Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
170/2001.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
INDEMNIZAÇÃO
PRESCRIÇÃO
PRAZO
PENDÊNCIA DA ACÇÃO PENAL
MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO PELA RELAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS FUTUROS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 09/15/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE VISEU – 2º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 498º, Nº 3, E 564º DO C. CIV.; 71º CPP; 712º CPC.
Sumário: I – O prazo de prescrição mais longo, previsto no nº 3 do artº 498º do C. Civ., é aplicável também aos responsáveis meramente civis, com base na unidade do sistema jurídico, respondendo a seguradora nos mesmos termos do seu segurado e estando sujeita ao mesmo prazo de prescrição, na medida em que esta substitui o lesante.

II – A pendência de processo penal constituirá sempre impedimento ao exercício em separado do pedido de indemnização civil, face ao princípio da adesão obrigatória do pedido civil, consagrado nos artºs 29º e 30º do CPP/1929 e no artº 71º do actual CPP.

III – É orientação jurisprudencial prevalecente a de que o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e na avaliação da respectiva credibilidade tem que reconhecer-se que o tribunal a quo está em melhor posição.

IV – O depoimento de parte (é um meio técnico de provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento de factos favoráveis à parte contrário – artº 352º CC) ou conduz à confissão e, neste caso, deve ser reduzido a escrito, com força probatória plena (artº 563º CPC e 358º, nº 1, CC) ou não conduz à confissão e, nestes casos devem valorar-se as declarações não confessórias de acordo com a livre apreciação do tribunal – artº 358º, nº 4, e 361º do CC.

V – Provando-se que a A. sofreu 15% de IPP, à qual acresce mais 5% de dano futuro, sendo as suas sequelas muito importantes em termos de rebate profissional, exigindo um esforço acrescido para o desempenho da sua actividade habitual, é inquestionável tratar-se de um dano patrimonial futuro, a merecer ser indemnizado – artº 564º, nº 2, CC.

VI – Mesmo nos casos em que o lesado não exerce qualquer actividade profissional remunerada ou exercendo-a não houve perda de salário ou de rendimento, tanto a doutrina como a jurisprudência são unânimes no sentido da ressarcibilidade do dano, com recurso à equidade.

VII – A indemnização pelos danos não patrimoniais não visa reconstituir a situação que existiria se não ocorresse o evento, mas sim compensar o lesado, tendo também uma função sansionatória sobre o lesante (natureza mista).

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I - RELATÓRIO

1.1. - A Autora - A... – instaurou (1/3/2001) na Comarca de Viseu acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra a Ré -B... , actual C....
Alegou, em resumo:
No dia 25 de Abril de 1996, quando caminhava pela berma da EN 16 ( valeta do lado esquerdo sentido Viso/Viseu), no lugar do Viso, juntamente com outras pessoas em peregrinação a Fátima, foi atropelada pelo veículo de matrícula XM-20-86, conduzido pelo proprietário D..., que circulava em sentido contrário ( Viseu/Viso).
O acidente deu-se por culpa exclusiva do condutor do XM por circular desatento a uma velocidade superior a 70 Km/hora, tendo-se posto em fuga.
Em consequência, a Autora sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais.
Pediu a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 4.380.000$00 e a quantia que se liquidar em execução de sentença quanto a danos futuros.
Contestou a Ré defendendo-se, em síntese, por excepção, ao arguir a prescrição, e por impugnação, tendo requerido a intervenção acessória provocada do condutor do veículo, D....
Contestou o interveniente excepcionando a prescrição e por impugnação negou haver participado no acidente.
Replicou a Autora.

1.2. - No saneador (fls.112 a 119) julgou-se improcedente a excepção da prescrição.

1.3. - Inconformado, o interveniente recorreu de agravo ( fls.129 e159), com as seguintes conclusões:
1º) - A Autora não estava sujeita ao princípio da adesão ao processo crime que foi arquivado por amnistia, para efeitos de deduzir o pedido de indemnização, tanto mais que notificada para o efeito, não o fez.
2º) - Por outro lado, verificam-se as circunstâncias das alíneas c), f) e h) do art.72 do CPC, enquanto excepções ao princípio da adesão obrigatória, não ocorre o diferimento do início do prazo de prescrição, nos termos do art.306 nº1 do CC.
3º) - O despacho violou os arts.498 nº1, 306 nº1 CC, 72 nº1 c), f) g), 71 do CPC.
Não houve contra-alegações.

