Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1473/22.6T8ACB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: GARANTIA AUTÓNOMA
CARACTERÍSTICAS
LIVRANÇA ASSINADA EM BRANCO
ABUSO DE PREENCHIMENTO
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
DEVER DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
ÓNUS DA PROVA
FACTO EXTINTIVO DO DIREITO DO CREDOR
Data do Acordão: 12/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE EXECUÇÃO DE ALCOBAÇA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 1.º, N.º 3, 5.º, N.ºS 1 A 3, 8.º, ALÍNEAS A) E B), DA LEI DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS, 342.º, N.º 2, DO CÓDIGO CIVIL, 48.º, 3, E 77.º DA LEI UNIFORME SOBRE LETRAS E LIVRANÇAS
Sumário: I – A garantia autónoma, ou contrato autónomo de garantia é o contrato celebrado entre um banco ou uma sociedade de garantia mútua – garante – e um seu cliente – devedor – pelo qual o primeiro se obriga por ordem do último a pagar determinada quantia pecuniária a um terceiro – garantido ou beneficiário – sem que a este possam ser opostas quaisquer excepções fundadas nas suas relações negociais com o mandante;
II – A garantia autónoma é uma figura jurídica atípica, dado que não dispõe de regime legal próprio – causal – cuja causa é garantir a satisfação do direito pecuniário do garantido – autónoma, i.e., não acessória ou dependente da obrigação garantida, salvo em eventos de fraude ou abuso. É também executiva dado que o respectivo documento negocial representa um título executivo, se tiver sido exarado ou autenticado por notário ou equiparado;

III – De harmonia com o critério da automaticidade, a garantia autónoma pode ser simples ou automática – ou à primeira solicitação – conforme o direito do beneficiário esteja dependente do prévio incumprimento do devedor ou da mera interpelação do garante;

IV – Com a entrega da livrança assinada em branco o subscritor confere, necessariamente, à pessoa a quem faz a entrega o poder de a preencher e, portanto, o acto de preenchimento tem o mesmo valor que teria se fosse praticado pelo subscritor ou se já tivesse sido praticado no momento da subscrição, pelo que aquilo que se escreve na livrança em branco considera-se escrito pelo subscritor, sendo de presumir que o conteúdo daquele título de crédito representa a vontade daquele; esta presunção pode, no entanto, ser ilidida pelo subscritor demonstrando que houve abuso no preenchimento;

V – Antes de assinar ou de entregar a livrança em branco, o subscritor pode, porém, convencionar com o credor em que termos deve ser feito o preenchimento, qual o conteúdo dos elementos essenciais da livrança ainda em falta; existindo essa convenção, se houver abuso no preenchimento, i.e., se o possuidor da livrança inserir nela contexto diverso do convencionado, pode o subscritor opor a excepção de abuso, cuja prova lhe compete, excepção que consiste na alegação de que a livrança foi assinada e entregue em branco e que o contexto é diferente do que se ajustara.

VI – O ónus da prova da violação, pelo predisponente de cláusulas contratuais gerais do dever de informação prévia sobre o sentido e alcance das cláusulas contratuais gerais, que vincula quer à aclaração por iniciativa própria, quer ao esclarecimento de dúvidas postas pelo destinatário, em qualquer caso antes da conclusão do contrato recai, sobre o aderente ou destinatário da cláusula contratual geral, dado que constitui facto extintivo do direito alegado pelo credor.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: Relator:
Henrique Antunes
Adjuntos:
Cristina Neves
Falcão de Magalhães

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.

A..., SA, promoveu, no juízo de Execução ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, contra B... – Sociedade Unipessoal Lda. e AA, acção executiva para pagamento de quantia certa, para dos últimos haver a quantia de € 39 580,13, acrescida de juros, à taxa de 4%, vencidos, no valor de € 216,53, e vincendos, e € 197.90 de imposto de selo.

Fundamentou esta pretensão executiva no facto de ser portador de duas livranças, vencidas no dia 28 de Abril de 2022, com o valor global de € 39 580,13.

B... – Sociedade Unipessoal, Lda., opôs-se, por embargos, à execução, pedindo a sua extinção.

Fundamento a oposição no facto de não ter sido integrada, com era obrigatório, no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), pelo que fata um condição objectiva de procedibilidade, não sanável, que conduz à extinção da instância, de os contratos que conduziram à emissão das livranças e o pacto de preenchimento, estarem submetidos ao regime das cláusulas contratuais gerais, dado que se limitou a subscrever o respectivo clausulado, não tendo a embargada comunicado nem explicado, antes da assinatura dos documentos, qualquer das cláusulas que os compõem, designadamente as que conformam o pacto de preenchimento, que, por isso, padecem de nulidade, de os contratos celebrados com as entidades bancárias não lhe terem sido entregues, de os valores pelos quais as livranças foram preenchidas não corresponderem aos montantes efectivamente devidos, alheando-se dos pagamentos que efectuou e de a exequente não ter protestado as livranças.

Por despacho de 2 de Novembro de 2022 – que não foi objecto de qualquer impugnação - a oposição foi logo indeferida in limine no tocante aos fundamentos relativos à falta de integração da embargante no PERSI, ao excesso do valor pelo qual as livranças foram preenchidas e à omissão do seu protesto.

A exequente afirmou, em contestação, que, no exercício da sua actividade, celebrou com os executados dois contratos nos termos dos quais, a seu pedido, prestou duas garantias autónomas à primeira solicitação, uma a favor da Banco 1..., outra a favor da Banco 2... SA, destinada a garantia o cumprimento das obrigações assumidas nos contratos de mútuo celebrados entre a embargada e as beneficiárias das garantias autónomas, que entregaram os contratos à embargante que os analisou e concordou com o seu teor, que a embargantes lhe entregou uma livrança em branco para cada um dos contratos, subscritas por aquela e avalizadas pelo co-executado, sendo o pacto de preenchimento do seu inteiro conhecimento, que pagou aos beneficiários os valores garantidos, que interpelou a empresa e o avalista, informando-os que preencheu as livranças e para procederem ao seu pagamento, que os termos dos contratos de mútuo e de garantia mútua eram do perfeito conhecimento da embargante, que sempre com eles concordou, cumprindo durante um longo período de tempo as suas obrigações contratuais, sem nunca ter apresentado qualquer reclamação ou pedido de esclarecimento, tendo ficado na sua posse cópia de cada um dos contratos.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, a sentença final da causa jugou improcedente a oposição.

É esta sentença que a embargante impugna no recurso – no qual pede a sua revogação e substituição por outra que julgue os embargos procedentes – tendo rematado a sua alegação com estas conclusões:

1. A Recorrente não se conforma com o teor da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, uma vez que não subsumiu, com o devido respeito, corretamente, o Direito aos factos, ou, sequer, a decisão sobre a matéria de facto;

2. Neste sentido, relativamente à entrega dos “contratos”, foi dado como FACTO PROVADO, que os documentos em causa foram entregues à Recorrente;

3. Conclusão retirada não só, através do depoimento da testemunha da Recorrida, BB, mas também com recurso a presunção judicial;

4. Violando, por si só, o exposto no art.º 5.º, n.º 3, da LCCG;

5. Inexistindo uma prova adequada e efetiva relativamente à entrega das cópias do contrato, impede o cabal cumprimento da legislação aplicável ao caso concreto;

6. Mais, tal como entende CC: O cumprimento deste dever não se presume, isto é, a demonstração do respetivo cumprimento cabe ao contraente que utilize cláusulas contratuais gerais (…)”;

7. Não deve ter-se considerado como provada a comunicação das cláusulas 4), nem as demais cláusulas contratuais gerais contidas nos contratos, o que agora se impugna, mais devendo considerar como provado a al. f) dos factos dados como não provados pela Mm. Juiz a quo, ou seja, que os documentos referidos em 2.º e 4.º não foram entregues à executada/opoente.

8. O ónus da prova cabe à recorrida, que não o cumpriu.

9. O facto dado como provado sob o ponto 8º da matéria de facto, deve ser considerado NÃO PROVADO e por outro lado;

10. Os factos dados como não provados sob as alíneas c), d) e) e f) devem ser dados como PROVADOS e, nesta conformidade aditados à matéria de facto dada como provada;

11. Assim e consequente desta conduta faltosa por parte da Recorrida, as cláusulas contidas nos “contratos” não se devem considerar como devidamente comunicadas e, por conseguinte, considerarem-se excluídas dos contratos celebrados entre a Recorrida e a Recorrente;

12. A douta sentença do tribunal a quo, relativamente à entrega dos “contratos”, nada refere quanto ao momento dessa mesma entrega;

13. O dever de comunicação deve ser feito de “modo adequado e com a antecedência necessária” (art. 5.º, n.º 2, LCCG), para que seja possível, para o seu aderente, ter o conhecimento completo e efetivo;

14. Para concretização deste dever, o conteúdo de qualquer contrato que utilize cláusulas contratuais gerais na sua composição, não deve ser considerado como comunicado se, o aderente, apenas teve contacto com o mesmo aquando da sua assinatura;

15. É necessário concretizar o momento temporal em que as cláusulas foram devidamente comunicadas e os “contratos” colocados à disposição da Recorrente;

16. Neste sentido, e por violação do art. 5.º, n.º 2, da LCCG, não se deve ter como comunicadas as cláusulas contratuais gerais utilizadas no âmbito destes contratos, sendo certo que não existe qualquer concretização sobre o modo como a comunicação foi feita, bastando-se, o Tribunal a quo, com a mera alegação genérica da entrega dos mesmos;

17. Devendo considerar, à luz da legislação em vigor, que os contratos não foram entregues de forma atempada e adequada à Recorrente;

18. O dever de informação, embora depreenda iniciativa por parte da Recorrente. não pode ser efetivado sem que antes tenha o devido conhecimento das cláusulas contratuais gerais constantes nos contratos;

19. Neste sentido, o dever de informação deve ser sempre considerado a par com o dever de comunicação, devendo, o predisponente, ora Recorrida, comunicar, primeiramente, de forma adequada, efetiva e atempada, o conteúdo das cláusulas contratuais gerais para que depois, o aderente, ora Recorrente, munido de uma diligência média, esteja capaz de eliminar qualquer dúvida que tenha relativa às mesmas;

20. Ora, tal como exposto supra, o dever de comunicação não foi devidamente cumprido;

21. Desconsiderando, a Recorrida, o conhecimento por parte da Recorrente, das cláusulas contratuais gerais constantes nos “contratos”, bem como do seu conteúdo;

22. O que leva, forçosamente, ao inquinar, também, do dever de informação;

23. E, por conseguinte, à violação do art. 6.º, n.º 1, da LCCG.

Não foi oferecida resposta.

2. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.

O Tribunal de que provém o recurso decidiu a matéria de facto nos seguintes termos:

2.1. Factos provados.

Resulta provada a seguinte factualidade face aos documentos juntos aos autos, ao acordo e/ou à confissão das partes e à prova produzida, efectuada a análise crítica desta, excluindo os factos que não apresentam relevo para a decisão da causa ou não servem para consubstanciar a pretensão deduzida:

1.º Nos autos de execução foi apresentado como título executivo um documento onde se inscreve a expressão “no seu vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança…”, a “importância” de 18.284,58 €, com data de “emissão” a 18/04/2022 e de “vencimento” a 28/04/2022, assinado pela gerência da executada/opoente no campo “subscritor(es)”.

2.º O documento referido em 1.º foi subscrito e entregue em branco, à data, no âmbito do documento com “Assunto: Emissão de garantia autónoma à primeira solicitação em nome e a pedido da B..., SOCIEDADE UNIPESSOAL LIMITADA e a favor da Banco 1...”, com data de 16/11/2016, assinado pela gerência da executada/opoente, que se encontra anexo à contestação e aqui se dá por integralmente reproduzido, onde consta a cláusula 4), na qual se lê o seguinte:

3.º Nos autos de execução foi apresentado como título executivo um documento onde se inscreve a expressão “no seu vencimento pagarei(emos) por esta única via de livrança…”, a “importância” de 21.295,55 €, com data de “emissão” a 18/04/2022 e de “vencimento” a 28/04/2022, assinado pela gerência da executado/opoente no campo “subscritor(es)”.

4.º O documento referido em 3.º foi subscrito e entregue em branco, à data, no âmbito do documento com “Assunto: […] Emissão de garantia autónoma à primeira solicitação em nome e a pedido do B..., SOCIEDADE UNIPESSOAL LIMITADA e a favor da Banco 2..., S.A.”, com data de 06/07/2017, assinado pela gerência da executada/opoente, que se encontra anexo à contestação e aqui se dá por integralmente reproduzido, onde consta a cláusula 4), na qual se lê o seguinte:

5.º A generalidade das cláusulas constantes nos documentos referidos em 2.º e 4.º foram previamente elaboradas pela exequente e destinam-se a ser apresentadas a qualquer pessoa que contrate com a exequente, sem que a executada/opoente tenha colaborado ou podido colaborar na feitura de algumas dessas cláusulas, incluindo as cláusulas 4) extractadas em 2.º e 4.º.

6.º Algumas “condições particulares” relativas aos documentos referidos em 2.º e 4.º foram negociadas e previamente acordadas com a executada.

7.º Os documentos referidos em 2.º e 4.º encontravam-se integralmente preenchidos à excepção dos campos destinados às assinaturas.

8.º As cláusulas 4), bem como as demais, dos documentos referidos em 2.º e 4.º foram comunicadas à executada/opoente antes da assinatura dos documentos.

9.º Uma cópia de cada um dos documentos referidos em 2.º e 4.º ficou na posse da executada/opoente.

10.º A exequente contactou a executada, na pessoa do seu legal representante, nos termos dos emails datados de 26/11/2021 e 10/12/2021, e a executada, naquela pessoa, respondeu à exequente nos termos do email datado de 03/12/2021, ambos que se encontram anexos à contestação e aqui se dão por integralmente reproduzidos.

2. Factos não provados.

a) Sem prejuízo do referido em 5.º, não houve qualquer negociação prévia entre a exequente, por si ou por interposta pessoa, e a executada/opoente sobre o conteúdo das cláusulas dos documentos referidos em 2.º e 4.º.

b) Sem prejuízo do referido 5.º, em todas as cláusulas apostas nos documentos referidos em 2.º e 4.º a executada não colaborou ou podia colaborar na sua feitura, limitando-se a executada a subscrever os mesmos.

c) O conteúdo das cláusulas que compõem os documentos referidos em 2.º e 4.º não foi comunicado e explicado à executada/opoente.

d) Em nenhum momento prévio à assinatura dos documentos referidos em 2.º e 4.º, ninguém transmitiu à executada/opoente o que seria o teor dos mesmos.

e) A exequente, por si ou por interposta pessoa, não comunicou nem, muito menos, explicitou à executada/opoente, anteriormente à assinatura dos documentos referidos em 2.º e 4.º, qualquer das cláusulas que os compõem.

f) Os documentos referidos em 2.º e 4.º não foram entregues à executada/opoente.

g) Sem prejuízo do referido em 8.º, os bancos beneficiários discutiram e explicaram à executada todas as condições dos “contratos de prestação de garantia mútua”.

h) O referido em 9.º ocorreu por intermédio dos bancos beneficiários.

i) Em Outubro de 2018 o legal representante da executada reconheceu estar em divida para com a exequente do montante pago ao beneficiário “Banco 1...”, referindo que se estaria a tentar obter a cobrança de quantias de que a executada seria credora junto de clientes para então pagar o valor em divida à “A...”.

                2.3. Motivação da decisão da matéria de facto.

                (…).

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação do âmbito objectivo do recurso.

O âmbito objetivo do recurso é delimitado pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados na instância de que provém, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação (art.º 635.º n.ºs 2, 1ª parte, 3 a 5, do CPC).

Nem sempre se justifica exigir a propositura de uma acção condenatória como meio de obter um título executivo. Se a obrigação se encontra titulada por um documento escrito, pode inferir-se, com elevado grau de probabilidade, a sua constituição. Numa tal eventualidade, justifica-se que se dispense a acção declarativa e se permita ao credor, utilizando esse documento como título executivo, instaure directamente a acção executiva. É esta nitidamente a orientação do direito português, actualmente menos vincada, que atribui, muitas vezes avulsamente, a um conjunto amplo de documentos, a qualidade de título executivo (art.º 703.º, n.º 1, b) a d), do CPC).

Na oposição à execução baseada num título extrajudicial podem ser invocados todos os fundamentos que é possível deduzir como defesa no processo de declaração (art.º 731.º do CPC). Portanto, nessa oposição pode usar-se quer a defesa por impugnação quer a defesa por excepção (art.º 576.º do CPC). Isto é assim, uma vez que o título extrajudicial não se baseia em nenhum processo declarativo e, consequentemente, a oposição não está condicionada por nenhuma regra de preclusão. Não há assim, qualquer restrição quanto à invocação de factos impeditivos, modificativos ou extintivos na oposição deduzida contra um título extrajudicial.

No tocante ao ónus da prova dos fundamentos da oposição valem as regras gerais, cabendo, portanto, ao executado embargante a prova dos fundamentos de oposição invocados (art.º 342.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil).

O encargo da prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito cuja satisfação coactiva constitui objecto da execução recai, pois, sobre o embargante[1]. Portanto, a oposição não provoca qualquer refracção às regras gerais sobre a distribuição do ónus da prova. Assim, por exemplo, se o embargante impugnar a letra ou assinatura do documento particular que constitua o título executivo, cabe ao exequente, que o apresentou, a prova da veracidade de uma e de outra (art.º 374.º, n.º 2, do Código Civil)[2]. Da mesma maneira é sobre o embargante que recai o encargo de provar qualquer facto extintivo da obrigação, como, por exemplo, o cumprimento (art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil).

A acção executiva, que visa a realização efectiva, por meios coercivos, do direito violado, tem por suporte um título que constitui a matriz ou limite quantitativo e qualitativo da prestação a que se reporta (art.ºs 2.º, n.ºs 1 e 2, e 10.º, n.ºs 4 e 5, do CPC).

A exequibilidade extrínseca da pretensão é atribuída pela incorporação da pretensão no título executivo, i.e., num documento que formaliza, por disposição da lei, a faculdade de realização coactiva da prestação não cumprida (art.º 10.º, n.º 5, do CPC).

O título executivo cumpre, no processo executivo, uma função de legitimação: ele determina as pessoas com legitimidade processual para a acção executiva e, salvo oposição do executado, ou vício de conhecimento oficioso, é suficiente para iniciar e efectivar a execução.

O título executivo é o documento da qual resulta a exequibilidade de uma pretensão e, portanto, a possibilidade de realização da correspondente pretensão através de uma acção executiva. Este título incorpora o direito de execução, ou seja, o direito do credor a executar o património do devedor ou de terceiro para obter a satisfação efectiva do seu direito à prestação[3].

O título executivo exerce, assim, uma função constitutiva – dado que atribui exequibilidade a uma pretensão, permitindo que a correspondente prestação seja realizada através de medidas coactivas impostas ao executado pelo tribunal – uma função probatória – o título executivo é um documento e a sua eficácia probatória é aquela que corresponde ao respectivo documento[4] - e uma função delimitadora: é por ele que se determinam o fim e os limites, subjectivos e objectivos, da acção executiva (art.º 10.º, n.º 5, do CPC).

A acção executiva visa a realização coactiva de uma prestação ou de um seu equivalente pecuniário. A exequibilidade da pretensão, na qual se contém a faculdade de exigir a prestação e, portanto, a possibilidade de realização coactiva desta prestação, deve resultar do título.

