Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3308/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
Data do Acordão: 11/30/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE OLIVEIRA DO BAIRRO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTº 1905º, Nº 2, DO C. CIV. .
Sumário: I – O interesse dos menores passa pela sua entrega àquele progenitor que lhes possa proporcionar as melhores oportunidades de equilíbrio psíquico, estabilidade emocional e condições de futuro .
II – Tendo os menores tenra idade, a não ser que existam razões ponderosas, não se deve privar os menores dos cuidados e contacto íntimo e continuado com as mães .
Decisão Texto Integral: 1

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- A..., residente na Rua do Carneiro, Mogofores, Anadia, propõe contra B..., residente na Rua dos Colégios, Ed. Olympus, Bloco 2, 4º Dtº, Oliveira do Bairro, a presente regulação do poder paternal em relação aos menores C... e D..., nascidos a 13-8-98, alegando, em síntese, serem casados mas estarem separados de facto, havendo necessidade de regular o poder paternal em relação aos menores seus filhos, entendendo que a guarda dos mesmos devem ser confiada a si, que o requerido deve pagar a pensão alimentícia de 32.000$00, estabelecendo-se o regime de visitas do pai aos menores.
1-2- Entretanto a requerente e requerido vieram juntar um acordo provisório quanto à regulação do poder paternal dos menores ( nos autos de fls.18 a 20).
1-3- Procedeu-se à conferência a que alude o art. 175º da OTM, mas não foi conseguido o acordo dos requerente e requerido.
1-4- O requerido/pai e a requerente alegaram, pronunciando-se, cada um deles pela entrega dos menores a si.
1-5- Foi pedido e elaborado o relatório social sobre as condições sociais, morais e económicas dos pais dos menores.
1-6- Foi designado dia para a audiência de julgamento à qual se procedeu com observância das formalidades legais, finda qual se declarou a matéria dada como assente e se proferiu a sentença.
1-7- Nesta decidiu-se entregar os menores ao pai, estabelecendo-se os contactos e visitas da mãe aos menores e fixando-se a pensão alimentícia de 125 euros da mãe a favor dos filhos, com actualização de acordo os índices de inflação de preço ao consumidor publicado pelo INE.
1-8- Não se conformando com esta sentença, dela veio recorrer a requerente, recurso que foi admitido como apelação e com efeito devolutivo.
1-9- Já depois da prolacção da sentença, os pais dos menores, com vista a concretizar os contactos da mãe com os menores, acordaram, provisoriamente (enquanto perdurar o recurso ), de harmonia com os termos de fls. 294 e 295, cujo o teor aqui se dá como reproduzido.
1-10- A recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões úteis:
1ª- A entrega dos menores ao pai, no caso concreto, só se poderia verificar se existissem razões ponderosas, que o justificassem, que não existem.
2ª- A entrega dos menores ao pai não se pode basear, fundamentalmente, na ruptura com o meio ambiente ou na continuidade das relações porque os menores sempre conviveram e frequentaram a casa da mãe, diariamente e ali dormiam. Pelo menos, duas vezes por semana, além de fins de semana alternados.
3ª- A frequência de um infantário, não pode ser configurada como um dos argumentos decisivos para as relações de continuidade estabelecidas pelos menores enquanto o processo aguardou julgamento.
4ª- O pai gere o dia-a-dia dos menores em conjunto com a avó paterna deles, ignorando a mãe e contra a vontade desta, pelo que não oferece garantia de equilíbrio na proximidade com os filhos menores.
5ª- A avó paterna, com papel activo nos cuidados de alimentação, vestuário dos menores, está incompatibilizada com a mãe, o que oferece riscos de afastamento desta e não foi avaliado na sentença.
6ª- O papel dos avós é sempre salutar, mas não quando surgem em sobreposição com o papel dos pais, como é o caso, relativamente à mãe.
7ª- A mãe também dispõe de ajuda familiar, caso necessite.
8ª- Não pode a situação económica do pai, mais vantajosa, ser preponderante na atribuição a este da guarda dos filhos, sob pena de preferência de critérios económicos perante outros de afectividade.
