Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
229/97 PR 15-97
Nº Convencional: JTRC
Relator: PIRES DA ROSA
Descritores: FIANÇA OMNIBUS
OBRIGAÇÃO FUTURA
DETERMINABILIDADE DO OBJECTO
FORMA
VALIDADE
Data do Acordão: 05/26/1998
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: OLIVEIRA DE FRADES
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 280, 627, 628 CC
Sumário: 1.- A validade de uma fiança omnibus, sem qualquer limite máximo ou horizonte temporal, depende da determinabilidade do seu objecto, que postula, antes de mais, um problema de interpretação do contrato, e no caso em que os fiadores são sócios gerentes da sociedade devedora, deve atender-se à função da qualidade dos fiadores e da especial ligação à empresa afiançada.

2.- É determinável uma fiança e conforme aos bons costumes e aos princípios de ordem pública, ainda que não esteja fixado um limite temporal, designada de “fiança para todas as responsabilidades”, para garantia “de todas e quaisquer obrigações pecuniárias decorrentes de mútuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em contas à ordem, letras, livranças, extractos de factura, warrants, garantias bancárias, fianças, avales e empréstimos obrigacionistas, concedidos ou a conceder”, se os fiadores são os sócios-gerentes da sociedade mutuária, agindo, por um lado, como representantes da empresa, vinculando-a, e, por outro, em nome próprio como fiadores, podendo assim, perfeitamente controlar o nascimento das obrigações afiançadas.

3.- O art. 628 nº1 do CC impõe que “a vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal”, significando que para a consideração da forma exigível à fiança, não importa que as partes do contrato principal tenham voluntariamente adoptado para este uma forma mais pesada, se se não trata de uma forma exigida por lei.

Decisão Texto Integral:             Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

No Tribunal Judicial da comarca de Oliveira de Frades, em execução que com o nº 78/95 lhes move

A…, S.A.

deduziram

B…, LDA

C… e mulher

D…,

embargos de executado nos quais, além do mais, invocam a título de excepçãonulidade da fiança prestada pelos embargados pessoas singulares em favor da embargada sociedade, como garantia de contratos de mútuo/contrato de empréstimo com garantias até ao montante de 30 000 000$00 e de mútuo/em regime de conta corrente até ao montante de 10 000 000$00, alterado em 7/Abril/94 para 20 000 000$00. 

            Alegam que

            a redacção do termo de garantia fiduciária não determina nem permite a determinação das obrigações resultantes dos financiamentos feitos à sociedade;

            o termo de fiança não foi elaborado nem redigido nos mesmos moldes e com as mesmas características formais do contrato de hipoteca e de empréstimo.

            A fiança é assim nula por indeterminação e indeterminabilidade do objecto - art.280°, nº1 do CCivil - e por falta da forma legal exigida - art.628° do CCivil.

            A embargada A... contestou os embargos.

            No que à questão da fiança respeita, disse:

            a fiança é válida, e o seu objecto perfeitamente determinável, já que é sempre possível conhecer as dívidas que a fiança garante, bastando para tanto que os fiadores peçam a necessária informação à A…;

            a fiança não é contrária à ordem pública, e é prática comum a todas as instituições de crédito;

            não é necessária qualquer forma especial para a subscrição da fiança.

            À contestação, apresentou o embargante um articulado de « resposta », resposta que todavia a Mª Juíza considerou inadmissível e mandou desentranhar.

            E proferiu um longo, trabalhado e trabalhoso despacho saneador onde, além do mais - fls.84, julgou

                                                                                              « procedente a excepção da nulidade da fiança invocada e em consequência ao abrigo do disposto no art.493°, nº3 CPC absolv(eu) os embargantes C… e D… do pedido e consequentemente da acção executiva apensa, que passará a seguir apenas contra a B… Lda, ficando deste modo prejudicado o conhecimento do restante alegado quanto à fiança ».

            É desta decisão que a embargada A… interpõe recurso, que foi admitido como de apelação, com subida imediata em separado e efeito meramente devolutivo.

