Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2491/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO JORGE DIAS
Descritores: COMPARTICIPAÇÃO CRIMINOSA
PRINCIPIO DA INDIVISIBILIDADE
Data do Acordão: 10/12/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA MÊDA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIME
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART.º 26°, 114°, 115° E 116° DO C. PENAL
Sumário: I. Se um documento de conteúdo ofensivo da honra e consideração de outrem está assinado por duas pessoas existe a comparticipação criminosa mesmo que lido publicamente só por uma delas,
II. Se o ofendido apresenta tempestivamente queixa, mesmo que só contra a pessoa que o leu, o M.º P.º tem legitimidade para prosseguir a acção penal contra ambas.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

No processo supra identificado foi proferido despacho em que se decidiu não pronunciar o arguido A..., determinando-se o consequente arquivamento dos autos.
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Deste despacho interpõe recurso o assistente B....
São do seguinte teor as conclusões da motivação do recurso, e que delimita o objecto do mesmo:
A) O assistente ora recorrente não atribuiu a responsabilidade pela prolacção da expressão em causa nestes autos ao Sr. Vereador C...;
B) Muito embora a última folha do documento em causa tenha nela apostas duas assinaturas, a "análise técnica - jurídica" é da exclusiva responsabilidade do arguido, o que ele próprio expressamente assume;
C) A expressão injuriosa de que o arguido foi acusado, traduz-se num comentário a respeito da análise técnico jurídica de uma posição defendida pelo recorrente;
D) Não existe in casu qualquer violação do princípio da indivisibilidade uma vez que não se trata do recorrente escolher entre quem quer ver perseguido e quem não quer, mas sim de apresentar queixa contra quem entende ser o único autor do crime em causa;
E) Não existe comparticipação na autoria do crime de que o recorrente se queixa, por não existir a respeito da expressão injuriosa uma decisão conjunta com vista à obtenção de um resultado através de uma execução conjunta;
F) As actuações dos signatários do documento em questão, são diferenciadas pelo próprio arguido que assume em pleno e em exclusivo, expressa e inequivocamente, a autoria da expressão de que o recorrente se queixou.
G) Ainda que, abstractamente, se tratasse de uma autoria em comparticipação, em face da redacção do documento em que se insere a expressão injuriosa do recorrente, não pode em caso algum entender-se que isso resultava desde logo da sua leitura, em termos de ser exigível ao assistente que formulasse queixa contra ambos os seus subscritores.
H) Sempre devendo funcionar o disposto no art. 114° do Código Penal, segundo o qual "A apresentação da queixa contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento extensivo aos restantes";
I) O facto do Ministério Público ter legitimidade para prosseguir com o procedimento criminal contra todos os comparticipantes, ainda que não tenham sido visados desde logo pela queixa, não implica que se verifique automaticamente a falta de condição de procedibilidade prevista no art. 115° n° 2 do CP, caso não seja deduzida acusação contra todos os comparticipantes;
J) Ao decidir como decidiu, pela não pronúncia do arguido, a Douta Decisão recorrida fez uma errada interpretação, violando-os, dos arts 114° e 115° n° 2, 26° do CP e do art. 308° do CPP.
Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e proferindo-se despacho de pronúncia do arguido pela prática do crime de que vem acusado, seguindo-se os ulteriores termos legais.
Respondeu o Mº Pº, concluindo que, havendo vários autores do crime, se o ofendido apresenta queixa contra um deles, nos termos do disposto no art. 115 nº 2 do CP, não pode o denunciado ser submetido a julgamento, pelo que entende não merecer provimento o recurso.
Respondeu o arguido A..., concluindo que o recurso deve ser julgado improcedente.
Nesta instância, o Ex.mº Procurador Geral Adjunto emite parecer no sentido da improcedência do recurso.
Foi cumprido o art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
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É do seguinte teor o despacho recorrido, no que à questão dos recursos interessa:
Cumpre proferir decisão instrutória:
De acordo com o art. 286°, n.º 1 do CPP, a instrução tem como escopo a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento. Configura-se, assim, como um fase, ou expediente processual, sempre optativa - cfr. n.º 2 do citado artº- destinado a questionar o despacho de arquivamento ou a acusação deduzida.
In casu, a bondade da instrução visa questionar o despacho de acusação, acompanhado pelo assistente, o qual conclui pela existência de indícios suficientes da prática pelo arguido de um crime de injúria agravada.
Para tal é necessária uma apreciação crítica de toda a prova recolhida no inquérito e na instrução, terminando por uma decisão, sobre esta, no sentido da suficiência da mesma - a verificação dos indícios suficiente de que fala o CPP, no art. 308, n.º 1 - para envio do processo à fase de julgamento, ou não, porém, sendo certo, que para a pronúncia se exige prova indiciária de todo diferenciada daquela que se exige na fase de julgamento. Temos que, em sede de pronúncia, têm de se verificar o conjunto de indícios dos quais possa resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou medida de segurança, como decorre do art. 283, n.º 2 do CPP, Há, assim, que atender à prova vista num carácter geral - ao nível dos indícios.
