Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
295/07.9GTLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: ALCOOLÉMIA
NULIDADE
CONTRAPROVA
AUTO DE NOTÍCIA
Data do Acordão: 01/30/2008
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: MARINHA GRANDE – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 118º DO C.P.P.; 243º DO C.P.P., 153º DO C.E.; DEC. REGULAMENTAR Nº 24/98, DE 30 DE OUTUBRO
Sumário: 1. Do auto de notícia devem constar os elementos devem constar os elementos que constituem o crime; o momento temporal em que o crime terá sido cometido, as circunstâncias que envolveram a sua prática; os elementos tendentes à identificação dos agentes e ofendidos, bem como os meios de prova possíveis de ser conhecidos.
2. Não padece de nulidade o auto de notícia que contendo o relato de factos passíveis de preencher um ilicito criminal subsumíveis ao Artigo.292º, nº 1 do Código Penal (Condução de Veículo em Estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas) não faz expressa menção à possível existência de um erro máximo do alcoolímetro utilizado no exame ao ar expirado do presumível agente da infracção noticiada.
3. Nem do auto de noticia levantado nos termos descritos no número antecedente tem de ser feita menção à data em que foi efectuada a última verificação periódica do alcoolímetro que foi utilizado no exame de medição de álcool no sangue do fiscalizado.
4. O condutor que tendo sido sujeito a fiscalização para verificação da taxa de álcool no sangue e a quem tenha sido detectada uma taxa superior à legalmente pretendida deve, para infirmar e poder afastar o valor indicado no aparelho utilizado na medição, solicitar a realização de contraprova, em qualquer das modalidades previstas no nº3 do artigo 153º, do Código da Estrada.
Decisão Texto Integral: Acordam, em audiência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.
I. RELATÓRIO.

Pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial da comarca da Marinha Grande, sob acusação do Ministério Público, que lhe imputava a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292º e 69º, nº 1, a), do C. Penal, foi sujeito a julgamento em processo sumário, o arguido A…, divorciado, comissionista, nascido a 28 de Março de 1969 em Espanha, filho de …. e de ……, residente na quinta das Nespereiras, na Marinha Grande.

