Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3141/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: HELDER ALMEIDA
Descritores: RECURSO
ALTERAÇÃO DOS FACTOS
REPRESENTAÇÃO
Data do Acordão: 02/01/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA - VARA MISTA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 690.º -A E 712.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E D.L. Nº 39/95, 15/02
Sumário: 1. No conhecimento do recurso da matéria de facto, o tribunal de 2ª jurisdição não vai à procura de uma nova convicção, mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal recorrido tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si..
2. Não basta negociar-se com um gerente duma sociedade para logo se concluir que actua em sua representação. Faltando essa ligação expressa ou tácita, perante o terceiro, tem de se considerar que o gerente actua em nome próprio, pese embora, nas relações puramente internas, o negócio poder ser imputado à sociedade.
3. Nada obsta que o gerente duma sociedade acorde num arrendamento em nome próprio, para colocar o locado à disposição da sociedade para dele se servir.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

A..., intentou, na Vara Mista de Coimbra, a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra B... e esposa C..., pedindo que seja declarado resolvido o arrendamento referente ao 1º andar do prédio identificado; e pedindo que os RR. sejam condenados a despejar de imediato o locado, a pagar as rendas vencidas e vincendas até efectiva entrega e a pagar a quantia de € 667,43, acrescida dos montantes a liquidar em execução de sentença, da energia consumida no locado até efectiva entrega.
Alegou para tal –e em síntese-, que, tendo sublocado ao R. marido o 1º andar de um edifício (de que é locatária financeira), não recebe do mesmo as rendas devidas desde 1/12/2001; bem como os pagamentos da energia que, conforme o combinado, lhe tem fornecido.
Os RR. contestaram invocando a ineptidão da PI, o erro na forma de processo, a ilegitimidade activa da A, a ilegitimidade passiva dos RR. e a nulidade, por vício de forma, do contrato de sublocação celebrado entre A e R. Alvim; alegando que o locado sofre de mazelas que põem em causa a boa e plena utilização e aproveitamento do mesmo, razão por que deixaram de pagar as respectivas rendas.
A título reconvencional, pediram ainda que a A seja condenada a pagar-lhes uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, pelos prejuízos que lhes causaram as deficientes condições do locado.
Replicou a A, opondo-se às excepções, alegando que, antes da celebração do contrato, foi o locado vistoriado e inspeccionado pelo R. e impugnando a factualidade em que os RR baseiam o não pagamento das rendas e o pedido reconvencional.
Foi elaborado o despacho saneador, no qual, entre o mais, foram julgadas improcedentes as excepções da ineptidão da PI, do erro na forma de processo, da ilegitimidade activa da A e da ilegitimidade passiva do R. Alvim. Diversamente, foi julgada procedente a excepção da ilegitimidade passiva da R. Maria da Natividade e esta, em conformidade, absolvida da instância.
Em sede do mesmo douto despacho, ainda, procedeu-se ao conhecimento parcial do pedido, declarando-se nula, por vício de forma, a sublocação celebrada e, em consequência, condenando-se o R. Alvim a restituir à A., livre de pessoas e bens, o “locado”, 1º andar do prédio identificado nos autos, decisões esta com que o R. Alvim não se conformou, interpondo o competente recurso, admitido e tramitado como de apelação, com subida imediata e cuja decisão por ora se desconhece.
Finalmente, na lógica e em consequência de tais decisões, determinou-se o prosseguimento dos autos, tão só para conhecer do pedido de rendas, daquele respeitante à condenação na energia consumida e, bem ainda, do pedido reconvencional.
Seleccionados, por último, os factos assentes e organizada a base instrutória, procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, no culminar do qual se verteu nos autos douta sentença, rematada com dispositivo que segue:
.................
III – DO DIREITO
1. O âmbito do recurso, é consabido, acha-se delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, de harmonia com o estipulado nos arts. 684º, nº3 e 690º, nº 1, do Cód. Proc. Civil, circunscrevendo-se -salvo as de conhecimento oficioso-, às questões aí equacionadas.
Destarte, e tendo em mente as acima transcritas conclusões, cuidemos das questões em tal súmula suscitadas.

2. Como dessas sintéticas proposições inequivocamente promana, o Recorrente, em ordem a conseguir a revogação da douta sentença recorrida, dirige nuclearmente a sua actuação à douta decisão sobre a matéria de facto, impugnado-a e propugnando a sua alteração no quadro dos quesitos nelas referenciados.
Será o seu intento – ainda que parcelarmente-, de acolher?
Vejamos.

3. Como é sabido, segundo se estipula na al. a), do nº 1, do art. 712º, do Cód. Proc. Civil, a Relação pode alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 690º-A, a decisão com base neles proferida.
Ora, no caso em exame, essa gravação dos depoimentos emitidos em audiência teve efectivamente lugar.
Sem embargo, e antes de entrar propriamente na pretendida sindicação do julgamento fáctico realizado pelo Tribunal “a quo”, perscrutando o teor das gravações efectuadas e respectiva transcrição, importa, sobremaneira, tecer algumas e pertinentes considerações.

