Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1336/11.0TBLRA-T.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOSÉ AVELINO GONÇALVES
Descritores: INSOLVÊNCIA LIQUIDATÁRIA
VENDA EM LIQUIDAÇÃO DO ATIVO
PERFEIÇÃO DO NEGÓCIO
PRODUÇÃO DE EFEITOS
Data do Acordão: 10/24/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMÉRCIO DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 164.º, N.º 1, DO CIRE, 879.º, ALÍNEA A) E 408.º, N.º 1, DO CÓDIGO CIVIL, 827.º E 833.º, N.º 4, DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL
Sumário:
I – O meio processual próprio para o terceiro invalidar a decisão alegadamente irregular do administrador da insolvência, em sede de liquidação do activo, é a impugnação incidental no processo da insolvência, não uma acção autónoma de processo comum.

II – A insolvência liquidatária assume-se como acção executiva para pagamento de quantia certa, na qual a liquidação/venda dos bens da massa insolvente integra actividade e objetivo para proceder ao pagamento dos créditos reconhecidos sobre a insolvência, depois de satisfeitas as dívidas da massa.

III – A venda executiva não pode deixar de ser considerada como um fenómeno essencialmente processual e com os efeitos de direito substantivo do negócio típico da compra e venda. A venda realizada em sede de liquidação do activo no processo de insolvência é uma venda judicial que tem, por regra, os mesmos efeitos da compra e venda em geral – a propriedade transmite-se para o adquirente por mero efeito do contrato, como seu efeito real (arts. 879º-a) e 408º-1 Código Civil).

IV – Uma vez aceite a melhor – ou a única – proposta, o contrato acha-se concluído – a declaração negocial gerará efeitos de natureza obrigacional, consubstanciados no direito do transmissário à exigência da prossecução das condutas idóneas à perfeição do negócio.

V – Todavia, a transferência da propriedade e a entrega efectiva ficam condicionadas ao pagamento integral do preço e satisfação das obrigações fiscais inerentes à transmissão, pois que só nesse momento é lavrado o instrumento da venda – artigos 827.º e 833.º n.º 4, ambos do Código do Processo Civil.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 1336.11.0TBLRA-T.C1

 

(Juízo de Comércio de Leiria - Juiz 2)

Acordam os Juízes da 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

1.Relatório

A A..., SA veio, por requerimento de 7.02.2023, e com os fundamentos aí referidos, requerer que seja declarado nulo e de nenhum efeito o Leilão cujo término foi agendado para o dia 2 de Fevereiro de 2023 e que seja ordenado ao Sr. Administrador da Insolvência que diligencie pela venda das verbas nº 21, 39 e 40 à Requerente, pelos valores por esta propostos a 26.09.2018, de acordo com a comunicação que lhe foi endereçada, aceitando os referidos valores.

Notificado, o Srº Administrador veio pronunciar-se por requerimento de 23.02.2023, requerendo o indeferimento do requerido.

Notificados os credores, apenas o Banco 1..., SA veio pronunciar-se aderindo à posição manifestada pelo Administrador de Insolvência.

Pelo Juízo de Comércio de Leiria - Juiz ... foi proferida, na parte com interesse para o recurso, a seguinte decisão final:

“No que respeita à verba nº 21, em face do supra referido, impõe-se considerar que a omissão pelo Srº Administrador dos actos conducentes à formalização da venda com a sociedade A..., SA, na sequência da aceitação da proposta e da improcedência da acção que reconheceu que não existia direito de preferência por parte das sociedades que se apresentaram a exercê-lo, nomeadamente, com a notificação da A... para prestar a caução correspondente a 20% da licitação e demais actos subsequentes, traduz uma irregularidade susceptível influir no exame ou decisão da causa (por aplicação subsidiária do art. 195º do Código de Processo Civil), na medida em que retira à requerente a possibilidade de adquirir o bem pelo valor da licitação e, consequentemente, determina a nulidade do leilão que terminou a 2.02.2023.

Notifique”.

