Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
83/09.8GCACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULO GUERRA
Descritores: CONDUÇÃO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
PENAS
ESCOLHA
PENA DE PRISÃO
PENAS DE SUBSTITUIÇÃO
PRISÃO POR DIAS LIVRES
TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
Data do Acordão: 10/21/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE ALCOBAÇA – 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 40º, 43º, 58º, 70º ,71º E 292º, Nº 1 CP
Sumário: 1. A escolha da pena principal de prisão em detrimento da multa não significa que desde logo se opte pela execução ou cumprimento da pena privativa da liberdade, pois entretanto haverá que ponderar a aplicação das penas de substituição que apenas são aplicáveis depois de escolhida a pena de prisão e de concretamente determinado, nos termos do artigo 71.º, o seu quantum.
2. A prisão por dias livres permite que não se quebrem totalmente os laços sociais do recorrente, assim impedindo a potenciação do efeito criminógeno particularmente activo nas penas de privação da liberdade de curta duração,
3. A prestação de trabalho a favor da comunidade evita a execução de penas de prisão de curta duração [mesmo que em regime de dias livres] e promove a assimilação da censura do acto ilícito mediante a construção de um trabalho socialmente positivo, a favor da comunidade, assente na adesão do próprio arguido. Ao mesmo tempo, apela a um forte sentido de co-responsabilização social e de reparação simbólica.
Decisão Texto Integral: I - RELATÓRIO

            1. No processo sumário n.º 83/09.8GCACB.C1 do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Alcobaça, o arguido M..., devidamente identificado nos autos, foi condenado, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 69º, n.º 1, alínea a) e 292.º, n.º1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, a cumprir em dias livres, em 36 períodos de 36 horas e ao fim-de-semana., bem como na (pena acessória) de proibição de veículos motorizados pelo período de 12 (doze) meses.

            2. Inconformado, o arguido recorreu da sentença condenatória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição):

· A pena de prisão efectiva aplicada ao arguido mostra-se desproporcionada e deve ser suspensa na sua execução.

· A pena aplicada apresenta um forte carácter punitivo, revelando maior aptidão para satisfação de um fim imediato de punição do que para a prevenção.

· O cumprimento efectivo de uma pena de prisão, ao invés de contribuir para a reintegração do arguido, terá graves efeitos dessocializantes.

· O recorrente tem actualmente uma situação laboral estável, responsabilidades sociais e compromissos empresariais, que dificilmente poderá voltar a ter se cumprir prisão efectiva, ainda que a cumprir em dias livres.

· As finalidades da punição, no caso concreto, serão melhor alcançadas mediante a aplicação, ao recorrente, de pena de substituição não privativa da liberdade, do que através do cumprimento de prisão efectiva;

· A censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

· A suspensão da execução da pena de prisão revela-se eficaz na prossecução das exigências de prevenção geral e especial.

· Em alternativa deverá a pena aplicada ser substituída por trabalho em favor da comunidade, nos termos do artigo 58.° do CP, uma vez que esta forma de cumprimento realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Acaba por pedir, a final, que a pena de prisão efectiva aplicada ao arguido na sentença condenatória seja suspensa na sua execução ou, em alternativa, seja substituída por trabalho em favor da comunidade, nos termos do artigo 58.° do CP.

            3. O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra na medida em que a pena de prisão aplicada foi justa e adequada, não devendo, assim, ser substituída por outra ou suspensa na sua execução.

Como questão prévia, e a final, defendeu que o recurso deveria ser rejeitado uma vez que suscita questões de direito sem invocar as normas jurídicas violadas, apesar de no corpo da sua resposta já defender, previamente, um convite ao aperfeiçoamento das conclusões.

           

            4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 71 a 74, no sentido de que o recurso não merece provimento, aderindo à fundamentação do MP de 1ª instância.

            5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.

            II – FUNDAMENTAÇÃO

             1. Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

             Assim, balizados pelos termos das conclusões formuladas em sede de recurso, as questões a decidir consistem em saber:

            - se a pena de prisão aplicada deve ser substituída pela pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

             - se a pena de prisão aplicada ao arguido deve ser suspensa na sua execução.

            2. DA SENTENÇA RECORRIDA

            2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:

            1. No dia 24/02/2009, cerca das 03H53, M... conduzia o veículo ligeiro de passageiros, matrícula …, pela Av. Padre Inácio Antunes – Benedita, área desta Comarca de Alcobaça, com uma T.A.S. de 1,70 g/litro.

            2. O arguido sabia que se encontrava sob o efeito do álcool e mesmo assim quis conduzir o referido veículo nas condições descritas.

3.Agiu. Agiu livre, voluntária e conscientemente, conhecendo a reprovabilidade da sua conduta.

