Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||||||||||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||||||||||
Relator: | DR. SERRA LEITÃO | ||||||||||
Descritores: | ARGUIÇÃO DE NULIDADES ÓNUS DA ALEGAÇÃO E PROVA | ||||||||||
Data do Acordão: | 05/20/2004 | ||||||||||
Votação: | UNANIMIDADE | ||||||||||
Tribunal Recurso: | COVILHÃ | ||||||||||
Texto Integral: | S | ||||||||||
Meio Processual: | RECURSO DE APELAÇÃO | ||||||||||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||||||||||
Legislação Nacional: | ARTº.S 77º, Nº 1, DO CPT ; 8º DO DL 64-A/89, DE 27/12 . | ||||||||||
Sumário: | I – Nos termos do artº 77º, nº 1, do CPT, a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento do recurso, sob pena de se não conhecer desse pretenso vício . II – Nas acções de impugnação de despedimento ( considerado este como a declaração unilateral receptícia, emitida pelo empregador, no sentido de fazer cessar o contrato de trabalho ) o ónus de alegação e prova da facticidade integrante desse conceito impende sobre o trabalhador – artº 342º, nº 1, do C. Civil. III – Tendo o empregador o intuito de despedir o trabalhador e este concordando com essa vontade, declarando aceitar livremente o despedimento, face ao que aquele paga a este um valor indemnizatório acordado entre ambos, dá-se a cessação do contrato de trabalho por acordo das partes e não por efeito de um despedimento . IV – Para que este acordo seja válido a lei impõe que o mesmo revista a forma escrita, com a assinatura de ambos os outorgantes e contendo os demais elementos normativamente exigidos, sob pena de não ser válido esse dito acordo ( formalidade ad substantiam )– artº 8º do DL nº 64-A/89, de 27/12 . | ||||||||||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juizes da Secção Social do T. Relação de Coimbra BB, casado, serralheiro civil, com residência em DD- Fundão instaurou acção declarativa na forma comum contra CC com sede em EE- Fundão, pedindo que: 1) Seja declarada a nulidade do despedimento do A., por ilícito, com as legais consequências; 2) Seja a Ré condenada a pagar-lhe uma indemnização por antiguidade que, à data da propositura da acção, se cifra em 7.278 €, acrescida de juros legais desde a data da citação até integral pagamento; 3) Seja a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de 3.881,60 €, referente a prestações pecuniárias já vencidas, a saber: a) € 2.911,20 referente às retribuições dos meses de Dezembro de 2002 a Maio de 2003; b) € 970,40 referente a férias e subsídio de férias vencidas em 1 de Janeiro de 2003. A fundamentar a sua pretensão, alegou sinteticamente: Trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da R, desde 15 de Agosto de 1989 até 2 de Dezembro de 2002, data em que em que esta, alegando faltas ao trabalho, o despediu verbalmente. Exercia a actividade de serralheiro civil com a categoria de oficial de 1ª, auferindo o salário mensal de € 485,20. O despedimento do A. é ilícito devendo ser declarado nulo com as legais consequências. Na audiência de partes não foi possível uma composição amigável do litígio pelo que se ordenou a citação da ré. Contestou a esta, alegando sinteticamente: O A. faltava frequentemente ao trabalho. No dia 2 de Dezembro de 2002 o A. compareceu no escritório da R. e ali falou com o gerente desta FF. Nessa conversa, o dito gerente manifestou ao autor que o modo como encarava e assumia o trabalho era incompreensível e inaceitável e disse-lhe que a R. tencionava despedi-lo. O A. propôs então fazer cessar o seu contrato de trabalho, pagando-lhe a R. “ o que era devido”. Combinaram voltar a encontrar-se no seguinte dia 4 Neste dia, o A. aceitou fazer cessar o seu contrato de trabalho e procedeu a um acerto de contas quanto ao que a R. lhe pagaria para de imediato porem termo ao contrato. Segundo tal acerto de contas, acordaram em que a cessação do contrato se operasse com o pagamento pela R. de certas quantias. Em conformidade com esse acordo, a R. emitiu e entregou ao A. um cheque no valor de € 1.024,98, que o A. levantou no banco, fazendo sua a quantia por ele titulada. Ainda em conformidade com esse acordo, em simultâneo com o recebimento do cheque, o A. assinou e entregou à R. a declaração que faz fls. 29 dos autos, assim como lhe entregou em mão a carta que faz fls. 10 dos autos que o gerente da R. já havia redigido. Pediu improcedência da acção. Respondeu o A. alegando também sinteticamente: No dia 2 de Dezembro de 2002, ao comparecer para exercer as suas funções foi-lhe dito que já não trabalhava ali, que “estava despedido”. Não houve qualquer acordo de cessação do contrato. A declaração junta a fls. 29 não lhe