            Na respectiva alegação, apresenta a apelante as seguintes CONCLUSÕES:

            1 - no dia 25 de Novembro de 1993, a A… concedeu à , B… Lda dois financiamentos, sendo um de mútuo até ao montante de 30 000 000$00 e outro sob a forma de abertura de crédito em conta corrente até 10 000 000$00;

            2 - estes contratos foram assinados pelos aqui recorridos enquanto gerentes da B… Lda;

            3 - no mesmo dia 25 de Novembro de 1993, os ora recorridos assinaram, também o termo de fiança, que designaram de « fiança para todas as responsabilidades », no qual se constituíram fiadores solidários e principais pagadores de todas e quaisquer obrigações pecuniárias decorrentes de mútuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em contas à ordem, letras, livranças, extractos de facturas, warrants, garantias bancárias, fianças, avales e empréstimos obrigacionistas, concedidos ou a conceder pela A… à , B… Lda;

            4 - na cláusula 133 do contrato de mútuo e na cláusula 143 do contrato de abertura de crédito junto com o requerimento de execução, ficou convencionado que as respectivas garantias eram, para além da hipoteca, ... « a fiança dos sócios C… e D… para todas e quaisquer responsabilidades, prestada em documento de 25 de Novembro de 1993 »;

            5 - a reunião, nas mesmas pessoas físicas - os aqui recorridos - da qualidade de representantes da B… Lda e a de fiadores, manteve estes, desde o início e inteiramente, informados do objecto dos negócios, do conteúdo exacto das obrigações deles emergentes, das taxas aplicadas, dos seus reembolsos, etc;

            6 - determinado ficou igualmente, de forma clara e definitiva, os títulos donde resultaram as obrigações dos fiadores, in casu um contrato de mútuo e outro de abertura de crédito em regime de conta-corrente, assinados igualmente pelos aqui recorridos, por serem os sócios-gerentes da afiançada, não cabendo assim na previsão do art.280° do CCivil;

            7 - a recorrente não celebrou com a B… Lda qualquer outro contrato que não sejam os descritos, nem exigiu na execução, aos fiadores, quaisquer outros valores que não fossem os deles emergentes;

            8 - todos os elementos de facto que permitem qualificar os negócios como determináveI o objecto dos negócios, quantificar as obrigações deles emergentes e tipificar os títulos donde resultam as obrigações afiançadas constam no processo de execução ab initio pelo que a Mª Juíza a quo deveria tê-los tomado em consideração na decisão recorrida, nos termos do art.515° do CPC e examiná-los criticamente nos termos do nº3 do art.659° do mesmo diploma;

            9 - ao julgar nula a fiança, a sentença violou os arts.515° e nº3 do 659º do CPC, o art.672°, nº1 do CCivil, e interpretou incorrectamente o art.280°, nº1 do CCivil.

            Em contra -alegações, os apelados defendem a bondade do decidido.

            Estão corridos os vistos legais.

            FACTOS com interesse para a decisão da presente questão:

            no exercício da sua actividade creditícia a A… celebrou, em 25 de Novembro de 1993, com B…, Lda os contratos de:

            empréstimo nº5640001402820019, contrato de mútuo, « Contrato de empréstimo e de garantias» de longo prazo até ao montante de 30 000 000$00, formalizado em 25 de Novembro de 1993 por troca de correspondência, à taxa de juro de 18% ao ano;

            empréstimo nº5640001747.80019, contrato de mútuo em regime de conta - corrente, no montante -de 10 000 000$00, formalizado em 25 de Novembro de 1993 por troca de correspondência, à taxa de 18% ao ano;

            este financiamento foi objecto de alteração contratual, por acordo das partes, em 7 de Abril de 1994 segundo o qual o montante de crédito passou a ser de 20 000 000$00;

            as assinaturas dos subscritores dos referidos contratos, entre as quais os embargantes C… e mulher, como sócios - gerentes e em representação da embargante ,-B…, Lda, foram presencialmente reconhecidas por notário;

            para garantia das obrigações pecuniárias decorrentes de quaisquer operações bancárias assumidas ou a assumir pela mutuária B…, Lda até ao montante de 50 000 000$00, respectivos juros e despesas, foi constituída hipoteca sobre um lote de terreno;