4. Assim é que proficientemente discorrendo sobre o novo regime introduzido pelo D.L. nº 39/95, de 15 de Fev. –o qual, como é sabido, instituiu no nosso ordenamento a gravação da prova produzida em audiência-, consigna-se no Ac. da R.L. de 13-11-2001, Col., V, pág. 85, que “Apesar da maior amplitude conferida pela reforma de processo civil a um segundo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, a verdade é que não se trata de um segundo julgamento, devendo o tribunal apreciar apenas os aspectos sob controvérsia. Por outro lado, malgrado a gravação magnética dos depoimentos oralmente prestados perante o Tribunal “a quo”, as circunstâncias que a este Tribunal se colocam não são inteiramente coincidentes.”.
E continuando: “Isto para concluir, afinal, que mais do que uma simples divergência em relação ao decidido, é necessário que se demonstre, através dos concretos meios de prova que foram produzidos, que existiu um erro na apreciação do seu valor probatório, conclusão difícil quando os meios de prova porventura não se revelem inequívocos no sentido pretendido pelo apelante ou quando também eles sejam contrariados por meios de prova de igual ou de superior valor ou credibilidade.”

Em sentido equipolente, escreve-se no Ac. desta Relação de 3-10-2000, Col., IV, pág. 28, que “o tribunal de 2ª jurisdição não vai à procura de uma nova convicção, mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal “a quo” tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si.”.
E isso porquanto –conforme no mesmo aresto também se doutrina-, “a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, não pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas inserto no art. 655º, nº 1 do C. P. Civil –o juiz aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto-, sendo que na formação dessa convicção não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio”

Sendo, portanto, um problema de aferição da razoabilidade -à luz das regras da ciência, da lógica e da experiência (Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Proc. Civil”, Lex, pág. 348) -, da convicção probatória do julgador recorrido, aquele que essencialmente se coloca em sede de sindicabilidade ou fiscalização do julgamento fáctico operado pela 1ª instância, forçoso se torna concluir que na reapreciação da matéria de facto à Relação apenas cabe, pois, um papel residual, limitado ao controle e eventual censura dos casos mais flagrantes, como sejam aqueles em que o teor de algum ou alguns dos depoimentos prestados no tribunal “a quo” lhe foram indevidamente indiferentes, ou, de outro modo, eram de todo inidóneos ou ineficientes para suportar a decisão a que se chegou.

Neste conspecto, importa ainda considerar –tomando a sábia lição de Eurico Lopes Cardoso, in Bol. 80-203 (apud António Geraldes, Temas da Reforma do Proc. Civil, II Vol., Almedina, pág. 257, nota 346)- que “os depoimentos não são palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe. O magistrado experiente sabe tirar partido desses elementos intraduzíveis e subtis. Nisto consiste a sua arte. As próprias reacções quase imperceptíveis do auditório vão-se acumulando no espírito do julgador, ávido de verdade, e vão formar uma convicção cujos motivos lhe será muitas vezes impossível explicar.”
Neste mesmo pendor se pronuncia também o Prof. A. Reis, Anotado, IV Vol., pág. 137, onde refere que “É já hoje lugar-comum a nota de que tanto ou mais do que o que o depoente diz vale o modo por que o diz, é que se as declarações contam, contam também as reticências, as hesitações, as reservas, enfim a atitude e a conduta do declarante no acto do depoimento.”
E é por isso, pois, que todas estas reacções e manifestações comportamentais -decisivas para a emissão de um seguro e fiável juízo de valor-, não resultam acessíveis à frieza de meios mecânicos, como sejam os registos escritos ou magnetofónicos (cfr. António Geraldes, ob. cit., pp. 257-258), que ao Tribunal da Relação apenas e só é dado alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e essa decisão.
Tal será o caso, como dissemos, de o depoimento de uma testemunha ter um sentido em absoluto dissonante ou inconciliável com o que lhe foi conferido no julgamento, de não terem sido consideradas -v.g. por distracção-, determinadas declarações ou outros elementos de prova que, sendo relevantes, se apresentavam livres de qualquer inquinação, e pouco mais.

5. Vertidas estas considerações, feitas mister para a cabal realização do desempenho a que nos vimos remetendo, e que se sabe ser a reapreciação do julgamento fáctico efectuado pelo Tribunal recorrido, vejamos então se esse julgamento -circunscritamente à parte relativa às respostas àqueles apontados quesitos-, é ou não de manter.
Houve-se, ou não, o Mm Juiz em conformidade com tais falados cânones de razoabilidade ao proferir essas respostas?
Vejamos.

6. Começa o Recorrente por sustentar que a resposta ao quesito 1º deveria ter sido positiva, sendo que –no seu entender-, tal resulta, desde logo, do teor do documento particular designado “Contrato de Sublocação”, em cuja cláusula 5ª se estipula que “o local arrendado se destina a escritórios, a exposição e comercialização de produtos até ao máximo de quatro empresas que o segundo outorgante legalmente representa, na qualidade de sócio ou gestor”, como ainda do depoimento da sua testemunha Maria do Carmo, no qual se referenciam as empresas “Eurozonas”, “Predigest”, “Medizonas” e “Big Top”:
Salvo o devido respeito, a Recorrente carece de razão.