4. O arguido é empresário e aufere €700 mensais;

5. Vive em casa própria com a mulher que aufere €700 mensais.

6. Tem dois filhos de 12 e 18 anos.

7. Tem três veículos automóveis.

8. Tem o 5º ano de escolaridade;

9. Foi condenado no processo n.º 228/05.7GTSTR do 1.º Juízo do Tribunal da Comarca de Caldas da Rainha por sentença de 8/5/2006 pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, por factos datados de 28/8/2005, na pena de 63 dias de multa à taxa diária de €5 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 3 meses e 15 dias, ambas extintas pelo cumprimento;

10. Foi condenado no processo n.º 242/08.0GCACB do 3.º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 pela prática de dois crimes de condução em estado de embriaguez, e um crime de desobediência qualificada por factos datados de 20/6/2008, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €5 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 6 meses e 15 dias;

11. Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3.º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 (cf. dispositivo deste acórdão) pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, e um crime de violação de proibições por factos datados respectivamente de 25/10/2008 e 27/10/2008 na pena de 5 meses e 15 dias de prisão suspensa por um ano e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 8 meses.

           

            2.2. Inexistindo factos não provados, o tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição):

            «A convicção do tribunal baseou-se, quanto a todos os factos provados na confissão integral e sem reserva do arguido.

Quanto às condições económicas e sociais do arguido o tribunal valorou as declarações do mesmo, que se revelaram credíveis.

No que respeita aos antecedentes criminais do arguido o tribunal valorou o teor do

CRC junto aos autos».

            3. APRECIAÇÃO DE DIREITO

            3.1. Não se verificando qualquer dos vícios enunciados no artigo 410.º, n.º2, do Código de Processo Penal, consideram-se assentes os factos supra descritos, sendo certo que não foi, de todo em todo, impugnada a matéria de facto.

            3.2. QUESTÃO PRÉVIA

Antes de mais, interessa constatar que as conclusões do recurso do arguido estão incompletamente formuladas, na medida em que olvidam, de todo em todo, as normas jurídicas tidas por violadas e as normas que deveriam ter sido antes aplicadas, de acordo com o comando legal do artigo 412º, n.º 2 do CPP, assente que este recurso apenas versa sobre matéria de direito.

O artigo 417º, n.º 3 do CPP (na versão revista de 2007, levada a cabo pela Lei n.º 48/2007 de 29/8) permite o convite ao aperfeiçoamento da respectiva peça processual se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 desse mesmo normativo (não havendo, assim, qualquer necessidade de invocar arestos do Tribunal Constitucional pois agora é a lei processual penal que permite este convite ao aperfeiçoamento).

Analisada a peça do recurso, constato que a indicação das normas tidas por violadas e das normas que se pretendem que sejam aplicadas constam do corpo da motivação de forma assaz suficiente para se compreender o móbil do recorrente – não deveremos, assim, ser demasiado formalistas ao ponto de atrasar a tramitação de um processo quando existem conclusões e se consegue das mesmas deduzir, mesmo que parcialmente, note-se, as indicações previstas no n.º 2 do citado artigo 412º.

A este propósito, convém lembrar que as “conclusões aperfeiçoadas” têm de se manter no âmbito da motivação apresentada, não se tratando de uma reformulação do recurso ou da apresentação de um novo recurso - por outras palavras: o convite ao aperfeiçoamento, estabelecido nos n.º 3 e 4 do artigo 417.º, do C.P.P., pode ter lugar quando a motivação não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos nºs. 2 a 5 do artº 412º do mesmo código, mas sempre sem modificar o âmbito do recurso.

Pelo que se o corpo da motivação não contém as especificações exigidas por lei, já não estaremos perante uma situação de insuficiência das conclusões, mas sim de insuficiência do recurso, insusceptível de aperfeiçoamento.

Entendemos, nesta sede, e neste campo, ter alguma flexibilidade, pois, no rigor, muitos recursos contêm deficiências, não sendo, pois, necessário suscitar o aperfeiçoamento das conclusões.

É o que não faremos in casu, opinando que do conjunto da peça processual se retira, com rigor, o sentido normativo do recurso e a enumeração, quer das normas legais que foram violadas, quer das normas que deveriam ter sido alternativamente aplicadas pelo tribunal a quo.

Desta forma, se resolve a questão prévia suscitada pelo Exmº Magistrado do Ministério Público de 1ª instância na sua resposta.

3.3. DA ESCOLHA DA PENA – A PENA DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE

3.3.1. O tribunal «a quo» começou por escolher a modalidade da pena a aplicar ao arguido, tendo escolhido a pena de prisão, afastando qualquer outra pena substitutiva em sentido próprio (Multa, Trabalho a favor da Comunidade e Suspensão da execução da pena de prisão)

O arguido discorda esta decisão, sob dois prismas:

1º-acha que a pena de prisão deve ser suspensa na sua execução;

2º-acha que a pena de prisão deve ser substituída pela pena de trabalho a favor da comunidade.