O titulo deve, portanto, incorporar o direito de execução, quer dizer, o direito do credor a executar o património do devedor – ou de um terceiro – para obter a satisfação efectiva do seu direito à prestação (art.ºs 817.º e 818.º do Código Civil). Nos casos em que documento que serve de suporte ao accionamento executivo não incorpora a faculdade de exigir o cumprimento de uma prestação, o título correspondente é extrinsecamente inexequível. Na verdade, o objecto da acção executiva é necessariamente, e apenas, um direito a uma prestação, visto que só este direito impõe um dever de prestar e só este dever de prestar pode ser imposto coactivamente. A inexequibilidade extrínseca do título constitui idóneo fundamento de oposição à acção executiva para pagamento de quantia certa (artºs 814 a), 2ª parte, e 816 do CPC). Se for considerado procedente, esse fundamento traduz-se na falta de um pressuposto processual da execução, o que conduz à instância executiva bem como à caducidade de todos os efeitos produzidos na execução (artº 817 nº 4 do CPC). Na verdade, o objecto da acção executiva é necessariamente, e apenas, um direito a uma prestação, visto que só este direito impõe um dever de prestar e só este dever de prestar pode ser imposto coactivamente.

Os instrumentos de que a exequente e embargada é portadora são legalmente qualificados como livrança na qual a opoente e aquela figuram nas posições jurídicas de subscritor e tomador, respectivamente (art.º 75.º da LUsLL). Por força da promessa de pagamento em que se resolve a declaração cambiária de subscrição, a recorrente - subscritor - obrigou-se a pagá-la ao portador no vencimento, rectior, a entregar-lhe a quantidade de espécies pecuniárias nela inscrita (art.º 28.º, ex-vi art.º 78.º da LUsLL).

Para além de literal, a obrigação cambiária é também abstracta. A criação da obrigação cartular pressupõe uma relação jurídica anterior que constitui a relação jurídica subjacente ou fundamental, causa remota da assunção da obrigação cambiária. Todavia, por força do princípio da abstracção, a causa encontra-se separada do negócio jurídico cambiário, decorrente de uma convenção extra-cartular: a convenção executiva em conexão com a relação fundamental. A obrigação cambiária é vinculante independentemente dos vícios da sua causa: as excepções causais são inoponíveis ao portador da livrança precisamente porque decorrem de uma convenção executiva extra-cartular, exterior ao negócio jurídico cambiário (art.º 17.º, ex-vi artº 77.º, 1ª parte, da LUsLL). Mas isto só é assim nas relações mediatas – i.e., aquelas que se verificam entre um subscritor e um portador que se lhe não siga imediatamente na cadeia cambiária e que, portanto, não é sujeito da convenção extra-cartular - as excepções ex-causa só são oponíveis demonstrando-se que o portador, ao adquirir a livrança, procedeu, conscientemente, em detrimento daquele que lhe opõe a excepção (artº 17, ex-vi artº 77, 1ª parte, da LUsLL). Portanto, o devedor cambiário não pode opor a terceiros excepções fundadas na relação fundamental ou causal da livrança, a não ser que esses terceiros tenham, ao adquirir a livrança, procedido conscientemente em detrimento do devedor.

É, portanto, indispensável que o portador tenha agido, ao adquirir a livrança, com a consciência de prejudicar o devedor. No entanto, uma coisa é a intenção de prejudicar, outra, a consciência de prejudicar: o portador, ao adquirir a livrança, pode agir com o propósito de prejudicar o devedor mediante a inoponibilidade, por este, das excepções que tinha contra os precedentes portadores e pode proceder apenas com conhecimento dessas excepções e do prejuízo que é causado ao devedor com a perda delas. O adquirente da livrança, embora não a adquira com a intenção de iludir as excepções do devedor, pode fazê-lo sabendo que o devedor é prejudicado pela circunstância de não poder valer-se delas contra o novo portador. Não é suficiente, portanto, o simples conhecimento, pelo adquirente, da existência das excepções, visto que a lei exige que o portador tenha agido conscientemente em detrimento do devedor e não age conscientemente em detrimento do devedor quem somente tem conhecimento das excepções que este poderia opor aos portadores antecedentes; não obstante esse conhecimento, pode o adquirente ter razões para supor que o devedor não será prejudicado, não excluindo, necessariamente, esse conhecimento, a boa fé do adquirente. Exige-se, assim, que o adquirente ao adquirir a livrança conhecesse a existência da excepção e tivesse consciência de prejudicar o devedor: uma tal consciência significa ter o adquirente conhecimento de que prejudica, com a perda das excepções o devedor, e que ele aceita, voluntariamente, este resultado, querendo provocá-lo ou, ao menos, aceitando-o[5]. A prova deste facto incumbe, naturalmente, ao excipiente (art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil).

Todavia, nas relações imediatas, i.e., nas relações entre um subscritor e o sujeito cambiário imediato: porque os sujeitos cambiários o são simultaneamente da convenção executiva, tudo se passa como se a obrigação cambiária deixasse de ser literal e abstracta. Quando isso suceda, o subscritor pode opor ao portador as excepções decorrentes das relações pessoais entre ambos.

Como se notou, a executada e a exequente figuram na livrança nas qualidades cambiárias de subscritor e tomador, respectivamente. A exequente é portadora imediata das livranças, o sujeito cambiário imediato do subscritor: aquela e esta encontram-se, pois, no domínio das relações imediatas.

Assim, dado que os sujeitos cambiários o são simultaneamente das convenções extra-cartulares, tudo se passa como se a obrigação cambiária deixasse de ser abstracta. O exequente está, por isso, sujeito às excepções que nessas relações pessoais se fundamentem, sendo por isso lícito ao executado opor ou invocar toda e qualquer excepção causal.

A livrança pode ser entregue a terceiro e entrar na circulação em branco.

Livrança em branco é aquela em que falta algum dos requisitos enunciados na lei, mas que incorpora, ao menos, uma assinatura feita com a intenção de contrair uma obrigação cambiária. Para que exista uma livrança em branco é necessário que lhe falte algum ou alguns dos requisitos essenciais da livrança, havendo no entanto, pelo menos, a assinatura de um obrigado cambiário; este obrigado segundo uma opinião só pode ser o subscritor, embora segundo outra – doutrina que se tem por preferível – possa ser um diverso subscritor[6]. A lei não faz distinção nem põe limitações acerca da extensão do que falta no título, podendo ser deixadas em branco todas as declarações necessárias para a existência da livrança ou só algumas delas (art.º 10.º, ex-vi artº 77º, 1ª parte, da LUsLL). Basta, portanto, que no título destinado a tornar-se livrança exista uma assinatura que possa valer como assinatura do subscritor ou de outro obrigado cambiário, porque doutro modo não poderia verificar-se a hipótese prevista na lei de uma livrança incompleta quando foi emitida, i.e., de uma livrança susceptível de ser completada sem necessidade de uma ulterior cooperação do emitente (art.º 10º, ex-vi art.º 77.º, 1ª parte, da LUsLL)[7].

Para a existência de uma livrança em branco é necessário que o documento incompleto, subscrito pelo tomador ou outro subscritor, tenha sido emitida, ou seja entregue ao tomador, ou tenha de algum modo chegado à posse de um terceiro. A livrança em branco não é, enquanto lhe faltar qualquer elemento essencial, uma livrança plenamente eficaz, sendo, porém, para muitos autores, já um título de crédito endossável, com fundamento no qual o crédito e a obrigação não surgem apenas com o preenchimento, embora esta seja necessário para fazer valer os direitos cambiários. Para haver um tal livrança, é preciso que lhe falta algum ou alguns dos elementos essenciais, havendo, contudo, pelo menos a assinatura do subscritor ou do emitente ou de qualquer outro subscritor[8].

A entrega do título é, nos termos gerais, um elemento essencial à validade da própria obrigação cambiária, e, portanto, a obrigação cambiária não surge se não se verificar a emissão da livrança pelo seu possuidor. Tratando-se, porém, de livrança em branco, a entrega da livrança deve ser acompanhada de uma autorização, pelo subscritor ao credor, para a preencher. Faltando essa autorização o caso não é de livrança em branco – mas de livrança incompleta. Com a entrega da livrança assinada em branco o subscritor confere, necessariamente, à pessoa a quem faz a entrega o poder de a preencher e, portanto, o acto de preenchimento tem o mesmo valor que teria se fosse praticado pelo subscritor ou se já tivesse sido praticado no momento da subscrição. Aquilo que se escreve na livrança em branco considera-se escrito pelo subscritor, sendo de presumir que o conteúdo daquele título de crédito representa a vontade daquele; esta presunção pode, no entanto, ser ilidida pelo subscritor demonstrando que houve abuso no preenchimento[9].           Quem assina, como subscritor, uma livrança em branco, pratica precisamente um acto jurídico que tem a mesma natureza que teria se a livrança estivesse, no acto da assinatura, totalmente preenchida: ninguém apõe normalmente a sua assinatura numa livrança sem ter a intenção de assumir uma obrigação cambiária.

Antes de assinar ou de entregar a livrança em branco, o subscritor pode, porém, convencionar com o credor em que termos deve ser feito o preenchimento, qual o conteúdo dos elementos essenciais da livrança ainda em falta. Esta convenção não está sujeita a forma especial[10]. Existindo esta convenção, se houver abuso no preenchimento, i.e., se o possuidor da livrança inserir nela contexto diverso do convencionado, pode o subscritor opor a excepção de abuso. A excepção consiste, precisamente, na alegação de que a livrança foi assinada e entregue em branco e que o contexto é diferente do que se ajustara. Como já se observou a prova desta alegação incumbe, claro está, ao subscritor ou subscritores (art.ºs 342.º, n.º 2, e 378.º do Código Civil)[11].

Já se observou que obrigação cambiária para além de literal é também abstracta. A abstracção da obrigação cambiária não significa, como se salientou, a ausência de uma causa de assunção dessa obrigação – mas apenas que essa causa se encontra separada do negócio cambiário, decorrendo, não dele próprio mas de uma convenção subjacente, extra-cartular: a convenção executiva em conexão com a relação fundamental. Por força do princípio da abstracção, a relação jurídica fundamental, bem como a convenção executiva, ficam separadas da relação cambiária. Apesar da independência da obrigação cartular em face da relação fundamental, coloca-se ainda assim o problema de saber se a assunção da obrigação cambiária produz a novação daquela relação.

