Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1196/06
Nº Convencional: JTRC
Relator: GARCIA CALEJO
Descritores: ALEGAÇÕES
PRAZO
BASE INSTRUTÓRIA
FACTOS A CONSIDERAR
MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO
Data do Acordão: 05/16/2006
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA LOUSÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTºS511º, Nº 1, 655º E 698º, NºS 2 E 6, DO CPC ;
Sumário: I – Umas alegações de recurso entradas em juízo no prazo dilatado de 40 dias, caso o recorrente impugne a matéria de facto dada como provada através das gravações efectuadas, deverão ser consideradas como tempestivas, na medida em que não se impõe que o recorrente, para beneficiar deste prazo alargado, tenha de dizer que pretende a reapreciação da prova logo que interpõe o recurso .
II – Sabendo-se que à base instrutória só devem ser levados factos concretos e não enunciados legais, juízos de valor ou factos conclusivos – artº 511º, nº 1, do CPC – nela não pode ser quesitada nem pode ser dado como provada a asserção legal de que ” A. conduzia o veículo por conta, sob a direcção e no interesse de B.” .

III – Só quando os elementos do processo levem inequivocamente a uma resposta diversa da dada na 1ª instância é que se deve alterar essa resposta, por só então se verificar um erro de julgamento – artº 655º do CPC - , importando respeitar os princípios de oralidade, imediação e de livre apreciação da prova .

Decisão Texto Integral:

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório:
1-1- A..., residente em Miranda do Corvo, intenta a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, emergente de acidente de viação, contra a B..., com sede na Av.ª da Liberdade, n.º242, Lisboa, C..., com sede na R. Garrett, n.º 62, D..., residente na R. da Indústria, Arruda, Ventosa, E..., residente no Corvo, Miranda do Corvo e G..., com sede na, R. Júlio Diniz, n.º 127, 1.º, Porto, pedindo a condenação dos RR a pagarem-lhe a quantia global de 12.070.636$00, (60.208,08 euros ), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do acidente e até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta este seu pedido, em síntese, com base no facto de ter sido interveniente num acidente de viação, envolvendo dois veículos automóveis, cada um deles seguro em cada uma das ora RR. seguradoras, uma propriedade do R. D... e conduzida pelo R. E... e a outra propriedade de “H...”, do que resultou o seu atropelamento, quando se encontrava fora da via por onde circulavam os veículos envolvidos. O acidente verificou-se em virtude de o veículo de matrícula HD, quando pretendia mudar de direcção, não ter respeitado um sinal de Stop existente na via, em consequência do que foi embater no IG que, assim, foi projectado e acabou por colher, na berma, o ora A., ou por o IG ter ido embater no HD e em consequência disso, despistou-se indo colher o A. Decorrente de tal atropelamento, o A. sofreu lesões e consequências, que lhe ocasionaram prejuízos que computa na quantia pedida.
1-2- A R. B..., contestou, sustentando, em síntese, que o acidente se ficou a dever à conduta do R. E..., o qual, ao pretender mudar de direcção para a estrada por onde já circulava o IG, não respeitou um sinal de Stop ali existente, indo embater neste e, assim, provocando o acidente. Acresce que esse mesmo condutor conduzia com uma taxa de alcoolémia de 0,52 g/l e sem que o veículo que conduzia estivesse seguro. Impugna a existência e amplitude dos danos invocados pelo A..
Termina pedindo o julgamento da acção em conformidade com a prova a produzir, com a sua absolvição do pedido.
1-3- A R. C... contestou, alegando, em síntese, que o veículo de matrícula HD interveniente no acidente não se encontrava seguro sob a sua responsabilidade, uma vez que, à data do acidente, não havia celebrado com o respectivo proprietário, qualquer seguro de responsabilidade civil que abrangesse o dito veículo, tendo sido emitida uma apólice de seguro relativa ao mesmo que teve na sua origem falsas declarações quanto à sua data de início de entrada em vigor, pelo que veio a mesma a ser anulada.
Quanto ao acidente, aderiu à versão que do mesmo que é dada pelo co-R. E..., impugnando tudo o mais alegado pelo A., designadamente no que toca aos danos e respectivas consequências.
Termina pedindo a improcedência da acção com a sua absolvição do pedido.
1-4- O R. D... contestou alegando que, à data do acidente, já não era o proprietário do HD, por já o ter vendido em data anterior a Paulo Jorge Quelhas.
Termina pedindo a sua absolvição do pedido.
1-5- O R. E... na sua contestação, deduziu o pedido de intervenção principal provocada de “F...”, com o fundamento em ser esta a proprietária do HD, por conta de quem o conduzia, no momento do acidente, por, nessa altura, trabalhar para aquela, sob as suas ordens e direcção, sendo que tal veículo não se encontrava seguro, o que desconhecia.
Relativamente à matéria do acidente, alegou que o mesmo se ficou a dever ao condutor do IG que embateu na viatura que conduzia, quando se encontrava parado, em obediência a um sinal de Stop ali existente, na estrada proveniente da Lousã e em direcção a M. do Corvo, após o que o IG fez ricochete e foi apanhar o A., quando este ainda se encontrava a atravessar a via, em local onde não havia passadeira para peões, existindo uma a menos de 20 metros, e fê-lo obliquamente, pelo que este também contribuiu para o acidente.
Impugnou, ainda, a existência e amplitude dos danos invocados pelo A.
Termina pedindo a improcedência da acção com a sua absolvição do pedido.
1-6- Contestou o FGA sustentando que não responde pelos danos sofridos pelo A., dado que ambos os veículos intervenientes no acidente, tinham seguro válido.
Para além do mais, impugnou toda a matéria alegada pelas demais partes, por não ser do seu conhecimento.
Termina pedindo se julgue procedente a excepção invocada e seja absolvida do pedido e caso assim se não entenda se julgue a acção conforme a prova que se vier a produzir em audiência.
1-7- Por despacho de fls. 164 e v.º, foi admitido o chamamento da “F...”.
Esta apresentou articulado próprio em que alegou que, no momento do acidente, o R. E... conduzia o HD, mas não sob as suas ordens ou direcção, bem sabendo que tal viatura não se encontrava segura, que apenas se encontrava no seu stand para exposição e venda e não cabendo a condução de veículos nas funções que estavam atribuídas a tal R., desconhecendo o motivo pelo qual o mesmo o conduzia, mas que, o fazia sem a sua autorização.
Quanto ao acidente, aderiu à versão dada pelo R. E... e impugnou a existência e amplitude dos danos invocados pelo A..
1-8- Os HUC vieram requerer a sua intervenção espontânea, com o fundamento em terem prestado assistência ao ora A., em consequência do acidente em apreço, com o que despendeu a quantia de 3.391,86 euros, que reclama, bem como aos respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.
Foi tal pedido foi admitido, por despacho judicial de fls. 199.
1-9- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador em que se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade invocada, julgando-se todas as partes como legitimas, após o que se fixaram os factos assentes e a base instrutória.
1-10- Posteriormente, através do requerimento de fls. 678, o A. veio desistir do pedido, relativamente ao R. D..., que aceitou tal desistência e que já foi homologada ( conforme despacho proferido a fls. 689 ), pelo que se acha extinto o direito que se fazia pretender valer quanto a esse R..