1.4. - Na audiência de 13 de Maio de 2005 ( fls.451) foi inquirida a testemunha F....
Após o depoimento, o interveniente deduziu o incidente da contradita, requerendo que fosse perguntado à testemunha se admitia ou não o que acabara de fazer constar do requerimento no que se refere às declarações prestadas no inquérito.
O M.mo Juiz proferiu o seguinte despacho:
“ A contradita ora requerida visa claramente abalar a credibilidade do depoimento da testemunha F..., diminuindo a fé que ela possa merecer.
“ Assim, verificados que se mostram os requisitos do art.640 e 641 nº1 do CPC, recebe-se a contradita em apreço”.
Após audição da testemunha, o interveniente requereu a junção de uma certidão extraída do processo de inquérito.
Foi proferido o seguinte despacho:
“ O objecto da contradita reporta-se unicamente às declarações prestadas pela testemunha Abel na fase de inquérito.
Nesse particular, porque nem tudo o que então disse agora confessou, são de admitir as declarações prestadas no Ministério Público em 4/5/99 e constantes da certidão ora apresentada.
No mais, a certidão incorpora uma participação do acidente, duas declarações prestadas em inquérito pela autora e dois despachos do Ministério Público, o que tudo extravasa o objecto da contradita.
A participação do acidente e aqueles despachos foram juntos em fase anterior destes autos. Já referidas declarações da ora autora mais não são do que o depoimento escrito da mesma, que o chamado agora não pode requerer nesta acção, e jamais sujeitas ao contraditório das restantes partes nestes autos.
Assim, admitindo-se a certidão apenas quanto às declarações da testemunha F..., no mais rejeita-se a sua junção e consequentemente desincorporado que seja daquela certidão, ordena-se a devolução do restante ao apresentante.
Condena-se o chamado D... nas custas do incidente da contradita, com taxa de justiça equivalente a 1 Uc, já que o incidente lhe aproveitou, sem oposição da parte – art.16 do CCJ”.

1.5. - Inconformado, o interveniente recorreu de agravo, com as conclusões:
1º) - O M.mo Juiz não devia desmembrar a certidão, mandando arrancar as peças que no seu entender não interessavam, tanto mais que foi logo alertado para o facto de que o requerente pretendia utilizar a certidão para provar factos alegados na contestação.
2º) – O incidente da contradita foi recebido e não obstante isso o requerente foi condenado nas custas do mesmo, sem fundamento legal.
3º) – O despacho violou os arts.446 e 515 do CPC.

1.6. – A Autora ampliou o pedido ( fls.450, 457, 532) pelos danos não patrimoniais, correspondente ao quantum doloris e dano estético, no valor de 22.469,95 euros, pelos danos patrimoniais relativos à incapacidade temporária e permanente, em 5.650,00 e 25.000,00 euros, respectivamente.

1.7. – Realizada audiência, foi proferida sentença ( fls.785 a 790) que, na parcial procedência da acção decidiu condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de €49.800 (€20.500 + €24.000,00 + €5.300), acrescida do montante a liquidar correspondente às sobreditas despesas de deslocação hospitalar e medicamentosas.

1.8. – Inconformados, a Ré ( fls.807) e o interveniente D...( fls.796) recorreram de apelação.

1.8.1. – Recurso da Ré ( fls.825) – Conclusões:
1º) - Não tendo sido apurado o vencimento líquido da Autora, o montante de 500,00 euros estabelecido na sentença como ponto de referência é manifestamente excessivo, tanto mais que o salário mínimo nacional era então de 272,34 euros.
2º) - Para efeitos do cálculo da indemnização deverá ser levado em conta o vencimento mensal de 350,00 euros, pelo que o valor da indemnização pelo dano patrimonial futuro não pode ser superior a 12.500,00 euros.
3º) - O valor de 20.500 euros atribuído na sentença a título de indemnização pelos danos não patrimoniais é excessivo, devendo reduzir-se para 15.000 euros.
4º) - A sentença violou os arts.483, 496, 562 e 473 do CC.

1.8.2. – Recurso do Interveniente ( fls.841) – Conclusões:
1º) - Existe erro na apreciação da prova porque os factos dos quesitos 5º e 6º da BI e dos quesitos 8º, 13º a 19º, na medida em que se refere ao XM ao recorrente como condutor, foi incorrectamente julgada ao ser dada como provada.
2º) – Nenhuma das testemunhas declarou o que quer que fosse no sentido de confirmar a intervenção do recorrente no acidente.
3º) - No que se refere à alegada confissão do recorrente, ela não existe, e sempre seria indivisível ( art.360 CC ), pelo que o tribunal não podia aproveitar apenas alguns factos como confessados sem aceitar os demais.
4º) – Não podia o tribunal tomar como referência o valor de 500 euros para o cálculo da indemnização quando foi a Autora que alegou que ganhava 60.000$00/mês e o tribunal deu como provado que era um montante não concretamente apurado.
5º) – Atendendo ao salário mínimo nacional, o dano patrimonial futuro importa em 12.500,00 euros.
6º) – A indemnização pelo dano não patrimonial deve ser fixada em valor não superior a 12.500,00 euros.
7º) – A sentença violou os arts.563 nº1, 360 e 562 do CC.

