Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | SERRA LEITÃO | ||
Descritores: | INSTRUMENTO DE REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO TRABALHADOR TRANSPORTE RODOVIÁRIO COMPENSAÇÃO INDEMNIZAÇÃO DOENÇA | ||
Data do Acordão: | 12/16/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL DO TRABALHO DE CASTELO BRANCO | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | CL.ª 84ª, NºS 1 E 4, DO IRCT PARA OS TRABALHADORES DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS E URBANOS DO CENTRO; ARTº 6º, Nº 1, AL. E), DO DEC. LEI Nº 519-C1/79, DE 29/12, NA REDACÇÃO DADA PELO D.L. Nº 209/92 | ||
Sumário: | I – A cl.ª 84ª, nºs 1 e 4, do IRCT para os Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro, estipula que “em caso de doença a empresa pagará aos trabalhadores a diferença entre a remuneração líquida da sua categoria profissional e o subsídio atribuído pela Previdência” II – Quando exista tal obrigatoriedade de pagamento, o mesmo deve ter em conta a remuneração líquida tabelar correspondente à categoria profissional do trabalhador e não a remuneração efectivamente recebida. III – O artº 6º, nº 1, al. e), do Dec. Lei nº 519-C1/79, de 29/12, na redacção dada pelo D.L. nº 209/92, não é inconstitucional, quando dispõe que “os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho não podem estabelecer e regular benefícios complementares dos assegurados pelo sistema de segurança social, salvo ao abrigo e nos termos da legislação relativa aos regimes profissionais complementares de segurança social ou equivalentes, bem como aqueles em que a responsabilidade pela sua atribuição tenha sido transferida para instituições seguradoras”. IV – Donde decorre que são proibidos os esquemas complementares de segurança social instituídos em contratação colectiva desde que estabelecidos para serem geridos pelos respectivos outorgantes. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da Secção Social do T. Relação de Coimbra
A...(processo 111/06.3TTCTB) e B...(processo 000/06.6TTCTB), ambos litigando com apoio judiciário, intentaram cada um acção sob a forma de processo comum contra C.... pedindo que esta fosse condenada ao pagamento das diferenças de remuneração diária pagas pela Segurança Social e a remuneração diária a que teriam direito se não estivessem a trabalhar. Estribaram a sua pretensão no facto de terem estado de baixa médica, durante certos lapsos de tempo, tendo recebido parte da remuneração devida pela Segurança Social e devendo o remanescente dessa remuneração – em ordem a receber a sua totalidade – ser pago pela entidade patronal, ora ré, ao abrigo do que vai no artº 84º do AE. Realizada a audiência de partes a que se reporta o artº 54º, nº 2 do Código de Processo de Trabalho, não foi obtida conciliação tendo os autos prosseguido os seus trâmites legais foi designada data para julgamento tendo, ainda, sido ordenada a apensação de processos. Oportunamente, foi oferecida contestação na qual a ré, por excepção, se defende alegando, em suma, que nada tinha de pagar a título do reclamado pelos autores, porquanto o AE invocado não era aplicável às relações mantidas entre ela e aqueles. Mais alegou que, caso assim não se entendesse, sempre o contrato entre ela e os autores estaria ferido de nulidade por impossibilidade do objecto negocial. Concluiu pedindo a absolvição do pedido. Prosseguindo o processo seus regulares termos veio a final a ser proferida decisão que julgou improcedente a acção e absolveu a Ré dos pedidos formulados pelo A. Discordando apelaram os AA, alegando e concluindo: [………………………………………………………….] Não houve contra alegações. Recebido o recurso e colhidos os vistos legais, cumpre decidir. DOS FACTOS É a seguinte a factualidade dada como assente [………………………………………………………….]
