Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2336/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: SERRA LEITÃO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
SUA JUSTIFICAÇÃO
CONTRATOS DE TRABALHO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Data do Acordão: 11/03/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE COIMBRA- 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 41º, Nº 2, DO DL Nº 64-A/89, DE 27/02 . DL Nº 333/79, DE 24/08 .DL 427/89, DE 7/12 .
Sumário: I – As escolas de hotelaria, embora dotadas de personalidade jurídica, fazem parte integrante do Instituto Nacional de Formação Turística, que é um instituto público, dotado de autonomia administrativa, financeira e de património próprio .
II – Através de sucessivos diplomas tem sido proibida a celebração de contratos de trabalho sem termo na administração pública – Dl 35/80, de 14/3; 140/81 ; 166/82, de 10/05; 184/89, de 2/6 .

III – O DL nº 427/89, de 7/12, que veio regulamentar os princípios a que obedece a relação jurídica de emprego na administração pública, determinou que essa relação apenas seja constituída por nomeação e por contrato pessoal, assumindo este as formas de contrato administrativo de provimento ou de contrato de trabalho a termo certo .

IV- Donde a impossibilidade de celebração de contrato de trabalho sem termo com a administração pública, o que, a acontecer, implicará a nulidade do contrato, produzindo apenas efeitos como se válido fosse e em relação ao tempo em que estiverem em execução .

Decisão Texto Integral:
Acordam os Juizes da Secção Social do T. Relação de Coimbra
A..., intentou acção declarativa comum, emergente de contrato individual de trabalho contra B... e C..., alegando em síntese:
A 1ª Ré contratou com a A a prestação de serviços por esta àquela de 1/11/00 a 31/10/01 e de 25/3/02 a 24/7/02;
A A trabalhou sob as ordens e direcção da 1º Ré que diariamente a instruía sobre as tarefas que deveria executar no local de trabalho, onde desempenhava funções inerentes ao serviço de escritório e correspondentes à categoria profissional de 1ª escriturária junto do restaurante de aplicação daquela escola;
Foi fixada a remuneração mensal de € 619, 01 , tendo o contrato a duração de 12 meses.
Em 22/10/01 a 1ª Ré sob comunicação de caducidade do contrato de trabalho veio a provocar a cessação unilateral da prestação de trabalho da A;
Em 25/3/02 a A prosseguiu a colaboração descrita junto da 1ª Ré, sendo que o respectivo contrato foi outorgado pelo D...; sendo a remuneração de € 706, 89, o horário de trabalho de 35h/ semana e tendo a A a categoria de secretária de direcção.
O contrato teria a duração de 4 meses, sendo justificado pela necessidade de substituir a funcionária Sandra Simões, em licença de parto;
Findos aqueles 4 meses os RR comunicaram verbalmente à A que prescindiam da sua colaboração;
A razão da não renovação do com trato inicial residiu tão só na doença prolongada de que a A padeceu nesse período
O 1º contrato foi celebrado na sequência da aprovação do quadro de pessoal pelo Despacho nº 21/00 do Director do D..., onde se considerava o facto de “ estarem reunidas as condições para integração no quadro de pessoal dos estabelecimentos de aplicação do pessoal não afecto á função pública”
As funções de 1ª escriturária correspondem ao suprir de necessidades permanentes da escola e do restaurante de aplicação;
A 1ª comunicação de caducidade do contrato de trabalho é ilegal, pois em causa está um contrato sem termo, já que a ausência de motivo justificativo para o termo opera a nulidade da respectiva estipulação e com a consequente e legal conversão do contrato, em contrato sem termo;
Trata-se de uma cessação ilícita do contrato de trabalho por iniciativa da entidade empregadora , tanto mais que não houve lugar a qualquer processo disciplinar
A entidade patronal deve ser condenada na reintegração da A nas funções de 1º escriturária e a pagar-lhe a importância correspondente ao valor das retribuições que a A deixou de auferir desde 14/9/02 até sentença
Terminou pedindo que os RR sejam condenados a reconhecer a ilicitude da A, a reintegrá-la e a pagar-lhe a importância a apurar correspondente às retribuições que a A deixou de receber desde 14/9/02 até à data da sentença
Não conseguida a conciliação dos litigantes, na audiência de partes, veio o R D... contestar referindo em suma:
O R é um Instituto Público e o contrato de pessoal na administração pública e nos institutos públicos só pode revestir duas modalidades: a de contrato administrativo de provimento ou de contrato a temo certo, que não se converte em caso algum, em contrato sem termo
Todavia, ao contrato a termo celebrado com a A em 1/11/00, não falta motivo justificativo.