Não houve contra-alegações.
II - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. - 1º AGRAVO
O agravo tem por objecto o despacho saneador que julgou improcedente a excepção da prescrição.
Nele considerou-se que a pendência do processo de inquérito constituiu impedimento legal ao exercício do direito ( art.306 nº1 do CC ), logo iniciando-se o prazo prescricional de três anos em 17/8/1999 ( notificação do arquivamento ) não estava decorrido aquando da citação.
Objecta o agravante dizendo que a pendência do processo crime não interrompeu a prescrição, por não haver lugar à adesão obrigatória.
Sendo a responsabilidade de natureza extracontratual, o prazo de prescrição é de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa responsável e da extensão integral dos danos ( art.498 nº1 do CC ).
Porém, estabelece o nº3 do citado artigo - “Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo de prescrição aplicável”.
Entendeu o legislador que se os factos integram ilícito criminal e o prazo de prescrição do crime for superior não faria sentido restringir a possibilidade do exercício do direito antes que decorresse o prazo mais longo da prescrição criminal.
Na verdade, para que a acção cível seja admitida nos termos do art.498 nº3 do CC, basta que o facto ilícito constitua crime e que a prescrição do respectivo procedimento penal esteja sujeito a um prazo mais longo que o previsto para aquela, não estando subordinada à condição de simultaneamente correr procedimento criminal contra o lesante, pelos mesmos factos. É que o alongamento do prazo prescricional radica na especial qualidade do ilícito e não na circunstância de se demonstrar, em sede penal, o respectivo crime, tornando-se indiferente a amnistia ( cf. ANTUNES VARELA, RLJ ano 132, pág.46, Ac do STJ de 22/2/94, C.J. ano II, tomo I, pág.126, de 20/2/2001, C.J. ano IX, tomo I, pág. 126, de 24/10/2002, C.J. ano X, tomo III, pág.104 ).
Questão mais controversa é a de saber se o alongamento do prazo de prescrição, previsto no art.498 nº3 do CC, é comunicável aos responsáveis meramente civis, como o comitente e a seguradora, sobre a qual se tem afirmado duas correntes jurisprudenciais.
Deve acolher-se, porém, contra a posição de ANTUNES VARELA ( RLJ ano 123, pág.25 e ano 124, pág.30 e segs. ), o entendimento de que o prazo mais longo é aplicável também aos responsáveis meramente civis, cujo argumento essencial, com base na unidade do sistema jurídica, não arranca tanto do regime da solidariedade, postulando antes uma nova metodologia, cujo enfoque se situa nos termos em que respondem os responsáveis meramente civis ( cf., por ex., Ac do STJ de 8/6/95, BMJ 448, pág.363, de 6/7/93, C.J. ano I, tomo II, pág. 180, de 22/2/94, C.J. ano II, tomo I, pág.126 ).
Respondendo a Ré Seguradora nos mesmos termos do seu segurado, está sujeita ao prazo de prescrição que se verificar em relação a ele, pois a obrigação de indemnizar funda-se no próprio contrato de seguro que a vincula a ressarcir as indemnização devida ao lesado.
Na situação concreta teve lugar a abertura de um processo de inquérito ( nº24/97 ), em que se investigava a existência do crime de ofensa à integridade física por negligência ( art.148 nº1 do CP) e de um crime de omissão de auxílio ( art.200 nº1 e 2 do CP) ambos imputados ao condutor do XM, D... e que culminou com despacho de arquivamento, por amnistia em relação à ofensa à integridade física ( art.7º da Lei 29/99 de 12/5) ( cf. fls.35 e 36).