No referenciado quesito 1º, perguntava-se se o contrato referido em B (o dito Contrato de Sublocação) foi celebrado pelo R. como sócio-gerente das empresas que representa; a resposta foi rotunda e simplesmente negativa.
Como é sabido, a representação traduz-se na prática de um acto jurídico em nome de outrem , para na esfera desse outrem se produzirem os respectivos efeitos. Requisito indispensável da representação é, pois, a actuação, a realização do negócio em nome do representado, a chamada “contemplatio domini” –por todos, vd. Mota Pinto, Teoria Geral do Dir. Civil, 3ª ed., C. Editora, pp. 535 e ss.
Como ensina o mesmo insigne Mestre, conquanto não seja necessário que se diga o nome do representado, é no entanto indispensável que a ligação do negócio ao seu dono seja reconhecível, para que a contraparte saiba com quem negoceia. Na dúvida –considera o mesmo Mestre-, “negoceia-se em nome próprio.”
Existindo várias formas tradicionais de classificar a representação, no caso das pessoas colectivas avulta a chamada representação orgânica ou estatutária, a qual –no dizer de Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Dir. Civil, 2ª ed., Almedina, pág. 701, “ refere a situação dos titulares dos órgãos externos das pessoas colectivas e o modo como os actos que praticam nessa qualidade são imputáveis a essa mesma pessoa.”
Neste conspecto, e no que concerne mais precisamente às sociedades comerciais –que é o que para o caso em apreço releva-, a definição das condições em que os actos praticados pelos respectivos gerentes produzem os seus efeitos jurídicos directamente na esfera jurídica da sociedade -são actos dessa sociedade que, por isso, recebe os seus efeitos-, consta do art.º 260º do Código das Sociedades Comerciais.
No nº 1 deste preceito determina-se que “os actos praticados pelos gerentes, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros...”.
Por sua vez, no posterior nº 4, estatui-se que “os gerentes vinculam a sociedade, em actos escritos, apondo a sua assinatura com indicação dessa qualidade.” Esta indicação –como o STJ sentenciou no seu acórdão uniformizador de jurisprudência nº 1/2002, de 6-12-01 (D.R., I-A, de 24-01-02, rectificado por Declaração de 11-2-02)-, “pode ser deduzida, nos termos do art.º 217º do Cód. Civil, de factos que, com toda a probabilidade, a revelem.”
Portanto, a mais da expressa ou textual menção de que um negócio é celebrado em nome da sociedade, o que releva é que das circunstâncias se possa deduzir esse facto, que o mesmo é dizer, a vontade dos intervenientes no sentido de que esse negócio é celebrado, não para um deles directamente, mas para a sociedade da qual, na qualidade de gerente, é representante.
Com efeito, só assim é possível estabelecer aquela imprescindível ligação do acto com a sociedade -do negócio com o seu dono-, donde resulta o conhecimento pela outra parte da entidade com quem verdadeiramente contrata e, logo, da qualidade meramente representativa em que o seu co-outorgante actua.
Como deflui da lição do Prof. Raul Ventura, Sociedades por Quotas, Vol. II, Almedina, pág. 171, faltando essa ligação expressa ou tácita, perante o terceiro, tem de se considerar que o gerente actua em nome próprio, pese embora, nas relações puramente internas, o negócio poder ser imputado à sociedade.