9ª- O facto de a mãe trabalhar não a impede de exercer o poder paternal dos filhos, sob pena de discriminação injusta e injustificada.
10ª- A presente sentença apresenta-se como uma reformatio in pejus relativamente à situação dos menores, limitando e diminuindo, de forma drástica, o contacto dos filhos com a mãe.
11ª- Os menores são de tenra idade e nada substitui o colo da mãe.
12ª- A sentença só veio tornar mais ténues os laços e ligações afectivas, dos menores com a mãe, em prejuízo destes.
13ª- A prestação de alimentos a cargo da mãe é superior ao exigível, atendendo ao rendimento do pai e às necessidades dos filhos.
14ª- Assim, a sentença ao atribuir o exercício do poder paternal ao pai, violou as normas contidas nos arts. 1905º nº 2 e 1906º nº 2 do C.Civil, devendo os menores serem entregues à mãe, por ser a situação que melhor salvaguarda os interesse dos mesmos.
1-11- O M.P. respondeu ao recurso, tendo-se pronunciado pela entrega dos menores à guarda da mãe, revogando-se a sentença recorrida., fixando-se um regime de visitas do pai aos menores idêntico ao decidido para a mãe e fixando-se a pensão alimentícia dele a favor dos filhos em 175 Euros.
1-12- O requerido/pai respondeu a estas alegações sustentando o não provimento do recurso.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
II- Fundamentação:
2-1- Como se vê pelas alegações e respectivas conclusões formuladas pela recorrente, a questão essencial que se suscita no presente recurso, é a de saber a qual dos progenitores devem ser entregues os menores, com vista ao exercício do poder paternal.
Na douta decisão recorrida entendeu-se por bem entregar a guarda dos menores ao pai. Na apelação, discordando em absoluto dessa entrega ao pai, a recorrente entende que os menores lhe deverão ser entregues a si.
Nos termos do 713º nº 6 do C.P.Civil e dado que a matéria de facto dada como provada na 1ª instância não foi impugnada, remete-se para os termos da decisão que a fixou.
Para apreciação do presente recurso, salientaremos que foi dado como provado o seguinte:
a) Do casamento da requerente com o requerido nasceram, em 13-8-98, os menores C... e D....
b) Em 10-7-01 foi estabelecido pelos requerente e requerido, provisoriamente, um acordo quanto à regulação do poder paternal dos menores, ficando estabelecido, para além do mais, que os menores ficavam com o pai.
c) A requerente gozou o tempo normal de licença de maternidade cuidou e velou os filhos, prestando-lhes toda a assistência, a tempo inteiro, vendo-se depois obrigada a regressar ao seu trabalho, com funcionária administrativa.
d) O requerido trabalha numa empresa familiar e goza de um horário de trabalho flexível, gerindo o seu tempo como bem entende.
e) Quando a requerente regressou ao trabalho, a avó paterna dos menores, mãe do requerido, ofereceu-se para cuidar deles durante o dia, enquanto aquela trabalhasse.
f) Acordaram então que o pai, ora requerido, que trabalhava em Vagos, levaria de manhã os menores, deixando-os durante o dia com a avó paterna.
g) A requerente entendia, então, que os menores deveriam frequentar uma escola em Oliveira do Bairro ( onde o casal residia ).
h) A requerente contactou um infantário em Oliveira do Bairro a fim de aí inscrever os menores, de forma a que os mesmos ficassem perto da casa do casal, evitando percorrer diariamente a distância entre Vagos e Oliveira do Bairro.
i) A requerente enfrentou a oposição do requerido, pelo que se viu obrigada a desistir da inscrição, entretanto feita, conformando-se com a decisão deste.
j) A requerente e a sua sogra, avó paterna dos menores, encontram-se incompatibilizadas, sendo mau o relacionamento entre si.
k) As relações do casal foram-se degradando, até que passaram a fazer vidas separadas.