Após realização da audiência de julgamento, por sentença de 19 de Julho de 2007, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292º e 69º, nº 1, a), do C. Penal, na pena de 75 dias de multa á taxa diária de € 7 ou seja, na multa global de € 525, a que corresponde, subsidiariamente, a pena de 50 dias de prisão, e na pena acessória de seis meses de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria.
*
Inconformado com a sentença, dela interpôs o arguido recurso, formulando no termo da sua motivação as seguintes conclusões (por transcrição):
“ (…)
1. O Ministério Público requereu o julgamento em processo sumário, com intervenção do tribunal singular do arguido, imputando-lhe a prática, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artº 292º, nº 1 do Código Penal, pela prática constante da acusação de fls. 6 dos autos.
2. O arguido apresentou contestação escrita, onde em síntese, nega a prática dos factos que lhe são imputados e alega a nulidade do auto por não fazer referência à margem de erro do alcoolímetro quantitativo; por ao realizar contraprova no mesmo aparelho, ver afectado o seu direito de contraditar os factos que lhe são imputados e ainda pelo facto de no auto não constar quando foi realizada a última verificação periódica do aparelho, sendo tal elemento essencial para aferir da idoneidade daquele meio de prova e além disso, essencial à defesa do arguido.
3. A invocada excepção de nulidade foi julgada improcedente.
4. Com o presente recurso, pretende o arguido, submeter a apreciação deste Venerando Tribunal, as três questões levantadas em sede de contestação e que não mereceram acolhimento por parte do Tribunal "a quo".
5. Isto por entender que aquelas questões mereciam acolhimento, devendo consequentemente, ter sido declarado nulo o auto de noticia.
6. Quanto à questão da margem de erro prevista na Portaria nº 748/94 de 13.08, entendemos que a mesma deve constar do auto e ser aplicada.
7. Só desse modo ao arguido é possível conhecer com rigor os factos que lhe são imputados e pode exercer, com pleno conhecimento, o seu direito de defesa.
8. A omissão de tal elemento cria a dúvida que põe em causa a exactidão da descrição dos factos e a exactidão da TAS.
9. Sendo certo que omitindo-se tal elemento, o auto não contém os factos que constituem a infracção, tal como prevê o artº 170º do C.E.
10. Quanto à questão da contraprova ter sido efectuada no mesmo aparelho, é incontestável que tal afectou o direito do arguido contraditar os factos que lhe eram imputados.
11. A contraprova é um direito concedido ao arguido de demonstrar que a TAS que acusou, não corresponde à realidade e em última instância, demonstrar que não tem qualquer taxa de álcool no sangue.
12. Tudo depende portanto, por um lado, da precisão do aparelho e do seu bom funcionamento e, por outro lado, da sua correcta utilização e da leitura fiel dos seus dados.
13. Se o aparelho é o mesmo e manobrado pela mesma pessoa, como pode o arguido contraditar os resultados obtidos no primeiro teste?
14.Não pode.
15. O arguido fica sem nenhuma possibilidade prática de se defender em caso de eventual avaria ou mau funcionamento do aparelho, ficando assim, afectado um dos requisitos essenciais das garantias de defesa: a possibilidade efectiva de contraditar os factos que lhe são imputados.
16. Quanto à terceira questão, entendemos que deve constar do auto a data da última verificação periódica do aparelho.
17. No auto apenas se refere que o aparelho foi aprovado pelo Despacho nº 1259/07.
18. Tal contudo, não certifica que aquele aparelho, se encontre em boas condições de funcionalidade.
19. Apenas que aquele modelo foi aprovado para o exame de pesquisa de álcool no ar expirado, a que se refere o artº 153º do C.E.
20. Tais aparelhos estão no entanto, sujeitos ao disposto no Decreto-lei nº 291/90 de 20.09 e à Portaria 962/90.
21. Em conformidade com o disposto nesses diplomas legais, aqueles instrumentos de medição estão submetidos a um conjunto de operações com vista à sua regular utilização.
22. Sendo uma dessas operações e durante toda a vida do aparelho a verificação periódica anual.
23. Assim sendo, do auto tem de constar quando foi realizada a última verificação periódica do aparelho, pois, tal elemento é essencial a aferir da idoneidade daquele meio de prova e além disso, essencial à defesa do arguido.
24. Sendo o auto omisso quanto aos elementos atrás referidos, o mesmo é nulo e como tal deveria ter sido declarado.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que declare a nulidade do auto de noticia, como é de JUSTIÇA.
(…)”
*
Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal recorrido, pugnando pela sua improcedência.

Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da rejeição do recurso.

Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO.

As relações conhecem de facto e de direito (art. 428º, nº 1 do C. Processo Penal).
Os presentes autos seguem os termos do processo especial sumário e no início da respectiva audiência foi efectuado o aviso previsto no art. 389º, nº 2, do C. Processo Penal, nada tendo sido requerido pelos intervenientes processuais (cfr. acta de fls. 20 a 22).
Assim, e nos termos do disposto no art. 428º, nº 2, do c. Processo Penal, renunciaram ao recurso em matéria de facto, pelo que os poderes de cognição deste tribunal de recurso se limitam a matéria de direito, sem prejuízo do disposto no art. 410º, nºs 2 e 3, do C. Processo Penal sendo aliás, oficioso, o conhecimento dos vícios previstos neste nº 2 (Acórdão nº 7/95 de 19/10, DR. I-A, de 28/12/95).


Face às conclusões da motivação do recurso apresentadas, e que delimitam o seu objecto deste, as questões suscitadas pelo recorrente são:
- A nulidade do auto de notícia, por dele não constar a margem de erro do alcoolímetro quantitativo;
- A nulidade do auto de notícia, por dele não constar a data da última verificação do aparelho referido;
- A nulidade do auto de notícia, porque a realização da contraprova através do mesmo alcoolímetro, impediu o recorrente de contraditar o primitivo resultado.
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Para a resolução destas questões importa ter presente a matéria relevante e que consta da decisão objecto do recurso. Assim:

a) A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos (por transcrição):
“ (…)
No dia 2 de Julho de 2007, pelas 23h32m, na E.N. 242, ao km 6,5, Albergaria, área desta Comarca, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 71-BZ-48, após ter ingerido bebidas alcoólicas.
Ao ser submetido a teste de alcoolemia, com o aparelho "DRAGER ALCOTEST 7110MKIII, revelou uma TAS de 1,77 gramas/litro.
O arguido bem sabia que havia ingerido bebidas alcoólicas em quantidade excessiva e que se encontrava sob a influência do álcool e, não obstante, decidiu-se a conduzir o referido veículo na via pública.
O arguido agiu de modo livre e voluntário, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível pela lei penal.
O arguido aufere cerca de 1.200 € mensais na sua profissão, vive sozinho e paga de mensalidade da casa 550 € mensais.
O arguido tem uma filha com 12 anos, para a qual contribui mensalmente com uma pensão de alimentos entre 150 e 200 €.
O arguido tem o 12° ano como habilitações literárias.
O arguido não tem antecedentes criminais.
(…)”.
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b) Quanto aos factos não provados, nela foi considerado que, para além dos descritos, não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a discussão da causa.
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c) Quanto à motivação consta (por transcrição):
“ (…)
A convicção do Tribunal baseou-se, no conjunto da prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente, nas declarações da testemunha Henrique Letra, soldado da G.N.R., que confirmou o auto de notícia, bem como nas declarações do arguido quanto à sua situação económica e social, uma vez que quanto aos factos o arguido não prestou declarações; na análise do talão de pesquisa de álcool no sangue de fls. 4 e no certificado de registo criminal juntos a autos a fls. 24.
(…)”.
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d) Finalmente, e quanto às questões suscitadas na contestação, consta (por transcrição):
“ (…)
Em sede de contestação o arguido vem arguir a nulidade do auto de notícia por do mesmo não constar a margem de erro prevista na Portaria 748/94 de 13.8, bem como pelo facto de ter realizado a contraprova no mesmo aparelho e ainda por desconhecer se o aparelho foi sujeito a verificação periódica e quando a mesma foi realizada.
Salvo o devido respeito não tem razão o arguido, nem se vislumbra em que medida o por si alegado leva à nulidade do auto de notícia, desde logo, por do mesmo não ter de constar os elementos invocados, nem a contraprova ter de ser realizada em aparelho diferente.
No que tange à taxa de álcool no sangue apresentada pelo arguido, que o Tribunal deu como provada, resulta do teor do talão junto aos autos. Nos termos do nº 5 do art. 5º do Dec. Lei nº 44/2005 de 23 de Fevereiro, "Cabe à Direcção-Geral de Viação aprovar, para uso na fiscalização do trânsito, os aparelhos ou instrumentos que registem os elementos de prova previstos no nº 4 do art. 170º do Código da Estrada, aprovação que deve ser precedida, quando tal for legalmente exigível, pela aprovação de modelo, no âmbito do regime geral do controlo metrológico".
Com efeito o teste foi realizado no alcoolímetro "DRAGER", modelo "ALCOTESTE 7110MKII", com o nºARPN-0056 aprovado pelo I.P.Q. e cuja utilização foi aprovada pelo competente despacho da D.G.V.
Entendemos assim que, a circular 101/2006 divulgada pelo Conselho Superior da Magistratura, apenas tem carácter informativo do teor de uma recomendação do Director Geral de Viação ao Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, e reporta-se a uma Portaria nº 748 que remonta a 13 de Agosto de 1994.
Ao Tribunal apenas compete aplicar a lei.
(…)”.
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1. Estabelece o art. 118º, nº 1, do C. Processo Penal que a violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. E dispõe o nº 2 do mesmo artigo que, quando a lei não comina a nulidade, o acto ilegal é irregular.
Assim, o acto ilegal pode estar ferido de nulidade ou apenas de irregularidade. E nos primeiros, há que distinguir entre nulidades insanáveis e nulidades sanáveis (arts. 119º e 120º do C. Processo Penal).
O recorrente, fundou a sua motivação de recurso em nulidades que, em seu entender, afectam o auto de notícia, nulidades que, contudo, não qualifica. Vejamos.

Sempre que uma autoridade judiciária, um órgão de polícia criminal ou outra entidade policial presenciarem qualquer crime de denúncia obrigatória, levantam ou mandam levantar auto de notícia, dele devendo constar:
- Os factos que constituem o crime;
- O dia, hora, local e as circunstâncias em que o crime foi cometido;
- Os elementos possíveis quanto à identificação dos agentes e dos ofendidos, e os meios de prova conhecidos (art. 243º, nº 1, a), b) e c), do C. Processo Penal).