Por isso e de qualquer das formas foi lícita a declaração de caducidade emitida pela empregadora
No que concerne ao segundo contrato a termo, uma vez que o motivo justificativo foi a substituição de uma trabalhadora enquanto esta gozava a sua licença de parto, foi igualmente o mesmo celebrado dentro dos condicionalismos legais.
Por tudo isto terminou pedindo que a acção fosse declarada improcedente.
Respondeu a A, mantendo a sua posição inicial e apresentando articulado superveniente( fls. 136 e segs.)
Prosseguindo o processo seus regulares termos veio a final a ser proferida decisão que na procedência da acção:
- declarou nulo o termo do contrato celebrado em 1/11/00 e consequentemente ilícito o despedimento da A;
condenou o R :
1- A reintegrar a A no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade
2- A pagar à A as retribuições vencidas que deixou de auferir desde 14/9/02, no valor de € 14 237, 23.
Discordando apelou Réu, alegando e concluindo:
1º- Sendo o R. aqui recorrente um Instituto Público, não pode aplicar-se o disposto no artº 42º nº 2 e 3 da LCCT, pelo que a nulidade do termo não pode determinar a conversão do contrato em apreço em contrato sem termo
2º- O contrato de pessoal na Administração Pública e os Institutos Públicos, considerando as disposições conjugadas dos artºs 2º e 14º do D.L. 427/89 de 7/12, só podem revestir a modalidade de contrato administrativo de provimento ou contrato de trabalho a termo certo, o que significa que de acordo com o artº 18º nº 4 de tal diploma, o contrato a termo certo não se converte, em caso algum, em contrato sem termo, contrariamente ao defendido pelo Mtº Juiz do Tribunal “ a quo”
3º- O D.L. 427/89 teve presente as situações contratuais relativas ao pessoal admitido a título precário, de raiz irregular, que se institucionalizaram como verdadeiras relações de trabalho subordinado, consagrando um processo de regularização da sua situação jurídica, que culminaram nuns casos com a contratação a termo certo e noutros com a integração nos quadros de pessoal ou nos quadros efectivos interdepartamentais;
4º- Esta modalidade de contrato de trabalho a termo certo, prevista pelo D.L. 427/89 rege-se pela lei geral sobre o contrato a termo certo, com as especialidades constantes do artº 14º nº 3 do D.L. 427/89
5º- Com a entrada em vigor do D.L. 427/89 é vedada a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por formas diferentes das nele previstas( artº 43º nº1);
6º Se tivermos em conta o estatuído no nº 1 daquele artº 14º e o nº 2 do artº 7º do D.L. 184/89 de 2/6, resulta com evidência a intenção da lei afastar qualquer possibilidade de celebrar contratos de trabalho que não refira a forma de contratos a termo certo;
7º O carácter proibitivo destes artºs no que respeita à celebração de contratos de trabalho sem termo não levanta dúvidas e revestindo essa norma carácter imperativo, os contratos celebrados em contravenção a tal norma não podem deixar de se considerar nulos, nos termos do artº 294º do CCv
8º Atento o atrás exposto e contrariamente ao entendimento perfilhado pelo Mtº Juiz do Tribunal “ a quo” ( que remete a disciplina do contrato celebrado em 1/11/00 entre as partes para a LCCT e a “ lei geral do contrato individual de trabalho e CCT aplicável”) temos que há que concluir pela nulidade do termo aposto no contrato por violação dos artºs 18º nº 2 e) do D.L. 427/89 e do artº 41º nº 1 b), mas tal nulidade é apenas geradora de responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de actos ilícitos por parte dos dirigentes da Ré, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço, algo que obviamente nesta se não incumbe curar, não sendo pois aplicável o disposto no artº 42º nºs 2 e 3 , na parte em que se dispõe sobre a conversão em contrato sem termo.