Quanto à definição de indícios suficientes, dispõe aquele n.º 2 do art. 283 que “Consideram-se suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança”.-
Embora a questão não seja líquida, tem-se entendido que os indícios suficientes são “(...) aqueles elementos de facto trazidos pelos meios probatórios ao processo, os quais, livremente analisados e apreciados, criam a convicção de que, a manterem-se em julgamento, terão sérias probabilidades de conduzir a uma condenação do arguido pelo crime que lhe é atribuído”.-
Com efeito, os indícios devem ser reputados como suficientes quando, das diligências efectuadas durante o inquérito, resultarem “(...) vestígios, suspeitas, presunções, sinais, indicações, suficientes e bastantes, para convencer de que há crime e é o arguido responsável por ele. " - cfr. Ac. RC de 26-06-63 in J.R., 3, p. 777 e ainda Acs. RC de 09-11-83 in CJ, 1983, Tomo V, p. 71 e ss.; de 10-04-85 in CJ, 1985, Tomo II, p. 81 e ss.; e de 31 de Março de 1993, in CJ, 1993, Tomo 11, p. 65 e ss.
Aliás, os factos indiciários devem ser suficientes e bastantes por forma a que logicamente relacionados e conjugados, formem um todo persuasivo de culpabilidade do arguido, impondo um juízo de probabilidade do que lhe é imputado - cfr. Ac. RC. de 31-01-93, in CJ, 93, II, p. 66.
Como refere Figueiredo Dias in Direito Processual Penal, 1981, os indícios só serão suficientes e a prova bastante quando, já em face deles, seja de considerar altamente provável a futura condenação do acusado, ou quando esta seja mais provável do que a absolvição.
Tendo em atenção os elementos reunidos ao longo do inquérito e da instrução, teremos que verificar se desses elementos podemos formar uma convicção e como.
Quais são os factos tidos como certos no inquérito e instrução?
De acordo com a queixa apresentada e o obtido no inquérito e instrução, temos:
- Queixa apresentada por B..., que em 6 de Janeiro de 2003, era Presidente da Câmara Municipal de Penedono.
- O arguido A... e C... eram à data referida vereadores da mesma Câmara.
- O documento junto aos autos a fls. 6, denominado proposta n.º 1/JunCP/2003, encontra-se assinado pelos vereadores JunCP (Juntos pelo Concelho de Penedono), A... e C....
- No dia 6 de Janeiro de 2003, pelas 15.30 horas, em reunião ordinária da Câmara Municipal de Penedono, realizada nos Paços desse concelho, o arguido A... apresentou a proposta n.º 1/Jun CP/2003, lendo-a em voz alta.
- Dessa proposta consta a dada altura a seguinte afirmação: "(...) se o Presidente da Câmara tivesse pedido a colaboração do Sr. Dr. Seco ou da Sr. Vereadora Drª. Maria José, teria, concerteza, posições jurídicas sólidas, já que o assunto que se vem discutindo não se compadece com ousadas iliteracias ou descarados analfabetismos funcionais. "
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Perante tal circunstancialismo indiciário necessário se torna fazer a qualificação jurídica dos factos.
Estamos perante uma imputação de um crime de injúria, p.p. no art. 181 do CP.
Dispõe o art. 181, n.º 1 que "Quem injuriar outra pessoa, imputando--lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivas da sua honra ou consideração, é punido com pena e prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias”.
De acordo com o disposto no art. 184 do CP, as penas previstas nos artigos 180, 181 e 183 são elevadas de metade nos seus limites mínimo e máximo se a vítima for uma das pessoas referidas na alínea j) do nº 2 do artigo 132, no exercício das suas funções ou por causa delas, ou se o agente for funcionário e praticar o facto com grave abuso de autoridade.
A) Importa apurar se no presente caso estamos perante uma comparticipação criminosa, levada a cabo pelo arguido A... e o outro vereador C....
O art. 26 do Cód. Penal, sob a epígrafe de autoria, estatui que "É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução”.-
Este preceito engloba a figura da comparticipação criminosa. A este respeito, cita-se, Dr. Faria da Costa, in "Formas do Crime, Jornadas de Direito Criminal", pag. 169 e ss: "Todavia, para definir uma decisão conjunta parece bastar a existência da consciência e vontade de colaboração de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime juntamente com ou outros. É evidente que na sua forma mais nítida tem de existir um verdadeiro acordo prévio - podendo mesmo ser tácito - que tem igualmente de se traduzir numa contribuição objectiva conjunta para a realização típica. Do mesmo modo que, em princípio, cada co-autor é responsável como se fosse autor singular na respectiva realização típica...”.-
Ora, no caso dos autos, dúvidas não há que o documento em causa está assinado pelo arguido e pelo outro vereador C..., pelo que daqui decorre impreterivelmente que as expressões aí vertidas se atribuem a ambos e não só ao arguido. Tal decorre até do depoimento daquele C...- cfr. fls. 41. O arguido foi somente o porta-voz dessa referida proposta.