Massa Insolvente de B..., S.A., notificada de tal decisão – proferida nos autos principais em 25.04.2023, que determinou a nulidade da venda realizada em 02.02.2023 do imóvel que consta no auto de apreensão como verba 21 -, não se conformando com o mesmo, dela interpõe recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:

1. A presente decisão que anulou a venda decorrente do leilão de 02.02.203 padece de nulidade por força do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d) e c).

2. De facto, decidiu o Tribunal a quo que a venda decorrente do leilão de 2.02.2023 é nula por constituir uma irregularidade suscetível de influir no exame ou decisão da causa (por aplicação subsidiária do artigo 195º do CPC).

3. Ora, esta nulidade processual- secundária- não é de conhecimento oficioso como decorre do artigo 196º do CPC, pelo que a mesma teria ser arguida pela requerente, o que não aconteceu.

4. De facto, a reclamante peticiona anulação do leilão de 02.02.2023 por força da declaração negocial de 26.09.2018, não invoca qualquer irregularidade processual cometida pelo Sr. Administrador da Insolvência, nem tal sequer seria lógico atendendo que reclama a venda das três verbas e a decisão proferida no apenso S se referir unicamente à verba 21.

5. Em conformidade, impõe-se concluir que a presente decisão é nula por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, al. d) do CPC.

6. Por outro lado, fundamenta sua decisão de anulação do ato de venda porquanto, ao contrário do alegado pelo Sr. Administrador de insolvência, tem de se considerar como sinalizada a venda da verba 21 pela A..., SA, contudo, condena o Administrador de insolvência a notificar a A... para prestar caução correspondente a 20% da licitação – de 119.000,00€- e demais atos subsequentes e conducentes à formalização da venda.

7. De modo evidente se verifica uma ilogicidade, contradição e ambiguidade entre os fundamentos e a decisão, que salvo melhor entendimento e o devido respeito, se impõe julgar como nula a decisão termos do disposto no artigo 615º, nº 1 alínea c).

8. O Sr. Administrador da Insolvência fundamentando a sua decisão de revogar a anterior decisão de aceitação da proposta da A..., SA por constatar a desistência desta sociedade na aquisição das verbas 39 e 40 e o comportamento abusivo e de má fé deste proponente, lesivo dos interesses da Massa Insolvente, colocou à apreciação da sua decisão à comissão de credores e em conformidade (vide requerimentos de 02/12/2022 e de 06/01/2023 do apenso O) procedeu a novas diligências de venda da verba 21, sendo que do resultado dessa venda obteve uma proposta pelo valor de 188.000,00€, proposta esta aceite pela comissão de credores e credor hipotecário, pelo que estão cumpridas todas as formalidades processuais previstas no CIRE.

9. E atendendo que é o Administrador de Insolvência que tem a competência exclusiva de liquidar o património adstrito à satisfação dos credores, esta decisão tornou-se vinculativa e eficaz.

10. A lei insolvencial (especial em relação aos demais e por isso só se lhe aplicando as regras gerais, de forma residual, nos termos previstos no artigo 549.º, n.º 1, do CPC), só prevê neste caso em concreto um mecanismo de discussão dos atos do Administrador da Insolvência que tenham violado a lei: a declaração da respetiva ineficácia, em acção própria a instaurar por apenso aos autos de insolvência (nos termos do disposto no artigo 163º do CIRE).

11. Tendo a A... peticionado a anulação de um ato de liquidação da massa insolvente nos autos principais da insolvência, ao invés de intentar uma acção declarativa por apenso aos presentes autos, cometeu, por força do disposto nos artigos 163º, 59º do CIRE e 549º, nº, 1 do CPC erro na forma do processo e meio processual, exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que importa a anulação de todo o processo, por força do disposto no artigo 193º, 1 e 2 , do CPC.

12. Em todo o caso, sempre se dirá que a decisão padece de erro de julgamento não só quanto à factualidade alegada e junta nos autos principais e apensos como na interpretação e integração do direito substantivo e processual.