            quer um quer outro dos contratos previam, como garantia, a prestação de « fiança dos sócios C… e D…, para garantia de todas as responsabilidades, prestada em documento de 25 de Novembro de 1993 »;

            conforme documento de fls.12 da execução, desta mesma data, sob a designação de « Fiança para todas as responsabilidades » os embargantes C…e mulher D… declaram:

            a) que por este instrumento se constituem fiadores solidários e principais pagadores de todas e quaisquer obrigações pecuniárias decorrentes de mútuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em contas à ordem, letras, livranças, extractos de factura warrants, garantias bancárias, fianças, avales e empréstimos obrigacionistas, concedidos ou a conceder por esta A…a B…, Lda:

            b) os documentos que representam os créditos da A,… fazem parte integrante para fins de execução, se for caso disso;

            o termo de fiança de fls.12 encontra-se assinado ( não tendo a assinatura sido reconhecida notaria1mente ) pelos subscritores C… , D… e pelo representante da A…;

            na presente execução é pedida relativamente ao primeiro empréstimo n° 5640001402820019 um capital de 30 000 000$00, juros no montante de 6 915967$00, e despesas de 68 940$00;

            e relativamente ao empréstimo nº564000174780019 a quantia de 14 405 240$00, juros no montante de 2 910 920$00, e despesas de 900$00.

                                                                       *

            Com a celebração dos dois contratos de empréstimo com a B…, Lda, a A… pôs à disposição daquela a quantia de 50 000 000$00.

            E exigiu, como garantia do pagamento dessa quantia de que a B…, Lda iria poder dispôr - de imediato ou no futuro - a prestação de fiança por parte de C…e mulher D… afinal os sócios gerentes da sociedade que consigo, em representação desta, estavam a contratar.

            Nenhuma dúvida quanto à validade da fiança em relação aos montantes dos quais, ao abrigo desses contratos, a B…, Lda possa ter disposto de imediato.

            Nessa parte, e como se escreve no Ac. S T J de 21 de Janeiro de 1993, CJSTJ, TI, pág.7I, « a fiança ." não pode, por referência ao preceituado no art.280°, nº1 do CCivil, ser tida por nula ». Naturalmente porque, nessa parte, o objecto da fiança está inteiramente determinado.

            A questão da nulidade, ou da validade, da fiança põe-se sim quanto às obrigações futuras, às obrigações a constituir no futuro ao abrigo desse crédito concedido à B…, Lda.

            É consensual a validade da fiança de obrigações futuras. É princípio que já vinha sendo reconhecido entre nós pela doutrina e pela jurisprudência quando o novo preceito do nº2 do art. 628° do CCivil veio expressamente dizer - ... à sua prestação [ da fiança ] não obsta o facto de a obrigação ser futura ou condicional.

            É igualmente adquirido que podendo a obrigação futura não ser determinada, tem ao menos que ser determinável, sob pena da nulidade resultante do disposto no art.280°, nº1 do CCivil, sendo certo que - Meneses Cordeiro, Parecer publicado na CJ 1992, T3, págs.55 a 64 - « a prestação é indeterminada mas determináve1 quando não se saiba, num momento anterior, qual o seu teor mas, não obstante, exista um critério para proceder à determinação ».

            O « desacordo » jurisprudencial nesta questão começa na análise, em concreto, daquilo que pode ou não considerar-se determináve1.

            E para textos em tudo semelhantes àquele que os RR subscreveram - que por este instrumento se constituem fiadores solidários e principais pagadores de todas e quaisquer obrigações pecuniárias decorrentes de mútuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em contas à ordem, letras, livranças, extractos de factura, warrants, garantias bancárias, fianças, avales e empréstimos obrigacionistas, concedidos ou a conceder por esta A… a B…, Lda - algumas decisões caminharam no sentido da indeterminabilidade, outras no sentido inverso.

            Se bem pensamos, a questão principal a ter em conta é uma questão de interpretação do contrato que a prestação de fiança é.