1-11- Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, depois do que foi proferida decisão final em que se considerou parcialmente procedente por provada a acção, condenado-se, consequentemente, solidariamente, o R. E..., a chamada “F...” e o G..., a pagarem ao A., as seguintes quantias:
a) 21.622,89 euros ( vinte e um mil seiscentos e vinte e dois euros e oitenta e nove cêntimos ), a título de ordenados não recebidos;
b) 4.756,32 euros ( quatro mil setecentos e cinquenta e seis euros e trinta e dois cêntimos ), a título de despesas médicas, medicamentosas e de reabilitação;
c) 300,00 euros ( trezentos euros ), relativos a viagens que efectuou;
d) 23.354,11 euros ( vinte e três mil trezentos e cinquenta e quatro euros e onze cêntimos ), a título da IPP de que é portador e correspondente perda da capacidade de ganho e;
e) 5.800,00 euros ( cinco mil e oitocentos euros ), a título de danos morais; tudo, no montante global de 55.833,32 euros ( cinquenta e cinco mil oitocentos e trinta e três euros e trinta e dois cêntimos );
absolvendo-os do demais, por ele, pedido.
Mais se condenou os mesmos, solidariamente, a pagar aos HUC a quantia de 3.391,86 euros ( três mil trezentos e noventa e um euros e oitenta e seis cêntimos ), e respectivos juros de mora
Porém, relativamente ao FGA, será deduzida a franquia a que se refere o disposto no artigo 21, n.º 3, do DL 522/85, acima já referido.
Considerou-se totalmente improcedente, por não provada, relativamente às RR. “B...” e “C...” a acção, absolvo-se as mesmas dos pedidos contra ambas formulados.
Sobre as quantias atribuídas a título de danos patrimoniais acrescem juros de mora, sempre sobre o capital em dívida, à taxa de 7 %, ao ano, prevista na Portaria n.º 263/99, de 12/04/99, desde a citação e até 30/04/03 e à de 4%, ao ano, prevista na Portaria 291/2003, de 08/04, desde 01/05/03 e até efectivo e integral pagamento e sobre as atribuídas a título de danos não patrimoniais, acrescem juros, à taxa de 4%, ao ano, também sobre o capital em dívida, desde a data da presente decisão e até efectivo e integral pagamento.
Sobre a quantia devida aos HUC, são, igualmente, devidos juros de mora, desde a respectiva notificação e até integral pagamento, nas mesmas condições dos devidos ao A.
1-12- Não se conformando com esta sentença, dela vieram recorrer a interveniente F..., o G... e o R. E..., recursos que foram admitidos como apelações e com efeito devolutivo.
1-13- A recorrente F... alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- A sentença entende que o veículo HD era conduzido pelo co-réu E... por conta, sob direcção e no interesse da F... para quem trabalhou mediante remuneração o que revela uma relação de comissário/comitente e, neste pressuposto condenou solidariamente a apelante no pagamento dos danos emergente do acidente.
2ª- Resultou provado que a recorrente havia adquirido o veículo no âmbito da sua actividade comercial de compra e venda de automóveis com o objectivo de o comercializar, que para o efeito o mesmo se encontrava exposto e imobilizado no seu stand, que o R. E... sabia que tal veículo não tinha seguro, que “os proprietários” do veículo se encontravam ausentes no estrangeiro, mais tendo sido provado e demonstrado que o E... na altura do sinistro não se dirigia à estação dos CTT de Miranda de Corvo para enviar correspondência da apelante pois já passava da hora do respectivo fecho e porque o trajecto do acidente era o mais longo para a dita estação.
3ª- Na sequência de tal matéria dada como provada, não poderia a sentença recorrida, mais concretamente na alínea u) dos factos provados, dar como provado que “na altura do acidente o co-réu E... conduzia o veículo HD por conta, sob a direcção e no interesse da chamada F....
4ª- Dos factos provados constantes das alíneas T), X), AA), BB) e CC) e ainda da fundamentação da resposta negativa ao quesito 31º de base instrutória, resulta que o E... no momento do acidente conduzia o HD não no interesse da apelante, mas no seu próprio interesse pessoal, pelo que tinha a respectiva e efectiva direcção do mesmo.
5ª- Até porque tinha conhecimento de que inexistia seguro para tal veículo e que o mesmo foi adquirido pela proprietária para ser comercializado e por isso se encontrava exposto e imobilizado no stand, pelo que ao usá-lo, fez do mesmo uma utilização abusiva, já que, em virtude de conhecer tais factos, dos mesmos resulta inequivocamente que a apelante não pretendia que o mesmo circulasse.
6ª- Assim sendo e não tendo a recorrente a direcção efectiva do HD na altura do acidente e não sendo este nesse momento conduzido no seu interesse, não deve a apelante ser solidariamente responsável pelos danos do sinistro.
7ª- Ao decidir como decidiu, o Mº Juiz violou o art. 503º do C.Civil.
1-14- O recorrente G... alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- No pedido de intervenção espontânea efectuado pelos HUC não é demandado o apelante, mas apenas as duas RR. Seguradoras.
2ª- O pedido foi formulado em articulado próprio, não havendo adesão ao articulado já apresentado pelo A., sendo que apenas neste era demandado o FGA.
3ª- Assim, a condenação do FGA no pagamento do pedido efectuado pelos HUC extrava o pedido por estes efectuado, violando, assim, a limitação imposta pelo disposto no art. 661º e 668º nº 1 al. e) e art. 268º do C.P.Civil.
4ª- Devendo, como tal, ser alterada a sentença nesta parte, absolvendo-se o FGA do pedido dos HUC.
5ª- Em todo o caso e como o pedido não lhe era dirigido, nunca foi o FGA do mesmo notificado, não o tendo contestado, pelo que sempre seria nulo o processado após o momento da referida notificação omitida, de acordo com o art. 194º e segs. do C.P.Civil, tendo-se violado o art. 324º do C.P.Civil.
6ª- Por esta razão, também não deveria o FGA ter sido condenado em tal pedido.
1-15- O recorrente E... alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões:
1ª- Não foi atendida nem valorada pelo tribunal a prova produzida através do depoimento da testemunha Rui Manuel Rodrigues Gonçalves, encontrando-se, assim, em manifesta contradição com tal prova o facto provado na al. G) dos factos provados da sentença.
2ª- Tal testemunha descreveu ao tribunal ter presenciado o co-réu e ora recorrente, pouco tempo antes do acidente, deteve a marcha da viatura que conduzia no sinal de “stop”, contrariamente ao que dá como provado a sentença.
3ª Sucedendo até que o Mº Juiz não apreciou, de todo, este elemento probatório, não lhe fazendo qualquer referência na resposta à base instrutória, nem tendo sequer nela chegado a dizer, como tinha o dever de dizer, se o achaca credível ou não e, na segunda hipótese, porquê.
4ª- Sendo que tal material probatório, mesmo tendo sido produzido, como foi o caso, por uma testemunha indicada por outra parte, deve reputar-se adquirido para o processo, pertencendo à comunidade dos sujeitos processuais.