Importa analisar da relevância deste processo para efeitos da interrupção da prescrição do prazo trienal, previsto no art.498 nº1 do CC.
Face ao princípio da adesão obrigatória, consagrado nos arts.29 e 30 do CPP/1929, a jurisprudência era praticamente uniforme no sentido de que o prazo de prescrição civil apenas se iniciava com a notificação ao lesado do arquivamento ou absolvição em processo penal.
Argumentava-se que a instauração e decurso do processo penal funcionava como causa impeditiva do exercício do direito à indemnização, nos termos do art.306 do CC, devido ao princípio da adesão obrigatória, já que o prazo de prescrição não começaria a correr enquanto o direito não pudesse ser exercido ( cf., por ex., LOPES DO REGO, RMP ano 8º, nº32, pág.158 e segs.; Ac do STJ de 25/6/85, BMJ 348, pág.410, de 4/2/86, BMJ 354, pág.505).
O actual CPP/1987 consagra o princípio da adesão obrigatória no art.71, alargando, contudo, no confronto com o anterior art.30 do CPP/29, as causas de cessação.
Questiona-se, agora, se esta amplitude, designadamente nos casos em que existam responsáveis meramente civis, é susceptível de reduzir os impedimentos ao exercício do direito à indemnização, com duas posições jurisprudenciais divergentes:
a) - Uma, no sentido de que nas situações de excepção ao regime de adesão obrigatória do pedido cível (art.72 do CPP/87 ) não se verifica diferimento do início do prazo de prescrição do direito à indemnização, por existir a possibilidade de deduzir em separado a acção cível, pelo que não tem aplicação o art.306 nº1 do CC ( cf., por ex., Ac RC de 11/1/94, C.J. ano XIX, tomo I, pág.16 );
b) - Outra, dogmaticamente mais consistente e que aqui se adopta, defende que a pendência do processo penal constituirá sempre impedimento, argumentando-se que a possibilidade de deduzir em separado a acção cível fica na disponibilidade do lesado, como resulta da interpretação literal e teleológica, por tais excepções ao princípio da adesão obrigatória serem estabelecidas em benefício e no interesse do lesado, logo não se traduz numa imposição ou poderes-deveres, mas antes direitos potestativos ou faculdades, e, por outro lado, a pendência do processo crime representa uma interrupção contínua ( art.323 nº1 e 4 do CC ) ( cf., por ex., Ac do STJ de 22/11/04, C.J. ano XII, tomo I, pág.37, de 6/10/2005, em www dgsi.pt, Ac da RC de 5/11/96, C.J. ano XXI, tomo V, pág.7, Ac RP de 26/6/2006, disponível em www dgsi.pt ).
E também é dominante o entendimento de que a interrupção da prescrição se aplica aos responsáveis meramente civis, como a seguradora, na medida em que estes substituem o lesante ( cf., por ex., Ac do STJ de 2/12/86, BMJ 362, pág.514, de 22/2/94, C.J. ano II, tomo I, pág.126 ).
O processo de inquérito nº24/97 foi arquivado, por despacho de 11 de Maio de 1999, tendo a Autora sido notificada (também para deduzir o pedido cível no inquérito, nos termos do art.11 nº2 e 3 da Lei nº29/99) em 17 de Setembro de 1999.
Daqui resulta que o prazo de prescrição se interrompeu com a pendência do processo-crime e se iniciou com a notificação da decisão de arquivamento.
Como a acção deu entrada em juízo em 1 de Março de 2001, sendo a Ré citada 7 de Março de 2001, é manifesto não estar esgotado o prazo de prescrição de três anos.
Improcede o agravo, confirmando-se o despacho recorrido.

2.2. - 2º AGRAVO
Está em causa o mérito do despacho exarado em acta ( fls.454 e 455) que admitiu a certidão apenas quanto às declarações da testemunha F..., rejeitando os demais elementos dela constantes e condenou o requerente nas custas.
O tribunal a quo qualificou de contradita o incidente suscitado pelo interveniente em relação à testemunha, com fundamento em ser divergente o depoimento prestado em julgamento do que havia prestado em inquérito. Tem-se entendido que nestes casos é admissível o incidente da contradita, face ao disposto no art.640 do CPC (cf., por ex., Ac do STJ de 13/10/98, www dgsi.pt ).
Recebida a contradita e ouvida a testemunha sobre a matéria alegada, “quando esta não seja confessada, a parte pode comprová-la por documentos ou testemunhas” ( art.641 nº2 CPC).
Foram rejeitados a participação do acidente e despachos do Ministério Público porque tais elementos já constavam do processo.
Quanto às declarações prestadas pela autora no inquérito, a rejeição foi justificada pela circunstância de não assumirem valor probatório.
Com efeito, dada a ausência do contraditório, o depoimento da autora em inquérito, quando muito, apenas vale como “ princípio de prova”, por imposição do art.522 nº1 do CPC.
Logo, não constituindo prova documental, nem valendo aqui como prova testemunhal, justificava-se a rejeição.
O tribunal condenou o requerente do incidente nas custas porque dele tirou proveito, sem que houvesse oposição da parte contrária.
A tributação está conforme o art.446 nº1 do CPC, pois não tendo havido oposição ao incidente, quem dele tirou proveito foi o requerente (cf., neste sentido, MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, pág.343, nota 1).
Improcede o agravo.

2.3. - AS APELAÇÕES

2.3.1. – O objecto das apelações:
Impugnação de facto ( quesitos 5º, 6º, 8º, 13º a 19º);
A indemnização pelo dano patrimonial futuro;
A indemnização pelo dano não patrimonial.