foi lida assinando-a convicto que estava a assinar um recibo relativo à quantia entregue por meio de cheque. A R. alega factos que sabe não serem verdadeiros, devendo ser condenada como litigante de má fé em multa adequada. Prosseguindo o processo seus regulares termos veio a final a ser proferida decisão, que na improcedência da acção, absolveu a Ré de todo o peticionado. Discordando apelou o A, alegando e concluindo: 1- A douta decisão recorrida é nula por não ter sido fundamentada violando o disposto nos artºs 659º e 668º do CPC 2- A douta decisão viola do disposto no D.L. 64-A/89 de 27/2, designadamente o disposto nos artºs 10º, 12º e 13º. Com efeito 3- A douta decisão recorrida considerou válido um despedimento promovido pela entidade empregadora, sem o processo de despedimento; 4- Deve pois tal decisão ser revogada e substituída por outra que considera o despedimento do A ilícito com as consequências da Lei, designadamente com o pagamento dos montantes peticionados pelo A na p. i. Contra alegou a recorrida defendendo a correcção da sentença sob censura Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, tendo o Ex. mo SR PGA emitido douto parecer no sentido da respectiva improcedência, cumpre decidir. Dos Factos Foi a seguinte a factualidade dada como assente na 1º instância 1-O autor começou a trabalhar por conta da ré, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desde 15 de Agosto de 1989 mediante um contrato de trabalho sem termo; 2- O autor exerce a actividade de serralheiro civil com a categoria de oficial de 1ª. e aufere o salário mensal de € 485,20. 3- O autor faltava por longos períodos ao trabalho. 4- Em 29 de Outubro o autor terminou um período de baixa médica. 5-O autor continuou ausente do trabalho durante todo o mês de Novembro de 2002. 6- No dia 2 de Dezembro de 2002 o autor compareceu no escritório da ré e ali falou com o gerente desta, FF. 7- Nessa conversa o dito gerente da ré manifestou ao autor que o modo como ele encarava e assumia o trabalho era incompreensível e inaceitável e disse-lhe que a ré tencionava despedi-lo. 8- Combinaram então voltar a encontrar-se no dia 4 de Dezembro de 2002. 9- No dia 4 de Dezembro o autor voltou ao escritório da ré tendo aceite a insatisfação desta e a vontade da mesma em fazer cessar o contrato de trabalho que os ligava. 10- O autor e o gerente da ré procederam ao acerto de contas no que respeita ao que a ré pagaria ao autor de imediato para porem termo ao contrato. 11- Autor e ré concordaram que a cessação do contrato operasse com o pagamento pela ré ao autor das quantias referidas no artigo 16º da contestação, a saber:
13- Em conformidade com o mesmo acordo e em simultâneo com o recebimento do cheque o autor assinou e entregou à ré a declaração que consta de fls. 29 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 14- Na altura a ré entregou também ao autor, em mão, a carta constante de fls. 10 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, carta esta que a ré havia já redigido mas ainda não havia entregue ao autor. 15- Ao autor não foi entregue qualquer nota de culpa. 16- Com data de 16-12-2002 em resposta a uma carta dirigida pelo autor à ré com data de 11 de Dezembro a ré enviou ao autor a carta que consta de fls. 39 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido. Do Direito Sabe-se que é pelas conclusões das alegações, que se delimita o âmbito da impugnação- artºs 684 n.º 3 e 690º nºs 1 e 3 ambos do CPC-. Pelo que as questões a dilucidar nesta impugnação são: - se se verifica nulidade da sentença, por falta de fundamentação - se ocorreu um despedimento ilícito. Vejamos então. Como se sabe nos termos do artº 77º nº 1 do CPT a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento do recurso( itálico nosso). Esta formalidade não foi cumprida pleo A, o que desde logo levaria a que não se conhecesse de tal pretenso vício. Todavia sempre se dirá o seguinte: Nos termos do artº 668º nº 1 b) do CPC a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Ora no caso em apreço – e ressalvando naturalmente como sempre fazemos o devido respeito por entendimento diverso- a decisão em crise está fundamentada, quer de direito, quer de facto. Na verdade o Ex.mo Juiz do Tribunal recorrido elencou não apenas os factos que considerou provados, mas também os não provados e indicou explicitamente os motivos( e os meios probatórios) a que se arrimou para fundamentar da forma como o fez. E de seguida operou a subsunção de tal facticidade ao direito. Em suma: não só a invocação da aludida nulidade é extemporânea, como mesmo a assim se não considerar a sentença não padece de tal vício. Resta portanto