3.3.2. A condenação do arguido como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, não foi posta em causa no presente recurso, pois que, “quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1, 2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”.

            Discorda o arguido da pena de prisão efectiva, mesmo que executada por dias livres, em que foi o primeiro condenado, pugnando antes pela aplicação da pena do artigo 58º do CP (pena de trabalho a favor da comunidade, aplicável agora, após 2007, às situações em que deveria ser aplicada ao agente do crime uma pena de prisão não superior a dois anos).

            O tribunal recorrido entendeu que a pena escolhida teria de ser a prisão, afastando, em primeiro lugar, a pena de multa como alternativa à pena de prisão pressuposta no tipo legal de crime.

            Depois, entendeu o tribunal que a medida da pena – de prisão - se devia situar a meio da moldura penal aplicável, demonstrando-se adequada e suficiente a pena de 6 meses de prisão, adiantando que, assente que o arguido já sofreu pena de multa pela prática de crime idêntico, e que já foi condenado em pena suspensa, a substituição da pena de prisão pela pena de multa não iria de encontro às exigências preventivas especiais do caso concreto, razão pela qual afasta a conversão da pena de prisão em multa, nos termos do art. 43.º (e não 44º, como por lapso, consta do texto da sentença).

Mas o tribunal não fica por aqui – opina e decide expressamente que não se vislumbra que a aplicação da pena de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º do CP) permita realizar, de forma adequada, as exigências de prevenção, já que o arguido, desde logo, não demonstra respeito pelas imposições públicas, (desobediência e violação de proibições) e, desde logo, pela imposição de prestar trabalho a favor da comunidade, acrescentando-se que é necessário o consentimento do arguido para aplicação desta pena de substituição.

Há, POIS, divergência quanto à ESCOLHA da pena aplicada ao arguido.

3.3.3. Para a fixação da pena o tribunal recorrido considerou, além do mais, as elevadas exigências de prevenção geral positiva, o elevado grau da ilicitude do facto, o dolo intenso e, em sede de prevenção especial, as anteriores condenações do arguido exactamente pelo mesmo tipo de ilícito o que revela que as penas aplicadas não têm surtido qualquer efeito.

O recorrente contrapõe que a perigosidade do arguido não é de molde a considerar--se que apenas com a prisão por dias livres se cumprem, no caso concreto, as finalidades da punição.

Temos por adquirido que a aplicação de uma pena visa a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal. Também estatui o art. 70° do Código Penal que "Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa da liberdade e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".

Nos termos do preceituado no art. 40°, n.º 2, do Código Penal, uma das finalidades da punição é a reintegração do agente na sociedade prevenindo-se a prática de futuros crimes. O princípio que a doutrina tem denominado da necessidade das penas [da tutela penal] ou da máxima restrição das penas afirma que a legitimidade das penas criminais depende da sua necessidade, adequação e proporcionalidade, em sentido estrito, para a protecção de bens ou interesses constitucionalmente tutelados, não sendo só os princípios dogmáticos do direito constitucional-penal que nos obrigam a uma reflexão mais profunda sobre a eficácia das penas privativas de liberdade.

São também os dados da reincidência a revelar que o espaço prisional mais do que reabilitativo é igualmente estigmatizante, e por consequência, alavanca maiêutica de mais criminalidade.

Como se sabe, de acordo com a lei – artigo 58.º, n.º 1, do Código Penal (revisto em 2007) – a pena de prisão de medida não superior a 2 anos pode [e deve] ser substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade “sempre que [o tribunal] concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” – no fundo, estamos perante um poder-dever que vincula o tribunal a apreciar a aplicação desta medida sempre que se mostrem preenchidos os pressupostos legais da sua admissão – ver acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Junho de 2007 [Relator: Cons. Rodrigues da Costa], Colectânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, tomo II, p. 228.

Considerada como uma das mais relevantes e revolucionárias medidas de político-criminal dos últimos decénios no domínio sancionatório [ver Maia Gonçalves, Código Penal Português – 11ª ed., em anotação ao art. 58.º] e recomendada pelas mais altas instâncias [v.g. as recomendações e resoluções do Conselho da Europa e Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio) adoptadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução 45/110, de 14 de Dezembro de 1990 – com menção expressa à imposição de prestação de serviços à comunidade no ponto 8.2.i)], a prestação de trabalho a favor da comunidade concita elevadas expectativas na progressiva afirmação das medidas não institucionais como fórmulas punitivas indispensáveis à eficácia do sistema penal (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/7/2008, no Pº 0842309 (nº convencional JTRP00041539 - http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/5b7495cf2e91b4f5802574880050042a?)