Contra alegou a recorrida defendendo a Justeza da sentença impugnada.
Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, tendo o Ex. mo SR. PGA emitido douto parecer no sentido da procedência da apelação, cumpre decidir.
Dos Factos
Foi a seguinte a factualidade dada como assente na 1ª instância
1- A 1ª Ré é uma escola pública de hotelaria a funcionar em Coimbra e no âmbito desta, foi constituído por despacho nº 3/2000 do Director Geral do INFT, um estabelecimento de restauração de aplicação; e o Despacho nº 21/00 veio aprovar o quadro de pessoal a contratar no âmbito de tal estabelecimento;
2- A primeira Ré contratou com a A a prestação de serviços desta àquela, de 1/11/00 a 31/10/01 nos termos constantes do contrato junto a fls. 15 a 17 e a A prestou-os ainda à Ré, de 25/3/02 a 24/7/02;
3- A A trabalhou sob as ordens da 1º Ré, que diariamente instruía a A sobre as tarefas que deveria executar no local de trabalho, onde desempenhava funções inerentes ao serviço de escritório e correspondentes á categoria profissional de 1ª escriturária junto do restaurante de aplicação daquela escola, com recurso a materiais e equipamentos propriedade da 1º Ré e nas próprias instalações desta;
4- O horário de trabalho era de 40h/semana divididas em 8h/ dia, com dois dias de descanso semanal e vinte e dois dias úteis de férias por ano;
5- A esta prestação de trabalho foi fixada a remuneração mensal de € 619, 01 com direito a subsídio de férias e de Natal no valor idêntico à remuneração mensal e a duração de 12 meses;
6- A A , não obstante o período conturbado de saúde que atravessou durante o tempo que prestou os serviços supra descritos, cumpriu sempre com zelo e diligência as respectivas funções, obedecendo à 1ª Ré nas ordens que lhe eram dirigidas,
7- Em 22/1/01 a 1ª Ré veio provocar a cessação unilateral da prestação de trabalho da A, por comunicação enviada nessa precisa data da caducidade do contrato de trabalho, nos termos constantes do doc. de fls. 18 e 19;
8- E a razão da não renovação do contrato residiu tão só na doença prolongada de que padeceu nesse período;
9- Em 25/32 a A prossegui a colaboração supra descrita junto da 1ª Ré, com base num contrato outorgado pelo INFT, sendo a remuneração de € 7 06, 89, o horário de trabalho de 35h/ semana e 7 h/ dia, a categoria de secretária de direcção e pelo prazo de 4 meses, justificado com a necessidade de substituir a funcionária Sandra Isabel Fernandes Simões, em licença de parto;
10- Passados estes 4 meses os RR comunicaram verbalmente à A que prescindiam da sua colaboração;
11- O 1º contrato referido em 2 foi celebrado na sequência da aprovação do quadro de pessoal pelo Despacho nº 21/00 do Director do INFT, onde expressamente se considerava o facto de se encontrarem “ assim reunidas as condições para integração no quadro de pessoal dos estabelecimentos de aplicação do pessoal não vinculado à função pública”
12- E as funções de 1ª escriturária correspondem ao suprir de necessidades permanentes da escola e do restaurante de aplicação;
13- A A em16/8/02 enviou ao R. que o recebeu, o requerimento de fls. 25 a 27;
14- A A retomou funções portadora de fls. 100, emitida pelo R, atenta a realização nos presentes autos da tentativa de conciliação;
15- Os RR notificados para esclarecer os termos do acordo obtido, respondeu o R Intfur afirmando que ser o seu entendimento o expresso na declaração referida em 13 e que não era o reconhecido, nem coincidia com o da Secretária de estado do Turismo de que dependia;
16- O Secretário de Estado veio a entender que a A está vinculada ao abrigo de um contrato de trabalho a termo, devendo permanecer ao serviço ao abrigo da autorização de renovação do contrato de trabalho a termo certo
17- No dia 3/3/03 a A foi notificada da deliberação nº 3/2003 da direcção da B... que lhe atribuía funções de tesoureira, acrescendo ao vencimento que auferia, a partir de então, o pagamento adicional de abono para falhas;
18- No dia 11/3/03 o Presidente do Conselho de Administração da Ré informou a A que o contrato de trabalho a termo certo não seria renovado, razão pela qual a partir de 25/3/03 deixaria de exercer funções nos serviços da D...- B..., comunicação de que a A teve conhecimento em 13/3/03;
19- Em consequência da interposição da presente acção e dos factos descritos de 13 a 17 a A sofreu desconforto devido à indefinição de um projecto de vida, angústia, ansiedade, alterações de humor e irritabilidade.