5ª- O tribunal não considerou credível o depoimento da testemunha Fernando Mendes, não tendo, porém, fundamentado a alegada falta de credibilidade do mesmo, como devia, apontando-lhe incoerências decorrentes da violação de regras da lógica ou decorrentes da violação das regras da experiência comum, antes baseou tal alegada falta de credibilidade em juízos subjectivos e aleatórios.
6ª- Conforme resulta da transcrição da prova gravada, a testemunha declarou ter presenciado o ora recorrente parado no “stop”, precedido de uma carrinha, também parada no mesmo “stop”, mais tendo declarado que não tinha dúvidas sobre que era efectivamente o ora recorrente que ali se encontrava, porque o conhecia, bem como ao carro.
7ª- Não constitui uma explicação lógica e racional, antes subjectiva e aleatória, para a falta de credibilidade que atribui ao depoimento desta testemunha, o Mº Juiz dizer dela que « é estranho que conhecesse o veículo ... do stand, onde nunca foi, mas porque o viu na estrada quando ali passa, não sendo verosímil que estivesse interessado nos veículos que ali se encontravam».
8ª- Não se compreende, na verdade, porque é que aquele magistrado achou estranho que a testemunha conhecesse o veículo sem nunca ter ido ao stand, porque, conforme afirmou, o via na estrada quando ali passava.
9ª- Também não constitui um raciocínio ou juízo lógico e em conformidade com as regras comuns de experiência, susceptível de retirar credibilidade ao depoimento em apreço, a observação de a testemunha «até referiu o período de tempo em que tal viatura já ali se encontrava»
10ª- Com efeito, resulta claramente da inquirição supra transcrita que foi o Mº Juiz que instou de forma assaz insistente a testemunha sobre tal matéria, pois a mesma, naturalmente, já não fazia ideia sobre quanto tempo o carro tinha estado em exposição, tendo em conta que os factos ocorreram anos antes da realização do julgamento.
11ª- Se o veículo conduzido pela testemunha Fernando Rodrigues Mendes tiver feito o percurso entre o “stop” e o ponto onde ouviu o estrondo do acidente a uma velocidade média de 40 Kms/hora, o que é perfeitamente razoável dentro de uma localidade, teria levado 9 segundos a percorrer aqueles metros, não se podendo dizer, como faz o Mº Juiz, que estar um veículo parado 9 segundos num “stop”, antes de entrar noutra estrada com prioridade seja estar aí muito tempo.
12ª- Nem há qualquer contradição entre o facto de a testemunha em apreço ter dito que não viu nenhum carro a circular atrás dela antes de virar para a estrada da Lousã e o facto de o ora recorrente poder ter estado ali parado cerca de 9 segundos, pois à frente do ora recorrente, no dito “stop” estava parada uma carrinha branca.
13ª- A qual teve necessariamente que arrancar antes do veículo do ora recorrente, após o que, e só então, o veículo do recorrente se pôde posicionar no “stop”, de modo a verificar se também podia seguir para a estrada para onde a dita carrinha tinha acabado de seguir.
14ª- Até porque a prova deve ser globalmente valorada, para tanto devendo no caso vertente, conjugar-se os depoimentos das testemunhas Rui Manuel Gonçalves e Fernando Mendes.
15ª- A sentença recorrida assentou também indevidamente na desvalorização integral do depoimento da testemunha Joaquim Rodrigues, não tendo provado os factos que esta testemunha presenciou, de que o A. recorrido atravessou a estrada obliquamente ao eixo da via e foi colhido quando ainda se encontrava no asfalto da estrada, a cerca de 1 metro ou 1 metro e meio da berma.
16ª- Não há, ao contrário do que afirma o Mº Juiz, qualquer contradição no depoimento desta testemunha e a sindicância da sua coerência lógica e cronológica é perfeitamente possível, mesmo sem se ter estado em contacto directo com a prova, como o Mº Juiz esteve.
17ª- Tal como foi sublinhado durante a inquirição desta testemunha, ela não viu o “filme” todo, mas só algumas partes ou cenas do mesmo, pelo que o facto de ter sido “despertada” para o acidente pelo estrondo do mesmo provocado pelo choque dos dois carros e não pelo embate de um dos veículos no A., não é incompatível, nem lógica nem cronologicamente, com o facto de a testemunha ter visto um desses carros projectados em direcção ao A. e á ainda menos incompatível com ter visto o local da estrada onde o A. se encontrava quando foi colhido por aquele veículo.
18ª- Razão pela qual, sem conceder, ainda que hipoteticamente a recorrente não tivesse parado no sinal de “stop”, sempre haveria concorrência de culpa do A., não podendo a sentença considerar o recorrente o único e exclusivo culpado do acidente.
19ª- A sentença contém lapso manifesto, constituindo um erro de cálculo na operação aritmética de fixação do montante devido ao A. a título de indemnização pela IPP de 15% de que é portador, o qual deve ser rectificado, ao abrigo do disposto no art. 667º nºs 1 e 2 do C.P.C., fixando-se a indemnização a que o A. teria direito decorrente daquela IPP, no quantitativo de 3.652.538$00 ou de 18.218,78 euros.
1-16- O apelado A... respondeu a estas alegações, sustentando não provimento do recurso e a confirmação da sentença recorrida.
1-17- O Mº Juiz veio, em relação à invocação de nulidade da sentença por banda do recorrente E..., sustentar que essa irregularidade se não verifica. Porém, em relação ao erro material de cálculo apontado pelo mesmo R. à sentença, entendeu rectificá-lo condenando os RR. no pagamento 19.780 euros ( ao invés de 23.354,11 euros ) a título da IPP de que é portador e correspondente perda da capacidade de ganho, tudo no montante global de 52.229,21 euros ( ao invés de 55.833,32 euros ). No mais manteve a condenação proferida.
Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
II- Fundamentação:
2-1- Uma vez que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ).
2-2- Após a resposta à matéria da base instrutória resultou provado que:
A) Em 14-5-98 o veículo 44-89-IG tinha transferida a sua responsabilidade civil para a co-ré B..., por contrato titulado pela apólice nº 0514011, sendo tomador do seguro Mário Wilson Gomes Reis, estando a propriedade do mesmo registada em nome de BFB Rent -Comércio e Aluguer de Bens.
B) Em 14-5-98, o automóvel ligeiro de passageiros de matrícula 07-91-HD, modelo Corsa Combo Van, estava registado em nome de D....
C) À data do acidente, o co-réu E... era portador de uma alcoolemia de 0,52g/l.
D) Teor da apólice de seguro nº 2-1-43-898868/09 constante como documento junto a fols. 92, que se dá por integralmente reproduzida.
E) No dia 14 de Maio de 1998, cerca das 18h30m, no entroncamento das estradas nacionais 17-1 com a 342, em Miranda do Corvo, ocorreu um embate em que foram intervenientes, o automóvel ligeiro de passageiros de matrícula 44-89-IG, seguindo no sentido Miranda do Corvo – Semide e o automóvel ligeiro de passageiros de matrícula 07-91-HD, modelo Corsa Combo Van, conduzido por E..., seguindo no sentido Lousã - Miranda do Corvo.
F) O A. encontrava-se na berma da EN 17-1, fora da via, ao fundo das escadas da sua casa.
G) Desrespeitando o sinal vertical vulgo STOP, com que se deparam os condutores que circulam no sentido de trânsito do HD, antes de entrar na EN 17-1, o condutor não parou a sua marcha, indo embater no IG.