O Assento de 8 de Julho de 1928[12] decidiu que com a subscrição da letra fica extinta por novação a obrigação fundamental; mas o Assento de 8 de Maio de 1936[13] estabeleceu, para o caso da prescrição, a doutrina de que a relação fundamental se não extingue por novação.

Não pode entender-se que, com a subscrição de uma livrança, fique extinta, por novação, a obrigação fundamental: a novação supõe uma declaração de vontade inequívoca no sentido de extinguir uma obrigação e constituir outra em seu lugar, o que não acontece, em regra, com a subscrição de uma livrança, ainda que exista uma obrigação subjacente entre as partes (art.º 859.º do Código Civil). A vontade das partes não é novar a obrigação – mas constituir ao lado da obrigação já existente, uma outra, isto é ao lado da obrigação causal ou fundamental, uma obrigação cambiária, a qual não é dada em cumprimento – in solutum – mas só pro solvendo ou em função do cumprimento (art.º 850.º do Código Civil). Na falta de uma clara vontade nesse sentido, não ocorre uma novação ou dação em cumprimento – datio in solutum – mas uma simples dação pro solvendo, quer dizer a constituição de uma obrigação cambiária destinada a facilitar ao credor a satisfação do seu crédito (artº 840.º do Código Civil)[14]. Desde que não haja intenção de, ao subscrever a livrança, novar a obrigação fundamental, destinando-se a nova obrigação cambiária a facilitar ao credor a realização do seu crédito – dação pro solvendo ou em função do cumprimento – o propósito das partes não é cercear os direitos do credor mas aumentá-los, dando-lhe, além do que já tinha, um novo crédito – o crédito cambiário – que, pelas garantias de que está cercado, é susceptível de lhe dar um meio mais ágil e seguro de obter a satisfação do seu direito.

Nestas condições, dado que o devedor efectua uma prestação diversa da devida, para tornar mais fácil ao credor a realização do seu crédito, este só se extingue quando for satisfeito, e na medida em que o for (art.º 840.º, n.º 1, do Código Civil). E como a dação tem por objecto a assunção de uma nova dívida, presume-se feita nesses termos, i.e., pro solvendo, presunção especialmente importante no caso de entrega de uma livrança, de uma letra ou de um cheque (art.º 840.º. n.º 2, do Código Civil). A dação tem, pois, a vantagem de facilitar ao credor a satisfação do seu direito, sem perder os benefícios do seu crédito. Nestas condições, a vontade usual das partes parece ser a de que o credor procure primeiro a sua satisfação através da coisa ou direito prestados pro solvendo, dado que, fazendo a dação, quererá, em regra, que o credor se pague por esse meio e este o aceita. Se o devedor emite a livrança com a convenção de que a dívida se extingue com a emissão dela, há novação. Na dúvida, porém, deve admitir-se que a nova dívida é contraída pro solvendo e não pro solutum, caso em que o credor fica com dois créditos, mas é obrigado, segundo a vontade presumida das partes, a procurar, primeiro, a sua satisfação pelo novo crédito. A dação pro solvendo é, no fundo, um mandato conferido pelo devedor ao credor para liquidar o crédito dado: se o credor exigir ao devedor o cumprimento da obrigação originária, pode este opor que aquele é obrigado a procurar primeiro a sua satisfação pelo direito ou coisa prestada pro solvendo; se, porém, o contrário não resultar da convenção, pode o credor, oferecendo a restituição do objecto da dação, afastar a excepção, visto que a dação pode presumir-se feita principalmente no seu interesse. Dada a sua função, ao credor só assiste o direito de actuar o novo crédito se e enquanto for titular do crédito originário, pois foi justamente para facilitar a satisfação deste que foi constituída a obrigação cambiária.

Na espécie do recurso, é indiscutível que os títulos de crédito que servem de fundamento à execução são duas livranças, na qual o recorrente assume a qualidade de subscritor, e que essas livranças foram entregues à exequente em branco, tendo sido esta última a preenchê-las. Da mesma maneira não pode ser oferecida qualquer dúvida, por mais leve que seja, que subjacente à obrigação cambiária assumida pela executada se encontra esta relação jurídica fundamental, estabelecida entre ambas: dois contratos de garantia autónoma.

O cumprimento da obrigação reconduz-se a esta proposição simples: a realização da prestação devida. Ontológica e analiticamente, o cumprimento da obrigação traduz-se na concretização do comportamento a que o credor tem direito, no acatamento pelo devedor, da norma de obrigação que o adstringia.

O cumprimento – a prestação como conduta devida - é o fim último da obrigação; este fundamento final orienta todas as normas destinadas a instituir e proteger a posição do credor.

Apesar da segurança que disponibiliza o património do devedor – e os diversos instrumentos ordenados para proteger preventivamente o direito de crédito em função da evolução desse património – a verdade é que essa massa de bens pode não ser – ou pode deixar de ser – tranquilizadora para o credor. E pode sê-lo objectivamente – mas o credor não confiar no devedor ou temer uma crise patrimonial deste.

Para proteger e garantir a satisfação do seu crédito, o credor pode recorrer, designadamente, a soluções externas ao vínculo obrigacional e que, portanto, lhe disponibilizam uma tutela mais forte do que a que é oferecida pelo património do devedor. Não raro, a constituição pelo devedor, sobre bem integrado no seu património, não é considerada suficiente pelo credor que, mesmo nesse caso, exige do devedor uma solução externa que lhe disponibilize um meio ágil de satisfaça do seu crédito, para além do património deste, que constitui a garantia geral, e, portanto, que esconjure o perigo ou lhe diminua o risco do não cumprimento do devedor ou de não conseguir, à custa do património deste, a realização coactiva, especifica ou por equivalente, da prestação. Esta atitude defensiva do credor cria uma garantia, através da qual pretende tornar efectiva a satisfação do seu crédito, aumentar a probabilidade da efectiva realização da prestação correspondente.

Esse resultado pode ser conseguido, por exemplo, através da adjunção de novo ou novos devedores que possam responder pelo devedor primitivo pelo cumprimento da obrigação ou pelas consequências do seu não cumprimento. Ainda que a garantia disponibilizada pelo novo devedor seja meramente pessoal, ocorre um alargamento da massa de bens responsáveis e, correspondentemente, um reforço quantitativo da probabilidade de satisfação do crédito. É claro que o valor económico da garantia, quando esta seja meramente pessoal, está na dependência directa da capacidade de cumprimento do terceiro, dador da garantia. Isto explica que seja comum que o credor exija que esse terceiro goze de reconhecida solvabilidade económica. Seja a garantia meramente pessoal ou real, sempre que ela provenha de terceiro, o credor passa a beneficiar de uma posição jurídica adicional, de um novo meio orientado para a satisfação do seu crédito. A garantia não é, porém, um meio de satisfação do crédito, dado que, evidentemente, a sua constituição não envolve a satisfação do crédito[15]. Esta situação dá, ou pode dar lugar, muitas vezes, a situações de sobregarantia ou de sobrecobertura, portanto, de desproporção, desrazoável ou injustificada entre o valor do crédito garantido e o valor dos bens ou dos patrimónios dados em garantia.

Uma dessas garantias pode bem ser uma garantia autónoma, bancária ou não.

Sem preocupação de especial rigor, a garantia bancária autónoma pode ser definida como um tipo de garantia que, na fórmula mais comum, é prestada por uma entidade – normalmente um banco – que se obriga a entregar, a pedido de um terceiro, uma soma pecuniária previamente acordada, ao beneficiário da garantia, logo que este prove o incumprimento de determinado contrato por parte do terceiro, ou de imediato, quando este simplesmente o interpele a realizar essa prestação, mas abdicando, desde logo, em ambos os casos, a opor ao terceiro beneficiário quaisquer excepções derivadas, tanto da sua relação com o terceiro garantido, como da relação jurídica cujo cumprimento garante. Por ser geralmente prestada por um banco, a garantia é normalmente conhecida como garantia bancária autónoma[16].  A garantia pode, todavia, ser prestada por sociedades de garantia mútua (art.º 1.º e 2.º, n.º 1, a), do Decreto-Lei n.º 211/98, de 16 de Julho). A garantia autónoma, ou contrato autónomo de garantia é, assim, o contrato celebrado entre um banco ou uma sociedade de garantia mútua – garante -  e um seu cliente – devedor – pelo qual o primeiro se obriga por ordem do último a pagar determinada quantia pecuniária a um terceiro – garantido ou beneficiário – sem que a este possam ser opostas quaisquer excepções fundadas nas suas relações negociais com o mandante. Trata-se, assim, de uma figura jurídica atípica, dado que não dispõe de regime legal próprio – causal – cuja causa é garantir a satisfação do direito pecuniário do garantido – autónoma, i.e., não acessória ou dependente da obrigação garantida, salvo em eventos de fraude ou abuso. É também executiva, i.e., o respectivo documento negocial representa um título executivo, se tiver sido exarado ou autenticado por notário ou equiparado (art.º 703.º, n.º 1, b), do CPC).

De harmonia com o critério da finalidade, a garantia diz-se para boa execução se se destinar a assegurar o cumprimento de obrigações contratuais.

Enquanto obrigação, a garantia autónoma é, antes de mais, uma garantia obrigacional, em que, sendo bancária, o garante é um banco, mas também pode bem ser uma sociedade de garantia mútua, e a obrigação garantida tem por credor o beneficiário e por devedor um terceiro; através dela, o garante fica adstrito para com o beneficiário à realização de uma prestação pecuniária, logo que por este último seja invocado o incumprimento da obrigação garantida ou a impossibilidade da prestação a que respeita a obrigação assumida[17]. De harmonia com o critério da automaticidade, é usual fazer o distinguo entre a garantia autónoma simples e a garantia autónoma à primeira solicitação; esta última caracteriza-se pela impossibilidade de o garante não poder opor qualquer excepção à exigência do cumprimento, estando vinculado a entregar a quantia acordada assim que o beneficiário a solicite – desde que se mostrem observadas as condições convencionadas para a exigência da garantia. Tanto a admissibilidade como o conteúdo concreto da garantia autónoma relevam, inteiramente, da autonomia privada (art.º 405.º do Código Civil).