Tal prestação de trabalho a favor da comunidade evita a execução de penas de prisão de curta duração [mesmo que em regime de dias livres] e promove a assimilação da censura do acto ilícito mediante a construção de um trabalho socialmente positivo, a favor da comunidade, assente na adesão do próprio arguido. Ao mesmo tempo, apela a um forte sentido de co-responsabilização social e de reparação simbólica.

A determinação da pena envolve diversos tipos de operações.

Na parte que agora nos importa, o julgador, perante um tipo legal que prevê, em alternativa, como penas principais, as penas de prisão ou multa, deve ter em conta o disposto no artigo 70.º do Código Penal que consagra o princípio da preferência pela pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Tais finalidades, nos termos do artigo 40.º do mesmo diploma, reconduzem-se à protecção de bens jurídicos (prevenção geral) e à reintegração do agente da sociedade (prevenção especial).

Na determinação da pena, o juiz começa por determinar a moldura penal abstracta e, dentro dessa moldura, determina, em seguida, a medida concreta da pena que vai aplicar, para depois escolher a espécie da pena que efectivamente deve ser cumprida.

Assim, o tribunal, perante a previsão abstracta de uma pena compósita alternativa, deve dar preferência à multa sempre que formule um juízo positivo sobre a sua adequação e suficiência face às finalidades de prevenção geral positiva e de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial de socialização, preterindo-a a favor da prisão na hipótese inversa.

Neste momento do procedimento de determinação da pena, o único critério a atender é o da prevenção.

O artigo 70.º opera, precisamente, como regra de escolha da pena principal, nos casos em que se prevê pena de prisão ou multa.

Porém, a escolha da pena principal de prisão em detrimento da multa não significa que desde logo se opte pela execução ou cumprimento da pena privativa da liberdade, pois entretanto haverá que ponderar a aplicação das penas de substituição que apenas são aplicáveis depois de escolhida a pena de prisão e de concretamente determinado, nos termos do artigo 71.º, o seu quantum.

No nosso caso, a moldura abstracta da pena do crime de condução de veículo em estado de embriaguez é a de prisão até um ano ou a de multa de 10 a 120 dias.

O tribunal a quo escolheu a prisão em detrimento da multa e fixou aquela em seis meses.

A escolha da pena principal de prisão em detrimento da multa e a sua fixação em seis meses não mereceu qualquer reparo por parte do arguido/recorrente, o que se percebe se tivermos em conta tratar-se da sua quarta condenação, por factos idênticos, desde 2005, conforme decorre dos factos considerados provados.

Já o assinalámos: da escolha da pena principal de prisão, no caso de moldura abstracta que contempla prisão ou multa, não decorre, necessariamente, que a pena privativa da liberdade tenha de ser cumprida.

O que pode acontecer é que o tribunal, atento o preceituado no artigo 70.º, opte pela prisão como pena principal, por entender que a multa não satisfaz de forma adequada e suficiente todas as finalidades da punição, mas que, num segundo momento, uma vez fixada a prisão em certa medida, entenda dever proceder à sua substituição, por tal lhe ser legalmente imposto se a execução da prisão não for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes (anterior artigo 44.º, agora artigo 43.º), ou porque, face às penas de substituição legalmente previstas, acaba por concluir que uma dessas penas satisfaz de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Figueiredo Dias, As consequências jurídicas do crime, 1993, p. 364).

3.3.4. No caso em causa, a sentença recorrida não CONFUNDE os dois momentos atrás delineados: o da escolha da pena principal e o da ponderação da aplicação de uma pena de substituição.

Foi bem feito o procedimento de determinação da pena:

· determinação da medida abstracta da pena (prisão OU multa);

· escolha, no caso de molduras compósitas alternativas de prisão ou multa, da pena principal, nos termos do artigo 70.º do Código Penal (prisão, no caso);

· fixação do quantum da pena principal dentro da moldura respectiva, com base nos critérios do artigo 71.º do Código Penal (seis meses de prisão);

· ponderação da aplicação de uma pena de substituição (não substituição por multa[1], por TFC e não suspensão da execução);

· fixação, finalmente, desta pena, sendo caso disso (seis meses de prisão por dias livres).

E foi também ponderada (sob pena de poder incorrer em vício de nulidade de sentença[2]) a possibilidade de aplicação do artigo 58º do CP.

Diríamos que o tribunal não é livre de aplicar ou deixar de aplicar tal pena de substituição ou qualquer outra, pois não detém uma faculdade discricionária; antes, o que está consagrado na lei é um poder/dever ou um poder vinculado, tal como sucede com a suspensão da execução da pena, pelo que, uma vez verificados os respectivos pressupostos, o tribunal não pode deixar de aplicar a pena de substituição.