H) O qual foi projectado para a meia faixa direita e berma contrária aquela em que circulava, embatendo no A..
I) O embate dos veículos ocorreu em plena faixa de rodagem do IG.
J) O condutor do IG pôs-se em fuga, após o acidente, abandonando o carro que conduzia.
L) Ocorrido o acidente, o co-réu E... omitiu à autoridade a inexistência de seguro, solicitando-lhe prazo para exibir comprovativo da existência do mesmo.
M) Dirigiu-se a um mediador de seguros da C..., da área de Miranda do Corvo, das suas relações, falou-lhe do acidente e pediu-lhe que fizesse um contrato de seguro, com início a partir de 11 de Maio de 1998.
N) Em comunhão de esforços e com o intuito de enganarem a co-ré C..., acordaram o co-réu e o mediador em prestarem falsas declarações à seguradora quanto ao início do contrato.
O) O mediador deslocou-se à Delegação da C... de Coimbra, em 15 de Maio e, face à data aposta na proposta de seguro - 9 de Maio - conseguiu que o funcionário da R. emitisse o certificado de carta verde com data de 11 de Maio.
P) Participado o acidente, verificou a R. C... que o contrato havia sido celebrado com base em declarações inexactas e não teria aceite a proposta caso soubesse que a data não correspondia aquela em que efectivamente foi celebrado.
Q) A R. procedeu à anulação do seguro, a pedido do co-réu Alexandre, com efeitos desde 11 de Maio de 1998.
R) Tendo tal co-réu reembolsado tal seguradora das despesas que esta tinha efectuado com a averiguação do sinistro.
S) Em 4-02-98, o R. D... transferiu a sua apólice de seguro para um outro veículo que entretanto adquirira.
T) A chamada «F...», com sede em Bairro Novo, Miranda do Corvo, adquirira o veículo (HD) no âmbito da sua actividade de compra e venda de veículos automóveis.
U) Na altura do acidente, o co-réu E... conduzia o veículo HD por conta, sob direcção e no interesse da chamada «F...», para quem trabalhou mediante remuneração, cerca de um ano.
V) Incumbindo-lhe, dentro da sua prestação laboral à chamada, deslocar-se frequentemente à Estação dos Correios de Miranda do Corvo.
X) O co-réu E... deslocou-se no veículo HD, sabendo que o mesmo não estava segurado.
Z) Sendo habitualmente nos veículos em carteira da sociedade que prestava o seu trabalho à chamada.
AA) À semelhança das demais, o HD encontrava-se exposto e imobilizado no stand da chamada.
BB) Sendo do conhecimento do co-réu E... a inexistência de seguro.
CC) Na semana do acidente, os dois únicos sócios da chamada encontravam-se ausentes na Alemanha, sendo o co-réu E... incumbido de ficar a tomar conta do «stand».
DD) O A. foi, na sequência do embate, colhido pelo veículo IG, tal como descrito nas respostas aos quesitos 2 a 5.
EE) Tendo de ser evacuado para o Hospital.
FF) E recebendo primeiros socorros no Centro de Saúde de Miranda do Corvo, de onde foi enviado para os HUC sendo internado em Ortopedia 1.
GG) Foi submetido a intervenção cirúrgica em 29-05-1998 para osteossíntese de fractura diafisária do fémur direito N5td.
HH) Sofreu fractura nos 7º e 8º arcos costais à esquerda com dificuldades respiratórias.
II) Após a intervenção cirúrgica, teve de retirar pontos (15 dias depois) e ficou a marchar com apoio de canadianas submetendo-se a reabilitação.
JJ) Sofreu fractura do fémur viciosamente consolidada sendo submetido a nova intervenção cirúrgica, na Casa de Saúde de Coimbra, em 18-06-1999, seguindo-se recuperação com alta em 30-06-2000.
LL) Entre 14-5-98 e 30-06-2000 sofreu incapacidade temporária absoluta, ficando incapacitado de trabalhar durante 25 meses e meio.
MM) O A. é gerente da «Mirandinveste, Ldª» e «Capitão, Ldª», onde trabalha a tempo inteiro.
NN) Auferindo na primeira o ordenado mensal de esc: 100.000$00 e na segunda 70.000$00.
OO) E deixando de exercer a actividade, deixou de receber tais ordenados.
PP) A partir da consolidação das lesões, padece de incapacidade permanente parcial de 15%.
QQ) Gastou em despesas médicas e medicamentosas a quantia global de esc: 953. 557$00.
RR) Despendeu em deslocações para os hospitais, casa de saúde e médico, quantia não apurada.
SS) À data do acidente era pessoa saudável e sem qualquer mazela.
TT) Sofreu dores e continua a sentir.
UU) Ficou com ligeiro manquejar da perna direita, na qual deixou de ter força.
VV) Como consequência do atropelamento, os HUC despenderam em encargos em assistência ao autor a importância de 3.391,86 euros, tendo aquele sido assistido no serviço de urgência em 14/5/98, ficado internado no Serviço de Ortopedia 1H até 9 de Junho e assistido em consulta externa nos dias 29-07, 16-09 e 6-10-98.
XX) Conforme assento de nascimento junto a fls. 688, aqui dado por reproduzido, o A. nasceu em 15 de Setembro de 1945.
2-3- Como se sabe, os recursos deverão ser apreciados pela ordem da sua interposição ( art. 710º nº 1 do C.P.Civil ), razão por que começaremos por apreciar a apelação interposta pela interveniente F..., conhecendo depois o recurso interposto pelo G... e, por fim, a apelação do R. E....
Porém, como assunto prévio, deveremos apreciar a questão levantada pelo A. nas suas contra-alegações e que diz respeito à tempestividade das alegações do R. E..., visto que, no seu entender, para poder gozar do prazo suplementar de 10 dias a que alude o art. 698º nº 6 do C.P.Civil, deveria ter especificado, no requerimento de interposição de recurso, de que pretendia impugnar a matéria de facto gravada. Não o tendo feito, deve aplicar-se a regra geral do prazo para alegações, isto é, 30 dias, prazo que foi ultrapassado, pelo que as alegações entraram em juízo intempestivamente.
É certo que as alegações do R. deram entrada em juízo para além de 30 dias contados após a notificação do despacho de recebimento do recurso.
Nos termos do art. 698º nº 2 do C.P.Civil, o recorrente deve alegar por escrito no prazo de 30 dias, contados da notificação do despacho de recebimento do recurso. Todavia, o nº 6 da mesma disposição concede o prazo suplementar de 10 dias, ao recorrente cujo recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada. Ou seja, quando o recorrente impugne a matéria dada como provada, com base na prova gravada, tem um prazo de 40 dias para apresentar as alegações.
A questão que coloca o A. recorrido é a de saber se o recorrente para beneficiar deste prazo dilatado, terá, logo que interpõe o recurso, dizer que pretende a reapreciação da prova através da gravação efectuada.
E a nosso ver, a resposta terá de ser negativa. Em primeiro lugar porque não vemos que a disposição legal em evidência imponha esse procedimento. Além disso, tal entendimento, imporia ao recorrente uma obrigação inadmissível, porque no momento de interpor o recurso, poderia não estar ainda ciente do interesse e cabimento da reapreciação da prova gravada. Normalmente só com a análise e avaliação das gravações é que se toma a decisão da dita impugnação.