l) O requerido continuou a transportar os menores durante o dia para Vagos e a requerente deslocava-se diariamente, à noite, a casa do casal para adormecer os menores.
m) A requerente encontra-se actualmente a residir em casa dos seus pais em Mogofores, Anadia e trabalha como funcionária administrativa em Santa Comba Dão.
n) Já fez tentativas para que os menores fiquem consigo, mas sempre a resistência do requerido que se opõe.
o) A requerente inscreveu os menores num infantário em Mogofores, onde actualmente reside.
p) O requerido é pessoa que consegue exercer autoridade sobre a requerente.
q) A requerente tem evitado assumir posições de força que se reflictam nos menores.
r) O requerido gere o dia-a-dia dos menores como entende, tendo matriculado os filhos num infantário que escolheu, sem que alguma coisa tivesse comunicado à requerente.
s) A avó paterna dos menores dispensa-lhes cuidados e durante o dia olha por eles quando vêm da escola e os fins de semana quando ficam com o requerido, são passados em casa desta.
t) A requerente é pessoa de bom comportamento, de óptima formação moral, merecedora de todo o respeito público, tem uma vida estabilizada e tem boas condições psíquicas e afectivas.
u) O requerido dorme todos os dias com os menores e, actualmente, leva-os à escola às 9 horas, vai buscá-los às 12 horas para almoçar com eles, leva-os, de novo, às 13,30 horas e vai recolhê-los às 15,30 horas.
v) A requerente tem vindo a conviver com os menores nos termos estabelecidos no acordo provisório firmado pelos pais.
w) Os menores têm uma excelente relação afectiva com o pai, com os avós paternos, com os tios e com os primos, com quem convivem diariamente.
x) A requerente foi algumas vezes à noite à residência do casal em Oliveira do Bairro adormecer o Gonçalo, porque estava habituado às canções que ela cantava.
y) É a avó paterna que cuida e manda as roupas dos menores asseada, todos os dias.
z) A requerente e a avó materna, têm disponibilidade para acompanhar os menores.
aa) Durante as férias de Verão ( de 2001 ), o requerido sempre informou a requerente do local onde se encontravam os menores, permitindo-lhe que os visse e que estivesse com eles.
bb) A requerente levou os menores consigo para a praia da Tocha e não permitiu que o requerido soubesse a localização dos menores, razão por que o requerido tivesse de deambular por várias praias para conseguir saber onde estavam os menores.
cc) Os menores são menos obedientes à requerente que lhes dá uma educação mais rígida que a ministrada pelo requerido, mais descontraída, permissiva ou liberal.
dd) Tem havido um esforço de ambos os pais em não repercutir para os menores os problemas do casal.
ee) Os menores encontram-se com o pai e com os avós paternos, pelo menos, desde a data do acordo acima indicado.
ff) A requerente tem sofrido pressão por parte do requerido e dos pais deste no sentido de os menores ficarem à guarda do requerido.
gg) O requerido tem dos seus pais um grande suporte pessoal e familiar, recebendo deles toda a ajuda relativa aos cuidados com a alimentação, higiene e supervisão dos menores.
hh) Durante o dia, os menores frequentam o pré-escolar em Vagos, a cerca de 500 metros da residência dos avós paternos, com quem permanecem desde as 15,30 horas ( hora do regresso da escola ) até às 19,30 horas, altura em que o requerido os leva para sua casa.
ii) A casa de habitação dos avós paternos dista cerca de 1 km do local de trabalho do requerido, ficando situada a escola que os menores frequentam entre a casa de habitação e aquele local de trabalho.
jj) Os menores são pessoas felizes, alegres, bem tratadas e mantêm, quer com o requerido quer com a requerente, uma relação afectiva positiva, demonstrando vontade de estar com ambos, embora a figura paterna seja predominante na vida diária e quotidiana dos menores.
kk) A requerente mantém contacto diário com os menores e mantém contacto regular com os educadores do infantário que frequentam.-----------------
2-2- A componente teórico/jurídica indicada na douta sentença recorrida não merece qualquer contestação por parte da recorrente. Também nós entendemos não dever fazer qualquer reparo ao sustentado pelo Mº Juiz nesse âmbito. Por isso entendemos dever remeter para o que aí se referencia sobre o assunto.