Por sua vez, estabelece o art. 292º, nº 1, do C. Penal que, quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
Este crime de condução de veículo em estado de embriaguez é um crime público e, por isso, um crime de denúncia obrigatória.

Do auto de notícia de fls. 2 e v. constam os factos que constituem o crime e as circunstâncias, incluindo as de tempo e lugar, em que foi cometido – a condução, pelo arguido, no dia 2 de Julho de 2007, pelas 23h32, na E.N. 242, ao km 6,5, em Albergaria, Marinha Grande, de um veículo automóvel, com uma TAS de 1,77 g/l – bem como constam os elementos de identificação do arguido e o meio de prova existente – teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue, realizado com o aparelho DRAGER, modelo ALCOTEST 7110HKIII, com o nº ARPN – 0056, aprovado pela DGV pelo despacho nº 12594/2007, publicado no DR nº 118, II Série, de 21 de Janeiro de 2007, e respectivo talão, de prova e contraprova, requerida e realizada no mesmo aparelho.
O auto de notícia deu portanto, integral cumprimento ao disposto no art. 243º, nº 1, do C. Processo Penal.

1.1. Alega o recorrente que dele deveria constar também o erro prevista para a TAS, conforme Portaria nº 748/94, de 13 de Agosto e, consequentemente, a dedução de tal margem na TAS efectivamente detectada pelo alcoolímetro, por forma a que pudesse conhecer com rigor os factos que lhe são imputados e assim poder exercer o seu direito de defesa.
Entendemos que, e ressalvado sempre o devido respeito pela opinião contrária, não lhe assiste razão.

Em primeiro lugar porque, como vimos, a lei não exige que seja feita qualquer menção a uma margem de erro na medição feita pelo aparelho, nem a mesma integra a factualidade típica ou as circunstâncias do seu cometimento.

Depois, porque o recorrente, pela simples leitura do auto, ficou habilitado a conhecer, e com absoluto rigor, todos os factos que lhe eram imputados, a saber, e em síntese, condução de veículo automóvel na via pública com uma TAS de 1,77 g/l.
E, como é evidente, com base neste conhecimento, poderia ter exercido, plenamente, o seu direito de defesa como aliás fez, não só requerendo o adiamento da audiência, nos termos do art. 386º, nº 1, a), do C. Processo Penal, para preparação da sua defesa, pretensão que foi deferida (cfr. Acta de fls. 12 a 13), como apresentando a contestação de fls. 17 a 19.
Questão completamente diferente é já a de saber se, de facto, era esta ou não, a TAS de que era portador. Mas aqui, estamos já num outro âmbito, no âmbito da prova.
E a falta de prova dos factos constantes do auto de notícia em caso algum determina a sua nulidade.

Acresce que o Dec. Lei nº 291/90, de 20 de Setembro – posteriormente regulamentado pela Portaria nº 962/90, de 9 de Outubro – prevê as regras gerais do controlo metrológico, dele resultando que é o Instituto Português da Qualidade – e não à Direcção Geral de Viação, a quem apenas compete aprovar, para uso na fiscalização do trânsito, os aparelhos ou instrumentos que registem os elementos de prova previstos no nº 4 do C. da Estrada (art. 5º, nº 5 do Dec. Lei nº 44/2005, de 23 de Fevereiro) – quem garante o controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição envolvidos em operações comerciais, fiscais ou salariais, ou utilizados nos domínios da segurança, da saúde ou da economia de energia, além de outros (arts. 1º e 8º) aqui se incluindo os aparelhos para pesquisa de TAS aos condutores de veículos.
É certo que a Portaria nº 962/90 foi reformulada pela Portaria nº 748/94, de 13 de Agosto, que aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, estabelece no seu nº 4 que estes aparelhos obedecerão às qualidades e características metrológicas e satisfarão os ensaios estabelecidos na norma NF X 20-701.
Porque o resultado de qualquer medição comporta sempre um determinado grau de incerteza, pois não existem instrumentos de medição absolutamente exactos, estabelece a Portaria nº 748/94, no seu nº 6 que nos alcoolímetros, os erros máximos admissíveis, em cada indicação, são definidos pelos seguintes valores:
a) Aprovação de modelo – os erros máximos admissíveis na aprovação de modelo são os definidos na norma NF X 20-701;
b) Primeira verificação – os erros máximos admissíveis da primeira verificação são os definidos para a aprovação de modelo;
c) Verificação periódica – os erros máximos admissíveis da verificação periódica são uma vez e meia os da aprovação de modelo.
Sendo os erros máximos dos alcoolímetros quantitativos, nos termos da citada norma, os seguintes:
- TAS < 0,92 g/l – erro máximo admitido de +/- 0,07;
- TAS =/> 0,92 < 2,30 g/l – erro máximo admitido de +/- 0,075;
- TAS =/> 2,30 < 4,60 g/l – erro máximo admitido de +/- 0,15;
- TAS =/> 4,60 < 6,90 g/l – erro máximo admitido de +/- 0,30.
Deve, contudo notar-se, que estes limites, para mais e para menos, não significam valores reais de erro numa qualquer concreta medição, mas apenas o intervalo dentro do qual, o valor medido se encontra.
Em todo o caso, a lei não prevê qualquer margem de erro para os resultados obtidos através dos analisadores quantitativos da TAS (cfr. Acs. da R. de Lisboa de 03/07/2007, nº 5092/2007-5 e da R. do Porto de 14/03/2007, nº 0617247, ambos em http://www.dgsi.pt).
Se dúvidas subsistem sobre a idoneidade do valor medido, o que a lei prevê é a possibilidade de ser feita a contraprova, ou através de novo exame em aparelho aprovado, ou através de análise ao sangue, à escolha do examinando (art. 153º, nº 3, do C. da Estrada).
Mas também aqui, estamos no âmbito da prova, que nada tem a ver com a nulidade do auto de notícia.