2.3.2. – Os factos provados ( descritos na sentença ):
Em 25.04.1996, cerca das 5.45 horas, a Autora foi vitima de um acidente de viação. (A/)
Aquando da ocorrência do acidente de viação foi instaurado procedimento criminal contra o Réu nos serviços do Ministério Público do Trib Jud de Viseu sob o nº24/97 ( B/)
Nesta data o veículo automóvel ligeiro, maca Volkswagen, modelo Polo, matrícula XM-20-86, propriedade de D..., tinha a responsabilidade civil emergente de acidentes de viação transferido para a Ré Companhia de Seguros, por contrato de seguro titulado pela apólice n° 139242. (C/).
O acidente de viação referido em A) ocorreu na Estrada Nacional n° 16, no Viso, concelho de Viseu. ( r.q.1º)
A Autora caminhava pela berma esquerda da estrada - valeta do lado -, considerando o sentido de marcha Viso/Viseu, junto ao stand de automóveis situado entre as bombas da “Lemos & Irmão” e a “Sol”. ( r.q.2º)
A Autora fazia parte de um grupo de pessoas que se dirigiam em fila única a uma peregrinação a Fátima. ( r.q.3º)
Tal grupo era formado por cerca de 6 pessoas. ( r.q.4º)
Nas descritas condições a Autora foi colhida pelo veículo XM-20-86. ( r.q.5º)
Este veículo era à data do acidente conduzido por D..., que ciculava dentro da cidade de Viseu. ( r.q.6º e 8º)
O local do acidente configurava uma recta e o condutor do XM circulava no sentido Viseu – Viso, saiu da sua hemi-faixa de rodagem e foi embater na Autora, que em consequência do embate caiu no chão ( r.q.9º, 11º, 13º, 14º e 15º).
O chamado, após o embate e ciente deste, não prestou qualquer auxílio à atropelada, prosseguindo a sua marcha sem imobilizar o veículo XM ( r.q.16º a 19º).
Logo após o acidente a Autora foi socorrida pelos acompanhantes e transportada para o serviço de urgências do Hospital Distrital de Viseu ( r.q.21º).
Como consequência directa e necessária do embate a Autora sofreu fractura do terço distal da perna direita, onde lhe foram aplicados ferros ( r.q.22º e 23º).
A Autora permaneceu internada no Serviço de Ortopedia do Hospital de Viseu desde a data do acidente até 6.05.96, data em que teve alta hospitalar ( r.q.24º e 25º).
A Autora fez consultas externas de ortopedia até 2.07.97, data da consolidação das lesões e alta definitiva ( r.q.26º).
Em consequência do acidente a Autora ficou com ligeira claudicação na marcha, tendo dificuldade em caminhar e subir e descer escadas ( r.q.27º e 28º).
No dia 19.08.2000 a Autora fez refractura na mesma região da anterior fractura ( r.q.30º).
Em consequência directa e necessária do acidente a Autora sofreu incapacidade temporária geral (total e parcial) e profissional durante o período de tempo descrito a fls.261 do relatório médico-legal que aqui se dá por inteiramente reproduzido, a saber:
– incapacidade temporária geral total de 11 dias;
– incapacidade temporária parcial de 421 dias;
– incapacidade temporária profissional total de 432 dias ( r.q.32º, 37º e 38º).
A Autora nasceu no dia 16.07.1942 ( r.q.33º).
À data do acidente a Autora exercia a profissão de empregada de limpeza, por conta da firma “Varandas, Almeida & Lopes, Lda” ( r.q.34º e 35º).
Aí auferia um vencimento mensal líquido de montante não concretamente apurado ( r.q.36º).
Nas deslocações para consulta externa de ortopedia a Autora despendeu montante não concretamente apurado com os transportes do seu domicílio para o Hospital de Viseu ( r.q.40º).
Em consequência das referidas lesões a Autora despendeu montante não apurado em medicamentos ( r.q.41º).
Com o acidente a Autora sofreu dores e incómodos, os quais se verificaram antes e depois da intervenção cirúrgica a que foi submetida, sendo o quantum doloris de grau 3/7 durante o período de incapacidade temporária ( r.q.43º e 44º).
Em consequência das lesões sofridas no acidente a Autora sofreu 15% de IPP, à qual acresce mais 5% de dano futuro, sendo as suas sequelas muito importantes em termos de rebate profissional, exigindo um esforço acrescido para o desempenho da sua actividade habitual ( r.q.47º).
Em consequência das sequelas determinadas pelo acidente a Autora sofreu dano estético de grau 2/7 ( r.q.48º).

