de alcoolémia para a condução automóvel, ou sobre os processos de co-incineração ou tratamento de resíduos industriais perigosos.) – para além de, muitas vezes, não serem de transposição fácil para as situações concretas de trabalho, em função das suas características de generalidade e abstracção, também não podem abranger todos os riscos e todas as situações acidentais com que a realidade da vida não cessa de nos surpreender. Por isso, esta noção é eminentemente específica, isto é, relacionada com uma situação específica. De facto, não há opções universais de risco aceitável”.
Assim, não existindo norma expressa a definir em que condições mínimas de segurança é que uma máquina daquelas, prensa mecânica, pode funcionar, ou melhor, a estatuir que tal máquina deveria operar com um sistema de protecção de leitura óptica ou por laser, não se pode concluir pela violação das normas invocadas pela recorrente, os citados artºs 8º do DL 441/91 e 3º e 40º da Portaria 53/71 ou quaisquer outras.
Na verdade, estes dispositivos legais contêm imposições genéricas ou princípios gerais, como aliás resulta do estatuído no art. 1º do DL 441/91, à luz dos quais devem ser interpretadas as normas que, em concreto, estabeleçam determinadas condições de segurança, higiene e saúde no trabalho.
Mesmo em relação à norma do art. 40º da Portaria 53/71, da qual decorre uma obrigação genérica de proteger por dispositivos de segurança as partes perigosas das máquinas que accionem e, por outro, de modificar ou proteger as máquinas antigas sem dispositivos de segurança eficientes, mesmo em relação a tal norma, dizíamos, não se crê que a situação sub judicio configure violação de tal dispositivo.
Na verdade, a máquina em causa não só tinha um sistema de protecção, que consistia em trabalhar no sistema manual, o qual obrigava a que o operador tivesse que pressionar com os dedos das mãos, em simultâneo, os dois botões colocados nas extremidades da frente da máquina e por debaixo da mesa da prensa, assim se impedindo o contacto do corpo do trabalhador com as partes móveis da máquina (torre/coluna), como a tarefa que o sinistrado realizava aquando do sinistro, calibragem de cornes, podia e devia ser executado utilizando esse sistema manual, embora pudesse também ser realizado no sistema de pedal ou de pé – v. al. g) da fundamentação de facto.
Está subjacente ao raciocínio da recorrente, como decorre da conclusão 11ª das alegações, que se a máquina em causa tivesse o sistema de leitura óptica ou por laser o acidente não teria ocorrido.
Porém, como já atrás dissemos e aqui repetimos para enfatizar, nada nos citados dispositivos legais impõe expressamente a necessidade de as prensas mecânicas estarem equipadas com tal sistema de protecção. Logo, não é possível fundamentar naqueles dispositivos genéricos a violação de normas ou regras de segurança concretas.
A não ser assim e adoptando a tese da recorrente, dificilmente as empresas não cairiam na violação sistemática de regras de segurança, tão genéricos e abrangentes são os princípios contidos nos preceitos em causa.
Conclui-se assim que, ao contrário do que pretende a recorrente, o caso dos presentes autos está muito longe de ser um típico caso de violação das regras de segurança por parte da entidade patronal.
Porém, ainda que se concluísse ter havido violação das regras de segurança, não está demonstrado que dessa eventual inobservância tenha resultado o acidente de que foi vitima o A., o que sempre faria soçobrar a tese da R. recorrente.
Na verdade, não vem dado como provado em que circunstâncias é que ocorreu o acidente em causa, nomeadamente em que sistema de funcionamento é que o sinistrado estava a laborar com a máquina – v. respostas negativas, implicitamente, aos nºs 20, 21 e 23 da base instrutória - bem como qual “a circunstância que desencadeou a (inesperada) descida da coluna de prensagem quando o A tinha a mão na zona de prensagem” – v. despacho de fls. 255, a fundamentar a decisão da matéria de facto.
Nesta medida, apreciando a factualidade provada, não é possível extrair dela em que circunstâncias de funcionamento da máquina ocorreu o entalão da mão do sinistrado, o que equivale a concluir que não está demonstrada a causa que produziu aquele resultado, o sinistro, pelo que não é possível concluir por um nexo de causalidade entre o acidente e a violação das regras de segurança. Neste sentido afirmando que nessas situações “permanece oculta a causa” decidiu o Ac. do STJ de 06.07.2004, atrás citado.
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3. Tudo visto e ponderado, ressalvando o devido respeito por entendimento diverso, cremos que as, aliás, doutas conclusões do recurso não contêm virtualidade suficiente para nos levar a concluir de modo diverso da decisão recorrida, pois nesta não foi feita violação das normas legais supra analisadas. É assim de concluir que o recurso deve improceder, mantendo-se a condenação da R. seguradora, a título principal.
Admitimos que nem sempre a máxima do jurista e filósofo inglês Jeremy Bentham, segundo o qual “A lei deve ser clara, quer dizer, deve criar no espírito uma ideia que represente exactamente a vontade do legislador, e deve ser concisa a fim de se fixar facilmente na memória” (In Direito, As melhores citações, Colecção Citações Jurídicas, pág. 107.) está presente quando o legislador, e ainda para mais o legislador do nosso tempo, cria leis.
Mas é algo com que nós, intérpretes da lei, temos de saber lidar.
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III- DECISÃO
Termos em que se delibera confirmar inteiramente a decisão impugnada, negando provimento ao recurso.
Custas a cargo da apelante.
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Coimbra,