DO DIREITO Como se viu os AA pretendem com base no plasmado no AE celebrado entre o Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro, o qual se encontra filiado na FESTRU – Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos/CGTP-IN que a aqui apelada tem que lhes pagar a diferença entre o que perceberam da Segurança Social e a remuneração líquida que lhes era devida pela empregadora, nos períodos que estiveram de baixa por doença e que acima se indicaram. E fundamentam a sua pretensão no estatuído na cláusula 84º, nº 1 do aludido IRCT que refere” Em caso de doença a Empresa pagará aos trabalhadores a diferença entre a remuneração líquida da sua categoria profissional e o subsídio atribuído pela Previdência”. Acresce que o nº 4 da mesma cláusula estipula que: Quando seja devido o complemento a que se refere esta cláusula, o trabalhador receberá a remuneração por inteiro nos termos desta cláusula, reembolsando a empresa no quantitativo da Previdência, quando e se o receber. É de notar desde já que a existir obrigatoriedade de pagamento de tal complemento, o mesmo deve ter em conta a remuneração líquida tabelar( constante logicamente do tal AE) correspondente à categoria profissional dos AA e não à remuneração que efectivamente percebiam. É o que resulta da interpretação da tal Clª 84º nº 1, pois ali expressamente se refere que “ a empresa pagará aos trabalhadores a diferença entre a remuneração líquida da sua categoria profissional…”( itálico nosso). Utilizando os legais princípios de interpretação dos negócios jurídicos que se encontram estabelecidos no artº 236º nº 1 do CCv (que como se sabe consagra a teoria da impressão do destinatário, segundo a qual a declaração vale com o sentido que um declaratário normal colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele), não pode a nosso ver, ser outra a conclusão a tirar. Acresce que quer segundo o disposto no artº 7º nº 1 do D.L. 519º C1/79 de 29/12, quer conforme o plasmado no artº 552º nº 1 do C.T/03 (também aplicável por força do determinado no artº 8º nº 1 da L. 99/03 de 27/8), as convenções colectivas obrigam os empregadores que a subscrevem e os inscritos nas associações de empregadoras signatárias, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros das associações sindicais outorgantes ( princípio da filiação). Ora provado ficou que a Ré A ré nunca outorgou o acordo de empresa para os trabalhadores da C...., publicado no BTE nº 45, de 8 de Dezembro de 1983, com as alterações publicadas no BTE nº 12, de 28 de Março de 1985 e nº 12, de 29 de Março de 1986 e sucessivas alterações salariais e também que nunca houve qualquer intervenção administrativa a operar a extensão de tal acordo de empresa – via PRT ou Regulamento de Extensão -. E é exactamente com base em tal AE que os AA fundam o seu pedido. Poder-se-ia então sem mais concluir que, como o decidido na 1ª instância a demandada nada tinha a pagar aos aqui recorrentes. Todavia a questão não se apresenta ( salvo o devido respeito) tão simples assim. Desde logo deve - se ter em conta que contrariamente ao que pretende a Ré na sua contestação, o artº 6º nº 1 e) do citado D.L. 519/-C1/79 de 29/12 ( na redacção que lhe foi dada pelo D.L. 209/92) não é inconstitucional, como já por várias vezes o tem decidido o T. Constitucional Dispõe esta norma na redacção introduzida por este último diploma, que «Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho não podem: … e) Estabelecer e regular benefícios complementares dos assegurados pelo sistema de segurança social, salvo se ao abrigo e nos termos da legislação relativa aos regimes profissionais complementares de segurança social ou equivalentes, bem como aqueles em que a responsabilidade pela sua atribuição tenha sido transferida para instituições seguradoras». Acontece que, sendo o AE a que vimos fazendo referência, de Dezembro1983, não pode deixar de levar em consideração o que estabelece o n.º 2 do art. 6º do Dec. Lei n.