Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
590-I/2002.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FRANCOSCO CAETANO
Descritores: LEGITIMIDADE
MENOR
EXECUÇÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
Data do Acordão: 09/20/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: NELAS
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: 812.º-E Nº 1 AL. B) E 495.º DO CPC
Sumário: Sendo a ilegitimidade singular excepção dilatória insuprível de conhecimento oficioso, é de indeferir liminarmente o requerimento de execução apresentado pela progenitora de menor, ainda que detentora do exercício das responsabilidades parentais, sem que nele indique a sua qualidade de representante legal do filho.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

           

                   1. Relatório                       

            A... veio instaurar contra B... execução especial por alimentos alegadamente devidos ao menor C..., no montante de € 700,00, correspondente a 14 prestações no valor, cada, de € 50,00, apresentando como título executivo a sentença homologatória do acordo que alterou as responsabilidades parentais celebrado entre os progenitores daquele menor e da também menor D....

            No despacho liminar foi indeferido liminarmente o requerimento executivo com 2 fundamentos: a ilegitimidade da exequente, uma vez que não figura como credora no título executivo (credor sendo o filho menor) (art.º 55.º, n.º 1, do CPC) e não foi como representante do menor que foi instaurada a execução e, o outro, porque, face à sentença que não reconheceu o ora executado como devedor de alimentos ao filho menor, actualmente o título apresentado não pode ser reconhecido como título executivo.

            Inconformada, recorreu a exequente, apresentando nas respectivas alegações as seguintes úteis conclusões:

            a) – Quanto à falta de título, insubsiste, porquanto a sentença do processo de incumprimento não transitou em julgado;

            b) – Sendo a recorrente a pessoa certa para representar na execução o menor C..., em ordem ao princípio da economia processual e da defesa do superior interesse do menor e com vista ao aproveitamento dos actos praticados, impunha-se que o tribunal a quo a notificasse para esclarecer se intervinha nos autos por si ou como legal representante do filho.

            c) – Foi a exequente quem interveio no processo de alteração do exercício das responsabilidades parentais, foi na sua contra bancária que o pai ficou de depositar o valor dos alimentos e é ela quem tem legitimidade no processo de incumprimento;

            d) – O despacho recorrido violou os princípios da cooperação processual, da economia processual, da defesa dos interesses do menor e as regras básicas da legitimidade processual s do processo civil em geral, pelo que deverá ser revogado.

            Houve lugar a resposta do executado no sentido da manutenção do despacho recorrido.

            Dada a simplicidade da questão foram dispensados os vistos.

Reporta-se a mesma a reapreciar se a exequente é parte ilegítima e se havia a obrigatoriedade ou possibilidade legal de prolação de despacho de aperfeiçoamento quanto à legitimidade da recorrente para a execução.


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2. Fundamentos

            2.1. De facto

            O acervo factual relevante para julgamento do recurso é o elencado no antecedente relatório, para onde, por brevidade, se remete.


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            2.2. De direito

            Como vimos, o despacho de indeferimento liminar do requerimento executivo assentou em 2 ordens de razões:

            a) – Falta de legitimidade da exequente para intentar a execução de alimentos, por não figurar como credora no título dado è execução, credor sendo o filho menor de quem é representante legal, qualidade esta que efectivamente conferiria legitimidade para lograr a cobrança coerciva dos alimentos;

            b) – Falta de título executivo face à sentença que julgou improcedente o incidente de incumprimento da obrigação alimentícia por banda do executado.

            Apreciando, quanto a este último argumento, tem razão a recorrente.

            A sentença proferida no incidente de incumprimento à data do despacho recorrido não havia transitado em julgado pelo que não podia produzir os efeitos em que o mesmo se louvou.

            Já quanto à ilegitimidade, a razão está do lado do despacho de indeferimento liminar.

            É sabido que nos termos do n.º 1 do art.º 55.º do CPC a execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.

            Como salienta A. dos Reis[1] a legitimidade deriva em princípio da posição que as pessoas têm no título executivo. Se o título é uma sentença é parte legítima como exequente a pessoa a favor da qual foi proferida a condenação.

            Ora, quem figura como credor de alimentos na sentença dada à execução, isto é, a pessoa a favor de quem foi proferida a sentença homologatória do acordo, é o filho menor da exequente e não esta, pese embora lhe caber o exercício das responsabilidades parentais quanto ao menor em causa e ter tido intervenção nos vários processos, irrelevando para o efeito que a conta bancária onde o executado efectuada os depósitos seja da sua titularidade, o que se traduz em mero instrumento de gestão do dia-a-dia das necessidades do menor, a quem compete a pensão de alimentos, que não à mãe.

            Daí que só enquanto representante legal do menor e não por si, poderia intentar a execução de alimentos contra o progenitor pai.

            Não o tendo feito, sustenta a recorrente que em vez do indeferimento deveria o tribunal a quo, por razões de economia processual, ter proferido despacho de aperfeiçoamento do requerimento executivo para que o exequente passasse a indicar essa qualidade.

            Cremos que não, colhendo acerto a via escolhida.

            O princípio da economia processual (e os demais invocados) não pode sobrepor-se ao princípio da legalidade e este vai no sentido de dever indeferir-se liminarmente o requerimento executivo, sempre que ocorra excepção dilatória não suprível, de conhecimento oficioso, como assim aconteceu com a ilegitimidade da exequente (art.ºs 812.º-E, n.º 1, alín. b) e 494.º, alín. e) e 495.º, do CPC[2].

            Eis por que, soçobrando as conclusões recursivas da recorrente e por falta de censura, se mantém o despacho recorrido.


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            3. Resumindo e concluindo:

            - Sendo a ilegitimidade singular excepção dilatória insuprível de conhecimento oficioso, é de indeferir liminarmente o requerimento de execução apresentado pela progenitora de menor, ainda que detentora do exercício das responsabilidades parentais, sem que nele indique a sua qualidade de representante legal do filho.


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            4. Decisão

            Face a todo o exposto, na improcedência da apelação, acordam em manter o despacho recorrido

Custas pela recorrente sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.


Francisco Caetano (Relator)
António Magalhães
José M. Ferreira Lopes


[1] “Código de Processo Civil, Anot.”, I, 3.ª ed., pág. 180.
[2] Quanto ao carácter insanável da ilegitimidade singular, v. Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil, Anot.”, 2.º, 2.ª, pág. 377.