Assim, sendo o conteúdo ofensivo da honra do assistente, a verdade é que a responsabilidade criminal será de imputar a ambos, o arguido e a C....
Desta forma, também dúvidas não temos que existe comparticipação.
O art. 188, n.º 1 do CP prescreve que o procedimento criminal para o crime em causa depende de queixa, assumindo aquele, assim, natureza semi-pública. Ora, nos crimes semi-públicos é necessário que o ofendido se queixe, i. e. que o mesmo dê conhecimento desse facto ao Ministério Público, para que este promova o processo, conforme o preceituado no art. 49, n.º 1 do CPP.
Por força do art. 115, n.º 1 do CP, o direito de queixa tem de ser exercido no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores.
No entanto, deveria ter sido apresentada contra todos os comparticipantes. O sistema penal português consagra o chamado princípio da indivisibilidade, ao referir que "O não exercício do direito de queixa relativamente a um dos comparticipantes no crime aproveita aos restantes, nos casos em que também estes não puderem ser perseguidos sem queixa"- art. 115, n.º 2 do CP.
O princípio está consagrado porque "Em matéria criminal não se pode escolher quem deve ser perseguido em caso de comparticipação; o que está em causa é o crime" - Maia Gonçalves in Código Penal Português, pág. 391, 13° edição.
Foi este princípio introduzido pela revisão de 1995, impondo assim a obrigatoriedade de um direito de queixa contra todos os comparticipantes, não sendo possível escolher quem deve ser perseguido, de modo que ou são perseguidos todos os comparticipantes conhecidos, ou não é nenhum.
Assim, e porque o assistente não deduziu queixa contra ambos os comparticipantes, o arguido e o vereador C..., falta uma condição legal de procedibilidade, estatuída pelo art. 115, n.º 2 do CP, o que importa a declaração de extinção do procedimento criminal.
De modo que prejudicada fica, a análise da restante questão do requerimento de abertura de instrução.
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Face ao supra exposto, decide-se:
Não pronunciar o arguido A..., determinando-se o consequente arquivamento dos autos.
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Conhecendo:
A questão suscitada no recurso, embora não colocada nestes termos, é apenas a de saber se a queixa apresentada contra o arguido A... é extensiva a todos os comparticipantes, ou se não sendo exercido o direito de queixa contra todos os comparticipantes se extingue o procedimento criminal contra aquele.
É necessário formular expressamente queixa contra todos os comparticipantes?
Entendemos que não.
No caso em apreço estamos perante crime semi-público. Neste tipo de crimes, aqueles em que a lei faz depender o procedimento de queixa ou participação, para que o Mº Pº possa exercer a acção penal é necessário que o titular do direito se queixe (dar conhecimento do facto ao Mº Pº)-art. 49 do CPP.
Refere o art. 114 do CP que em caso de comparticipação no crime, a apresentação da queixa contra um dos comparticipantes torna o procedimento criminal extensivo aos restantes.
E a desistência da queixa relativamente a um dos comprticipantes no crime aproveita aos restantes- arts. 115 e 116 do mesmo diploma.
O Prof. Germano Marques da Silva in Curso de Processo Penal, vol. I, pág. 265, refere que “a justificação destas normas é evidente. Pretendem obstar a que o titular do direito de queixa escolha apenas um dos participantes, perdoando aos demais, caso em que a perseguição teria então mais natureza pessoal do que em razão do crime praticado”.
No mesmo sentido, o Cons. Maia Gonçalves salienta que, “em matéria criminal não se pode escolher quem deve ser perseguido no caso de comparticipação; o que está em causa é o crime”, in Código Penal Português, anotado e comentado, anotação ao art. 115.
O Ac. da Rel. Lx., de 6-6-2002, in Col. Jurisp., tomo III, pág. 135, refere que “Ainda que o procedimento criminal dependa de queixa, não é necessário que, da participação conste a identificação do arguido; Manifestado o desejo de procedimento criminal, não está na disponibilidade do participante dirigir a acção penal contra quem quiser; A queixa vale mesmo contra pessoas não nomeadas”.
E tem de ser assim, pois caso contrário nunca se investigariam factos praticados por desconhecidos.
Muitas vezes não coincide o suspeito indicado pelo queixoso com o verdadeiro, apurado após investigação (inquérito), mas mesmo assim a queixa é relevante, sob pena de não poderem ser aceites queixas contra incertos.