º 519-C1/79, ao estipular que «A restrição constante da alínea e) do número anterior não afecta a subsistência dos benefícios complementares anteriormente fixados por convenção colectiva, os quais se terão por reconhecidos, no mesmo âmbito, pelas convenções subsequentes, mas apenas em termos de contrato individual de trabalho». O C.T /03 por seu turno permite que os IRCT instituam regimes complementares contratuais, que atribuam prestações complementares do subsistema previdencial, na parte não coberta por este, nos termos da lei. Em conclusão, a dita cláusula contida no AE invocado pelos AA, não é nula, sendo certo que os contratos de trabalho que ligam AA à Ré datam, como se provou, de muito antes do próprio AE de 1983. Portanto não será por essa via que se pode negar o pretendido pagamento das prestações em causa. Haverá que atender por outro lado, que quer no domínio do mencionado D.L. 519-C1/79, quer no do C.T/03 , em caso de transmissão da titularidade da empresa ou parte dela, o IRCT que vincula o transmitente é aplicável ao adquirente até ao termo do respectivo prazo de vigência e no mínimo de 12 meses a contar da data da transmissão, salvo se entretanto outro IRCT negocial passar aplicar-se ao adquirente. No caso concreto o dito AE foi celebrado entre a então D... e a FESTRU e publicado no BTE nº 45 de 8/12/83. Por seu turno a D... passou de E.P. para sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, através da publicação do D.L. 12/90 de 6/1 ( seu artº 1º), com a denominação de E.... E a Ré foi constituída por cisão da E.... em 1/1/91( ponto H da fundamentação de facto) e de acordo com o determinado pelo artº 9º nº 1 do aludido D.L. 12/90. Ora é indubitável que de acordo com o artº 14º nº 1 do já mencionado D.L. 12/90 de 6/1, os trabalhadores e pensionistas da D.... mantêm todos os direitos e obrigações que detenham à data da entrada em vigor deste diploma, isto aliás em consonância com o que o então artº 296º c) da CRP que determinava que a lei quadro da reprivatização dos bens nacionalizados mantivesse todos os direitos e obrigações de que os trabalhadores das respectivas empresas fossem titulares”. O que poderia significar que ainda que não outorgando no dito AE, a Ré( que nem sequer existia nessa altura), estava obrigada por força de lei a reger-se por esse IRCT. Mas mesmo que assim se entenda ( e propendemos para tal) e ainda que se admita( o que é controverso - ver p. ex. o A do STJ , publicado in CJ/STJ, 1995, Tomo III; pág. 275 – que o AE seria sempre aplicável aos AA, independentemente do seu período de vigência), o certo é que, no caso concreto os AA não têm direito a qualquer quantia a título de “ subsídio de doença” a pagar pela recorrida. É que está provado ( ambas as partes o aceitam - pág.56 do processo - ) que a última remuneração mensal publicada no BTE, pelo AE que os AA invocam data de 29/3/86 e estabelece as remunerações de 50.100$00 e 36.160$00, respectivamente para as categorias de empregado metalúrgico C ( caso do A A...) e de Pintor de 1ª ( caso do A B...). Ora como o valor a considerar como supra se disse, para determinar a obrigação de pagamento por parte da Ré da dita diferença relativa ao pagamento do salário quando os trabalhadores estão “ de baixa” por doença relativamente ao que percebem da S. Social, é a remuneração correspondente à “ categoria profissional” e não àquela que na realidade os trabalhadores recebem ( que até pode ser superior) e como por outro lado, os AA não alegaram( nem em parte alguma do processo se menciona seja o que for a esse respeito) que depois de 1986 outro IRCT tenha sido acordado e que obrigasse – e se aplicasse – a ambas as partes, ou então que de qualquer forma houvesse uma tabela categorial - sendo que tal ónus sobre eles impendia, por ser elemento constitutivo do direito que alegam (artº 342º nº 1 do CCv) então o valor a considerar só pode ser o último que foi convencionalmente estabelecido - ou seja os tais 50.100$00 e 36.160$00/mês ( naturalmente convertidos em euros após a entrada em vigor desta moeda). E assim sendo, contabilizando os tempos “ de baixa” dados como provados, tendo em conta aqueles montantes (porque outros não podem ser levados em consideração, já que não é a remuneração efectiva que vale, mas sim - repete-se - a categorial e que constava do referido AE) e computando os quantitativos que os Recorrentes receberam da S. Social em virtude das suas “ baixas” por doença, chega-se facilmente à conclusão de que aquilo que receberam desta entidade é superior ao valor total dos salários por inteiro ( e ainda que ilíquidos) relativos aos tempos do doença. O que significa que a Ré nada tem a pagar-lhes. Pelo que e sem necessidade de maiores considerações, confirmando-se a sentença recorrida, ainda que com diversa fundamentação, se julga improcedente a apelação. Custas pelos AA sem prejuízo do apoio judiciário de que gozam. |