Quer isto dizer que umas alegações entradas em juízo no prazo dilatado de 40 dias, caso o recorrente impugne a matéria de facto dado como provada através das gravações efectuadas, deverão ser consideradas como tempestivas.
Revertendo esta regra para o caso vertente, porque as alegações em causa entraram nesse prazo ( vide fls. 855 ), conclui-se que as mesmas entraram em tempo.
Carece de razão, quanto a este aspecto, o A., recorrido.
A) Apelação da interveniente F...:
2-4- Como se vê pelo teor das alegações de recurso, a apelante apenas coloca em dúvida o facto de se ter dado como assente que o R. E... conduzisse, na altura do acidente, o veículo por conta, sob direcção e no interesse da F.... Pelo contrário, no entender da apelante, esse R., nessa altura, conduzia o veículo no seu próprio interesse e não no dela, apelante. Pretende com esta objecção afastar a relação de comitente/comissário a que se refere o art. 503º nº 1 do C.Civil.
Sobre o assunto provou-se que a chamada «F...», com sede em Bairro Novo, Miranda do Corvo, adquirira o veículo (HD) no âmbito da sua actividade de compra e venda de veículos automóveis ( T ). Na altura do acidente, o co-réu E... conduzia o veículo HD por conta, sob direcção e no interesse da chamada «F...», para quem trabalhou mediante remuneração, cerca de um ano ( U ), incumbindo-lhe, dentro da sua prestação laboral à chamada, deslocar-se frequentemente à Estação dos Correios de Miranda do Corvo ( V). O co-réu E... deslocou-se no veículo HD, sabendo que o mesmo não estava segurado ( X ). Sendo habitualmente nos veículos em carteira da sociedade que prestava o seu trabalho à chamada ( Z ). À semelhança das demais, o HD encontrava-se exposto e imobilizado no stand da chamada ( AA ). Sendo do conhecimento do co-réu E... a inexistência de seguro ( BB). Na semana do acidente, os dois únicos sócios da chamada encontravam-se ausentes na Alemanha, sendo o co-réu E... incumbido de ficar a tomar conta do «stand» ( CC ).
No fundo e de essencial, a apelante contesta que se tivesse dado como provado o facto referido na alínea U, isto é, que o R. E... conduzisse o veículo HD por conta, sob direcção e no interesse dela, «F...». Esta matéria fazia parte do quesito 29º, ao qual foi dada a resposta de “provado” com uma pequena alteração, sem interesse aqui salientar.
Segundo a apelante, resultou provado que a recorrente havia adquirido o veículo no âmbito da sua actividade comercial de compra e venda de automóveis com o objectivo de o comercializar, que para o efeito o mesmo se encontrava exposto e imobilizado no seu stand, que o R. E... sabia que tal veículo não tinha seguro, que “os proprietários” do veículo se encontravam ausentes no estrangeiro, mais tendo sido provado e demonstrado que o E... na altura do sinistro não se dirigia à estação dos CTT de Miranda de Corvo para enviar correspondência da apelante pois já passava da hora do respectivo fecho e porque o trajecto do acidente era o mais longo para a dita estação. Na sequência de tal matéria dada como provada, não poderia a sentença recorrida, dar como provada tal matéria.
Não concordamos com esta maneira de ver as coisas por banda da apelante, visto que os factos que evidencia não excluem, per si, a circunstância dada como provada. Além disso, não é possível fazer qualquer dedução de um facto não provado. Aqui estamos a referirmo-nos à afirmação de que o R. E..., na altura do sinistro, não se dirigia à estação dos CTT de Miranda de Corvo.
Simplesmente entendemos subtrair aos acervo dos factos provados a circunstância relatada visto que não se trata de qualquer facto, tratando-se antes da asserção legal. Ora, sabendo-se que à base instrutória só devem ser levados factos concretos e não enunciados legais, juízos de valor ou factos conclusivos ( art. 511º nº 1 do C.P.Civil ), teremos que ter como não escrita a circunstância de que “o R. E... conduzia o veículo HD por conta, sob direcção e no interesse da chamada «F...»”. Aliás e por outro lado, não se deve levar à base intrutória elementos que contenham em si próprios a solução de direito que é objecto da acção, pelo que também por este prisma tal circunstância deveria ser afastada dessa base. A parte deveria, através de factos simples, retractar a realidade em causa, ou seja, de que a F... tinha a direcção efectiva do veículo e que o R. o conduzia sob a sua direcção e interesse.
Subtraindo aquelas circunstâncias, a questão que se coloca será a de saber se, se através dos ( outros ) factos provados, será possível deduzir a relação de comitente/comissário a que alude o art. 503º nº 1 do C.Civil.
Estabelece esta disposição que “aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação”.
Estabelece esta norma a responsabilidade pelo risco em relação aos veículos de circulação terrestre. Esta responsabilidade depende de duas circunstâncias: Ter a pessoa a direcção efectiva do veículo causador do dano e estar o veículo a ser utilizado no seu próprio interesse.
Provou-se que a «F...», adquirira o veículo em causa, no âmbito da sua actividade de compra e venda de veículos automóveis. Na altura do acidente, o co-réu E... conduzia o veículo, tendo trabalhado mediante remuneração, cerca de um ano, incumbindo-lhe, dentro da sua prestação laboral à chamada, deslocar-se frequentemente à Estação dos Correios de Miranda do Corvo. O co-réu E... deslocou-se no veículo HD, sabendo que o mesmo não estava segurado. Sendo habitualmente nos veículos em carteira da sociedade que prestava o seu trabalho à chamada. À semelhança das demais, o HD encontrava-se exposto e imobilizado no stand da chamada. Sendo do conhecimento do co-réu E... a inexistência de seguro. Na semana do acidente, os dois únicos sócios da chamada encontravam-se ausentes na Alemanha, sendo o co-réu E... incumbido de ficar a tomar conta do «stand».
Destes factos, se é possível dizer que a «F...» tinha a direcção efectiva do veículo, visto que era dele proprietária e mantinha-o exposto e imobilizado para venda no seu stand, já não poderemos ter tanta certeza no que respeita à utilização do veículo, pelo R., no seu interesse. Note-se que o automóvel nem seguro possuía, como o R. bem sabia, pelo que será de presumir ( por ser uma circunstância de boa prática ) que a sua circulação não seria desejável, pela proprietária. Para provar que agia no interesse da proprietária, o R. E... alegou que lhe incumbia, dentro da sua prestação laboral à empresa, deslocar-se frequentemente à estação dos correios de Miranda do Corvo, o que fez no dia 14-5-98, antes da hora do encerramento do correio, para expedir correspondência da sociedade, deslocando-se no veículo HD, por ignorar que o mesmo não estava segurado. Destes factos, apenas se provou que incumbia ao R. deslocar-se frequentemente à estação dos correios de Miranda do Corvo e que na altura se deslocava no veículo em causa, mas sabendo que o mesmo não se encontrava segurado ( resposta ao quesito 32º ). Isto é, não se demonstrou que se deslocava no veículo, no dia em causa, ao serviço ( e interesse ) da empresa.