Deveremos porém salientar que o art. 1905º nº 2 do C.Civil, manda que, na falta de acordo dos pais em relação à forma de regularem o poder paternal, o tribunal decida de harmonia com o interesse dos menores, “incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com o progenitor a quem não seja confiado, podendo a sua guarda caber a qualquer dos pais”. Isto é, em caso de desacordo dos pais em relação à regulação do poder paternal, o tribunal deve decidir conforme o interesse dos menores.
Evidentemente que o interesse dos menores passa pela entrega àquele progenitor que lhes possa proporcionar as melhores oportunidades de equilíbrio psíquico, estabilidade emocional e condições de futuro.
E a nosso ver, no caso dos autos como os factos provados demonstram, felizmente para os menores, tanto o pai como a mãe, têm condições para proporcionar estas condições de bem-estar aos filhos. Com efeito, os dois estão inseridos profissional e socialmente, sendo pessoas idóneas. Ambos também manifestam a disponibilidade e o propósito de ficar com a guarda dos filhos.
Como está fora de causa a guarda conjunta dos menores por ambos os progenitores ( pelo facto de não existir acordo dos pais - art. 1906º nº 1 -), haverá pois que decidir, a qual dos dois atribuir a guarda dos menores e concominantemente a exercício do seu poder paternal.
Na douta decisão recorrida, entendeu-se não existir um desnível sensível quanto às reais capacidades de cada um dos pais, em poder encabeçar o exercício do poder paternal dos filhos. Isto porque se considerou que ambos reuniam as condições pessoais, familiares e profissionais para exercer tal função. Optou-se porém em atribuir esse exercício ao pai pelas seguintes razões:
De continuidade das relações dos menores com o pai, com quem se encontram, não sendo adequado desenraizá-los, com apenas 5 anos de idade, do seu meio escolar e do contexto familiar em que se inserem e onde têm vivido.
Da maior consistência da relação afectiva do pai com os menores, em relação à relação afectiva da mãe.
Situação actual da vida da mãe, trabalhando a uma distância considerável, carecendo de disponibilidade e flexibilidade laboral para manter um contacto mais estreito e vigilante com os filhos.
O facto de a mãe não ter o mesmo apoio familiar de retaguarda do pai.
Não se ter verificado uma continuidade nas relações quer com a mãe quer com a avoenga materna.
E ter o mãe uma situação económica mais frágil que o pai.
Não podemos aceitar estes fundamentos, já que nem todos se nos afiguram verdadeiros, face ao acervo dos factos provados, ou pelo menos, são incorrectas as conclusões que deles se retiram.
Estamos concretamente a referimo-nos ao facto da não continuidade das relações da mãe com os menores e com a avoenga materna, já que se provou que a requerente mantém contacto diário com os menores e tem vindo a conviver com os menores nos termos estabelecidos no acordo provisório firmado pelos pais, donde resulta que, pelo menos, a mesma fica com os filhos em casa dos seus pais onde habita, nas noites de 5º e 6º feira e quinzenalmente e nos dias de sábado e domingo. Evidentemente que este regime também possibilita o contacto dos menores com os avós maternos, repete-se, em cuja casa vive hoje a mãe.
Pese embora se possa aceitar que os avós paternos têm boas condições para dar ao pai o apoio necessário para cuidar dos filhos, entendemos que o mesmo sucederá com os avós maternos, não havendo aqui de cuidar se uns terão melhores condições que os outros, mas, tão só, se têm, tanto uns como outros, os atributos suficientes e adequados para fornecer essas ajudas aos progenitores. E a resposta à questão não poderá deixar de ser positiva.