Ou seja:

Determinada a concreta medida da pena e sendo esta uma pena de prisão, impõe-se verificar se ela pode ser objecto de substituição, em sentido próprio ou impróprio, e determinar a sua medida.

Dentro das penas de substituição em sentido próprio, para além da pena de multa (artigo.43.º, n.º 1 do C.P.), também as penas de suspensão de execução da prisão (art.50.º do CP) e de prestação de trabalho a favor da comunidade (art.58.º do CP) podem substituir a pena de prisão de 6 meses aplicada ao arguido.

Há ainda que contar com penas de substituição detentivas (ou formas especiais de cumprimento da pena de prisão) como o regime de permanência na habitação (art.44.º do CP), a prisão por dias livres (art.45.º do CP) e a prisão em regime de semidetenção (art.46.º do CP), estas duas últimas vocacionadas para obstar aos efeitos nefastos da prisão contínua.


3.3.5. Vejamos o nosso caso.

O arguido sofreu já três condenações criminais pela prática de quatro crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, de um crime de desobediência e de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições (todos relacionados com crimes rodoviários), em penas de multa – por duas vezes - e pena de prisão suspensa na sua execução – por uma vez, em 14/11/2008 (e não em 30/6/2008, como por lapso consta de fls 27) -, sendo tais condenações anteriores aos factos a que respeitam estes autos.

Revela-se, assim, inequívoco e fora de qualquer outra cogitação, que as penas não detentivas não lograram surtir o pretendido efeito dissuasor da prática de novos ilícitos.

Há, então, que optar pela pena de prisão, o que só fez bem o tribunal recorrido, doseando de forma adequada e equilibrada tal tempo de prisão efectiva, na modalidade de pena de prisão por dias livres (artigo 45º do CP) – note-se que tal normativo preceitua que «a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano (o nosso caso pois entendeu-se, de forma equilibrada, ser de aplicar uma pena de seis meses de prisão[3]), QUE NÃO SEJA SUBSTITUÍDA POR PENA DE OUTRA ESPÉCIE, é cumprida em dias livres (…)[4]».

In casu, afastou-se a possibilidade de se aplicar a pena do artigo 58º do CP, e bem, a nosso ver.

Não se vislumbra, de facto, que a aplicação da pena de substituição de TFC, relativamente à previamente aplicada pena de prisão permita realizar, de forma adequada, as exigências de prevenção, já que o arguido desde logo não demonstra respeito pelas imposições públicas, (desobediência e violação de proibições – v.g. seu CRC de fls 20 a 22) e, desde logo, pela imposição de prestar trabalho a favor da comunidade (não será também de prever que, caso lhe viesse a ser aplicada tal pena, o arguido viesse a requerer a sua não prestação casuística face às inúmeras feiras e exposições que iria ter no país e no estrangeiro e às quais, em nome do seu bom nome e da sua atarefada agenda profissional, não poderia voltar costas?).

Apesar de agora dar o seu expresso consentimento para tal pena, entendemos, como o tribunal recorrido, que o passado do arguido não é de molde a dar-lhe esta chance (as prevaricações anteriores datam de Agosto de 2005, de Junho de 2008 e de Outubro de 2008), sendo demasiadas reiterações criminosas para quem agora pede tamanha clemência…

Assim, em concreto, atender-se-á:

· à culpa, sendo certo que o arguido actuou com dolo directo;

· às exigências de prevenção geral, as quais se nos afiguram particularmente acentuadas dada a enorme frequência deste tipo de crimes e alarme que provocam na comunidade, uma vez que o primeiro abala o princípio geral de confiança na circulação rodoviária e o segundo as ordens das autoridades, impondo assim fortes necessidades de prevenção geral intimidatória;

· às exigências de prevenção especial, as quais revestem elevadíssima intensidade uma vez que o arguido já tem 3 condenações anteriores aos factos por crimes de idêntica natureza, o que denota indiferença pelo sistema judicial e pelos seus comandos.

Tudo ponderado, afigura-se-nos adequada a fixação da pena de seis meses de prisão, já sendo considerado uma benevolência do tribunal o uso do mecanismo da prisão por dias livres.

Não basta dizer que somos pessoas integradas na sociedade e com responsabilidades sociais e empresariais, como o faz o arguido na sua motivação de recurso.

Dizer-se que a prisão por dias livres vai trazer graves efeitos dessocializadores na medida em que terá um efeito estigmatizador sobre a sua pessoa e que o impedirá de viajar para feiras e exposições, ficando também em perigo o apoio da Banca nesta época de crise, é vácuo e redundante.