            E a primeira coisa que é preciso dizer é que a prestação desta fiança está indissoluvelmente ligada à celebração dos contratos que permitiram à sociedade dispôr, então e no futuro, dos créditos para cuja garantia foi exigida a fiança.

            Contratos de empréstimo e de fiança foram celebrados no mesmo dia 25 de Novembro de 1993, e nos contratos de empréstimo se consigna expressamente a prestação de « fiança dos sócios C… e D…, para garantia de todas as responsabilidades, prestada em documento de 25 de Novembro de 1993 »,

            Ou seja, in casu,

            os fiadores sabem, e o banco credor sabe também, que a afiançada é uma sociedade por quotas, com um determinado estatuto social, que pode desenvolver determinados negócios e só esses, e que, para os desenvolver, tem de socorrer-se do comércio bancário, aproveitando-se do crédito fornecido pela banca, mas naturalmente responsabilizando-se pelas obrigações daí nascidas.

            Eles, os fiadores, são os sócios-gerentes da sociedade para a qual, com a sua fiança, conseguiram o crédito de que esta necessitava.

            Eles sabem qual é o limite quantitativo da sua fiança porque foram eles quem subscreveu os empréstimos obtidos para a sua empresa.

            Dentro dos limites do crédito concedido eles só vão, enquanto empresa, até onde quiserem ir; e como pessoas singulares, como fiadores, eles sabem sempre até onde foram.

            Eles sabem também - e a A… também o sabe - que as obrigações que estão a afiançar são apenas as que resultam do comércio empresarial. Neste sentido os mútuos, aberturas de crédito, letras, avales, warrants, etc, circunscrevem as obrigações afiançadas ao estrito comércio jurídico-empresarial da sociedade: só estão afiançadas obrigações cuja proveniência seja a desse comércio.

            É perfeitamente determinável o objecto da fiança, cujo limite quantitativo, portanto, está perfeitamente definido: o dos contratos de empréstimo celebrados no dia 25 de Novembro de 1993, com uma cláusula de garantia traduzida da na necessidade da fiança dos RR C… e D… que a prestaram nesse mesmo dia.

            Contratos aos quais, aliás, a alínea b) do próprio documento de fiança faz reconduzir esta directamente - os documentos que representam os créditos da A… constituirão títulos referidos a este instrumento e dele fazem parte integrante para fins de execução, se for caso disso.

            Deste contrato de fiança não nasce para os fiadores qualquer obrigação incontrolável que tome nula a fiança - veja-se Meneses Cordeiro, Parecer já citado: os fiadores, que são sócios-gerentes da sociedade podem perfeitamente controlar as obrigações que, ao abrigo dos créditos concedidos, façam nascer.

            E ainda que não fossem sócios-gerentes, o controlo resultava em via directa da própria existência do limite dos créditos ( que aliás a exequente A… não terá ultrapassado no seu pedido ) e da pré-definida natureza dos títulos através dos quais as obrigações garantidas podem nascer.

            Nenhuma indeterminabilidade, portanto.

                                                                       *

            Por outro lado, não se pode dizer contrária aos bons costumes ou a princípios de ordem pública a fiança prestada.

            Como já se escreveu no Ac. inédito desta Relação - Proc. nº574/93 ( 12-94 ) - não nos parece que seja, em si mesmo e sem mais, ofensivo dos bons costumes e contrário à ordem pública alguém responsabilizar-se perante uma instituição bancária pelas dívidas contraídas perante ela por uma determinada sociedade.

            Sobretudo porque as sociedades são formadas por pessoas singulares;

            porque a ideia fulcral da sociedade é a criação de riqueza pela associação de capacidade produtiva, seja intelectual seja material, riqueza a distribuir certamente por quem a constituir;

            porque o desenvolvimento dessa capacidade criadora passa às vezes pela utilização de capitais alheios, e quem deles a final aproveita deve assegurar a sua restituição.

            E aqui entra a consideração de que uma garantia como a fiança pode ser , e as mais das vezes é, o factor que permite às empresas o acesso ao crédito, porque só com ela a banca ( legitimamente) aceita correr o risco do financiamento.