Situação com pontos de afinidade relativamente à representação é aquela em que, verificando-se também estipulação a favor de outrem não interveniente no negócio, no entanto, essa intervenção tem lugar em nome próprio e não –como vimos para a representação-, em nome desse não interveniente.
Referimo-nos, como se antevê, ao contrato a favor de terceiro, previsto nos arts. 443º e ss. do Cód. Civil, e que o Prof.. Antunes Varela define como aquele em que um dos contraentes (promitente) atribui, por conta e à ordem de outro (promissário), uma vantagem a um terceiro (beneficiário), estranho à relação contratual – Das Obrigações em geral, Vol. I, 9 ª ed., Almedina, pág. 421.
Nesta figura contratual, pois, ocorre também uma actuação no interesse de outrem, não participante nas operações negociais.
Só que, na representação, esse outrem (representado) é o verdadeiro contraente; é em nome dele que o negócio se realiza, é a sua esfera a única destinatária dos efeitos de direito decorrentes da actuação do representante - em suma, é ele o titular de uma das posições contratuais, uma das partes em sentido substancial.
No contrato a favor de terceiro, diversamente, tanto um como outro dos intervenientes são os verdadeiros contraentes, são as partes do negócio, tanto no sentido formal como substancial.
O não participante –terceiro favorecido -, é apenas e só o titular do principal direito ou atribuição patrimonial nascido do negócio, mas –antes ou depois da respectiva adesão-, permanecerá sempre fora dele, nunca será parte no acordo que em relação a ele será sempre “res inter alios”. Como salienta Leite de Campos, in Contrato a favor de terceiro, Almedina, pág. 35, “o contrato a favor de terceiro é sempre celebrado por e para o estipulante e o promitente.” O terceiro, conquanto nela favorecido, será sempre um estranho à relação contratual apenas estabelecida entre aqueles sujeitos.
Entre os autores esta categoria contratual admite duas modalidades, e que são contrato a favor de terceiro próprio e contrato a favor de terceiro impróprio –cfr. Leite de Campos.
O traço de distinção entre ambas estas figuras reside no facto de na última (contrato impróprio), o benefício nascido do contrato é atribuído ao terceiro sem que se lhe confira qualquer direito a exigi-lo do devedor (promitente), sendo ele um mero destinatário de tal benefício, da prestação em que se traduz; naqueloutra (contrato próprio), o benefício é concedido com força vinculativa, ou seja, a título de direito e, portanto, atribuindo ao favorecido o poder de exigir o respectivo cumprimento do contraente promitente.
Portanto, enquanto neste o terceiro tem um direito próprio ao cumprimento, é credor juntamente com o promissário, no contrato impróprio assim não acontece, sendo apenas credor o estipulante e ele (terceiro) um mero destinatário da prestação.
Num ou noutro dos casos, porém, nenhuma confusão se pode estabelecer com o instituto da representação, pois, enquanto neste o actuante em benefício alheio o faz em nome desse beneficiado, em ambos aqueles casos tal actuante (promitente) fá-lo em nome próprio, na qualidade de verdadeiro sujeito do convénio em que tal benefício se gera.
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Expostos estes teóricos postulados, é tempo de revertermos à questão “sub judice”, e de, desde já, nos debruçarmos sobre o contrato firmado entre o ora Recorrente e a Recorrida, o sobredito “Contrato de Sublocação”.
Analisando o texto do mesmo, e começando pelo respectivo cabeçalho, desde logo constatamos que, como outorgantes, nele figuram, de um lado (1ª Outorgante), a A. e aqui Recorrida, Rodoviária da Beira litoral, S.A., representada pelo respectivo Presidente do Conselho de Administração, e, do outro (2º Outorgante), o R. e ora Recorrente, B..... A respeito deste, e para além de elementos de identificação estritamente pessoais, nenhuma outra referência se consigna.
Na parte final do mesmo documento, no lugar dos respectivos subscritores, verificamos, por outro lado, que, ao invés da Outorgante Rodoviária da Beira litoral –cuja intervenção se acha subscrita com a assinatura daquele seu representante, inscrita por baixo do carimbo com a respectiva denominação social e tendo ainda intercalada a expressão “A Administração” -, o Recorrente chancela a sua intervenção com a simples aposição da sua assinatura pessoal, complementada do seu nome completo por extenso, de novo sem outra qualquer referência.
No âmbito do clausulado, por sua vez, verifica-se que as alusões ao “segundo outorgante” são sempre a título pessoal, considerando-o na sua própria qualidade, como seja, “a primeira outorgante dá de sublocação ao segundo outorgante... o primeiro andar do imóvel “ (cláusula 2ª), “o segundo outorgante compromete-se a permitir o acesso ao terraço” (cl. 7ª, proémio), “o segundo outorgante terá prioridade na ocupação do rés-do-chão” [cl. 7ª, al c)], “o segundo outorgante fica desde já autorizado a mandar executar as obras e benfeitorias do local arrendado (cl. 8ª), “outras obras e benfeitorias realizadas pelo segundo outorgante, legalmente exequíveis, ficam a pertencer ao imóvel” (cl. 10ª), o segundo outorgante obriga-se a conservar em estado adequado as instalações sanitárias, assim como os equipamentos e acessórios que se relacionam com o fornecimento de energia, água e saneamento, suportando a expensas suas todas as reparações decorrentes da sua utilização, ou de actos negligentes, enquanto o contrato se mantiver.” (cl. 12ª), etc.
A única referência a representação, em toda a economia do acordo, circunscreve-se, justamente, àquela a que o Recorrente apela, a constante da cláusula 5ª, cuja formulação de novo se recorda: “o local arrendado destina-se a escritórios, a exposição e comercialização de produtos até ao máximo de quatro empresas que o segundo outorgante legalmente representa, na qualidade de sócio ou gestor”