Se o garante honrar a garantia, satisfazendo ao credor garantido o seu crédito, fica sub-rogado nos direitos deste, na exacta medida dessa satisfação, relativamente ao devedor desse mesmo crédito (art.ºs 592.º, n.º 1, e 593.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil).

Por necessidades de rapidez e de normalização – e também pela procura de maiores lucros, generalizada pela concorrência – o comércio, designadamente bancário, recorre, de forma intensiva, ao esquema das cláusulas contratuais gerais, que, de forma sucinta, podem, doutrinariamente, definir-se como proposições pré-elaboradas que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a propor ou a aceitar (art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 31 de Agosto - LCCG)[18].

Esta noção básica - que não constitui uma definição mas antes a delimitação ou demarcação do âmbito de aplicação daquele diploma legal – mostra que as cláusulas contratuais gerais se caracterizam pela generalidade e pela rigidez: generalidade, dado que se destinam a ser propostas a destinatários indeterminados ou a ser subscritas por proponentes indeterminados; rigidez, porque são elaboradas sem prévia negociação individual, sendo recebidas em bloco por quem as subscreve ou aceite, e, portanto, os intervenientes não têm a faculdade de modelar ou modificar o seu conteúdo, introduzindo-lhes alterações. Se faltar a generalidade, a cláusula contratual geral resolve-se numa simples proposta negocial que não admite contraproposta; faltando a rigidez, o caso é de comum exercício da liberdade negocial.

A primeira daquelas características das cláusulas contratuais gerais permite distingui-las do contrato pré-formulado. Diz-se pré-formulado o contrato que uma das partes proponha a outra sem admitir contraproposta ou negociações. O contrato pré-formulado aproxima-se das cláusulas contratuais gerais pela rigidez, mas afasta-se delas pela ausência de generalidade. Dado que coloca problemas muito semelhantes aos das cláusulas contratuais, a lei determina a aplicação aos contratos concluídos por esse modo o regime das primeiras (art.º 1.º, n.º 2, da LCCG).

As cláusulas contratuais gerais excluem a liberdade de estipulação - mas não a liberdade de celebração. Elas incluem-se, por isso, no momento da conclusão, nos contratos singulares ou individualizados, desde que tenham sido aceites. Não tendo havido aceitação, não se verifica a sua precipitação no contrato singular considerado (art.º 4.º da LCCG). Desde que se exige sempre o acordo de vontades, os contratos singulares nos quais se utilizem cláusulas contratuais gerais devem continuar a ser valorados à luz das regras gerais de perfeição das declarações negociais. Institutos como o do erro, da falta de consciência da declaração ou da incapacidade acidental são-lhes, portanto, inteiramente aplicáveis (art.ºs 246.º, 247.º e 251.º do Código Civil).

As cláusulas contratuais gerais constituem um modo específico de formação dos contratos. Contudo, o poder que o seu recurso coloca nas mãos de quem as utiliza é considerável, podendo revelar-se danosas para os particulares e, em especial, para o consumidor. Pela sua feição e generalidade, algumas dessas cláusulas são intrinsecamente injustas ou inconvenientes e, por isso, a lei admite, dadas certas condições, o seu bloqueamento. A ordem jurídica não podia, na verdade, ficar indiferente aos riscos e abusos que as cláusulas gerais encerram, atendendo à situação de precariedade e de vulnerabilidade em que colocam frequentemente os contraentes aderentes. Essa tutela desenvolve-se, não apenas ao nível do conteúdo do negócio concluído na base de cláusulas contratuais gerais, mas igualmente, e desde logo, na fase da formação desse mesmo contrato.

O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo (art.º 1.º, n.º 3, da LCCG). Sem prejuízo, pode entender-se que o ónus da prova da existência de uma cláusula contratual geral incumbe ao aderente ou destinatário – sempre que pretende abrigar-se na protecção jurídica correspondente – v.g., a que decorre no não cumprimento dos deveres de comunicação e de informação[19].

A inserção, num contrato celebrado com recurso a cláusulas contratuais gerais, de dispositivos que não tenham sido devidamente comunicados ou informados não corresponde ao consenso real das partes: ninguém pode dar o seu assentimento ao que, na realidade, não entende ou não conhece. Afastando-se das soluções do Direito comum, a LCCG disponibiliza, para esse problema, uma solução expedita e simples: a exclusão dessas cláusulas dos contratos singulares em que se inserem (art.º 8.º). Essa exclusão não afecta, porém, a subsistência do contrato singular em que tais cláusulas estavam presentes: a lacuna contratual daí resultante é preenchida pelas normas supletivas aplicáveis, se necessário for com recurso às regras gerais de integração dos negócios jurídicos; só assim não será se não se mostrar possível o suprimento de aspectos essenciais do contrato ou se do suprimento resultar um desequilíbrio insuportavelmente atentatório da boa fé. Neste caso, a única saída é a nulidade do contrato (art.º 9.º, n.ºs 1 e 2, da LCCG).

A comunicação das cláusulas pelo predisponente deve se integral e oportuna – com a antecedência necessária – e adequada à possibilidade de conhecimento completo e efectivo pelo aderente que use de comum diligência (art.º 5.º, n.ºs 1 e 2, da LCCG). Estes requisitos configuram um ónus de comunicação que recai sobre o predisponente para que possa invocar as cláusulas gerais predispostas (art.ºs 5.º, n.º 3, e 8.º, a), da LCCG). O predisponente tem, além disso, um dever de informação prévia sobre o sentido e alcance das cláusulas contratuais gerais, que vincula quer à aclaração por iniciativa própria, quer ao esclarecimento de dúvidas postas pelo destinatário, em qualquer caso antes da conclusão do contrato (art.º 8.º, b), da LCCG).

Diferentemente da regra geral, o ónus da prova da comunicação, adequada e efectiva, cabe ao predisponente das cláusulas contratuais gerais (art.º 5.º n.º 3, da LCCG). Não assim quanto ao cumprimento do dever de informação, relativamente ao qual vale a regra geral: o ónus da prova da violação deste último dever recai sobre o aderente ou destinatário da cláusula contratual geral, dado que constitui facto extintivo do direito alegado pelo credor (art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil).

O regime dos deveres de comunicação e de informação das cláusulas contratuais gerais não é tão especial como à primeira vista poderia parecer, correspondendo, em boa parte ao que resultaria das regras gerais sobre a eficácia e o âmbito da generalidade das declarações contratuais e à interpretação de comportamentos enquanto tal. A comunicação integral oportuna e adequada é requisito de eficácia de qualquer declaração contratual: quem pretenda que um contrato abranja determinadas cláusulas, gerais ou individuais, tem de agir de modo a que a outra parte possa compreender que tais cláusulas fazem parte do âmbito do consenso, por inclusão nas declarações ou por remissão a partir delas (art.ºs 232.º e 236.º do Código Civil). Quanto à inserção das cláusulas contratuais gerais a lei não exige mais do regime comum – embora também não se satisfaça com menos. A diferença mais saliente respeita ao ónus da prova da violação do dever de comunicação: como se observou, esse ónus, nos contratos que não tenham sido concluídos com enunciados contratuais gerais, vincula a parte que alegue a ineficácia da cláusula, dada a sua nítida feição de facto extintivo do direito que a contraparte, fundado nessa cláusula pretenda fazer declarar ou valer (art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil).

O regime de inserção de cláusulas contratuais gerais em contratos singulares só é, pois, verdadeiramente especial enquanto reforça, quanto ao conteúdo e aos efeitos, o dever de informação pré-contratual e quando faz recair sobre o predisponente o ónus da prova do dever de comunicação. Quanto ao conteúdo, porque o torna mais abrangente, incluindo também o esclarecimento das cláusulas predispostas, e independente de qualquer juízo concreto em função de critérios de boa-fé; quanto aos efeitos, porque, em vez do dever de indemnizar, estabelece a cominação radical de exclusão das cláusulas dos contratos singulares (art.º 227.º do Código Civil e 8.º da LCCG). Isto mostra, contudo, que a os deveres pré-contratuais de informação da contraparte do predisponente como aderente não excluem os deveres pré-contratuais do fiador como contratante.

O que não é líquido é o desvalor jurídico das cláusulas contratuais gerais excluídas, que segundo alguma doutrina é a inexistência jurídica[20], segundo outra, a nulidade[21] e, de harmonia com uma terceira, a ineficácia[22].

No caso, é um só o fundamento do recurso: o error in iudicando por erro na avaliação das provas em que, no julgamento dos pontos de facto n.º 8 – julgado provado – e c), d), e) e f), julgados não provados – incorreu o Sr. Juiz de Direito. No ver da apelante, numa sã e prudente apreciação das provas, o ponto de julgado provado deve declarar-se não provado e, inversamente, os enunciados c), d), e) e f), considerados não provados devem julgar-se provados.

3.2. Error in iudicando em matéria de provas.

3.2.1. Finalidades e parâmetros sob cujo signo são actuados os poderes de controlo e correcção desta Relação relativamente à decisão da matéria de facto.

O controlo da Relação relativamente à decisão da matéria de facto pode ter, entre outras, como finalidade, a reponderação e a correcção da decisão proferida. A Relação pode reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar – e substituir – a decisão da 1ª instância, nomeadamente, se a prova produzida – designadamente a prova pessoal produzida oralmente na audiência final, desde que tenha sido objecto de registo – impuser decisão diversa (art.ºs 640.º, n.º 1, b), in fine, e 662.º, n.º 1, do CPC).

Todavia, esse controlo é actuado na ausência de dois princípios que contribuem decisivamente para a boa decisão da questão de facto: o da oralidade e da imediação - a decisão da Relação não é atingida por forma oral – mas através da audição de registos fonográficos ou da leitura, fria e inexpressiva de transcrições – e sem uma relação de proximidade comunicante com os participantes processuais, de modo a obter uma percepção própria do material que há-de ter como base dessa mesma decisão.