13. Corresponde à verdade que o anterior Administrador de Insolvência não colocou à venda, no leilão de 26.09.2018, os imóveis apreendidos a favor da massa insolvente e descritos no Auto de apreensão como verbas 21, 39 e 40 em conjunto, como se de um “lote” se trata-se.

14. Contudo, a A..., por sua iniciativa e livre vontade declarou nessa venda pretender adquirir as três verbas, pelo valor de 119.000,00€; 12.600,00 e 13 500,00, fazendo-o sem declarar qualquer condição de aquisição.

15. Como garantia dessa vontade– adquirir as três verbas- a requerente deixou um único cheque emitido por terceira entidade, cfr. Doc. 1 da reclamação e requerimento do AI junto no apenso O em 27.09.2018)

16. E o Sr. Administrador de Insolvência atendendo que se tratava de proposta inferior ao valor mínimo e após colocar à apreciação da comissão de credores e do credor hipotecário, decidiu aceitar essas propostas, pelo como decorre da lei, procedeu a todas as diligências necessárias para notificar os confinantes para exercício do direito de preferência (facto provado 5)

17. Após o cumprimento de todas as formalidades previstas na lei e quando a A... foi notificada, em 18.09.2019, para cumprir as formalidades necessárias para a aquisição das verbas 39 e 40 e informado do exercício do direito de preferência em relação à verba 21, essa caução revelou-se imprópria, pois o cheque, não cumprindo os requisitos previstos na lei como garantia (cfr.artigo 623º do código Civil), estava caducado, não podendo sequer ser usado como pagamento do preço ou início do pagamento de qualquer verba (vide facto provado 6 e Doc. 2 da reclamação).

18. Significa, portanto, que ao contrário de entendimento do Tribunal a quo não houve, efetivamente, qualquer pagamento de sinal à Massa Insolvente.

19. Assim como, até porque se trata da liquidação do património adstrito à satisfação dos credores, houve uma única declaração negocial da A....

20. Na verdade, a A... notificada várias vezes para o efeito e não existindo qualquer obstáculo legal para a aquisição das verbas 39 e 40, forçoso é concluir que foi por sua livre vontade que decidiu incumprir o que declarou na venda de 26.09.2018.

21. Esse incumprimento definitivo como resulta das diferentes informações do estado do processo no Apenso da liquidação – Apenso O- obrigou o anterior e atual Administrador de Insolvência a promover diversas diligências de venda destas verbas, que perante a ausência de melhor propostas foi vendido por valor inferior ao proposto pela A....

22. O facto da C.... SA ter impugnado a venda em que licitou a D... SA e esta ter sido declarada nula pelo Tribunal - nos termos do previsto no artigo 195º do CPC- não só porque considerou provado que nem esta sociedade era preferente nem a C..., SA,- reclamação aliás não contestada pela A... (vide Doc. 5 da reclamação) - não confere, ao contrário do entendimento do Tribunal e atento ao já exposto qualquer direito ou título à A..., designadamente, para negociar o imóvel com terceiros, ou vincula a massa insolvente a qualquer obrigação legal ou processual para com esta sociedade.

23. Aliás, após as várias notificações de 2019 (factos provados de 6 a 12) para depositar o valor de 20% e assim celebrar a escritura de compra e venda sem que procedesse a qualquer transferência, vir, na presente data, reclamar no processo de insolvência a aquisição dessas verbas e da verba 21 é prova bastante do comportamento abusivo e de má-fé deste proponente.

24. Não obstante a esta atitude e comportamento, o Tribunal a quo considerou justo e equitativo que a Massa Insolvente ficasse à mercê da vontade da A... em adquirir as verbas que entendesse e no momento e circunstâncias que fossem favoráveis aos seus interesses, mesmo que esses interesses sejam prejudiciais à Massa Insolvente.

25. Não se entende, desde logo por força das disposições legais presentes no CIRE e da própria finalidade do processo de insolvência, como é que o Tribunal a quo considera que a Massa Insolvente se tem de vincular à vontade de uma sociedade que lesou os interesses da massa insolvente, por ter decidido que nem a C... nem a D... eram confinantes preferentes.