Também não nos parece correcto afirmar que os menores têm uma maior consistência na relação afectiva do pai do que a mãe, pois face aos contactos frequentes destes com os filhos e o facto de se ter provado que ela mantêm uma relação afectiva positiva com eles, demonstrando estes vontade de estar com ela ( e também com o pai ), tal afirmação não será correcta. Claro que não se ignora que se provou que a figura paterna é predominante na vida diária e quotidiana dos menores, já que é com ele que se estão mais frequentemente. Mas isto não quer, patentemente, dizer que os menores nutram pelo pai uma maior afeição ou uma relação afectiva mais consistente com ele do que com mãe, sentimento em causa neste fundamento.
É evidente que se provou que o pai, sob o ponto laboral, tem mais disponibilidade de tempo do que a mãe ( que tem um horário mais rígido ), para cuidar dos menores. Mas esta circunstância, numa sociedade em que é corrente homens e mulheres trabalharem, não é importante e muito menos decisivo para a decisão da guarda dos menores. É um dado da vida que muitas mulheres, nos dias de hoje, têm uma vida profissional absorvente e, nem por isso, tal é impeditivo de desempenharem convenientemente o seu papel de mães, frequentemente é certo, com árduo sacrifício pessoal. Não se poderá, obviamente, nesses casos, negar a possibilidade de exercício do poder paternal em relação aos filhos menores a essas mulheres. Importante será salientar, para o caso vertente, que pese embora a mãe dos menores tenha um horário laboral que a ocupa durante quase todo o dia, o certo é que se demonstrou que isso não a impediu de manter contacto diário com os filhos.
No que toca ao argumento da continuidade das relações dos menores com o pai, diremos que uma eventual entrega à mãe não irá terminar com essas relações, pois, como é obvio, dever-se-á estabelecer os contactos dos menores com o pai e este não deixará de visitar e estar com os filhos. Os filhos não deixam de ser seus, com toda a carga de afectividade que isso acarreta, pelo facto de serem entregues ao outro progenitor.
É claro que uma entrega à mãe implica que os menores deixem o contexto familiar onde têm vivido. Mas isso é fruto de uma opção que teremos que tomar, face ao desacordo dos pais na regulação do poder paternal dos menores. Acresce que se pode concluir pela posição assumida nos presentes autos, que a mãe nunca se conformou com o facto de os filhos ficarem à guarda do pai. O presente recurso é mais uma manifestação desse seu inconformismo. É certo que aceitou, provisoriamente, que os menores ficassem aos cuidados do pai. Mas esta decisão, para além de ser transitória, terá tido a ver com a preocupação dela em não repercutir para os menores os problemas do casal e ainda com o facto de a mesma ter vindo a evitar assumir posições de força que se reflictam nos filhos e quiçá com o facto de se ter também demonstrado que o requerido é pessoa que consegue exercer autoridade sobre a requerente.
No que toca à melhor situação económica do pai em relação à mãe, tal argumento não pode ser entendido como determinante e muito menos decisivo para entrega dos menores ao progenitor mais favorecido materialmente. Uma vantagem económica, não se pode, obviamente, sobrepor a razões de afectividade. Uma melhor situação económica do pai, apenas servirá para lhe ser fixada uma pensão alimentícia mais alta, assim se fazendo repercutir no bem-estar material dos menores, esse desafogo económico.
Primordial para a questão em debate, consideramos a circunstância de os menores terem apenas cinco anos de idade, ou seja serem crianças de uma muito tenra idade. Neste contexto, a não ser que existam razões ponderosas, não se deve privar os menores dos cuidados e contacto íntimo e continuado com as mães. É que estas, por natureza, estão, normalmente, mais próximas das necessidades físicas e afectivas dos filhos do que os pais. Isto é, as mães por natural instinto, não exclusivo da espécie humana, estão, em regra, mais vocacionadas para acudir às necessidades dos filhos, na fase inicial da infância. Pelo lado dos menores, somos em crer, poder também afirmar, que em idades tenras, a vinculação afectivas dos filhos às mães, derivada até de uma ligação biológica mais intensa, é um factor essencial ao desenvolvimento físico e psíquico das crianças.