            As necessidades práticas do comércio jurídico, que de algum modo nos poderiam empurrar para a solução da nulidade como forma de proscrever a possibilidade de uma vinculação excessiva, ilimitada e «incontrolável» dos cidadãos fiadores, impõem-nos a consideração inversa de não estigmatizarmos excessivamente uma actividade que, em última análise, esses mesmos cidadãos exigem que se processe com a fluidez necessária à sua vida empresarial.

            E bem se sabe como «na aplicação da lei, a moderna doutrina interpretativa manda atender, também, às consequências da decisão» - Meneses Cordeiro, CJ 1992, TI, pág.73.

            Então,

            se quem se apresenta a assumir a fiança, como é o caso, é a mesma pessoa física que pode controlar o nascimento das obrigações afiançadas, é seguro que o objecto da fiança tem de entender-se como determinável, e como conforme aos bons costumes e aos princípios de ordem pública a vinculação respectiva, ainda que à mesma não esteja fixado qualquer limite temporal.

            Limite que aliás, no caso da fiança, sempre existe, ao menos nos termos em que o possibilita o disposto no art.654° do CCivil.

                                                                       *

            Resta a questão da forma exigida para a prestação da fiança. O art.628°, nº1 do CCivil impõe que a vontade de prestar fiança deve ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.

            Esta solução é idêntica à que já resultava do CCivil de 1867, ou seja - exige-se para a fiança uma forma idêntica à exigida para a obrigação principal, solução que se justifica pela relação de acessoriedade em que a fiança se encontra em relação àquela.

            A este propósito escreveu Vaz Serra no seu estudo «Fiança e Obrigações Análogas», BMJ nº71, págs. 51 e 52 - «Mas não deverá subordinar-se a fiança, se a obrigação principal depender de formalidades rigorosas, a essas formalidades ?

            Parece, com efeito, não haver razão para sujeitar a fiança a formalidades menos rigorosas do que as precisas para a obrigação principal. Se há que defender, mediante certas formalidades, quem contrai a obrigação principal, deve com elas defender-se também o fiador, que pode ter de cumprir essa obrigação. Só quando a razão de ser dessas formalidades não seja extensiva à fiança (elas destinam-se, por exemplo, a evitar contestações futuras àcerca do conteúdo da obrigação), é que esta não ficaria submetida a elas. Mas esse caso é raro, pois quase sempre as formalidades têm em vista precaver as partes contra a sua precipitação».

            E escreveu também o mesmo Professor, na Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 106°, pág.203 - «o que o art.628°, nº1 do CCivil impõe é que a vontade de prestar fiança seja expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal. Portanto, se para a obrigação principal não for exigida forma especial, a vontade de prestar fiança pode ser declarada verbalmente».

            Isto significa que, para a consideração da forma exigível à fiança, não importa que as partes do contrato principal tenham voluntariamente adoptado para este uma forma mais pesada, se se não trata de uma forma exigida por lei.

            Ora bem : as obrigações futuras que os RR C… e D… assumirão prescindem de qualquer reconhecimento presencial das respectivas assinaturas - aos mútuos e aberturas de crédito concedidas ou a conceder pela A…, às contas à ordem , aos avales, às letras, etc, basta-se a simples assinatura dos RR.

            Como o simples documento escrito e a assinatura simples bastam à formalização dos contratos de mútuo bancário que abriram caminho à constituição dessa obrigações, presentes ou futuras - Dec.lei nº32765, de 29 de Abril de 1943, nos termos de cujo artigo único os contratos de mútuo ou usura, seja qual for o seu valor, quando feitos por estabelecimentos bancários autorizados, podem provar-se por escrito particular, ainda mesmo que a outra parte contratante não seja comerciante.

            Logo, o contrato de fiança escrito e assinado pelos RR C… e D… preenchem a forma legal exigida para a validade da fiança.

            A fiança prestada por estes é inquestionavelmente válida.

                        DECISÃO

                        Na procedência da apelação, revoga-se o despacho saneador sentença na parte aqui em análise, e julga-se válida a fiança

                        Custas a cargo dos apelados, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

Pires da Rosa (Relator)

Araújo Ferreira

Coelho de Matos