26. Acresce que, tratando-se de processo especial e como decorre do artigo 17º, nº 1, do CIRE, só se aplica o Código do Processo Civil em tudo o que não contrarie as disposições do CIRE.

27. Ora, conforme decorre dos requerimentos juntos em 02/12/2022 e 06/01/2023 no auto de liquidação, a decisão do administrador de insolvência e sua fundamentação de revogar a anterior decisão de aceitação da proposta de venda à A... e como tal prosseguir com a venda, colocando essa apreciação à comissão de credores e credor hipotecário, não ocorre in casu e ao contrário do decidido qualquer irregularidade processual susceptível de anular a venda nos termos do previsto no artigo 195º do CPC.

28. Não se poderá deixar de referir que a A..., veio declarar no email de 2 de julho de 2019 que a venda da verba 21 (vide Doc. 5 do requerimento do Administrador de insolvência) fosse celebrada precisamente pela “E..., Lda.”, sociedade que licitou e ofereceu o valor de 188.000,00€ na venda ora anulada (cfr. Doc. 2 e 8 da resposta à reclamação do  Sr. Administrador de Insolvência).

29. Não se entende, portanto, como possa esta venda contrariar a vontade expressa da requerente/reclamante.

30. Resulta, pois evidente que não existe qualquer fundamento de facto e de direito material ou processual suscetível de anular a venda da verba 21 no leilão de 02.03.2022., pelo que se impõe declarar a revogação desta decisão.

31. Com efeito, a presente decisão ofende o disposto nos artigos 1º,nº 1, 46º, 55º., 17º, nº1, 52º, 58º, e 163º do CIRE e bem assim, o disposto no artigo 406º , 334º e 801º do Código Civil.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve ser revogada a decisão objeto de Recurso e, em conformidade, ser julgado válido e eficaz o leilão do dia 2 de Fevereiro de 2023.

2. Do objecto do recurso

(…)

2.2. Da verba 21

Alega a Apelante:

8. O Sr. Administrador da Insolvência fundamentando a sua decisão de revogar a anterior decisão de aceitação da proposta da A..., SA por constatar a desistência desta sociedade na aquisição das verbas 39 e 40 e o comportamento abusivo e de má fé deste proponente, lesivo dos interesses da Massa Insolvente, colocou à apreciação da sua decisão à comissão de credores e em conformidade (vide requerimentos de 02/12/2022 e de 06/01/2023 do apenso O) procedeu a novas diligências de venda da verba 21, sendo que do resultado dessa venda obteve uma proposta pelo valor de 188.000,00€, proposta esta aceite pela comissão de credores e credor hipotecário, pelo que estão cumpridas todas as formalidades processuais previstas no CIRE.

9. E atendendo que é o Administrador de Insolvência que tem a competência exclusiva de liquidar o património adstrito à satisfação dos credores, esta decisão tornou-se vinculativa e eficaz.

10. A lei insolvencial (especial em relação aos demais e por isso só se lhe aplicando as regras gerais, de forma residual, nos termos previstos no artigo 549.º, n.º 1, do CPC), só prevê neste caso em concreto um mecanismo de discussão dos atos do Administrador da Insolvência que tenham violado a lei: a declaração da respetiva ineficácia, em acção própria a instaurar por apenso aos autos de insolvência (nos termos do disposto no artigo 163º do CIRE).

11. Tendo a A... peticionado a anulação de um ato de liquidação da massa insolvente nos autos principais da insolvência, ao invés de intentar uma acção declarativa por apenso aos presentes autos, cometeu, por força do disposto nos artigos 163º, 59º do CIRE e 549º, nº, 1 do CPC erro na forma do processo e meio processual, exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que importa a anulação de todo o processo, por força do disposto no artigo 193º, 1 e 2 , do CPC.

12. Em todo o caso, sempre se dirá que a decisão padece de erro de julgamento não só quanto à factualidade alegada e junta nos autos principais e apensos como na interpretação e integração do direito substantivo e processual.