O Ac. da Rel. Évora, de 25-11-1997, in Col., tomo V, pág. 281, refere que “exercido o direito de queixa, o inquérito pode prosseguir contra arguido diferente do nela identificado e ser, contra ele deduzida acusação”.
Este mesmo aresto entende que a queixa contra um indivíduo suspeito não inviabiliza o prosseguimento do processo, uma vez encontrado o verdadeiro arguido, que não o indicado inicialmente.
Havendo uma queixa para se investigarem determinados factos, passa o Mº Pº a ter toda a legitimidade para prosseguir a acção penal. “Na verdade, a legitimidade, uma vez adquirida, não se perde em momento processualmente posterior” -Ac. do STJ de 9-5-2000, in Col. vol. III, pág. 135.
“Para conferir legitimidade ao Mº Pº o que é necessário é dar conhecimento das ocorrências da vida real, das realidades históricas, independentemente da qualificação jurídica que venham a ter”- Ac. Rel. Évora de 17-11-1998, in BMJ, 481-561.
Do exposto, resulta a legitimidade do Mº Pº para prosseguir a acção penal, desenvolver o inquérito, ao qual preside.
Realizado o inquérito o Mº Pº, podia deduzir acusação contra aqueles em relação aos quais se investigassem factos que em seu entender eram susceptíveis de gerar responsabilidade criminal. Foi o que fez.
Entendendo-se na pronúncia que os factos são outros, ou outros os agentes responsáveis, deve-se decidir em conformidade, e não determinar o arquivamento dos autos, por questão formal (falta de queixa contra todos os comparticipantes), como se fez.
Temos pois, entendimento diverso do expresso no Ac. da Rel. de Guimarães, de 2-12-2002, in Col. Jurisp. tomo V, pág. 291, “sendo dois os autores do crime, se o ofendido apenas se queixa contra um deles, não pode o denunciado ser submetido a julgamento”.
O princípio da indivisibilidade quer dizer que:
- art. 114 do CP - apresentada queixa contra um dos participantes no crime, torna o procedimento criminal extensivo aos restantes;
- art. 116 nº 3 do CP - A desistência da queixa em relação a um dos comarticipantes, aproveita aos demais.
- art. 115 nº 2 do CP - o não exercício tempestivo do direito de queixa relativamente a um comparticipante aproveita aos restantes. (O não exercício tempestivo da queixa contra um comparticipante, quer dizer que já não pode haver queixa quanto aos demais, ainda que em tempo de o exercer).
O direito de queixa extingue-se no prazo de 6 meses a contar da data em que o titular tiver conhecimento do facto e dos seus autores -art. 115 nº 1 do CP.
Supondo um crime com comparticipação de agentes na sua prática <ex. furto simples>, em que o ofendido toma de imediato conhecimento de quem é um dos comparticipantes, e só passados meses <ex. com a investigação> fica a saber quem são os restantes:
- Se apresenta queixa dentro de 6 meses a contar dos factos (teve conhecimento imediato de um dos autores), a mesma vale contra todos os agentes - art. 114 do CP;
- Não apresenta queixa dentro desses 6 meses -deixou de exercer tempestivamente relativamente a um <o conhecido de imediato> - pelo que já não pode em relação aos restantes, apesar de em relação a estes ainda estar em tempo, art. 115 nº 2 do CP.
Temos que a interpretação do despacho recorrido, dada ao art. 115 nº 2 do CP, esvaziava de conteúdo, e ficava sem sentido o conteúdo do preceito do art. 114. Os dois têm de ser interpretados e conjugados.
O queixoso não escolhe contra quem será exercida a acção penal uma vez que, apresentada queixa contra um comparticipante, a queixa estende-se aos restantes; desistindo da queixa quanto a um, a desistência estende-se aos restantes; e não exercendo tempestivamente quanto a um, já não pode exercer quanto aos demais.
Este preceito do art. 115 nº 2, não foi introduzido pela reforma penal de 1995, como se refere no despacho recorrido, a norma já existia no contexto do anterior art. 114, respeitante à renuncia e á desistência.
Assim, no despacho recorrido deveria conhecer-se de fundo, o despacho recorrido deveria analisar e decidir, pela pronúncia, ou não pronúncia, com outros fundamentos que não a questão formal da existência da queixa, porque esta existe.
Deve ser, pois, proferido despacho que decida de mérito, caso não se verifique qualquer outra questão formal que a tal obste.
Decisão:
Face ao exposto, acordam nesta Relação e Secção Criminal em, embora com fundamento diferente, conceder provimento ao recurso interposto pelo assistente, e consequentemente revoga-se o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro em que a questão formal relativamente à existência de queixa válida, não obste ao conhecimento.
Sem custas.
Coimbra,