Do Direito
Sabe-se que é pelas conclusões das alegações, que se delimita o âmbito da impugnação- artºs 684 n.º 3 e 690º nºs 1 e 3 ambos do CPC-.
Pelo que no caso em apreço cumpre dilucidar, se no contrato em apreço a ausência de justificação da aludida contratação a termo, poderá ter a consequência prevista na LCCT, ou seja a sua conversão em contrato sem termo( cfr. art.41º nº 2 do D.L. 64-A/89 de 27/2 ) o que – a verificar-se- faria com que a comunicação do R no sentido da caducidade do contrato, configurasse um despedimento ilícito, desde logo por não precedido do necessário processo disciplinar( artº 12ºn nº 1 a) do D.L. 64-A/89).
Vejamos então:
Cremos ser inquestionável que o contrato em causa, ao ser celebrado com a B..., o foi com um Instituto Público, ou seja com uma pessoa colectiva instituída para permitir uma gestão mais ágil e eficiente de certos interesses colectivos que , em primeira linha competiriam directamente ao Estado( cfr. Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, Vol. I. , 10ª ed. págs. 187 e segs.
Na realidade e de acordo com o disposto no artº 1º nº 1 do D.L. 333/79 de 24/8,( que vigorava na altura em que o convénio em análise foi celebrado) o Centro Nacional de Formação Turística e Hoteleira, criado e regulamentado pelo D.L. nº 46. 354 e pelo D.L. nº 46355, ambos de 26/5/65, passava a denominar-se Instituto Nacional de Formação Turística, gozando de personalidade jurídica e sendo dotado de autonomia administrativa, financeira e de património próprio.
Por seu turno o artº 4º nº 1 do mesmo diploma( D.L. 333/79,) estabelecia que o este Instituto compreendia , órgãos, serviços e estabelecimentos , sendo que( e já na redacção que lhe foi dada pelo D.L. 258/99 de 7/7) o nº 4 da mesma norma considerava como estabelecimentos do Instituto as escolas de hotelaria e turismo e os hotéis e os estabelecimentos de restauração e aplicação.
Acresce que, embora as ditas escolas de hotelaria e turismo dispusessem de personalidade jurídica, dependiam hierárquica, administrativa e financeiramente do Instituto.
Por outro lado e de acordo com o artº 6º nº 1 e) ainda do D.L. 333/79 competia especialmente ao director do Instituto superintender na gestão das escolas hoteleiras e nos hotéis de aplicação.
Ainda o seu artº 3º a) dispunha que para a realização das suas atribuições competia nomeadamente ao Instituto “ criar, manter e desenvolver as estruturas e os meios necessários à formação profissional turística, nomeadamente escolas, hotéis de aplicação, estabelecimentos de restauração de aplicação, curso móveis e formação de monitores.”