2.3.3. – A impugnação de facto:
O tribunal a quo, respondendo aos quesitos 5º, 6º, 8º, 13º a 19º, considerou ter sido D..., condutor do XM, o interveniente no acidente.
Conforme consta da fundamentação ( fls.782 ), o tribunal baseou-se essencialmente no depoimento de parte do chamado D... visto que reconheceu o local do acidente, admitiu ter passado, à hora do sinistro, conduzindo a viatura XM e haver assumido a responsabilidade na declaração amigável de fls.445, conjugado com os depoimentos das testemunhas E..., F... e G...
O apelante D..., invocando erro na apreciação da prova, pretende a alteração das respostas aos quesitos 5º, 6º, 8º, 13º a 19º, na medida em que se deu com o provado ter sido o veículo XM, conduzido por si, a causar o atropelamento.
Indica como prova que impõe decisão diversa o depoimento das testemunhas, porque nenhuma delas declarou o que quer que fosse no sentido de confirmar a intervenção do recorrente no acidente e na inadmissibilidade legal da confissão.
Ouvida integralmente a gravação, verifica-se, em resumo, que:
O interveniente D... confirmou que no dia e hora em que ocorreu o acidente passou no local, conduzindo o veículo XM-20-86 (Polo preto GT coupé ), vinha sozinho de casa da namorada. Disse não presenciar ninguém ( “ eu não dei conta de nada”, “ não vi ninguém magoado, nem ninguém na rua”) e questionado se fora interveniente no acidente, declarou “não me apercebi de embater em ninguém”, “ não sei se bati”, “que me tenha apercebido, não”.
Quando confrontado com a declaração amigável (fls.445) confirmou a sua assinatura, não negou o exarado, limitando-se a esclarecer que o fez por um “ dever cívico”, porque lhe disseram que tinha sido ele e não ter a certeza.
A testemunha G..., circulava de motorizada no sentido Viso/Viseu, apercebeu-se de “ajuntamento”, viu uma senhora caída no chão, na valeta, foi às bombas da gasolina pedir para chamarem o “115”, não presenciou o embate e não viu nenhum carro.
A testemunha E..., irmã da Autora, seguia com ela, fez uma descrição pormenorizada sobre o acidente, não fixou a matrícula do carro, dizendo tratar-se de um carro escuro, sendo que o “ sujeito do carro” chegou ao Viso, fez a rotunda e voltou para trás.
A testemunha F..., estava a trabalhar no Posto de Combustível, a cerca de 80/100 metros do local do embate, ouviu um barulho e um cliente que ali se encontrava disse que era um colega dele que ia no carro. Confirmou não ter na altura passado ali mais algum carro, mas não sabe quem era a pessoa que o conduzia.
A testemunha J..., agente da PSP, elaborou a participação de fls.600, não presenciou o acidente, tendo contactado com a vítima no Hospital.
As testemunhas H... e I... declararam nada saber sobre o acidente.
Ainda que nenhuma das testemunhas tenha confirmado tratar-se do interveniente, enquanto condutor do veículo causador do acidente, impõe-se, no entanto, valorar o depoimento de parte deste. E uma vez que admite ter passado no local à hora do sinistro, a conduzir o veículo XM e tendo assinado a declaração amigável, com descrição do acidente, é suficiente para a convicção objectivamente fundada de ter sido ele o causador do acidente, conjugado com os demais testemunhos e as regras da experiência comum, como se justificou na respectiva fundamentação ( cf. fls.782).
O depoimento de parte constitui o meio técnico de provocar a confissão judicial (arts. 552 e segs. do CPC e 356, n.º 2 do CC), ou seja, o reconhecimento de factos favoráveis à parte contrária (art.352 do CC).
O depoimento de parte ou conduz à confissão e, neste caso, deve ser reduzida a escrito, com força probatória plena ( arts.563 do CPC e 358 nº1 do CC ) ou não conduz à confissão. Quando não gera a confissão, deve valorar-se as declarações não confessórias, de acordo com a livre apreciação do tribunal, conforme se extrai dos arts.358 nº4 e 361 do CC e 665 do CPC (cf., por ex., Ac do STJ de 10/12/91, de 21/10/93, de 2/10/03, de 18/11/04, de 7/5/06, Ac RC de 26/4/05, disponíveis em www dgsi.pt).
Contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo. O que se torna necessário é que no seu livre exercício da convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção do facto como provado ou não provado, possibilitando, assim, um controle sobre a racionalidade da própria decisão ( cf. MICHEL TARUFFO, “La Prueba De Los Hechos”, Editorial Trotta, 2002, pág.435 e segs. ).
De resto, a lei determina a exigência de objectivação, através da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador ( art.653 nº2 do CPC ).
Nesta perspectiva, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção. Conforme orientação jurisprudencial prevalecente, o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve, por isso, restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e na avaliação da respectiva credibilidade tem que reconhecer-se que o tribunal a quo está em melhor posição
Neste contexto, inexiste fundamento para a pretendida alteração de facto, mantendo-se intangível a descrita na sentença.