Além disso, esse controlo orienta-se pelos parâmetros seguintes:

a) Do exercício da prova – que visa a demonstração da realidade dos factos – apenas pode ser obtida uma verdade judicial, jurídico-prática e não uma verdade, absoluta ou ontológica, matemática ou científica: a verdade obtida em processo, dado que é alcançada por aplicação das normas e técnicas que valem no processo é, sempre, uma verdade contextual, obtida nas condições que a relação processual permite (art.º 341.º do Código Civil);

b) A livre apreciação da prova assenta na prudente convicção – i.e., na faculdade de decidir de forma correcta - que o tribunal adquirir das provas que foram produzidas (art.º 607.º, nº 5, do CPC).

c) A prudente obtenção da convicção deve respeitar as leis da ciência, da lógica e as regras da experiência - entendidas como os juízos hipotéticos, de conteúdo geral, desligados dos factos concretos objecto do processo, procedentes da experiência, mas independentes dos casos particulares de cuja observação foram deduzidos e que, para além desses casos, pretendem ter validade para casos novos – e que constituem as premissas maiores de facto às quais são subsumíveis factos concretos;

d) A convicção formada pelo juiz sobre a realidade dos factos deve ser uma convicção subjectiva fundada numa convicção objectiva, assente nas regras da ciência e da lógica e da experiência comum ou de normalidade maioritária e, portanto, uma convicção cognitiva e não volitiva, voluntarista, subjectiva ou emocional;

e) A convicção objectiva é uma convicção argumentativa, i.e., demonstrável através de um ou mais argumentos capazes de se impor aos outros;

f) A apreciação da prova vincula a um conceito de probabilidade lógica – de evidence and inference, i.e., segundo um critério de probabilidade lógica prevalecente, portanto, segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis: os elementos de prova são assumidos como premissas a partir das quais é possível extrair inferências; as inferências seguem modelos lógicos; as diversas situações podem ser analisadas de acordo com padrões lógicos que representam os aspectos típicos de cada caso; a conclusão acerca de um facto é logicamente provável, como uma função dos elementos lógicos, baseada nos meios de prova disponíveis[23].

Note-se – de harmonia com a doutrina que se tem por preferível – que se a Relação tem o dever de proceder ao exame crítico das provas - novas ou mesmo só renovadas – que sejam produzidas perante ela e de formar, relativamente às provas submetidas à sua livre apreciação, uma convicção prudente sobre essas provas – não há razão bastante – legal ou sequer epistemológica - para que não proceda àquele exame e à formulação desta convicção - e à sua objectivação - no caso de reapreciação das provas já examinadas pela 1ª instância (art.º 607.º, nº 5, ex-vi art.º 663.º, n.º 2, do CPC). O controlo da correcção da decisão da matéria de facto da 1ª instância exige, realmente, que a Relação construa – autonomamente, embora com os limites decorrentes da sua vinculação à impugnação do recorrente - não só a sua própria convicção sobre as provas produzidas, mas igualmente que a fundamente[24].

A conclusão da correcção ou da incorrecção da decisão da questão de facto do tribunal da 1ª instância exige um juízo de relação ou comparação entre a convicção que o decisor de facto daquela instância extrai dos elementos de prova que apreciou e a convicção que a Relação adquire da reapreciação dessas mesmas provas. Se a convicção do juiz da 1.ª instância e da Relação forem coincidentes, a decisão da matéria de facto daquele tribunal deve ter-se por correcta, com a consequente improcedência da impugnação deduzida contra ela; se a convicção do decisor da 1.ª instância e da Relação forem divergentes, a Relação deve fazer prevalecer a sua convicção sobre o convencimento do juiz da 1ª instância e, correspondentemente, revogar a decisão deste último e logo a substituir por outra conforme àquela mesma convicção[25].

A Relação deve, pois, formar uma convicção verdadeira – e fundamentada - sobre a prova produzida na 1.ª instância, independente ou autónoma da convicção do juiz a quo, que pode ou não ser coincidente com a deste último – não se limitando a controlar a legalidade da produção da prova realizada naquela instância e a aceitar o resultado do exercício da prova - salvo casos em que esse julgamento seja ilógico, irracional, arbitrário, incongruente ou absurdo[26].

3.2.2. Reponderação das provas.

Como se notou, a apelante reputa de julgados em erro a afirmação de facto julgada provada com algarismo 8.º - As cláusulas 4), bem como as demais, dos documentos referidos em 2.º e 4.º foram comunicadas à executada/opoente antes da assinatura dos documentos - que, acha que deve ser julgada não provada – e os enunciados, da mesma espécie, das alíneas c), d), e) e f) - c) O conteúdo das cláusulas que compõem os documentos referidos em 2.º e 4.º não foi comunicado e explicado à executada/opoente; d) Em nenhum momento prévio à assinatura dos documentos referidos em 2.º e 4.º, ninguém transmitiu à executada/opoente o que seria o teor dos mesmos; e) A exequente, por si ou por interposta pessoa, não comunicou nem, muito menos, explicitou à executada/opoente, anteriormente à assinatura dos documentos referidos em 2.º e 4.º, qualquer das cláusulas que os compõem; f) Os documentos referidos em 2.º e 4.º não foram entregues à executada/opoente -  declarados não provados e que, no ver da apelante, deve ser julgados provados.

Estando assente, face aos factos adquiridos, sem controversão, para o processo, que os contratos de garantia autónoma e à primeira solicitação, que compreendem o pacto ou acordo de preenchimento das livranças, foram concluídos com base em cláusulas gerais - portanto, que foram unilateralmente predispostas e inalteráveis, i.e., relativamente às quais só se reconheceu à apelante a mera possibilidade de aceitação ou de recusa, em bloco, dessas mesmas cláusulas – a controvérsia relativa à quaestio facti, gravita em torno do ónus de comunicação dessas mesmas cláusulas. Ónus de comunicação cuja prova – notou-se já – cabe, por inteiro, à apelada.

Como decorre da motivação com que o Sr. Juiz de Direito procurou justificar o julgamento cuja correcção é controvertida no recurso, foram duas as provas que o convenceram da realidade do facto da entrega dos documentos que corporizam a contracção da garantia autónoma: as declarações da – única – testemunha ouvida na audiência – DD, gestora de cliente da apelada no âmbito da recuperação de crédito, que asseverou que a entrega dos contratos constitui prática habitual da apelada; os documentos que corporizam os contratos no segmento em que contêm a indicação de que foram impressos em três exemplares originais, destinando-se um à executada. A partir destes elementos probatórios, o Sr. Juiz de Direito entendeu possível considerar provado (presunção judicial) que ocorreu a entrega de cópia (exemplar ou duplicado) dos “contratos”.

Na fundamentação da sentença, o juiz pode extrair os factos presumidos com base nos factos probatórios (art.º 607.º. n.º 4, CPC). Em concreto: se dos factos assentes ou da fundamentação sobre a matéria de facto constarem factos probatórios donde se possa concluir outros por presunção – de facto, de direito ou judicial – o juiz deve tirar essa conclusão e considerar provado o facto ou o direito presumido.

A presunção judicial situa-se no âmbito da chamada prova complexa, i.e., da prova através da qua o facto probando é inferido de um facto probatório ou instrumental. Como qualquer outra presunção, a presunção judicial permite a inferência de um facto desconhecido de um facto conhecido: este o facto probatório, sendo o facto desconhecido o facto probando. A relação entre um e outro é estabelecida através de regras ou máximas de experiência.

As presunções são, pois, ilações que a lei ou o juiz tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (art.º 349.º do Código Civil). As presunções podem ser legais, se estabelecidas pela lei, ou judiciais. Estas últimas – únicas que para o caso do recurso interessam – dizem-se também de facto ou hominis ou simples. As presunções hominis são afloramento nítido do princípio da livre apreciação da prova e o facto de só serem possíveis nos casos em que é admissível a prova testemunhal, mostra a fragilidade com que as ilações em que se resolvem são encaradas pela lei (art.º 351.º do Código Civil). O juiz, na base do id quod plerumque accidit – do que normalmente sucede – ou prima facie – na primeira aparência – infere conexões normais ou sequências típicas de factos. Mais precisamente: a presunção é a inferência ou processo lógico, mediante o qual, por via de uma regra de experiência - id quod plerumque accidit – se conclui, verificado certo facto, a existência de outro facto que, em regra, é consequência necessária daquele. O facto conhecido, de que se infere o outro, é a base ou o sopé da presunção.

                As presunções judiciais, de facto ou hominis ou simples presunções são afinal o produto de regras de experiência: o juiz valendo-se de certo facto e de regras de experiência, conclui que aquele denuncia a existência de outro facto. Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede, então, mediante presunção ou regra de experiência ou, se se quiser, vale-se de uma prova de primeira aparência[27].

                As regras de experiência são normas para a apreciação de factos e, com isso, para a aquisição deles, permitindo concluir de um facto pela existência de outro. E, na verdade, a cada passo, o juiz tem de socorrer-se de regras de experiência para a fixação dos factos ou da conexão causal entre dois eventos, sem as quais, portanto, lhe seria impossível decidir a questão de direito.

                No seu funcionamento, a presunção produz um efeito materialmente idêntico à exclusão do ónus da prova, embora se não confunda com este. Na verdade, a presunção não fornece a demonstração do facto, mas dá por admitida a sua realidade antes de toda e qualquer demonstração, com base na experiência comum de como certos factos normalmente se verificam – quod plerumque accidit – sem esperar o exercício da prova. Justamente no valor de credibilidade que, de per se, apresenta a regra de experiência está o fundamento racional da presunção e na medida desse valor assenta o seu grau de rigor. A presunção pode, assim, ser o único meio em que o juiz baseia a sua convicção, podendo até fazer prevalecer a presunção em detrimento de outras provas produzidas e mesmo recorrer a ela ainda que o facto questionado possa ser apurado por outro meio relativamente mais seguro. De outro aspecto, nada exclui que na base da presunção se situe um único facto: o que é necessário é que ele seja inequívoco, i.e., que faça aparecer como necessária a existência do facto desconhecido. No entanto, para que a presunção se aplique é indispensável a prova do facto que constitui a sua base.