Não denunciando, a nosso ver, os factos provados que o veículo circulava no interesse da «F...»[ Sendo de sublinhar aqui, que seria necessário provar-se a relação comissário/comitente traduzida num vínculo de autoridade e subordinação correspectivas ( art. 500º do C.Civil ).], é evidente que ela não poderá ser responsabilizada nos termos do art. 503º nº 1 do C.Civil ( e só nesta disposição legal se buscou a sua responsabilidade civil ).
Neste contexto, a sua absolvição do pedido justifica-se, o que se ordenará a final.
O recurso, se bem que por estas razões, será procedente.
B) Apelação do G...:
2-5- No recurso o apelante sustenta que, no pedido de intervenção espontânea efectuado pelos HUC, não é demandado ele, recorrente, mas apenas as duas RR. Seguradoras. O pedido foi formulado em articulado próprio, não havendo adesão ao articulado já apresentado pelo A., sendo que apenas neste era demandado o FGA. Assim, a condenação do FGA no pagamento do pedido efectuado pelos HUC, extrava o pedido por estes efectuado, violando, assim, a limitação imposta pelo disposto no art. 661º e 668º nº 1 al. e) e art. 268º do C.P.Civil, devendo, como tal, ser alterada a sentença nesta parte, absolvendo-se o FGA do pedido dos HUC.
Compulsando a respectiva petição verifica-se que os HUC referiram:
Os Hospitais da Universidade de Coimbra ... na acção emergente de acidente de viação que A... ... move à C...... e contra a B... ... ( vem reclamar ) o seu direito de crédito, nos termos dos arts. 320º al. a) b) e segs. do Código Processo Civil, incidente de Intervenção Principal Espontânea com coligação com o A., com os fundamentos seguintes ...”. Terminam dizendo “nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente pedido, ser julgado procedente e provado e, em consequência, condenaram-se as Rés a pagar à ora Interveniente Principal a quantia de ...”.
Quer dizer, o interveniente foi impreciso na forma como dirigiu o seu pedido, já que o A. A... não moveu a acção apenas contra as aludidas Seguradoras. Na sequência dessa sua imprecisão, acabou por pedir a condenação das indicadas RR. Seguradoras no pagamento da importância monetária que indica.
Significa isto que, não só não dirigiu o seu requerimento de intervenção aos outros RR., como não deduziu o pedido contra qualquer dos outros RR. (designadamente contra o R. FGA ).
Nos termos do art. 268º do C.P.Civil, citado o R. a instância deve manter-se a mesma em relação às pessoas. É o princípio da estabilidade da instância. Este princípio sobre as modificações subjectivas consignadas na lei, onde se deverá inscrever, para o aqui interessa, a intervenção espontânea ( arts. 320 e segs. do mesmo Código ). Nesta o interveniente ( nova parte ) pode deduzir articulado próprio, formulando a sua própria petição ( se a intervenção for activa - art. 323º nº 1 -), o que sucedeu no caso vertente. Tendo formulado petição própria, o interveniente identificou aí as partes, como, aliás era obrigado a fazer ( art. 467º nº 1 al. a) ) e formulou depois, o pedido contra elas. Ora, como já viu, nessa identificação de partes e na formulação do pedido, o interveniente deixou de fora o FGA, pelo que teremos que concluir que o FGA não é parte ( em relação ao pedido formulado pelos FGA ) e por isso, não poderá ser condenado nesse pedido.
Se bem que por estas razões, a pretensão do apelante de se ver absolvido do pedido formulado pelo HUC, é de aceitar, pelo que, neste contexto, a apelação procederá.
C) Apelação do R. E...:
2-6- Como o apelante claramente diz no início das suas alegações em jeito de síntese, o presente recurso tem por objecto a existência de contradições entre a prova produzida na audiência de julgamento e factos dados como provados e/ou não provados, que fundamentaram a decisão proferida e, por outro lado, a não valoração da prova produzida durante o julgamento, sendo certo que a alegada incredibilidade ou inverosimilhança - na perspectiva do tribunal a quo - de alguns elementos probatórios não foi fundamentada, como deveria ter sido, por juízos lógicos, coerentes e decorrentes das regras de experiência comum, antes assentou em raciocínios subjectivos e aleatórios.
Com esta argumentação, o apelante, de essencial, contesta a forma o tribunal respondeu ao quesito 3º ( onde se perguntava se o A. desrespeitou “ o sinal vertical vulgo STOP, com que se deparam os condutores que circulam no sentido de trânsito do HD, antes de entrar na EN 17-1, o condutor não parou a sua marcha, indo embater no IG” ), quesito a que foi dada a resposta de “provado”.
Como ponto prévio deveremos dizer que nos termos dos arts. 712º nº 1 al. a), 690º A e 522º C do C.P.Civil, a impugnação sobre a matéria de facto foi, formalmente, correcta. A questão, porém, que nos é colocada, é a saber se a alteração pretendida, em concreto, se justifica.
Segundo o apelante a alteração da resposta ao quesito compreende-se porque não foi atendida nem valorada pelo tribunal a prova produzida através do depoimento da testemunha Rui Manuel Rodrigues Gonçalves, encontrando-se, assim, em manifesta contradição com tal prova, o facto provado na al. G) dos factos provados da sentença.
Neste facto ( al. G) ), consta a resposta ao quesito 3º, isto é, que o A. desrespeitou o sinal de STOP em causa.
A resposta ao quesito, foi justificada pelo Mº Juiz, essencialmente, através dos depoimentos de Paulo Jorge Fernandes Henriques ( que seguia atrás do IG ) e de Armando Manuel Silva Fonseca ( que trabalha numa estação de serviço localizada nas proximidades do local onde ocorreu o acidente ), testemunhas presenciais do evento. Aliás de forma esclarecedora, o Mº Juiz, sobre a convicção a que chegou para dar resposta a este essencial quesito, referiu que “analisando todos estes elementos probatórios e no que se refere à forma como ocorreu o acidente, tendo em conta que o Peugeot ( o IG ) se deslocava na estrada M. do Corvo - Semide e não precisava de dela sair para continuar a sua marcha, nada aponta no sentido de que tenha sido este a sair da sua mão de trânsito e nem se apontou qualquer circunstância que o faça presumir. Ao invés, o co-réu E... é que pretendia entrar na estrada de onde provinha o Peugeot e lhe cortou a linha de trânsito, fazendo com que o respectivo condutor perdesse o seu domínio e, nas condições supra-referidas foi colher o A.. “. Isto é, o Mº Juiz deu uma explicação, que consideramos plausível, para a convicção que formou em relação à forma como o acidente ocorreu.
Segundo o apelante, a testemunha Rui Manuel Rodrigues Gonçalves, antes da intervenção no seu depoimento do Mº Juiz, chegou a produzir material para a decisão da causa, pois disse que ela própria ( que seria à frente do R. E... ) tinha parado no sinal em causa e que este R. também o tinha feito.
A testemunha terá dito “sim, eu parei no stop” e à pergunta se o R. teria também parado atrás dele, obrigatoriamente ela respondeu “sim, sim”.