Por tudo isto, somos levados a concluir que as ditas escolas de hotelaria embora dotadas de personalidade jurídica, fazem parte integrante do tal INFT, sentido no qual aponta, a nosso ver decisivamente o dito artº 4º nº1 , ao referir- repete-se- que o Instituto compreenderá órgãos , serviços e estabelecimentos , sendo que as escolas de hotelaria são um destes.
Temos assim que o contrato foi celebrado com uma entidade que organicamente pertence a um Instituto Público.
E daí que em princípio se deva aplicar o regime estabelecido para as contratações relativas à administração pública.
Ora e através de sucessivos diplomas ( D.L. 35/80 de 14/3, 140/81 de 39/5- artºs 9º e 10º- 166/82 de 10/5– artºs 3º e 12º- 184/89 de 2/6- artºs 5º, 7º e 9º) foi sendo proibida na A Pública a celebração de contratos de trabalho sem termo.
E o D.L. 427/89 de 7/12, que veio regulamentar os princípios a que naquela obedece a relação de jurídica de emprego, determinou ( seu art.º 3º) que essa relação se constituísse somente por nomeação e contrato pessoal.
Este podia assumir as formas de contrato administrativo de provimento, conferindo ao outorgante a qualidade de agente administrativo ou de contrato de trabalho a termo certo, que não atribuindo ao trabalhador aquele estatuto, se regeria pela lei geral sobre os contratos a prazo, com as especialidades constantes desse diploma( art.º 14).
Portanto e também aqui a impossibilidade de celebração de contrato de trabalho sem termo.
Aliás e por acórdão com força obrigatória geral publicado no DR I- A de 30/11/00, o T. Constitucional veio declarar a inconstitucionalidade do citado art.º 14º n.º 3 , na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado, se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no n.º 2 do art.º 47º da C.R.
Na realidade este normativo, estabelece que “ todos os cidadãos têm direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”.
Ora a possibilidade de conversão dos contratos com termo em contratos sem termo, viria ofender de forma intolerável o direito de acesso em condições de igualdade, ali previsto.
Aliás a impossibilidade de tal conversão já tinha sido consagrada no D.L. 280/85 de 22/7, que todavia veio a ser declarado inconstitucional.
Por outro lado art.º 43º n.º 1 do citado D.L. 472/89 é explícito ao estabelecer que a partir da entrada em vigor do presente diploma é vedada aos serviços e organismos referidos no art.º 2º( ou sejam serviços e organismos da A Central, bem como institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do estado e de fundos públicos) a constituição de relações de emprego de carácter subordinado por forma diferente das previstas no presente diploma.
Resulta pois deste regime, que a celebração de contrato sem termo com a A. Pública( lato sensu) implica a nulidade do contrato, produzindo este efeitos como se válido fosse em relação ao tempo em que estivessem em execução( art.º 15º n.º 1 da LCT).
Na verdade, só através da nomeação ( acto unilateral da Administração pelo qual se preenche um lugar do quadro e se visa assegurar de modo profissionalizado, o exercício de funções próprias do serviço público que revistam carácter de permanência- artº 4º nº1 do D.L. 427/89), é que o trabalhador fica por principio vinculado definitivamente à Administração( cfr. artº 6º do mesmo diploma), pois mesmo o contrato administrativo de provimento embora confira como se referiu a qualidade de agente administrativo, apenas assegura o exercício de funções públicas transitoriamente( artº 15º nº1 ainda do citado D.L. 427/89).
Se se entendesse que tal convénio era válido isso significaria que o trabalhador nessas condições, ficava com vínculo definitivo à função pública ao arrepio do ordenamento jurídico que rege para a constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na A Pública, ofendendo-se assim também o princípio constitucional constante do art.º 47 n.º 2 da C.R., que na altura da celebração do contrato em causa, vigorava e que se continua a manter na nossa Lei Fundamental, segundo o qual que o acesso à função pública, se faz em regra por via de concurso.
E pelos mesmo motivos , a contratação a termo feita de forma ilegal( ou porque não é explicitado o motivo justificativo, ou porque este é falso, ou ainda porque a situação não se integra em nenhuma das hipóteses que permitem este tipo de contratação) não pode ter como consequência a conversão do convénio em contrato sem termo.