Assim, a falta de menção, no auto de notícia, a uma qualquer margem de erro do alcoolímetro, e sua dedução na TAS no caso, medida pelo aparelho, não determina a sua nulidade.

1.2. Alega o recorrente que do auto de notícia deveria também constar a data da verificação periódica do alcoolímetro, elemento este essencial para aferir a idoneidade do meio de prova e portanto, essencial para a sua defesa.

Como atrás vimos, do art. 243º, nº 1, do C. Processo Penal não decorre a exigência de que do auto de notícia conste a data da verificação periódica do aparelho de medição.
A colheita de ar expirado para detecção de álcool no sangue é um exame efectuado através de um meio técnico adequado no caso, o aparelho DRAGER, modelo ALCOTEST 7110HKIII, com o nº ARPN-0056.
Já atrás referimos, que este aparelho, como qualquer aparelho de medição, é susceptível de erro. Daí que, no exercício do direito de defesa se compreenda o requerimento da contraprova como, se assim for entendido conveniente, a solicitação de informação sobre a data da verificação periódica (e que o recorrente tão pouco requereu, na defesa deduzida na contestação).
Mas, mais uma vez, estamos no âmbito da prova, da fiabilidade do meio de aquisição da prova, e não no campo das nulidades ou seja, na nulidade do auto de notícia.

Assim, a falta de menção, no auto de notícia, da data da verificação periódica do alcoolímetro, não determina a sua a nulidade.

1.3. Alega o recorrente que destinando-se a contraprova a demonstrar que a TAS medida não corresponde à realidade, a sua realização no mesmo aparelho não permite contraditar o primeiro resultado, e assim despistar a eventual avaria, mau funcionamento ou errada utilização do instrumento de medição.
Resulta de fls. 4 dos autos que o exame inicial e a contraprova foram efectuados, com uma dilação de quatro minutos, pelo mesmo aparelho DRAGER 7110 MKIII, com o nº ARPN-0056.

O regime jurídico da fiscalização da condução sob influência de álcool encontra-se previsto no art. 153º do C. da Estrada.
Assim, feito o exame de pesquisa de álcool no ar expirado através da utilização de aparelho aprovado para o efeito, se o resultado for positivo, o agente da autoridade notifica o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais que dele decorrem, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar as despesas por esta originadas no caso de resultado positivo (nºs 1 e 2 do art. 153º do C. da Estrada).
A contraprova deve ser realizada, ou através de novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado, ou através de análise ao sangue, cabendo a escolha do meio pretendido, ao examinando (nº 3 do art. 153º do C. da Estrada).
Caso o examinando opte pelo novo exame, deve ser de imediato, a ele sujeito e, se necessário, conduzido a local onde o exame possa ser efectuado. Se a opção tiver sido a se análise ao sangue, o examinando deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito (nºs 4 e 5 do art. 153º do C. da Estrada).
Em qualquer caso, o resultado da contraprova prevalece sobre o resultado do exame inicial (nº 6 do art. 153º do C. da Estrada).