A 1.ª instância fixou, assim, a matéria de facto:

1)- No âmbito da venda por negociação particular das verbas nº 21, 39 e 40 levada a cabo pelo Srº Administrador, a encarregada de venda, promoveu, em 26.09.2018, a licitação presencial entre os interessados que já haviam apresentado propostas para a aquisição daquelas verbas.

2)- Na licitação foi a A..., SA que apresentou as melhores propostas para as verbas 21, 39 e 40.

3) - A verba nº 21 foi licitada pelo valor de €119.000,00, a verba nº 39 pelo valor de €12.600,00 e a verba nº 40 por €13.500,00.

4) - Aquando da licitação a sociedade A..., SA entregou um cheque no valor de €29.020,00 correspondente à caução de 20% do valor da licitação e um cheque no valor de €8.923,65 correspondente a 5% do valor da proposta, emitido à ordem da leiloeira.

5) - Em 26.06.2019, a leiloeira enviou um email à A... SA com “o assunto – verbas 21,39 e 40 – proposta”, com o seguinte conteúdo:

“Serve a presente para informar Vª Exª que as propostas apresentadas por v Exª na licitação efectuada a 26.09.2018, cuja cópia se anexa, foram aceites superiormente.

Mais informamos que, de acordo com a legislação em vigor, serão notificados os confinantes dos referidos prédios rústicos para exercerem o direito de preferência, caso tenham interesse.

Do resultado destas notificações será oportunamente informado”.

6)- Em 18.09.2019, a leiloeira enviou à A... um email com “o assunto – verbas 21,39 e 40 – proposta”, com o seguinte conteúdo:

“No que se refere à verba 21, somos a informar que foi exercido o direito de preferência por dois confinantes, aguardando-se nesta fase o agendamento da licitação entre ambos para identificar a maior proposta recebida e promover a respectiva escritura de compra e venda.

Mais informamos que serão devolvidos os cheques que se encontram na nossa posse, (…).

No que se refere às verbas 39 e 40, cujas licitações efectuadas por V. Exª ascenderam a 12.600,00 e 13.500,00€, (…), somos a informar se que as mesmas foram aceites pelo Sr. Administrador de Insolvência e respectiva Comissão de Credores.

Nestes termos, e de acordo com o Regulamento publicitado, solicitamos o seguinte:

- Depósito de caução, em conta de Administração da massa insolvente de B..., Sa, em montante correspondente a 20% do preço oferecido, na importância de € 5.220,00€ ( Cinco mil e duzentos e vinte euros), no prazo máximo de dez dias, para o NIB da Massa Insolvente - NIB  ...78;

(…)- O valor remanescente, no montante de €20.880,00 (Vinte mil e oitocentos e oitenta euros) deverá ser pago no acto da escritura através de cheque visado bancário à ordem da "Massa Insolvente de B....

Solicitamos envio dos comprovativos de pagamento ora solicitados para envio do Auto de Adjudicação para efeitos de liquidação do IMT e IS e dar continuidade aos procedimentos inerentes à Escritura a agendar.

Publicas do F..., SA".

7) - Com a data de 19.09.2019, a leiloeira ... enviou à A..., SA uma carta com o seguinte conteúdo:

“No âmbito da licitação efectuada a 26.09.2018, relativamente à Verba 21, somos a informar que de acordo com a legislação em vigor foram notificados os confinantes para o Exercício do Direito de Preferência que a lei lhes confere, tendo sido exercido o referido direito por dois confinantes, aguardando-se nesta fase o agendamento de licitação entre ambos para identificar a maior proposta recebida e promover a respectiva escritura de compra e venda.

Desta forma, cumpre informar que não será o referido bem adjudicado a v Exa, pelo que somos a devolver os cheques que se encontram na nossa posse, com o nº ...92 e ...93 s/..., referentes à licitação efectuada a 26.09.2018, conforme indicações do Sr Administrador de Insolvência.

Sem outro assunto de momento, apresentamos os nossos melhores cumprimentos”.