analisar a problemática relativa á existência ou não de um despedimento. Como se sabe, nas acções de impugnação de despedimento( considerado este como a declaração unilateral receptícia, emitida pelo empregador no sentido de fazer cessar o contrato de trabalho- cfr. artº 3º nº 2 c) do D.L 64-A/89- de 27/2), o ónus de alegação e prova da facticidade a integrante deste conceito, impende sobre o trabalhador( arº 342º nº1 do CCv). Como resulta da matéria de facto dada como assente, não logrou o ora apelante tal objectivo. Logo por aí- e em nosso entendimento- a sua pretensão estava votada ao insucesso. O que ressalta da dita facticidade é que a Ré tinha efectivamente o intuito de despedir o A E este acabou por concordar com essa vontade, ao declarar que aceitava livremente o “despedimento com justa causa”. Com esta declaração negocial, o convénio em causa deixava de existir não por mera e única vontade do empregador, mas antes por um encontro concordante de vontades, o que por princípio seria o suficiente, para por fim a tal contrato. Contudo e para que a revogação contratual por mútuo acordo seja válida, a lei em nome da defesa dos interesses do trabalhador impõe que a mesma se revista de certa solenidade( forma escrita) com assinatura de ambos os outorgantes e contendo os demais elementos normativamente exigidos- cfr. artº 8º do citado D.L. 64-A/89- Discute-se se esta exigência de forma constitui, uma formalidade ad substantiam ou meramente ad probationem. Mas mesmo que se entenda que a dita declaração, por estar apenas assinada por um dos contraentes fica ferida de nulidade( cfr. artº 220º do CCv), tal circunstância não tem em nossa opinião a virtualidade de a transformar numa forma de despedimento eivado de ilicitude desde logo porque não precedido de processo disciplinar( cfr. artº 12º nº 1 do D.L. 64-A/89), pois como já se disse aquele implica a existência de uma declaração unilateral rescisória por parte da entidade patronal, o que não ficou minimamente demonstrado. Quando muito ( e porque a forma como A e Ré puseram termo ao convénio, não obedece aos requisitos exigidos pelo citado artº 8, não obtendo portanto validade face ao ordenamento jurídico) a ilação a tirar é a de que de que o contrato de trabalho em causa, se mantém válido( ainda que de facto tenha de há muito terminado), com todas as consequências a nível de direitos e deveres para ambas as partes, que dele decorrem. Contudo, como nesta acção a causa de pedir foi a existência de um despedimento, parece- nos evidente que tem a mesma que improceder, não podendo o Tribunal extrapolar para uma outra situação, de eventual condenação no pagamento de salários, até porque não se sabe se devidos, dada a também correspectiva ausência de prestação laboral por parte do A. Não deixou este de alegar que quando assinou o “ documento rescisório” em que além do mais se declarava pago de todas as importâncias que lhe eram devidas, agiu no erróneo convencimento de que estava apenas a assinar um recibo relativo à importância que estava no momento a perceber. E sabe-se que o erro na declaração pode conduzir à anulabilidade da declaração negocial( artº 247º do CCv). Todavia também neste ponto não conseguiu o A demonstrar como era seu ónus( artº 342º do CCv) esse vício da vontade. Dir-se-á ainda que igualmente o aqui recorrente alegou( mas do mesmo modo também não provou) que a Ré o tenha impedido em 4/12/02 de retomar as suas funções. E se é verdade que esta última redigiu a carta de fls. 10, que contém em si uma inequívoca declaração de despedimento, não é menos certo que, de acordo com a factualidade dada como demonstrada , a mesma apenas foi entregue ao A, já consumado o “ acordo rescisório” referido. O que evidentemente lhe retira toda a carga de constituir a tal declaração da vontade de unilateralmente por fim ao convénio que ligava ao e Ré. Tudo indica portanto que, existiu um acordo de vontades em terminar com o contrato, ou seja e de facto uma revogação por mútuo acordo. Feita de forma infeliz, indubitavelmente. Eventualmente nula, pode aceitar- se com as consequências daí advenientes em termos de manutenção contratual. Mas o que, a nosso ver- e salvo melhor opinião- não ficou minimamente provado perante todo esta quadro fáctico, foi a existência de um despedimento. E como foi com base nele( casa de pedir) que o A fundamentou o seu pedido, a conclusão a tirar é a que o mesmo não pode ser acolhido. Termos em que, confirmando-se a sentença sob censura, se julga improcedente a apelação. Custas pelo A sem prejuízo do apoio judiciário de que goza. Fixam-se os honorários devidos ao Ex. mo Patrono Oficioso em 8 Urs a pagar pelo CGT |