Ora, deste conteúdo, se bem cuidamos, não é possível, de modo algum, inferir que a intervenção do referenciado “segundo outorgante” no convénio tem lugar na qualidade de representante, em nome das ditas quatro empresas.
Não se diz que ,“no acto”, tal outorgante representa essas empresas; o que se diz –bem diferentemente-, é que sendo o mesmo legal representante –em decorrência da sua qualidade de respectivo sócio ou gestor- de quatro empresas, com o acordo em efectivação, que lhe concede o direito de gozo do espaço locado, objectiva concretizar –e como tal se obriga- essa utilização mediante a instalação de actividades respeitantes a tais empresas.
Contratante directo, exclusivo, é pois apenas o aqui Recorrente, cujos direitos e obrigações dimanantes do acordo pessoalmente adquire e assume.
Beneficiárias, poderão considerar-se, em primeira linha até, as ditas quatro empresas, mas o certo é que a actuação no interesse de outrem não é decisivo, nem sequer relevante, para o preenchimento da situação de representação, apenas o sendo –como salientámos-, a actuação em nome alheio, a “contemplatio domini”.
Ora, esta manifestamente não se surpreende em face do clausulado em apreço, quer considerando o seu teor em si, quer –tendo em conta o antes expendido-, conjugado com o demais conteúdo do documento.
Sem embargo, verdade é que –como antes frisámos -, a relação representiva pode resultar não só da gramática contratual, mas também das circunstâncias. E neste conspecto, poderia eventualmente relevar o depoimento -a que o Recorrente também faz apelo-, da testemunha Maria do Carmo, no qual –em aparente sintonia com essa cláusula 5ª -, se referenciam como ocupantes do arrendado as empresas “Eurozonas”, “Predigest”, “Medizonas” e “Big Top”, alegadamente geridas pelo aqui Recorrente.
Só que, além de ignorarmos se tais empresas têm ou não efectivamente existência –o que a mais de não ter sido alegado, também de modo algum consistente foi comprovado (de resto, o R. tanto fala em actividades exercidas por si, como enquanto sócio-gerente de várias firmas que representa, numa amálgama pouco esclarecedora) -, o certo é que –como ensina Pinto Furtado, Manual do Arrendamento Urbano, 2ª ed., Almedina, pág. 305-, nada impõe que as posições de arrendatário (“in casu” subarrendatário) e de utente do prédio, sempre e necessariamente, coincidam, antes podendo haver utentes que não sejam arrendatários.
Se assim não fosse –isto é, se a qualidade de arrendatário implicasse, forçosamente, o uso pessoal, directo, do locado-, é que no caso de contrato em que o interveniente não fosse a pessoa a quem o gozo do imóvel era concedido, a única hipótese plausível seria a de aquele estar na veste de representante dessa pessoa a quem tal gozo efectivamente se destinava. Só de tal modo os efeitos dessa sua intervenção (formal) se poderiam repercutir na esfera do futuro ocupante, tudo se passando como se fosse este a outorgar, por si, o contrato.
No entanto, assim não acontece, vale dizer, o gozo proporcionado em virtude de um contrato de arrendamento não tem de ser utilizado exclusiva ou pessoalmente pelo arrendatário.
Na verdade –e tal como sublinha Pinto Furtado, a cujo ensinamento nos vimos cingidamente atendo-, pode legitimamente acontecer que senhorio e inquilino (este agindo em nome e por conta própria) assentem em que o prédio locado se destine a ser ocupado por terceira pessoa, por este último referida ou indicada –ob. cit., pág. 307.
E em tal decorrência estaremos caídos numa situação de contrato a favor de terceiro, na modalidade de impróprio ou próprio.
Será naquela primeira modalidade –e em consonância com o acima, a esse respeito, expendido-, se o arrendatário é que investe o terceiro no gozo da coisa, que assim a utilizará apenas reflexamente e por intermédio daquele.
Verificar-se-á a segunda variante (próprio), se entre tais contraentes se convenciona que o gozo do prédio locado será proporcionado pelo senhorio (promitente) ao terceiro, estranho ao contrato. Neste caso, o senhorio fica obrigado a realizar directamente ao favorecido todas as prestações devidas ao arrendatário, podendo, pois, este último exigir daquele o respectivo cumprimento, recorrendo, se necessário, à via judicial –idem, pp. 323-325.
Como vimos, porém, em qualquer destas situações de estipulação de benefício a favor de terceiro, não se configura uma relação de representação.
O interveniente perante quem ou à ordem do qual a vantagem em prol de terceiro é criada actua sempre em seu próprio nome, é ele um dos sujeitos do contrato.
Ora, assim sendo, como é, e olhando de novo ao caso ajuizado, sabendo nós que a participação do Réu e ora Recorrente no enfocado contrato de “Sublocação” não pode ser encarada, frente à respectiva literalidade, como em veste representativa, há que concluir –na falta de outros e inequívocos elementos-, que o mesmo ali actuou como estipulante em contrato a favor de terceiro, mais precisamente as ditas quatro (hipotéticas) empresas.
Para a questão ora decidenda, já se vê, não releva saber se esse negócio se consubstancia num verdadeiro e próprio contrato de subarrendamento a favor de terceiro, ou, diversamente, num contrato de tal espécie, mas impróprio.
Sem embargo, tendo em conta aquela cláusula 9ª, bem como as demais em que, como vimos, apenas em função do “segundo outorgante” (o Réu) é definido o estatuto do sublocatário, reservando este na sua pessoa, em exclusivo, o núcleo dos poderes e deveres emergentes de tal posição negocial, pensamos que é a categoria do contrato impróprio a que melhor se lhe quadra.
Como quer que seja, porém, inegável é que nele não se manifesta, por parte do Réu, na qualidade de segundo outorgante, uma qualquer actuação compaginável com um exercício representativo, ao invés do outro participante pessoal, o Administrador da A. e ora Recorrida.
De tal sorte, e como adiantámos, o pronunciamento em relação ao ventilado quesito 1º não podia deixar de ser, como aconteceu, integralmente negativo, sendo por isso de manter.
A objecção recursória ora apreciada é, pois, improcedente.