O art. 159º, nº 3, a), do C. da Estrada, na redacção do Dec. Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, tinha a seguinte redacção:
“3 – A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando:
a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado especificamente para o efeito; (…)”.
Posteriormente, o Dec. Lei 265º-A/2001, de 28 de Setembro, veio dar nova redacção ao art. 159º, nº 3, a), do C. da Estrada que passou a ser a seguinte:
“3 – A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando:
a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado; (…)”.
E é esta a redacção que hoje subsiste, com a única alteração do número do artigo que, em vez de 159º, passou a ser o 153º, do C. da Estrada.

Por sua vez, o Dec. Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro, que regulamentou o regime jurídico da fiscalização da condução sob o efeito do álcool ou de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas, estabelecido no C. da Estrada, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei nº 2/98, de 3 de Maio, estabelecia no seu art. 3º, nº 1, que a contraprova a que se refere a alínea a) do nº 3 do art. 159º do C. da Estrada é em analisador quantitativo, no prazo máximo de quinze minutos após a realização do primeiro teste, podendo para o efeito, ser utilizado o mesmo analisador, caso não seja possível recorrer a outro no mesmo prazo.
Este decreto regulamentar foi revogado pelo art. 2º da Lei nº 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o vigente Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas.
No Regulamento actual, que contudo, apenas entrou em vigor no dia 15 de Agosto de 2007 (art. 4º da Lei nº 18/2007), estabelece o seu art. 3º, que os métodos e equipamentos previstos na presente lei e disposições complementares, para a realização dos exames de avaliação do estado de influenciado pelo álcool, são aplicáveis à contraprova prevista no nº 3 do art. 153º do C. da Estrada.

De tudo isto resulta que a lei vigente na data da prática dos factos, não só não exige que o novo exame, para efeitos de contraprova, seja realizado em aparelho diferente do que realizou o exame inicial, como prevê que a contraprova possa ser realizada no mesmo analisador quantitativo (art. 3º, nº 1 do Dec. Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro).
As razões que a tal conduzem são, por um lado, a necessidade técnica de o novo exame ser efectuado dentro de curto espaço de tempo, para prevenir eventuais alterações do estado do examinando, e por outro, a racionalização de meios que, porque escassos, não permitem que a esmagadora maioria das operações de fiscalização se efectue com pluralidade de analisadores quantitativos.
Apesar de o Regulamento em vigor não conter norma idêntica à do art. 3º, nº 1, do Dec. Regulamentar nº 24/98, não vemos que proíba, em absoluto, a possibilidade de a contraprova, ao menos em determinadas circunstâncias, ser efectuada no mesmo analisador quantitativo.
E em qualquer caso, não é por isso que ficam intoleravelmente cerceados os direitos de defesa do examinando. Com efeito, sempre pode este, em alternativa ao novo exame, e tendo razões para suspeitar da falta de fiabilidade do aparelho e/ou da falta de idoneidade do operador respectivo, optar pela realização de análise ao sangue.

Sucede que, tal como nas anteriores questões analisadas, também aqui estamos no âmbito da prova, da fiabilidade do meio de aquisição da prova, e não no campo das nulidades ou seja, na nulidade do auto de notícia.
Assim, temos por seguro que a realização da contraprova no mesmo analisador quantitativo em que foi efectuado o exame inicial não determina a nulidade do auto de notícia levantado com base em tal contraprova.
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2. Para terminar, dois aspectos cabe ainda referir.

2.1. Apesar de, a coberto da invocação de nulidades do auto de notícia, o recorrente pretendeu impugnar a matéria de facto, concretamente, a TAS de 1,77 g/l dada como provada na sentença posta em crise, tendo para o efeito atacado a fiabilidade do meio de aquisição de prova ou seja, o valo probatório a atribuir aos exames realizados através do concreto alcoolímetro utilizado na operação de fiscalização a que foi submetido.
Ora, tendo sido dado cumprimento ao disposto no art. 389º, nº 2, do C. Processo Penal, e nada tendo sido requerido pelos intervenientes processuais, tal equivale a renúncia ao recurso da matéria de facto (art. 428º, nº 2, do C. Processo Penal).
Significa isto que os poderes do tribunal de recurso quanto à matéria de facto, ficam limitados aos três vícios previstos no nº 2 do 410º, do C. Processo Penal.
O recorrente não invocou qualquer um dos referidos vícios, e lida a decisão recorrida, não vemos que, do seu texto, por si só ou conjugada com as regras da experiência, deles ou de algum, padeça.
Assim, não podia o recorrente, ainda que lançando mão de um outro nomen juris, impugnar a matéria de facto.