2.3.4. – A quantificação do dano patrimonial futuro:
A sentença fixou equitativamente o dano patrimonial futuro em 24.000,00 euros.
Para o cálculo da indemnização correspondente à incapacidade permanente a partir de 2/7/1997 ( alta clínica), considerou-se a idade ( 55 anos ), o grau de incapacidade ( 15% + 5% de IPP), a profissão ( empregada de limpeza ), a idade activa até aos 70 anos e um rendimento mensal de 500,00/mês x 14 meses.
A este propósito, como não se apurou o montante do salário líquido auferido pela Autora, a sentença tomou “ como ponto de referência um rendimento equivalente a €500/mês, ligeiramente superior ao salário mínimo nacional, montante perfeitamente razoável como base de cálculo e que na falta de outros elementos, actualizadamente, melhor se ajusta ao rendimento mensal a considerar”.
Ambos os apelantes impugnam o valor da indemnização, unicamente com o fundamento de que o tribunal não podia ter usado para o cálculo o rendimento mensal de 500,00 euros, pois entendem que, não se tendo provado o salário auferido pela Autora, deve considerar-se o salário mínimo nacional à data do acidente, ou seja, 272,34 euros, reclamando a indemnização o valor de 12.500,00 euros”
Comprovando-se que a Autora sofreu 15% de IPP, à qual acresce mais 5% de dano futuro, sendo as suas sequelas muito importantes em termos de rebate profissional, exigindo um esforço acrescido para o desempenho da sua actividade habitual, é inquestionável tratar-se de um dano patrimonial futuro ( art.564 nº2 do CC ), não só pelo maior esforço despendido na sua actividade laboral, mas também a actividade do lesado enquanto pessoa, afectado por uma incapacidade fisiológica significativa, ou seja, a sua incapacidade funcional.
Na verdade, a afectação da pessoa do ponto de vista funcional, na envolvência do que vem sendo designado por dano biológico, determinante de consequências negativas a nível da sua actividade geral, justifica a indemnização no âmbito do dano patrimonial, para além da valoração que se imponha a título de dano não patrimonial ( cf., por ex., Ac do STJ de 21/9/94, de 7/10/04, de 13/1/2005, in www dgsi.pt/jstj ).
Muito embora as regras gerais do processo indemnizatório, designadamente a “ teoria da diferença “, se ajustem mais facilmente, à diminuição da capacidade de ganho, o certo é que a incapacidade funcional ou “ dano fisiológico”, numa perspectiva sistémica da teoria geral da indemnização, implica a ressarcibilidade, enquanto dano patrimonial futuro (cf. ÁLVARO DIAS, Dano Corporal - Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Coimbra - Almedina - 2001, págs. 255 a 265 ).
Mesmo nos casos em que o lesado não exerce qualquer actividade profissional remunerada ou exercendo-a não houve perda de salário ou de rendimento, tanto a doutrina como a jurisprudência é hoje unânime no sentido da ressarcibilidade do dano ( cf., neste sentido, VAZ, RLJ ano 102, pág.296, ANTUNES VARELA, Obrigações, vol.I, pág.910; Ac STJ de 5/2/87, BMJ 364, pág.819, de 17/5/94, C.J. ano II, tomo II, pág.101, de 6/4/04, de 21/9/04, www dgsi.pt/jstj ).
Para a quantificação do dano corporal, serão convocadas as normas dos arts.564 e 563 nº3 do Código Civil, onde se extrai a legitimação do recurso à equidade (art.4 do CC) e a desvinculação relativamente a puros critérios de legalidade estrita.
Nesta medida, o direito equitativo não se compadece com uma construção apriorística, emergindo, porém, do “ facto concreto ”, como elemento da própria compreensão do direito, rectius, um direito de resultado, em que releva a força criativa da jurisprudência, verdadeira law in action, com o imprescindível recurso ao “ pensamento tópico” que irá presidir à solução dos concretos problemas da vida.
Como é sabido, têm sido vários os critérios utilizados para o cálculo da indemnização, mas quaisquer tabelas financeiras não são vinculativas, apenas servindo como critério geral de orientação para a determinação equitativa do dano (art.566 nº3 CC), sendo, por isso, de repudiar a utilização pura e simples de critérios mais positivistas, assentes em equações de complexidade variável, como determinadas fórmulas matemáticas utilizadas em alguns arestos, encontrando-se criticamente comentadas no estudo do Cons. SOUSA DINIS, “ Dano Corporal em Acidente de Viação“, publicado na C.J. do STJ ano V, tomo II, pág.11, e mais recentemente na C.J. ano IX, tomo I, pág.6 e segs.
Pois bem, a circunstância de não se haver apurado o vencimento não implica a utilização obrigatória do salário mínimo nacional, já que como tópico da equidade é tão legítimo como o cálculo a partir do salário médio nacional.
Como quer que seja, o equívoco dos apelantes está em reportar à data do acidente o salário mínimo nacional. É que entre a data do acidente e 2/7/1997 (alta clínica) a Autora sofreu de incapacidade temporária que foi objecto de autónoma indemnização e o cálculo do dano patrimonial futuro foi feito a partir desta data e não da do acidente.
Ora, o salário mínimo nacional em 1997 foi fixado em 426,00 euros/mês (DL nº397/2007 de 31/12), e como se está a calcular a perda de rendimento durante a vida activa, há que atender às variações ulteriores do rendimento, logo é perfeitamente adequado utilizar o rendimento mensal ligeiramente superior ao salário mínimo nacional, tal como se equacionou na sentença, de forma lúcida e prudente.
Por isso, a indemnização atribuída mostra-se equitativa.