Aliás fazendo ressonância destas realidades, a Declaração dos Direitos da Criança adoptada pela Assembleia das Nações Unidas em 20-11-59 estabelece, no seu art. 6º, que “salvo circunstâncias excepcionais, a criança de tenra idade não será apartada da mãe”.
Corolário de tudo isto, ocorre até, no caso dos autos, a circunstância de a mãe ( como se provou ), aquando da separação do casal, se deslocar diariamente, à noite, a casa do casal para adormecer os filhos, especialmente o Gonçalo “porque estava habituado às canções que ela cantava”.
Por outro lado, tendo-se provado que a mãe é pessoa de bom comportamento, de óptima formação moral, merecedora de todo o respeito público, tem uma vida estabilizada e tem boas condições psíquicas e afectivas e que possui o apoio dos seus pais para cuidar dos filhos, parece-nos notoriamente óbvio e claro que a mesma reúne as condições afectivas e materiais para ficar com a guarda dos filhos.
Existe, no caso dos autos, ainda um outro factor que aconselha, a nosso ver, a entrega dos menores à mãe. É que se provou que a mãe e avó paterna dos menores ( que recorde-se, é quem mais trata deles ) encontram-se incompatibilizadas, sendo mau o relacionamento entre si, circunstância que poderá propiciar o risco de afastamento dos menores da mãe ( sabe-se como crianças de tenra idade podem ser influenciadas para comportamentos adversos ), com todas as consequência nefastas, em termos de afectividade, para eles.
Assim sendo, entendemos adequado e justo entregar à mãe a guarda dos filhos.
Entregando os menores à mãe, haverá que definir o regime de visitas e de convívio do pai com os menores.
Porque se nos afigura que o regime de contactos da mãe com os menores, fixado pelo tribunal recorrido, é equilibrado, mantém-se tal regime, agora, porém, com referência ao pai.
Quanto à pensão alimentícia do pai a favor dos menores que haverá que fixar, provou-se:
A requerente aufere como funcionária administrativa o rendimento mensal líquido de 480 Euros, encontrando-se a pagar uma prestação mensal no montante de 130 Euros para aquisição de um veículo automóvel. Por sua vez o requerido trabalha como rectificador de motores, auferindo a quantia mensal de 1000 Euros, encontrando-se a pagar uma prestação bancária mensal de 298 Euros ( pelo empréstimo bancário para aquisição da casa do casal onde habita ) e ainda a quantia mensal de 50 Euros de um empréstimo pessoal que contraiu. Os menores frequentam o ensino pré-escolar, desconhecendo-se o custo de tal frequência acarreta para os progenitores.
Perante estes factos e atendendo que os menores frequentarão em breve a instrução primária, donde resultarão as despesas inerentes à sua condição de escolares e atendendo aos rendimentos da mãe e do pai ( mais elevados os deste ), somos em crer, de harmonia com o critério definido no art. 2004º nº 1 do C.Civil e ponderando nos demais elementos referenciados sobre o assunto na decisão recorrida, que uma pensão de 175 Euros ( 87,5 Euros para cada um dos menores ) se revela ajustada. A pensão será paga pelo pai à mãe, pela forma indicada na decisão recorrida e será actualizada nos termos referenciados no mesmo aresto.
Esta pensão será devida a partir do momento ( mês ) em que os menores passem a ficar a cargo da mãe.
III- Decisão:
Por tudo o exposto, dá-se provimento ao recurso, revogando-se parcialmente a douta decisão recorrida.
Assim:
Os menores ficam entregues à mãe que exercerá o respectivo poder paternal.
O pai contribuirá com uma pensão mensal de 175 Euros ( 87,5 Euros para cada um dos menores ) a favor dos menores, quantia que será paga por ele à mãe, pela forma indicada na decisão recorrida e será actualizada nos termos referenciados no mesmo aresto.
Esta pensão será devida a partir do momento em que os menores passem a ficar a cargo da mãe.
Mantém-se o regime de contactos com os menores fixado pelo tribunal recorrido em relação à mãe, mas com referência ( agora ) ao pai.
Custas na acção e na apelação pelo requerido e apelado.