Tem o arguido de sentir na pele e na soma dos seus dias o desarranjo existencial que uma pena deste cariz sempre lhe irá naturalmente acarretar. A pena tem de ser suficientemente expressiva para que o arguido pondere futuramente o que consigo se passou e a condenação de que foi alvo e não volte a conduzir quando beber para além do que deveria. Para seu bem e dos outros que consigo que cruzarão na estrada e na vida…

Foram dadas 3 hipóteses ao arguido de se emendar, e mesmo assim, cerca de 3 meses depois de ser condenado no Pº 426/08 (em pena de prisão suspensa na sua execução, o que poderá agora acarretar uma revogação dessa suspensão, à luz do artigo 56º do CP), voltou a ser apanhado a conduzir etilizado num dos seus 3 carros.

No caso em apreço, já o sabemos, são elevadas as exigências de prevenção geral, pois subjacente ao preceito em apreciação visa-se o combate à sinistralidade rodoviária em que o álcool tem um papel muito relevante, pois a condução sob o efeito do álcool põe em risco não só a própria vida do condutor como a dos restantes utentes da via, reclamando, por isso, uma punição que reafirme eficazmente a validade da norma violada.

A nossa opção é clara - esta privação de liberdade permitirá ao recorrente, mais uma vez, reflectir sobre as sérias e graves consequências que para si advirão, se repetir o seu comportamento delituoso e particularmente, a prática da condução de veículo de forma etilizada.

Além disso, e não obstante o que atrás de deixou escrito, a prisão por dias livres permite que não se quebrem totalmente os laços sociais do recorrente, assim impedindo a potenciação do efeito criminógeno particularmente activo nas penas de privação da liberdade de curta duração, razão pela qual acabamos por concordar com a opção do tribunal «a quo» em substituir a pena – efectiva - de prisão por prisão por dias livres.

Dela falando, bem doutrina Maia Gonçalves:

«(…) O que no fundo se pretende com a prisão por dias livres é adaptar a pena à vida familiar e profissional do condenado e criar um regime intermédio entre a prisão contínua e o tratamento em meio aberto, mas a ideia apoia-se também em considerações que transcendem o delinquente. É, antes de mais, indesejável que se projectem sobre a família do condenado consequências económicas desastrosas, a ponto de se dizer que “une peine de prison cloclochodise la famille”, sendo ainda indesejável a ruptura prolongada com o meio profissional e social (...)».

Vendo o seu regime legal, conclui-se que a prisão por dias livres consiste na privação da liberdade por períodos correspondentes a fins-de-semana, e não pode exceder 72 períodos (art. 45º, nº 2, do CP) – cada período equivale a 5 dias de prisão contínua, e tem a duração mínima de trinta e seis horas e máxima de quarenta e oito horas (nº 3 do art. 45º, do CP), podendo os feriados que antecederem ou se seguirem a um fim-de-semana ser utilizados para a execução da prisão por dias livres, sem prejuízo da duração máxima estabelecida para cada período (nº 4 do mesmo artigo).

Assim sendo, tendo o recorrente sido condenado em 6 meses de prisão que correspondem a 180 dias deverá, nos termos das normas citadas, cumprir a prisão por dias livres durante trinta e seis períodos (36 períodos x 5 dias = 180 dias) - cada período terá a duração de 36 horas e será cumprido entre as 8 horas de sábado e as 20 horas do Domingo seguinte, sem prejuízo do disposto no art. 45º, nº 4, do CP quanto a feriados.

            Como tal, não merece, neste particular, provimento o recurso intentado pelo

arguido na medida em que se considera que a pena de prisão (efectiva) por dias livres é a única que pode fazer algo em nome da prevenção geral e especial que se faz sentir no caso vertente.

3.4. SOBRE A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA

No que se reporta à REQUERIDA suspensão da execução da pena de prisão (estando o seu regime jurídico previsto nos artigos 50.º a 57.º do C.P, e nos artigos 492.º a 495.º do C. P.Penal), também só a temos de negar, nem que seja pela circunstância de termos considerado que foi bem aplicada a prisão – efectiva - por dias livres, necessariamente afastadora da possibilidade da suspensão em causa.

            O artigo 50.º, n.º 1, do CP dispõe:

«O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».

            As finalidades da punição são, nos termos do disposto no artigo 40.º, do C.P., a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

            Traduzindo-se na não execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos (outrora era de 3 anos), entendemos, com o apoio da melhor doutrina e jurisprudência, que a suspensão constitui uma verdadeira pena autónoma (cfr. Acórdão da Relação de Évora, de 10.07.2007, Proc. n.º 912/07-1, www.dgsi.pt).  

            Já assim se devia entender face à versão originária do Código Penal de 1982, como se infere das discussões no seio da Comissão Revisora do Código Penal, em que a suspensão da execução da pena, sob a designação de sentença condicional ou condenação condicional (que no projecto podia assumir a modalidade de suspensão da determinação concreta da duração da prisão ou de suspensão da execução total da pena concretamente fixada) figurava como uma verdadeira pena, ao lado da prisão, da multa e do regime de prova, no art. 47.º do projecto de 1963, que continha o elenco das penas principais.