2.3.5. – A quantificação do dano não patrimonial:
A sentença atribuiu a indemnização actualizada pelo não patrimonial em 20.500,00 euros.
Os apelantes consideram-na excessiva e reclamam 15.000,00 euros ( Seguradora ) ou 12.500,00 euros ( interveniente).
A indemnização pelos danos não patrimoniais não visa reconstituir a situação que existiria se não ocorresse o evento, mas sim compensar o lesado, tendo também uma função sancionatória sobre o lesante ( natureza mista ).
A doutrina e a jurisprudência têm teorizado sobre os modos de expressão do dano não patrimonial, distinguindo-se, como mais significativos, o chamado “ quantum doloris “, ou seja, as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária; o “ dano estético “, o “ prejuízo de afirmação pessoal “, dano indiferenciado que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes, o prejuízo da “ saúde geral e longevidade, que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar, o “ pretium juventutis”.
Há hoje uma preocupação superadora da tradicional categoria de “ dano moral “, ampliando o seu espectro, de molde a abranger outras manifestações que a lesão provoca na pessoa, e já não a simples perturbação emocional, a dor ou o sofrimento.
Na doutrina e jurisprudência italianas começou a emergir na década de setenta a noção de “dano pessoal”, incorporando todos os danos que lesam a estrutura psicossomática do ser humano, e mais recentemente com a definição conceitual de “ dano existencial “, visando abarcar os danos que não sendo estritamente morais originam consequências não patrimoniais ( cf., por ex., PATRÍCIA ZIVIZ, La tutela ressarcitoria della persona, danno morale e danno esistenciale, Milano, 1999 ).
Como critério de determinação equitativa para o equivalente económico do dano não patrimonial ( arts.496 nº3 e 494 do CC ), há que atender à natureza e intensidade do dano, ao grau de culpa, à situação económica do lesado e do responsável, sendo certo que o seguro de responsabilidade civil é também um elemento a ter em conta, bem como ao valor actual da moeda e aos padrões jurisprudenciais.
Em matéria de acidentes de viação, assistiu-se nas últimas décadas a uma evolução significativa quanto aos padrões da indemnização, a fim de se evitarem prejuízos irreparáveis aos lesados.
De resto, nesta linha de evolução, entre outros tópicos, apela-se, por exemplo, aos critérios da convergência real das economias no seio da União Europeia, facto notório, na carecido de alegação ou prova ( art.514 do CPC ), aos montantes mínimos do seguro automóvel obrigatório, aos seus constantes aumentos e dos respectivos prémios, como índices emergentes da preocupação legal de protecção dos lesados em matéria de acidentes de viação.
Considerando as lesões sofridas pela Autora, o internamento hospitalar, a idade, que em consequência do acidente a Autora ficou com ligeira claudicação na marcha, tendo dificuldade em caminhar e subir e descer escadas, sofreu 15% de IPP, à qual acresce mais 5% de dano futuro, sendo as suas sequelas muito importantes em termos de rebate profissional, exigindo um esforço acrescido para o desempenho da sua actividade habitual, sofreu dores e incómodos antes e depois da intervenção cirúrgica a que foi submetida, sendo o quantum doloris de grau 3/7 durante o período de incapacidade temporária, sendo o dano estético de grau 2/7, é manifesta a intensidade do dano, a que acresce a culpa exclusiva por parte do condutor do XM.
Porque os danos não patrimoniais devem ser dignamente compensados, a indemnização atribuída na sentença revela-se equitativa, sendo mantida.
Em resumo, improcedem as apelações, confirmando-se a bem elaborada sentença recorrida.





III - DECISÃO

Pelo exposto, decidem:
1)
Julgar não providos os agravos e confirmar os despachos recorridos.
2)
Condenar o agravante nas custas.
3)
Julgar improcedentes as apelações e confirmar a sentença recorrida.
4)
Condenar cada um dos apelantes nas respectivas custas.
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Coimbra, 15 de Setembro de 2009.