7. Prosseguindo, o Recorrente insurge-se contra a resposta proferida em relação aos quesitos 5º e -corporizadas nos acima inventariados factos L), M)) e N)-, pretendendo que essa resposta seja em sentido praticamente afirmativo, ou seja, do seguinte teor:
- Provado que, no Inverno e quando chove, ocorreram e ocorrem infiltrações - desde pequenos "repasses" de água até ao "corrimento em bica" da mesma, em alguns locais - através do telhado/terraço de cobertura do edifício, o qual é feito em tela asfáltica que, nos seus locais mais frágeis - isto é, nas costuras e remates à caleira - permite em dias de chuva tais "repasses" de água e "corrimento em bica"; que, em virtude de tais "repasses e corrimento em bica", ficam vestígios localizados (v.g., na alcatifa, tecto e paredes) no hall e salas existentes no 1.º andar, bem como num corredor interior de acesso ao WC.; e que o sistema de escoamento das águas pluviais está sub-dimensionado, encontrando-se atrofiado (pelo lixo que forma e a merecer reparação e manutenção.”
Aproximando este sugerido pronunciamento daqueles ordenados factos, pretende o Recorrente, ao fim e ao cabo, que, no essencial, se considerem as infiltrações pluviais ocorridas no locado não apenas constituídas por pequenos simples "repasses" de água –ut aqueles factos assentes -, mas por estes e um crescendo de quantidade até "corrimento em bica".
Em alicerce desta sua posição apela aos depoimentos de todas as suas testemunhas ouvidas em audiência de julgamento.
O pronunciamento do Tribunal que esteve na origem daqueles três factos filiou-se, como deriva da douta motivação à decisão fáctica, no relatório pericial elaborado e junto a fls 237 e ss., o qual teve lugar na sequência de diligência ordenada oficiosamente pelo Exmº Julgador (cfr. fls. 218 e ss).
Esse pronunciamento traduz-se num autêntico “apanhado” de algumas das respostas exaradas naquele relatório, não se verificando qualquer elaboração mental própria por parte do Exmº Juiz. Ou seja, toda a materialidade exarada naqueles factos consta nos seus precisos termos de tal documento pericial.
Ora, como é sabido, tanto em relação à prova testemunhal, como à prova pericial, no nosso direito processual vigora o princípio da liberdade de julgamento, consagrado no art. 655º, nº 1, do Cód. Proc. Civil, nos termos do qual o tribunal deve valorar a prova de acordo com a convicção realmente formada no seu espírito, mediante a apreciação do material probatório livremente efectuada.
Assim sendo, não havendo obstáculo a que o Mm.º Juiz apreciasse e valorasse ambos esses meios de prova de acordo com a sua livre e íntima persuasão, norteado pela sua experiência da vida e das coisas, desde logo temos que concluir que a este Tribunal “ad quem” não é possível alterar as respostas por aquele Magistrado emitidas em relação aos quesitos em foco. Dado que as mesmas, como dissemos, logram patente e cabal suporte naquela diligência pericial, por completamente arredada se tem de ter a possibilidade de erro flagrante de julgamento por parte do Exmº Magistrado, única situação em que, como referimos, os poderes censórios da Relação em sede de julgamento da matéria de facto podem ser actuados.
Como se afirmou no acórdão deste Tribunal de 18-05-2004, (Isaías Pádua), proferido na Apelação nº 1065/04, 3ª sec., não ocorre erro de julgamento quando estamos na presença de elementos de prova contraditórios, pois nesse caso deve prevalecer a resposta dada pelo tribunal ‘ a quo’, por estarmos então no domínio e âmbito da convicção e da liberdade de julgamento, que não compete a este Tribunal sindicar”.
E se estas considerações valem em tese geral, sucede ainda que, em face dos específicos condicionalismos dos vertentes autos, ganham acrescido reforço. Queremos dizer que a consistência dos depoimentos testemunhais a que o ora Recorrente apela estão longe de inculcar que o Mm.º Juiz, ao conferir decisiva relevância ao laudo pericial, tenha incorrido em menos correcta ou idónea aferição probatória.
Na verdade, todos esses depoimentos enfermam de fragilidades e deficiências que tornam precária a credibilidade e relevo a conferir-lhes.
Assim, e no que concerne à Engª Maria de Fátima Lopes Freire, a mesma, tendo vistoriado o locado –a pedido do Réu- já após a propositura da acção, elaborou o parecer técnico de fls. 66 –datado de 18-10-2002-, onde apenas refere ter observado a “existência de infiltrações localizadas em vários pontos do escritório, tornando o espaço em causa desagradável para os seus utentes.”, concluindo que “tais infiltrações só poderiam ter origem na cobertura.”
Ouvida em audiência, diz que vistoriou o local no Inverno, em altura em que não estava a chover, e que viu “manifestações de humidade nos tectos e nas paredes”. E embora respondendo a correspondente pergunta sobre a origem dessas humidades que “entrava bastante água”, esclareceu, no entanto, “agora não vi água em si”.
Vistas estas contraditórias -ou pelo menos inconclusivas- e pouco alicerçadas apreciações, não podemos deixar de concluir, em nosso modesto entendimento, deixarem as mesmas incólume, na sua credibilidade e valia, o dito relatório pericial oficialmente elaborado.
E o mesmo haverá que dizer do depoimento do Eng.º Énio Gilberto Silva Gomes.
Com efeito, refere esta Testemunha que foi exercer actividade para o locado em Julho de 2002 (a 15 desse mês teve lugar a instauração da acção), e que “nessa altura não havia assim grande problema, com excepção das casas de banho que não tinha grandes condições, mas de resto não havia assim grande problema”.
No entanto –ainda segundo a mesma-, “quando começou a aproximar-se as primeiras chuvas, salvo erro foi em Setembro, começou a verificar-se a cair água, inclusivamente, nas paredes mesmo no gabinete de estética”. E que em virtude dessa entrada de água, logo pôs termo à ocupação da sala do locado, por falta de condições para o exercício da sua actividade.
Ora, se é certo não ser plausível que, estando a cobertura do locado em tais ditas deficientes condições de estanquicidade –de molde a que, acto contínuo às primeiras chuvas, a água irrompeu no interior do prédio-, aquando da entrada da Testemunha para o mesmo nenhuns reflexos ali se evidenciassem, salvo no tocante às casas de banho; menos aceitável é ainda que, mal a verificação dessa inicial pluviosidade e respectiva penetração no locado se tivesse verificado, imediatamente, e sem mais, a dita Testemunha houvesse derrotisticamente posto fim à sua actividade, então praticamente apenas em embrião, por isso que menos de três meses antes começada.
Não se justificava e impunha, razoavelmente, um período de alguma contenção e espera, acompanhado de eventuais diligências no sentido de obter solução para o problema, solução essa que, ao menos do ponto de vista técnico –e até económico (no relatório pericial estima-se em cerca de € 1250 a reparação do telhado)- se apresentava perfeitamente viável?
A resposta afigura-se-nos por demais unívoca.
E iguais reticentes apreciações são por igual formuláveis em relação ao depoimento da testemunha Maria do Carmo Santos Fonseca, trabalhadora por conta do Recorrente.
Com efeito, tal depoimento, além de claramente parcial em favor do mesmo, por razões facilmente divisáveis, enferma de imprecisões, de contradições e até de exageros –sirva de exemplo o constante fundimento de lâmpadas no “hall”, por virtude da humidade, pese que não acompanhado de notados curtos-circuitos, a irremediável inoperacionalidade das máquinas fotocopiadoras por virtude dos óleos dos autocarros acumulados na loja e, para cúmulo, a anotação das matrículas dos autocarros com excessiva emissão de gases de escape: anotação primeiro afirmada, depois negada e por fim reafirmada-, que lhe retiram qualquer justificado crédito de confiança.
Resta, por fim, a testemunha José Manuel Gouveia Jorge que, a solicitação da dita Maria do Carmo Fonseca, se terá deslocado por duas vezes ao locado a tirar fotografias aos respectivos compartimentos.
Essa colheita de fotografias, a fazer fé nas suas palavras, em conjunto com as inscrições no verso das mesmas apostas, teve lugar a 23 de Julho e 23 de Setembro de 2002, uma vez mais após o ingresso judicial da acção.
Diz a testemunha que o que viu “está explícito nas fotografias...a humidade, a água que cai, o chão inundado”. E, com efeito, as fotos confirmam estas suas afirmações.
Todavia, se bem cuidamos -e sendo que se ignora totalmente as condições que antecederam essa tomada de fotografias-, verdade é que os factos nelas evidenciados –deteriorações e estragos determinados pela infiltração de água nos compartimentos do arrendado-, não são de todo em todo incompatíveis com os “repasses” de água em pouca monta mencionados na perícia e acolhidos pelo douto pronunciamento judicial em crise.
Demais, tendo em mente essa primeira data de tiragem de fotografias, reportando-nos às declarações do prefalado Eng.º Énio Gilberto Silva Gomes nada de anormal se passava ainda no prédio a respeito de infiltrações.
Ora, qual dos depoimentos em divergência se conforma com a realidade e, inerentemente, que valor conferir a tais elementos fotográficos?
A resposta aqui surge mais problemática, mas o que não suscita dúvida é que da ponderação de todos esses inventariados elementos carreados pelo Réu, das suas notórias debilidades, em nada a valia probatória do relatório pericial se apresenta infirmada ou, sequer, minorada.
De tal sorte, e sendo certo ainda que contra ele não foi desferida qualquer reclamação quando notificado às partes, nem sujeito a aferição mediante requerimento de segunda perícia (cfr. arts. 587º e 589º e ss), bem se houve o Mm.º Juiz em privilegiar a idoneidade, credibilidade, isenção e -numa palavra-, segurança, por ele conferidas.
As respostas aqui em questão são pois de manter, improcedendo também a vertente objecção.