8) - A carta referida em 7) foi enviada para a Rua ... , ... ... e foi devolvida com a menção “objecto não reclamado”.

9) – A Rua ..., ... ... é o endereço que consta dos envelopes e das cartas enviadas pela A..., SA à leiloeira em 29.07.2017, 19.07.2019 e que foi transmitido à leiloeira.

10) -Em 26.09.2019, a leiloeira enviou à A... um email, com o assunto “verbas 21,39 e 40 – proposta”, com o seguinte conteúdo:

“Serve o presente para, uma vez mais, reiterar informação prestada a 18.09.2019, no que se refere à adjudicação da verba nº 39 e 40.

Agradecemos o envio dos comprovativos de pagamento para envio aos Autos de Insolvência”.

11) - Em 21.10.2019, a leiloeira enviou um email à A... com o assunto – “ verbas 21,39 e 40 – proposta”, com o seguinte conteúdo:

“Serve o presente para, uma vez mais, reiterar informação prestada a 18.09.2019, no que se refere à adjudicação das verbas nº 39 e 40.

Agradecemos o envio dos comprovativos de pagamento para envio aos Autos de Insolvência”.

12) – A sociedade A..., SA nunca procedeu à transferência do valor referido em 8).

13) – A sociedade C..., Lda intentou, em 16.10.2019 uma acção contra a sociedade A..., SA, Massa insolvente B..., SA e D..., SA, pedindo, para além do mais, que se reconheça que a A. é única preferente com interesse para exercer o direito de preferência no prédio correspondente à verba nº 21 vendido no processo de insolvência.

14) - Por decisão de 12.01.2021 foi decidido que nem a A. C..., Lda nem a R. D..., SA tinham direito de preferência na aquisição do prédio referido sob a verba nº 21.

15) – As verbas nºs 39 e 40 foram vendidas, por escritura pública de 20.04.2022 à sociedade G..., Lda.

16) – O Srº Administrador promoveu a venda da verba nº 21 através de leilão electrónico com inicio no dia 4.01.2023 e terminus no dia 2.02.2023.

Diz a Apelante:

“Tendo a A... peticionado a anulação de um ato de liquidação da massa insolvente nos autos principais da insolvência, ao invés de intentar uma acção declarativa por apenso aos presentes autos, cometeu, por força do disposto nos artigos 163º, 59º do CIRE e 549º, nº, 1 do CPC erro na forma do processo e meio processual, exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que importa a anulação de todo o processo, por força do disposto no artigo 193º, 1 e 2 , do CPC”.

É verdade que o legislador do CIRE visou, além do mais, afastar a possibilidade de impugnação dos actos do administrador - substantivos ou de procedimento - directamente perante o juiz da insolvência.

Porém, como se escreve no Acórdão do STJ de 9.7.2020, pesquisável em www.dgsi.pt- , “resulta patente que tal inversão foi pensada unicamente para os credores e o insolvente, e, mesmo assim, apenas “por regra”. É isso que se afigura resultar dos excertos acima transcritos, com destaque para a comparação do texto legal anterior com o texto da lei atual. Em contrapartida, passou-se a conferir expressamente - art. 59.º do CIRE – um direito indemnizatório aos credores e ao devedor (mas não aos terceiros [1]) contra o administrador da insolvência pelos danos causados em decorrência da inobservância culposa dos respetivos deveres funcionais (esse direito indemnizatório do devedor e dos credores é a exercitar, naturalmente, através da competente ação autónoma de processo comum[2]). Pretendeu-se deste modo, sem prejuízo pois para o exercício do direito à reparação do prejuízo a que haja lugar, afastar do âmbito da insolvência tergiversações das partes naturais do processo (devedor e credores) relativamente aos atos do administrador da insolvência. É este o sentido e alcance, cremos, do aludido ponto 10 do Preâmbulo do diploma que aprovou o CIRE.