Daí que a cessação unilateralmente operada pela empregadora, não pode configurar um despedimento ilícito com as consequências para o infractor previstas no artº 13º n.º 1 a) do D.L 64-A/89, nem por qualquer forma tem a A o direito reintegração que peticionou, o qual aliás lhe poderia conferir a qualidade de “ funcionária pública”, o que como se viu é manifestamente vedado, até por imperativo constitucional.
Do facto de o contrato ser nulo apenas advém o efeito de ele ser considerado como se fosse válido durante o tempo em que esteve em execução( artº 15º nº 1 da LCT, já citado).
É certo que de acordo com o artº 26º nº 2 do D.L. 333/79 ( redacção do D.L. 258/99- que aliás apenas aditou a referência a restaurantes de aplicação, em vez de se cingir aos hotéis de aplicação como a primitiva redacção fazia) “ a vinculação jurídica, incluindo o regime disciplinar de todo o pessoal do quadro de hotéis de aplicação e dos restaurantes de aplicação é regida pela legislação de trabalho aplicável aos estabelecimentos hoteleiros e estabelecimentos de restauração e de bebidas”.
E foi com base neste normativo que no Tribunal recorrido se partiu para decidir pela conversão do contrato a termo, em contrato sem termo.
Mas – salvo o devido respeito- cremos que a solução não é correcta.
É fora de dúvidas que o legislador do D.L. 258/99 de 7/7, não podia desconhecer a existência do D.L. 427/89 e portanto a proibição legal de contratação por tempo indeterminado ou a conversão de contrato a termo em contrato sem prazo.
Além disso os ditos estabelecimentos nem sequer são dotados de personalidade jurídica.
Daí que esta norma apenas poderá ser interpretada( e para que desta forma se harmonize todo o sistema jurídico relativo a este tipo de contratações) no sentido de que as normas dos contratos de trabalho privados relativos aos estabelecimentos hoteleiros e de restauração e de bebidas são aplicáveis às relações laborais estabelecidas com o pessoal do quadro dos ditos estabelecimentos( hotéis e restaurantes de aplicação) tão só na medida em que não vão contra o estabelecido no citado D.L. 472/89, mormente no que tange à contratação sem termo, ou à conversão nesta por eventual ilegalidade do termo, da que foi feita a prazo.
Nomeadamente no que concerne à vinculação jurídica, os trabalhadores que como a A exercem funções nos hotéis ou restaurantes de aplicação, não a adquirem, contrariamente ao pessoal dos quadros do Instituto e das escolas por nomeação ou por provimento,( cfr. artº 30º nº1 do D.L. 33/79), mas sim por contrato individual de trabalho, mas somente- e pelas razões explanadas- inevitavelmente, a termo.
Doutro modo seria fazer “ tábua rasa” do disposto no aludido artº 43º nº1 do D.L. 472/89 que de forma imperativa determina que a partir da sua entrada em vigor é vedada aos serviços e organismos referidos no seu artº 2º( ou seja serviços e organismos da A Central e institutos públicos) a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por forma diferente às que nele estão previstas.
E ao permitir- se a conversão contratual pretendida, a consequência seria a integração da A nos quadros do actual C... ( D...)- já que os ditos restaurantes de aplicação como se referiu, são meros estabelecimentos desta entidade, sem terem sequer personalidade jurídica distinta- como funcionária ou agente do Estado( cfr. artº 3º nº1 do D.L. 277/01 o que viola frontalmente as normas constitucionais supra mencionadas.
Por todos estes motivos, concluímos( como já se referiu) que a comunicação do empregador não configura um despedimento ilícito, pelo que a pretensão da A não pode ser acolhida.
E assim sendo julgando - se procedente a apelação, revoga-se a decisão recorrida, absolvendo-se consequentemente o R do peticionado.
Custas pela A sem prejuízo do apoio judiciário de que goza.