8. Discorda o Recorrente, outrossim, das respostas, interligadas, que mereceram os quesitos 7º, e -supra, Factos O) e P)-, aduzindo que o conteúdo das mesmas não esclarece uma questão fundamental, qual seja, que ele apenas tomou conhecimento das limitações da energia eléctrica fornecida depois de se ter instalado no locado.
De novo, e ressalvando sempre o muito respeito, não tem razão.
É que a essa factualidade que o Recorrente pretende ver esclarecida não foi de qualquer modo alegada, nem, por igual, obteve comprovação.
Assim sendo, obviamente que não podia nem pode ser objecto de consideração, em ordem à conformação do material fáctico da causa,
A objecção em presença, portanto, soçobra.

9. Adversa também o Recorrente a resposta ao quesito 9º -integrante do Facto Q)-, dizendo que tal resposta deveria ter ido mais além, pois a mais de ambição –como ali se considerou-, ele tinha um manifesto e firme propósito em instalar na fracção sublocada as actividades nesse resposta mencionadas.
Salvo sempre o muito respeito, pensamos que a questão concitada se centra mais e melhor no domínio semântico que material.
Entre “ambição” e “firme propósito”, em nosso modesto ver, não intercede qualquer diferença significativa, notadamente para os fins a que na vertente acção se objectiva.
Sem embargo, sempre diremos que, se com essa ênfase no “firme propósito” se almeja significar que as actividades projectadas pelo R. para o arrendado só não foram avante e se consolidaram por virtude das más condições decorrentes das alegadas infiltrações –se é esse o escopo, então não poderá deixar de se malograr, porquanto, como deflui das explanações vertidas supra, no âmbito do pronunciamento aos quesitos 5º e 6º, nenhuma prova efectiva, consistente e indesmentível se fez a tal respeito.
Naufraga, pois, também a apreciada objecção.

10. Contesta ainda o Recorrente a resposta conjunta dada aos quesitos 10º, 11º, 20º e 21º -integrante do acima inventariado Facto R)-, propugnando que se dê como provado que o referido nas respostas aos quesitos 5º e 6º -ao invés de um condicionamento “ligeiro”, como em tal resposta se considerou-, determina gravemente, e impede até, o exercício das actividades em vista prosseguir, pelo R., no locado. De novo, alicerça o Recorrente este seu desiderato nos depoimentos conjugados das testemunhas por ele arroladas.
Como dimana de tudo o expendido por nós, em sede do pronunciamento a respeito daqueles quesitos 5º e 6º, esta pretensão do Recorrente está também votada ao insucesso.
Sendo o volume dos “repasses” de água pequeno, obviamente que o constrangimento daí decorrente para o giro comercial do Réu não poderia deixar de se revestir de idêntica expressão.
Isso mesmo –como se impunha forçoso-, é asseverado na perícia de iniciativa judicial, onde se consigna –e passamos a citar -, que “Apesar das pequenas infiltrações e humidades localizadas, e mesmo com a condicionante já explicada em 6 (quadro da electricidade não ser trifásico), afigura-se ser possível desenvolverem-se várias actividades comerciais em simultâneo “ ,e mais à frente, “As poucas humidades detectadas não impossibilitam a actividade dos três comércios citados.”
A resposta a esses quesitos tem, pois, de permanecer intocada.