Se bem observarmos este depoimento, o mesmo não é suficiente para desmentir a materialidade assente através da resposta ao quesito em causa. É que uma coisa é parar num sinal de “stop” em virtude de o carro que o precedia ter parado aí. E outra coisa diversa será o respeitar a determinação desse sinal, que é, como se sabe, a obrigatoriedade do condutor não só de parar, mas também de ceder a passagem a todos os veículos que transitem na via onde vai entrar ( sinal B2 - art. 3º A do Regulamento do C. Estrada, então em vigor ). Claro que o depoimento da testemunha só incidiu sobre a paragem ( aliás irrelevante porque ocorreu em resultado da sua própria paragem no sinal de stop, entendendo-se que o R., quando o veículo da testemunha entrasse na outra via e saísse da sua frente, novamente deveria parar, em obediência ao sinal, para verificar se teria que ceder a passagem a algum veículo ) e não já sobre a cedência de passagem.
Portanto não vemos, face a esse depoimento, qualquer razão para alterar a resposta ao quesito.
Mas mesmo que assim não fosse, como temos vindo a entender, só quando os elementos dos autos levem inequivocamente a uma resposta diversa da dada na 1ª instância, é que entendemos dever alterar as respostas. É que só nestas circunstâncias estamos perante um erro de julgamento. O mesmo não sucederá quando existam elementos de prova contraditórios, pois neste caso deve valer a resposta dada pelo tribunal recorrido, já que se entra então no âmbito da convicção e da liberdade de julgamento, que não cabe a este tribunal controlar ( art. 655º do mesmo Código ). Isto porque estando o juiz de 1ª instância perante a pessoa que depõe, melhor que ninguém se apercebe da forma como realiza o seu depoimento, da convicção com que o presta, da espontaneidade que revela, das imprecisões que deixa escapar, de tudo enfim, o que serve para fundar a impressão que o depoimento deixa no espírito do julgador e contribui, em menor ou maior grau, para formar a sua convicção. Quer isto dizer que convém continuar a respeitar os princípios de oralidade, imediação e livre apreciação da prova, pelo que, em regra, o uso deste tribunal de controle e sindicabilidade sobre a convicção adquirida pelo juiz de 1ª instância se deve restringir aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão. Como a prova testemunhal é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, há que ser extremamente cauteloso e prudente na avaliação da credibilidade dos depoimentos testemunhais e, nesta avaliação, tem que reconhecer-se que o tribunal de 1ª instância está em melhores condições de a emitir, como já vimos. Na mesma linha deste entendimento, referiu-se no Acórdão de 13-1-01 (in Col. Jur. 2001, tomo 5, 85 ) que “apesar da maior amplitude conferida pela reforma do processo a um segundo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, a verdade é que não se trata de um segundo julgamento, devendo o tribunal reapreciar apenas os aspectos sob controvérsia. Por outro lado, mau grado a gravação magnética dos depoimentos oralmente prestados perante o tribunal a quo, as circunstância que a este tribunal se colocam não são inteiramente coincidentes. Isto para concluir, afinal, que mais do que uma simples divergência em relação ao decidido, é necessário que se demonstre, através dos concretos meios de prova que foram produzidos, que existiu um erro na apreciação do seu valor probatório, conclusão difícil quando os meios de prova porventura não se revelem inequívocos no sentido pretendido pelo apelante ou quando também eles sejam contrariados por outros meios de prova de igual ou superior valor ou credibilidade” ( neste mesmo sentido ainda, Acs. desta Relação subscritos pelo mesmo relator e 1º adjunto, nas apelações 350/99, 2101/02, 3182/02, 3371/02 , 316/03, 1065/03 e 1756/03, 779/06 e ainda Ac. de 5-10-00, Col. 2000, tomo IV, 27 ).
Não existem, pois, quaisquer razões para alterar a resposta ao quesito.
Ainda em relação ao depoimento da testemunha Rui Manuel Rodrigues Gonçalves, o recorrente sustenta que o Mº Juiz não lhe fez qualquer referência na resposta à base instrutória, nem tendo sequer nela chegado a dizer, como tinha o dever de dizer, se o achava credível ou não e, na segunda hipótese, porquê.
Em relação a esta objecção, haverá desde logo a salientar que a testemunha ( indicada pela R. F... ), não foi indicada para responder a tal quesito (vide fls.693 ). Além disso, a existir qualquer deficiência na fundamentação por banda do Mº Juiz ( e, a nosso ver, não existe visto que sobre tal facto essencial, a argumentação e justificação do Mº Juiz foi bastante e coerente ), tal só poderia originar decisão desta Relação, no sentido de que o tribunal de 1ª instância procedesse a uma melhor fundamentação, mas isto, a requerimento da parte, o que não foi feito ( art. 712º nº 5 do C.P.Civil ).
Sustenta depois o recorrente que o tribunal não considerou credível o depoimento da testemunha Fernando Mendes, não tendo, porém, fundamentado a alegada falta de credibilidade do mesmo, como devia, apontando-lhe incoerências decorrentes da violação de regras da lógica ou decorrentes da violação das regras da experiência comum, antes baseou tal alegada falta de credibilidade em juízos subjectivos e aleatórios.
Relativamente a este aspecto, remetemos para o que acima dissemos em relação à fundamentação das respostas aos quesitos.
Ainda em relação à resposta do ( primordial ) quesito 3º, o apelante sustenta que esta mesma testemunha declarou ter presenciado o ora recorrente parado no “stop”, precedido de uma carrinha, também parada no mesmo “stop”, mais tendo declarado que não tinha dúvidas sobre que era efectivamente o ora recorrente que ali se encontrava, porque o conhecia, bem como ao carro.
Em relação ao depoimento desta testemunha, o Mº Juiz exarou que a sua credibilidade lhe levantava dúvidas porque se lhe afigurava “estranho que conhecesse o veículo conduzido pelo E..., do stand onde nunca foi, mas porque o viu na estrada quando ali passa, não sendo verosímil que estivesse interessado em ver que veículos ali se encontravam, mas até referiu o período de tempo em que tal viatura ali se encontrava, para além de que ali passando, a conduzir não teria muito tempo para o fazer”.
Quer dizer, o depoimento da testemunha, pelos motivos que indicou o Mº Juiz, não serviu para fundar a convicção que formou sobre o acidente. Por outras palavras, esse depoimento não lhe mereceu crédito suficiente que o levasse a afastar a convicção a que chegou sobre a forma como o acidente se processou, em face do depoimento das testemunhas que indicou ( Paulo Jorge Fernandes Henriques e Armando Manuel Fonseca ).
De sublinhar que em matéria de convicção, como já acima dissemos, nos termos do art. 655º do C.P.Civil, existe, por parte do tribunal de 1ª instância, liberdade de julgamento, não cabendo a este Tribunal da Relação, controlar ou sindicar essa convicção. Não compete, por conseguinte, a este Tribunal apreciar o modo de formação da convicção do tribunal recorrido. Isto tudo para dizer que, se o tribunal julgador entendeu valorizar um depoimento em detrimento de outro ou outros, isso será consequência da liberdade de julgamento que vigora neste âmbito. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional 198/2004 ( DR II, de 2-6-2004, págs. 8545 e segs.), em relação ao princípio da livre apreciação da prova “...a censura quanto à formação da convicção do tribunal não pode consequentemente assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, da valoração da prova (sublinhado nosso ); tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção”, censura esta que o apelante, claramente, não fez.