             No seio da Comissão, Eduardo Correia, autor do projecto do Código Penal, teve a oportunidade de sustentar o carácter autónomo, de verdadeiras penas, da sentença condicional e do regime de prova, contrariando o entendimento de que seriam institutos especiais de execução da pena de prisão (Actas das Sessões da Comissão Revisora do Código Penal, Parte Geral, Separata do B.M.J.)

            Figueiredo Dias, a propósito do projecto de 1963 e do Código Penal de 1982, recorrendo a algumas expressões que haviam sido utilizadas na discussão travada na Comissão Revisora, assinalou:

              «(…) as “novas” penas, diferentes da de prisão e da de multa, são “verdadeiras penas” – dotadas, como tal, de um conteúdo autónomo de censura, medido à luz dos critérios gerais de determinação da pena (art.º 72.º) -, que não meros “institutos especiais de execução da pena de prisão” ou, ainda menos, “medidas de pura terapêutica social”. E, deste ponto de vista, não pode deixar de dar-se razão à concepção vazada no CP, aliás continuadora da tradição doutrinal portuguesa segundo a qual substituir a execução de uma pena de prisão traduz-se sempre em aplicar, na vez desta, uma outra pena» (Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Aequitas-Editorial Notícias, 1993, p. 90).

            O mesmo autor, definindo a suspensão da execução da pena de prisão como “a mais importante das penas de substituição” (e estas são, genericamente, as que podem substituir qualquer das penas principais concretamente determinadas), chama a atenção para o facto de, segundo o entendimento dominante na doutrina portuguesa, as penas de substituição constituírem verdadeiras penas autónomas (cfr. ob. cit., p. 91 e p. 329).

Nas suas palavras, «a suspensão da execução da prisão não representa um simples incidente, ou mesmo só uma modificação da execução da pena, mas uma pena autónoma e, portanto, na sua acepção mais estrita e exigente, uma pena de substituição» (cfr. ob. cit., p. 339).

            A revisão do Código Penal, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, reforçou o princípio da ultima ratio da pena de prisão, valorizou o papel da multa como pena principal e alargou o âmbito de aplicação das penas de substituição, muito embora não contemple, como classificações legais, as designações de «pena principal» e de «pena de substituição».

            A classificação das penas como principais, acessórias e de substituição continua a ser válida e operativa, ainda que a lei não utilize expressamente estas designações, a não ser no tocante às penas acessórias.

Deste modo, sob o prisma dogmático, penas principais são as que constam das normas incriminadoras e podem ser aplicadas independentemente de quaisquer outras; penas acessórias são as que só podem ser aplicadas conjuntamente com uma pena principal; penas de substituição são as penas aplicadas na sentença condenatória em substituição da execução de penas principais concretamente determinadas.

            Se assim é, ou seja, se a pena de suspensão de execução da prisão é uma pena de substituição em sentido próprio (em contraste com as penas de substituição detentivas ou em sentido impróprio), temos como pressuposto material da sua aplicação que o tribunal, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime a às circunstâncias deste, conclua pela formulação de um juízo de prognose favorável ao agente que se traduza na seguinte proposição: a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

            No caso vertente, entendeu-se que a aplicação de uma suspensão da execução da pena era um poder-dever que vincula o julgador, que a terá de decretar, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os citados pressupostos.

            Entendendo-se que resulta dos presentes autos que o arguido tem antecedentes criminais, tendo sofrido já condenações sucessivas relacionadas com a condução, em pena de prisão suspensa na sua execução, e no decurso da qual vem a cometer crime de idêntica natureza., que inexistem comprovadas circunstâncias que possam favorecer o arguido e que tais circunstâncias impedem um juízo de prognose favorável ao arguido, tanto mais que não se vislumbra do seu recente comportamento que tenha interiorizado o desvalor da sua conduta delituosa (tal juízo terá como ponto de partida, o momento da decisão e não a data

da prática do crime), o tribunal recorrido afastou a possibilidade de suspender a pena de prisão que aplicou concretamente ao arguido.

Avançou a Exmª Juíza o seguinte na sua completa fundamentação:

«(…) Certos de que o que está aqui em causa não é qualquer certeza, mas a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda, se entende que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão não realizam, de forma adequada, as exigências e finalidades da punição, pelo que não se determina a suspensão da execução da pena de prisão aplicada».

E nós estamos com ela.