11. Põe o aqui Recorrente outrossim em causa a resposta ao quesito 15º -consubstanciadora do Facto V)-, sustentando que no seu âmbito deveria ter sido também incluída a montra situada no acesso ao terminal rodoviário, pois que isso foi igualmente acordado com a A., como decorre dos depoimentos contraditórios da testemunha desta, Jorge Manuel da Silva Amaral, bem como do contrato escrito de “Sublocação” junto aos autos, e, reforçadamente, do depoimento da sua (do Recorrente) testemunha Maria do Carmo
Ressalvando uma vez mais o devido respeito, pensamos não lhe assistir razão.
Como resulta do depoimento de todas as pessoas que a tal respeito se pronunciaram –as mencionada testemunhas Jorge Amaral e Maria do Carmo, a que se tem de juntar a testemunha da A., Maria da Glória Rodrigues-, a montra em foco não existia aquando da celebração do referido convénio.
Foi no decurso das obras de vedação, para a constituição de um acesso privativo ao locado, que, a pedido daquele Jorge Amaral, o Réu deixou ficar um espaço para possibilitar claridade à zona envolvente. Esse espaço, fechado com vidro, é que constitui a referida montra ou vitrina.
Ora, quanto à utilização de tal espaço, como já se vê, nada foi estipulado aquando da sobredita celebração negocial, sendo o atinente clausulado por isso, e ao invés do preconizado pelo Recorrente, a esse respeito totalmente omissivo.
No desenvolvimento do contrato outrossim, e tendo em conta a demais prova produzida –mormente os sobreditos depoimentos testemunhais-, também nada sobre eventual estipulação se pode ter por assente, sendo esses depoimentos, também eles, em absoluto omissos.
O judicial pronunciamento ao quesito em apreço só podia, pois, ser o que apresenta.
A censura contra ele dirigida é assim insubsistente.

12. Advoga outrossim o Recorrente que os quesitos 18º e 19º deviam ser dados –contrariamente às respostas negativas que receberam-, como provados.
Independentemente de outras considerações, a posição por nós assumida em relação à resposta ao quesito 15º, recusando a inserção do uso da referenciada montra ou vitrina no âmbito contratual, retira qualquer relevância à dilucidação da controvérsia em apreço.
Razão por que, abstendo-nos de outros arrazoados, damos as respostas ora em crise por também inalteráveis.

13. Reportando-se às respostas aos quesitos 4º e 22º -supra Factos J) e Z)-, diz o Recorrente que, conquanto esteja de acordo com o respectivo teor, o certo é que, a mais disso, nelas se devia ter feito constar que, diversamente de todo o 1ª andar, o R. não inspeccionou e verificou o estado em que se encontrava o telhado/terraço.
Sucede, porém, que esta materialidade que se pretende omitida naqueles pronunciamentos –à semelhança do que vimos acontecer no tocante quesitos 7º, 8º e 9º, não foi objecto, tanto de qualquer alegação como demonstração probatória.
Como assim, há que repetir aqui o veredicto por nós expendido naquele ponto antecedente, uma vez mais julgando, pois, improcedente a censura do Recorrente.

14. Questiona igualmente o Recorrente a resposta conjunta aos quesitos 30º e 31º -idem, Facto FF)-, defendendo que, em face das respostas por ele preconizadas em relação aos quesitos anteriores, mormente 10º, 11º, 20º e 21º, essa resposta só poderia ser no sentido de que o prédio, apesar de vistoriado e aprovado para efeitos de arrendamento, oferece precárias condições de utilização, e não simplesmente essas condições sem tal pejorativa adjectivação, como consta dessa adversada resposta.
O desfecho a conferir a esta objecção não pode destoar das até aqui analisadas, por isso que o pressuposto em que o seu êxito assentava –a alteração das antecedentes respostas aos quesitos, maxime aquelas especialmente enumeradas-, como sabemos, não ocorreu.
Em tal decorrência, também aquela englobante resposta se tem de manter inalterada.

15. Por fim, o Recorrente ataca a resposta parcialmente afirmativa ao quesito 35º -id., Facto JJ)-, propondo-lhe um pronunciamento cabalmente negativo, argumentando que tal resposta apenas assentou no depoimento da sobredita testemunha Jorge Manuel da Silva Amaral, o qual, no entanto, se revelou, a este propósito, notoriamente contraditório, tendo em mente as duas sessões de julgamento.
Uma vez mais, não podemos sufragar, sempre com a devida vénia, este douto entendimento.
Desde logo, vigorando no nosso sistema processual o regime da prova livre, nada obsta a que a persuasão do julgador se determine com base no depoimento de uma única testemunha –cfr., por todos, Teixeira de Sousa, Estudos Sobre O Novo Proc. Civil, Lex, pág. 347.
Depois, e sempre com o maior respeito, não é real que aquela testemunha no entrecorrer das duas sessões de julgamento tenha incorrido em discrepantes declarações acerca da matéria vertida naquela resposta.
Com efeito, se na última sessão afirmou a tal propósito –e entre o mais– que “Bem pelo contrário, chegou mesmo [o aqui R.] a dizer que era um bom local visto que havia muito movimento”(fls. 37 da transcrição), na primeira, e com pendor no essencial coincidente, não deixou de referir “É evidente que para ele, o que deu a entender, visto o volume de passageiros, de pessoas que por ali passariam, dentro da actividade dele, interessava-lhe precisamente por causa disso” (id., fls. 14).
Como assim, também a resposta em presença nos surge imodificável.

9. Destarte, sendo, como é, de manter intocada a factualidade que, vertida na douta sentença final, integrou o substracto com base no qual se operou a concernente decisão, a remanescente questão suscitada pela ora Recorrente –a saber, diferente solução jurídica da causa (compreendendo tanto o pedido inicial como reconvencional)- na medida em que assente e imperativamente função da pretendida alteração dessa materialidade, apresenta-se, como é bem de ver, também ela improcedente.

Nestes termos, e em conclusão, o douto recurso em exame, na sua totalidade, naufraga.

IV – DECISÃO
Atento o exposto, e sem mais considerações, julgando-se a douta apelação improcedente, confirma-se, na íntegra, a douta sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.