                As presunções sejam judiciais ou de facto ou legais, não são, propriamente, meios de prova – mas somente meios lógicos ou mentais de descoberta de factos e firmam-se mediante regras de experiência. Rigorosamente são, portanto, operações probatórias, tendo por base as regras de experiência resultantes do curso normal dos factos[28]. Ponto é que exista uma relação entre o facto probatório e o facto probando  de harmonia com a inferência para a melhor explicação, i.e., sempre que o primeiro constitui a melhor explicação do segundo[29].

Face a este enunciado, bem pode duvidar-se do acerto da metódica argumentativa da sentença impugnada, quando se socorre, para estabelecer o facto controverso – a entrega dos documentos continentes das declarações negociais de contracção das garantias autónomas e do pacto de preenchimento das livranças – de presunção. Em primeiro lugar, porque a referida testemunha nem sequer demonstrou ter conhecimento directo das circunstâncias atinentes à conclusão dos contratos; depois a afirmação da testemunha nem sequer é acorde com a alegação  produzida pela apelada no articulado de contestação, segundo a qual os documentos foram entregues à apelante pelos bancos – beneficiários das garantias - que é o que, aliás,  normalmente sucede; por último, porque do facto de dos documentos constar que foram produzidas várias vias deles, não se segue à evidência que um dos exemplares foi entregue à executada. Quer dizer: os factos probatórios – ou instrumentais, na designação legal – de que a sentença parte para afirmar o facto probando não podem dar-se, para além de qualquer dúvida razoável, como demonstrados.

Crê-se, todavia, que os factos controversos – a entrega de um exemplar dos documentos continentes da contracção das garantias e do acordo de preenchimento das livranças e a comunicação das respectivas cláusulas podem, de modo seguro ser estabelecidos a partir – do texto desses mesmos documentos, adquiridos para o processo com o articulado de contestação dos embargos.

O documento que cristaliza a conclusão do contrato de garantia de que foi beneficiário a Banco 1..., indica como data de enquadramento da candidatura da apelante 10 de Novembro de 2016, como data de emissão da garantia 16 de Novembro do mesmo ano; esse mesmo documenta a declaração da recorrente, datada também de 16 de Novembro de 2016, através da qual dá o seu acordo, expresso e sem reservas, às condições emergente da prestação da garantia pela A... a favor da Banco 1...; no anexo 3, consta a autorização, datada de 16 de Novembro de 2016, dada pela apelante de débito bancário directo, a favor da recorrida, das importâncias devidas a esta pela prestação da garantia; a assinatura do documento, do sócio gerente da impugnante, nesta qualidade, foi reconhecida por Advogada, por ter sido feita na sua presença, no dia 21 de Novembro de 2016.

O documento que corporiza a contracção da garantia a favor da Banco 2..., datado, no cabeçalho, de 6 de Julho de 2017, menciona como data de enquadramento da candidatura da apelante 29 de Junho de 2017 e contém a declaração, datada de 13 de Julho de 2017, data de contracção do financiamento, de que dá o seu acordo, expresso e sem reservas, às condições emergentes da prestação da garantia pela A... a favor da Caixa; no anexo 3, surge a autorização de débito, a favor da apelada, datada de 6 de Julho de 2017, das quantias devidas a esta pela prestação da garantia; a assinatura do sócio-gerente da apelante, em representação desta, foi objecto de reconhecimento notarial presencial no dia 13 de Julho de 2017.

 Do conteúdo destes documentos, decorre, como corolário que não pode ser recusado, que a apelante os deteve. É que, como o reconhecimento da assinatura tem de ser lavrado no próprio documento em que se contém a subscrição ou em folha anexa e esse reconhecimento foi no caso presencial - a assinatura foi feita na presença do notário ou equiparado – a apelante tinha necessariamente que ter na sua posse os documentos em cujo anexo aquele reconhecimento foi exarado, porque só nesta hipótese os poderia apresentar ao notário ou equiparado para os subscrever na sua presença (art.ºs 46.º, n.º 4, e 153,º, n.ºs 1 a 5, do Código do Notariado). Ergo, há que dar como provado que à apelante foram entregues os documentos continentes das cláusulas contratuais gerais com base nas quais os contratos de garantia autónoma foram concluídos e, logicamente, que essa entrega ocorreu em momento anterior ao do reconhecimento presencial da sua assinatura pelo representante da recorrente, sendo irrelevante, para o problema que nos ocupa – a cognoscibilidade do seu conteúdo - que se ignore se esses mesmos documentos lhe foram entregues pelos mutuantes bancários – beneficiários das garantias – ou pela garante, apelada.

De outro aspecto, no tocante ao documento relativo à conclusão da garantia autónoma de que a Banco 1... foi beneficiária se se comparar a data em que foi assinado quer esse documento quer o anexo contendo a autorização de pagamento por débito bancário das despesas com a sua contração – 16 de Novembro de 2106 – com a data do reconhecimento da assinatura – 21 de Novembro de 2016 – há também que concluir que a apelante teve acesso ao conteúdo do mesmo documento em momento anterior ao desse mesmo reconhecimento, tempo mais que razoável para se inteirar do seu conteúdo e das obrigações que contraía, não sendo razoável supor sequer que a apelante autorizasse o pagamento das despesas devidas à garante pela prestação da garantia no desconhecimento do seu conteúdo. E o mesmo se pode dizer no tocante à conclusão da garantia autónoma prestada a favor da Banco 2..., SA. Tal documento mostra-se datado de 6 de Julho de 2017 – data em que também foi assinada a autorização anexa do pagamento por débito em conta bancária das referidas despesas – tendo sido assinado no dia 13 de Julho de 2017, data em que também foi lavrado o reconhecimento presencial da assinatura. Da articulação destas datas decorre, igualmente, que a apelante teve acesso ao documento em momento anterior ao daquele reconhecimento, arco temporal suficiente, da harmonia com critérios de razoabilidade, para a apelante apreender o seu conteúdo e as vinculações que derivavam da sua subscrição. De resto, as garantias foram prestadas, ao menos formalmente, sob proposta – candidatura – da apelante, não sendo razoável assumir que a apelante se propusesse contrair as garantias ou se candidatasse à sua prestação na ignorância das condições a que a proposta ou a candidatura estavam subordinadas.

Conclusão que é corroborada pelo conteúdo – que em boa técnica deveria constar do ponto 10 dos factos provados - da mensagem de correio electrónico do representante da apelante, dirigida à apelada, em resposta à exigência do pagamento, pela recorrente, das quantias que desembolsou, em cumprimento das garantias a favor dos bancos beneficiários – no qual aquele reitera a disponibilidade para chegar a um acordo amigável. De harmonia com regras de experiência e critérios sociais ninguém se propõe transigir com o credor, encontrar com ele uma solução negociada ou contratualizada de satisfação do crédito, sem saber qual é esse crédito e a fonte de que promana. Mais do que a confissão do débito, aquela declaração tem necessariamente implícita o reconhecimento ou a admissão de que a apelante tinha inteira e clara consciência das vinculações a que estava adstrita para com a apelante e, consequentemente, das condições negociais em que foram prestadas as garantias.

Deste modo, a decisão de julgar provado que a recorrente recebeu um exemplar dos apontados documentos e que as cláusulas contratuais gerais nele contidas – maxime as relativas ao pacto ou contrato de preenchimento das livranças – que não se caracterizam por uma particular tecnicidade, lhe foram comunicadas é, de harmonia com um critério prudencial de avaliação da prova, correcta.

É certo que os enunciados, considerados não provados, que a apelante reputa de erroneamente julgados têm também por objecto os factos relativos à violação do dever de informação sobre o sentido e o alcance das cláusulas. Mas quanto a este segmento daqueles enunciados, a decisão de os declarar não provados é também correcta.

Como se observou, o ónus de comunicação das cláusulas contratuais gerais e o dever de informação sobre o sentido ou significado são realidades jurídicas diferentes. No caso, a violação do dever de informação resultava, de harmonia com a estratégia processual adoptada pela apelante, da violação do ónus de comunicação, o que, pelas razões expostas, não deve julgar-se demonstrado. Depois, como oportunamente se salientou, o ónus da prova dos factos relativos à inobservância do dever de informação não onera o predisponente das cláusulas – mas o aderente e, no caso, há que irrecusavelmente convir que a este propósito a apelante não produziu uma prova sequer que fosse.

                Todas as contas feitas, a conclusão derradeira a tirar é a de que a impugnação que a apelante dirigiu contra a decisão da questão de facto deve improceder, pelo que a decisão daquela matéria do tribunal de 1.ª instância deve ser mantida qua tale. E face dessa improcedência, a do recurso, in totum, é meramente consequencial.

3.3. Concretização.

Como resulta dos apontados documentos – cujo conteúdo, incorrectamente, não surge descrito, na matéria de facto – é incontroversa a conclusão, entre a apelante e apelada de dois contratos de garantia autónoma à primeira solicitação, por força dos quais, a última se vinculou a pagar aos beneficiários – dois bancos – o valor máximo garantido convencionado do débito que para a apelante emergiu dos contratos de mútuo que contraiu com aquelas instituições bancárias. Em contrapartida, a apelante vinculou-se a pagar à apelante, além das comissões, todos os valores que a apelada pagasse aos beneficiários da garantia acrescidos, em caso de mora, dos respectivos juros, autorizando-a a preencher, com esses valores, as livranças, em branco, que subscreveu e que lhe entregou.