2.2. Depois de proferida a sentença em recurso, entraram em vigor as alterações introduzidas ao C. Penal pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro.
As normas incriminadoras – arts. 69º e 292º, do C. Penal – não sofreram alterações, mas tendo sido aplicada ao recorrente pena de multa, alterado foi pela referida lei o art. 47º do C. Penal, no que respeita à medida do quantitativo diário daquela.
Assim, haverá que, neste particular aspecto, e porque todos os elementos relevantes constam dos autos, dar cumprimento ao disposto no art. 2º, nº 4 do C. Penal.
Estabelecia o art. 47º, nº 2, do C. penal, na redacção anterior à Lei nº 59/2007, que a cada dia de multa corresponde uma quantia entre € 1 e € 498,80, a fixar de acordo com a situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
A actual redacção continua a referir os mesmos parâmetros para a determinação do quantitativo diário da pena de multa, alterando apenas os seus limites mínimo e máximo, que passaram para € 5 e € 500, respectivamente. E como se vê, esta alteração consistiu, basicamente, na actualização do montante mínimo diário da pena de multa.

A amplitude dada ao montante diário da pena multa prende-se com a realização do princípio da igualdade de ónus e sacrifícios por forma a esbater a crítica apontada a esta pena que é a de ter distintos pesos, conforme a situação económica do agente (cfr. Maia Gonçalves, C. Penal Anotado, 8ª Ed., 307).
Mas a aplicação de uma pena de multa deve sempre significar a verdadeira função de uma pena e por isso, tem que constituir um real sacrifício para o condenado. Só assim este poderá sentir o juízo de censura que a condenação significa, bem como só assim se dá satisfação às exigências de prevenção.
Porém, não pode deixar de ser assegurado o mínimo necessário e indispensável à satisfação das suas necessidades básicas do condenado e do seu agregado familiar (cfr. Acs. do STJ de 02/10/1997, CJ, S, V, III, 183 e da R. de Coimbra de 17/04/2002, CJ, XXVII, II, 57).

Na sentença recorrida foi tida em conta a condição sócio-económica do recorrente o que vale dizer, e de acordo com os factos provados, a circunstância de auferir mensalmente a quantia de € 1.200, de viver só, e de ter como encargos mensais € 550 relativos à casa, e entre € 150 e € 200 relativos aos alimentos devidos à filha, vindo o quantitativo diário da pena de multa a ser fixado em € 7.
Considerando estes mesmos elementos, à luz dos limites legais vigentes, entendemos que o quantitativo diário da pena de multa deve ser fixado em € 9 o que, no caso concreto, perfaz a multa global de € 675.
Assim, a lei nova é, em concreto, menos favorável, pelo que deve o recorrente ser punido pela lei vigente na data da prática dos factos.
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Conclusões:
- O auto de notícia levantado em consequência de operação de fiscalização da condução sob influência de álcool, não tem que conter referência a qualquer margem de erro na medição efectuada pelo alcoolímetro utilizado, pelo que a falta de tal referência não determina a nulidade do auto;
- O auto de notícia levantado em consequência de operação de fiscalização da condução sob influência de álcool, não tem que conter referência à data em que foi feita a última verificação periódica do alcoolímetro utilizado, pelo que a falta de tal referência não determina a nulidade do auto;
- A realização da contraprova no mesmo alcoolímetro utilizado para o exame inicial, não determina a nulidade do auto de notícia.

E assim, com a improcedência de todas as questões suscitadas pelo recorrente, e sendo a lei velha a concretamente mais favorável, deve ser confirmada a sentença recorrida.
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III. DECISÃO.

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em negar provimento ao recurso, mantendo integralmente a sentença recorrida.
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Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UCs. (arts. 513º, nº 1, do C. Processo Penal e 87º, nº 1, b), do C. Custas Judiciais).