Mas mesmo que assim não fosse, de forma alguma seria de aceitar a posição do apelante, porque a testemunha, para além de dizer, peremptoriamente, que não assistiu ao acidente ( o que não sucedeu com as testemunhas Paulo Jorge Fernandes Henriques e Armando Manuel Fonseca que foram presenciais do evento ) somente afirmou que viu o carro do R. E... parado no sinal de “stop” atrás de uma carrinha branca. Isto é, em relação a este aspecto, teve um depoimento semelhante ao da testemunha Rui Gonçalves. Como se disse acima, tendo o depoimento da testemunha incidido só sobre a paragem do R. atrás doutro veículo ( irrelevante, face ao acima dito)[Ou seja, porque ocorreu quando estava à sua frente outro veículo parado no sinal de stop, entendendo-se que o R., quando o veículo frente entrasse na outra via e saísse da sua frente, novamente deveria parar, em obediência ao sinal, para verificar se teria que ceder a passagem a algum veículo.] e não já sobre a cedência de passagem, o seu alcance é pouco relevante.
Também, face a este depoimento, não há que alterar a resposta a tal quesito.
Defende depois o recorrente que a sentença recorrida assentou também indevidamente na desvalorização integral do depoimento da testemunha Joaquim Rodrigues, não tendo provado os factos que esta testemunha presenciou, de que o A. recorrido atravessou a estrada obliquamente ao eixo da via e foi colhido quando ainda se encontrava no asfalto da estrada, a cerca de 1 metro ou 1 metro e meio da berma.
Aqui o apelante entra na análise à resposta ao quesito 2º ( onde se perguntava ( para o que aqui interessa ) se o A. “se encontrava na berma da EN 17-1, fora da via, ao fundo das escadas da sua casa” ao que se respondeu “provado” em contraposição à posição do R. que alegou que “no momento em que foi embatido pelo IG, o A. ainda se encontrava no asfalto, a cerca de um metro da berma, a proceder à travessia da estrada, vindo das bombas da gasolina GALP, em direcção a casa, não utilizando a passadeira existente a menos de 20 metros e procedendo à travessia obliquamente ao eixo da via” ( quesitos 9º, 10º e 11º ), aos quais foi dada resposta “não provados”.
O Mº Juiz baseou-se para responder à questão, no depoimento das testemunhas Paulo Jorge Fernandes Henriques e Armando Manuel Fonseca ( que recorde-se, presenciaram o acidente ) e que mencionaram que na altura do acidente o A. se encontrava na berma da estrada. Concretamente disse o julgador que “relativamente ao local onde o A. se encontrava, apenas se pode ter como certo, dada a posição em que se encontrava a trajectória dos veículos e sempre tendo como referência os depoimentos das testemunhas que presenciaram o acidente, que o mesmo já se encontrava na berma, desconhecendo-se como efectuou a travessia da estrada”. É certo que também mencionou que a testemunha Joaquim Rodrigues, tio do R. E..., disse que despertou para o acidente ao ouvir o estrondo e que viu o A. atravessar a estrada, tendo sido colhido quando ainda se encontrava na faixa de rodagem, a cerca de um metro da berma. Sucede que o Mº Juiz não deu muito crédito a este depoimento pelas razões indicadas na fundamentação às respostas da base intrutória, nos autos a fls.726 in fine.
Remetemos para o que acima dissemos sobre a liberdade de julgamento do tribunal de 1ª instância e sobre a posição que assumimos quando existam depoimentos contraditórios.
De sublinhar que a posição que o Mº Juiz assumiu sobre a questão se baseou no depoimento de testemunhas que presenciaram o acidente, o que não sucedeu com a testemunha Joaquim Rodrigues que só “despertou” para o evento quando ouviu o estrondo, ou seja, após o acidente ter ocorrido.
Pelas razões acima ditas, também aqui não vemos qualquer razão para alterar a convicção que sobre a questão assumiu o tribunal recorrido.
Não se alterando a matéria de facto dada como assente, foi certo o juízo sobre a culpa do R. E..., realizado na 1ª instância.
Por fim, o recorrente sustenta que a sentença contém lapso manifesto, constituindo um erro de cálculo na operação aritmética de fixação do montante devido ao A. a título de indemnização pela IPP de 15% de que é portador, o qual deve ser rectificado, ao abrigo do disposto no art. 667º nºs 1 e 2 do C.P.C., fixando-se a indemnização a que o A. teria direito decorrente daquela IPP, no quantitativo de 3.652.538$00 ou de 18.218,78 euros.
Como acima já se disse, o Mº Juiz recorrido, com base no disposto no art. 667º nºs 1 e 2, rectificou o erro de cálculo que entendeu ter cometido, condenando os RR. no pagamento 19.780 euros ( ao invés de 23.354,11 euros ) a título da IPP de que é portador e correspondente perda da capacidade de ganho, tudo no montante global de 52.229,21 euros ( ao invés de 55.833,32 euros ).
O apelante, aponta esse erro de cálculo, sustentando que o montante correcto será de 18.218,78 euros.
Existe ( ainda ) uma diferença entre a quantia rectificada e que é sustentada pelo apelante. A desigualdade reside no facto de o Mº Juiz ter considerado que restavam ao A. 13 anos de vida activa e o R. considerar que lhe restavam apenas 12 anos. O acidente ocorreu em 14-5-98, sendo que o A. nasceu a 15-9-45. Como se considerou na sentença recorrida a vida activa até aos 65 anos, o A. tinha, na realidade, na altura do acidente, mais de 12, mas menos 13 anos de vida activa, até àquela idade. O tribunal entendeu, na rectificação, atender aos 13 anos, opção que pôde tomar, visto que a indemnização neste âmbito é concedida através da equidade ( vide sentença e arts. 564º nº 2 e 566º nº 3 do C.Civil ), entrando os cálculos aritméticos como mero indicador de quantias a fixar. Serve isto para dizer que, se o tribunal atendeu aos aludidos 13 anos e daí chegou a uma importância ( fixada segundo a equidade ), não haverá qualquer rectificação a efectuar, porque ( já ) não existe qualquer erro de cálculo, sendo também certo que só este erro de cálculo foi objecto de reclamação. Por outras palavras, se o tribunal recorrido entendeu por bem atender àqueles 13 anos e partir daí para a fixação da indemnização, nada este tribunal poderá fazer em relação e essa opção, porque fora do objecto do recurso. Para aqui, convém dizer que, após a rectificação que o tribunal recorrido entendeu por bem efectuar, não existe qualquer erro de cálculo.
Mantém-se a posição assumida sobre o assunto no tribunal recorrido.
III- Decisão:
Por tudo o exposto, dá-se provimento ao recurso da R. F..., revoga-se a decisão recorrida, absolvendo do pedido esta R.. Dá-se, igualmente, provimento ao recurso da R. FGA, absolvendo-se este, do pedido formulado pelo HUC.
No mais, considerando-se improcedente o recurso do R. E..., confirma-se a douta sentença recorrida ( com a rectificação de fls. 961 a 963 ).
Custas na acção pelas partes, na proporção do respectivo vencimento.
Custas nos recursos, pelas partes vencidas.