Os contratos devem ser pontualmente cumpridos (art.º 406.º do Código Civil). A apelada honrou a garantia, como demonstram os documentos oferecidos pela apelada com o articulado de contestação – e o acordo das partes – embora um tal facto também não conste, como deveria, na matéria de facto individualizada na sentença impugnada. Todavia, a apelada não demonstrou ter cumprido a obrigação pecuniária a que, por força de cada um dos contratos, se vinculou, incumprimento que se presume proceder de culpa sua, e que a faz incorrer no dever – legal e contratual – de reparar os danos que para a apelante resultam do atraso do cumprimento, indemnização que corresponde, na falta de estipulação diversa, aos juros legais, contados desde a constituição em mora (art.ºs 799.º, 804.º, n.ºs, 805 n.º 1, e 806.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil).

Além disso, com a falta de cumprimento, a apelante conferiu, à apelante o direito de potestativamente, proceder ao preenchimento das livranças que, para facilitar a satisfação dos seus créditos, lhe entregou. Por força da promessa de pagamento em que se resolve a declaração cambiária de subscrição, a recorrente - subscritora - obrigou-se a pagá-la ao portador no vencimento, rectior, a entregar-lhe a quantidade de espécies pecuniárias nela inscrita e, por força da mora, os respectivos juros, contados à taxa legal e, bem assim, a despesa de imposto do selo devido pela emissão das livranças, encargo fiscal que recai sobre o devedor (art.º 48.º, 3, ex-vi artº. 77.º da LUsLL, e 3.º, j), do CI do Selo). Obrigação que a apelante não demonstrou, como lhe competia, ter cumprido, pelo que há resolver contra ela a questão de facto correspondente (art.ºs 342.º, n.º 2, do Código Civil, e 414.º do CP Civil).

Nada tolhe, portanto, a exequibilidade extrínseca – do título que serve de suporte à execução – nem a exequibilidade – intrínseca – da obrigação que, constitutivamente, incorpora.

Importa, pois, recusar ao recurso decisão de procedência.

Da argumentação expendida extraem-se, como proposições conclusivas mais relevantes, as seguintes:

(…).

A apelante deverá suportar, por força da sua sucumbência no recurso, as custas correspondentes (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).

4. Decisão.

Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.

Custas pela apelante.

                                                                                                                                              2023.12.13


[1] Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, Lex, Lisboa, 1998, pág. 177.
[2] Cfr., v.g., Acs. da RC de 06.02.1990, BMJ n.º 394, pág. 430, n.º 330, pág. 543, e da RL de 04.11.1997, BMJ n.º 471, pág. 448.
[3] J. C. Ferreira de Almeida, Algumas considerações sobre o problema da natureza e função do título executivo, RFD, 19, (1965), pág. 317 e ss.

[4] O título executivo só formalmente é um documento – apresenta-se sempre como um documento; materialmente é um meio de demonstração legal, o qual poder ser um meio documental, como v.g., de títulos de crédito, um acto, como no caso de sentença. Título executivo é aquilo que convence o tribunal exequente de que existe o crédito exequendo, é o facto primário da sua convicção. Mesmo materialmente, o título executivo tem primariamente função demonstrativa (probatória, gnoseológica) e só secundariamente função constitutiva (ontológica). Castro Mendes, A Causa de Pedir na Acção Executiva, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. XVIII, 1964, págs. 205 e 206. O título executivo é, em termos substanciais, um instrumento legal de demonstração da existência do direito exequendo e a sua exequibilidade resulta da relativa certeza ou da suficiência da probabilidade da existência da obrigação nele consubstanciada: se a obrigação se encontra titulada por um documento escrito, pode inferir-se, com um elevado grau de probabilidade, a sua constituição. Cfr. Castro Mendes, Manual de Processo Civil, págs. 73 e 74, e Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 60.
[5] Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, vol. III, Letra de Câmbio, Coimbra, 1975, pág. 75, José de Oliveira Ascensão, Direito Comercial, vol. III, Títulos de Crédito, Lisboa, 1992, pág. 37, Abel Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças Anotada, 6ª edição, Lisboa, 1990, págs. 116, 126 e 127, Vaz Serra, RLJ Ano 105, pág. 376 e Acs. do STJ de 12.10.78 e 26.06.73, BMJ nºs 280, pág. 343 e 228, pág. 233.
[6] RLJ, Ano 55º, pág. 210.
[7] José A. Engrácia Antunes, Os Títulos de Crédito, Coimbra Editora, 2009, págs. 65 e 66.
[8] Abel Delgado, Lei Uniforme sobre Letras e Livranças Anotada, 6ª edição, Lisboa, 1990, pág. 76 e Vaz Serra, RLJ Ano 109, pág. 264 e Títulos de Crédito, BMJ nº 61, pág. 264 e Paulo Sendim, Letra de Câmbio, vol. I, Coimbra, 1979, págs. 32 a 34; Acs. do STJ de 24.10.2002, 20.05.2004 e 12.07.2005, www.dgsi.pt. Em sentido diverso, concluindo que a letra em branco não tem efeito como letra, só surgindo como título cambiário após o preenchimento – embora atribua a este carácter retroactivo, cfr., José de Oliveira Ascensão, Direito Comercial, vol. III, Títulos de Crédito, Lisboa, 1992, págs. 117 e 118.
[9] Vaz Serra, Provas (Direito Probatório Material), BMJ nº 111, pág. 168 e Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 4ª ed., Coimbra, 1985, pág. 421.
[10] Ac. do STJ de 13.12.2007, www.dgsi.pt.
[11] Acs. do STJ de 28.05.1996, BMJ nº 457, pág. 403, 01.10.1998, BMJ n.º 480, pág. 482 , e de 20.10.1996, www.dgsi.pt.
[12] Colecção Oficial, Ano 27º, pág. 122. O assento caducou por a LU não conter preceito semelhante ao Código Comercial – o artº 284 – a que se referia.
[13] Diário do Governo, I Série, de 22 de Maio de 1936. O Assento – agora com o simples valor de acórdão de uniformização de jurisprudência – apesar de ter sido tirado com base num texto do Código Comercial – o artº 339 – ainda se encontra em vigor (artº 17 nº 2 do DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro). Cfr. Ferrer Correia, Direito Comercial, vol. III, Letra de Câmbio, Coimbra, 1975, pág. 57. Contra, entendendo que também este último caducou com a revogação da legislação de que era complementar, José de Oliveira Ascensão, Direito Comercial, vol. III, Títulos de Crédito, Lisboa, 1992, pág. 234 nota 1.
[14] Vaz Serra, RLJ Anos 101 e 111, págs. 340 e 68, respectivamente; Ferrer Correia, cit., pág. 60 e José de Oliveira Ascensão, cit., págs. 234 a 236.
[15] Manuel Januário da Costa Gomes, Assunção Fidejussória de Dívida, Sobre o sentido e o âmbito da vinculação como fiador, Coimbra, 2000, págs. 46 e 47.
[16] Francisco Cortez, A garantia bancária autónoma – alguns problemas, in Revista da AO, n.º 52, 1992, Mónica Jardim, A Garantia Bancária Autónoma, Almedina, 2002, pág. 13, e Bendita Pessanha, “Garantia Bancária Autónoma, A Qualificação da Relação Jurídica Garantida, Junho 2014, Repositorium UCP, pág. 17; Ac. do STJ de 14.01.2021 (15265/14.2T8PRT-A.P1.S1).
[17] Galvão Telles, Garantia Bancária Autónoma, in O Direito, Ano 120, III-IV, 1988 (Julho-Dezembro), pág. 283, e Jorge Duarte Pinheiro, Garantia Bancária Autónoma, disponível em portal.oa.pt, pág. 2.
[18] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição 2000, Almedina, Coimbra, pág. 415 e Manual de Direito Bancário, Almedina, Coimbra, 1998, págs. 413 e 414.
[19] Ana Filipa Morais Antunes, Comentário à Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, Coimbra, 2013, pág. 67; Acs. da RP de 13.03.2012 (3951/08.OTBVFR.P1), da RC de 20.03.2012 (2421/09.4TBVIS-A.C1) e do STJ de 24.10.2006 (2978/06).
[20] Galvão Telles, Das condições gerais dos contratos e da directiva europeia sobre clausulas abusivas, O Direito, Ano 127, III-IV (Julho-Dezembro, Lisboa, 1995, pág. 322. Sousa Ribeiro, O regime dos contratos de adesão algumas questões decorrentes da directiva sobre cláusulas abusivas, in “Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977”, Vol. III, Coimbra, 2007, págs. 378 e 379 e Araújo de Barros, Cláusulas Contratuais Gerais, - DL n.º 446/85 – Anotado/Recolha Jurisprudencial, Coimbra, 2010, 64 e 110.
[21] Raul Ventura, Convenção de arbitragem e cláusulas contratuais gerais, Sep. da ROA, Ano 46, (Abril de 1986), pág. 37.
[22] Carlos Ferreira da Almeida, Contratos, I, Conceito, Fontes, Formação, 2.ª edição, Coimbra, pág. 154-
[23] Michelle Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, págs. 42 e 43.
[24] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, pág. 237, e João Paulo Remédio Marques, A Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2011, págs. 638.
[25] Miguel Teixeira de Sousa, “Prova, poderes da Relação e convicção: a lição da epistemologia – Ac. do STJ de 24.9.2013, Proc. 1965/04, in Cadernos de Direito Privado, nº 44, Outubro/Dezembro 2013, págs. 33 e ss.
[26] António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição actualizada, Almedina, Coimbra, 2022, págs. 333 e 334.

[27] Vaz Serra, Provas, BMJ n.º 110, pág. 190.

[28] Cfr. João de Castro Mendes, Do Conceito de Prova, 1961, pág. 251. Duvidoso é também saber se a presunção é uma indução ou uma dedução. Sustentando que se trata de prova por indução, cfr. Manuel de Andrade Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra editora, 1976, pág. 215.
[29] Deve, portanto, existir um enlace preciso e directo entre o facto adquirido e o desconhecido, uma conexão, coerência e congruência entre o primeiro e o segundo, de harmonia com a regra de experiência – mas não é necessário que entre o facto-base e o facto presumido exista um vínculo de absoluta e exclusiva necessidade causal, sendo suficiente uma relação de dependência lógica entre o facto conhecido e o desconhecido. Cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova por Presunção no Direito Civil, Almedina, 2012, pág. 48.