O juízo de prognose favorável que o percurso criminal do arguido e a persistência que vem demonstrando na prática de crimes, nomeadamente da natureza dos autos, revela-se, à saciedade, irremediavelmente comprometido (note-se que poderá estar iminente a revogação da execução de uma pena de prisão aplicada ao arguido em Novembro de 2008, precisamente por ter voltado a prevaricar, em Fevereiro de 2009, como “o melhor condutor do mundo”, entregue aos frémitos do álcool e a uma irresponsabilidade sem nome).

Como tal, só a condenação do arguido na pena única de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir por dias livres, nos termos fixados na sentença (art° 45° do Código Penal), satisfaz as finalidades das penas (art° 40°, n° 1 e 2 do C. Penal).

Também aqui falecem os argumentos do arguido.

3.5. Urge, contudo, fazer uma correcção de lapso material cometido na sentença recorrida que não mexe com o essencial do por nós acordado (e a que se chega por consulta atenta do CRC de fls 22).    

            Assim,

· a fls 27, onde se lê no ponto 11.

o “Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 pela (…)

dever-se-á ler

o “Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 14/11/2008 pela (…)

           

                                               ***************************

            III – DISPOSITIVO

            Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em

1º- Alterar o texto da sentença nos seguintes moldes:

· a fls 27, onde se lê no ponto 11.

o “Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 pela (…)

dever-se-á ler:

o “Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 14/11/2008 pela (…)

           

2º- Negar provimento ao recurso, mantendo na íntegra a sentença recorrida.



            Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça fixada em 6 UCs (artigos 513º, n.º 1 do CPP e 87º, n.º 1, alínea b) do CCJ).


Coimbra, _______________________________
(Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.)


_______________________________________

(Paulo Guerra)


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(Barreto do Carmo)

  


[1] Quanto à segunda ponderação da aplicação de uma pena de multa, estamos com o Acórdão da Relação do Porto de 20/4/2009, publicado no site do itij:
«Aparentemente, tendo o tribunal a quo optado pela aplicação da pena de prisão em alternativa à aplicação da pena de multa, levaria a crer que a questão da eventual substituição desta pena de prisão por multa, já não se colocaria. Puro engano, segundo a posição de Figueiredo Dias e que se acolhe.
Este jurisconsulto, na obra Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, Lisboa, 1993, afirma a fls. 363 e 364:
“Se, apesar deste comando, o tribunal se decide pela pena de prisão, que sentido poderá ter, quando ao crime fosse já aplicável em alternativa prisão ou multa, cominar a substituição-regra por multa da prisão concretamente fixada em medida não superior a 6 meses”?
Para logo responder:
“A resposta está em que uma coisa é a aplicação da pena de multa ser preferível à da prisão, outra diversa e muito mais estrita, é que a execução da prisão seja exigida por razões de prevenção; além temos um critério de conveniência e de maior ou menor adequação, aqui um critério estrito de necessidade: é necessário - e o tribunal tem de o demonstrar, sob pena de erro de direito inescapável - que só a execução da prisão permita dar resposta às exigências de prevenção”».
[2] Já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 21 de Junho de 2007, entendendo: «E não se pode dizer que, se não estavam reunidos os pressupostos para a suspensão da execução da pena, também não estavam reunidos os pressupostos para a sua substituição nos termos do art. 58.º do CP. O trabalho a favor da comunidade não tem a mesma natureza (salvo a de ser também uma pena de substituição), nem as mesmas exigências, nem obedece às mesmas práticas de reinserção social, que a suspensão da execução da pena. Por isso, nada garante que, não podendo as exigências de punição ser satisfeitas com a suspensão da execução da pena, não o possam ser com a prestação de trabalho a favor da comunidade.» (P. 07P2059, disponível em www. dgsi.pt) - segundo o entendimento do mesmo S.T.J., conclui-se que a sentença incorre na nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, alínea c), do C.P.Penal ao nem sequer abordar a questão da pena de TFC (omissão de pronúncia).
 

[3] A determinação da pena dentro dos limites da moldura penal é um acto de discricionariedade judicial, mas não uma discricionariedade livre como a da autoridade administrativa quando esta tem de eleger, de acordo com critérios de utilidade, entre várias decisões juridicamente equivalentes, mas antes de uma discricionariedade juridicamente vinculada.
[4] Note-se que a prisão por dias livres constituiu-se como uma pena de substituição detentiva (em sentido impróprio), enquadrando-se, a par do regime da semidetenção (artigo 46º do CP), no quadro integrado dos esforços empreendidos para substituir as penas curtas de prisão (contínua) por medidas político-criminais mais aceitáveis. Tal pena só poder ter lugar quando anteriormente o tribunal tenha considerado, nos termos da parte final do artigo 43º, n.º 1, que a execução da prisão é exigida pela necessidade de prevenir futuros crimes. Por isso, ou se aplica a prisão por dias livres, ou se suspende a execução da pena de prisão, não sendo possível a suspensão de uma pena de prisão por dias livres.