Passando ao caso vertente, vemos que a ora Recorrente não é o devedor nem é um credor. Ao invés, e como muito bem observa a própria Recorrente no ponto XXIII do capítulo IV do corpo da sua alegação, é um terceiro que se apresentou como proponente no procedimento de venda mediante propostas em carta fechada implementado pela Administradora da Insolvência. E está em causa (é este o fundamento basilar da presente ação), como resulta claro do teor da petição inicial, a impugnação de uma alegada irregularidade no procedimento da venda, consistente em não ter sido dada sequência a esse procedimento (que, ao invés, foi suspenso e depois dado sem efeito), mediante a adjudicação à Recorrente do prédio urbano (verba n.º 10) a que se referia a proposta que apresentara.

Ora, desde que, em decorrência do acima exposto, é de entender que não existe razão jurídica para sustentar que à Recorrente, como terceiro que é, estava vedado impugnar incidentalmente no processo de insolvência (mais propriamente, no processo de liquidação do ativo) o suposto ato irregular da Administradora da Insolvência, então segue-se que era perante o juiz da insolvência, e a seu devido tempo, que a Recorrente havia de ter reagido. É o que decorre dos art.s 91.º, n.º 1, 195.º, n.º 1, 723.º, n.º 1, alíneas c) e d), e 822.º, n.º 1 do CPCivil, aplicáveis ao caso por força dos art.s 1.º (no sentido de que o processo de liquidação insolvencial é para todos os efeitos uma execução, com a particularidade de ser universal[3]) e 17.º, ambos do CIRE[4]”.

Não faria sentido, que estando em causa uma questão incidental surgida no domínio da liquidação e com repercussão direta sobre o processo de insolvência - cujo decurso se quer urgente e cuja liquidação do activo se quer ver tratada com prontidão - se admitisse o recurso a um meio processual autónomo – acção de processo comum - para a sua apreciação jurisdicional.

Como se escreve no citado acórdão, “como conjugar uma tal possibilidade com o funcionamento normal do processo de insolvência, com o princípio geral de que as controvérsias incidentais surgidas no decurso do processo devem, sob pena de preclusão, ser nele suscitadas e decididas (e não numa ação ad hoc) e com a estabilização dos direitos e interesses do insolvente e dos credores?”Concorda-se assim inteiramente com o acórdão recorrido aí onde aduz que a invocação, apreciação e decisão do cerne da controvérsia em causa só poderia ter lugar nos próprios autos da liquidação insolvencial, pois trata-se da apreciação do aí ocorrido, impondo-se a intervenção da totalidade dos interessados, garantindo-se desse modo o devido contraditório e a obtenção de uma decisão vinculativa para o universo dos interessados. Essa tutela não seria possível de garantir num quadro de posterior instauração de ações autónomas e dispersas, pois, para além da necessária delimitação dos sujeitos, tal potenciaria a contradição de julgados”.

Improcede, pois, a invocada excepção dilatória de erro na forma do processo.

Avançando.

Nos termos do artigo 164º, nº 1, do CIRE:

“O administrador da insolvência procede à alienação dos bens preferencialmente através de venda em leilão electrónico, podendo, de forma justificada, optar por qualquer das modalidades admitidas em processo executivo ou por alguma outra que tenha por mais conveniente”.

Como é sabido, insolvência liquidatária assume-se como acção executiva para pagamento de quantia certa, na qual a liquidação/venda dos bens da massa insolvente integra actividade e objetivo para proceder ao pagamento dos créditos reconhecidos sobre a insolvência - art.ºs 46º, nº 1, 55º, nº 1, al. a) e 172º do CIRE -, depois de satisfeitas as dívidas da massa.

A venda executiva não pode deixar de ser considerada como um fenómeno essencialmente processual e com os efeitos de direito substantivo do negócio típico da compra e venda – a venda realizada em sede de liquidação do activo no processo de insolvência é uma venda judicial, que visa satisfazer não um interesse próprio, mas sim um interesse alheio, o interesse do credor – e tem, por regra, os mesmos efeitos da compra e venda em geral - a propriedade transmite-se para o adquirente por mero efeito do contrato, como seu efeito real (arts. 879º-a) e 408º-1 Código Civil).

Porém, a compra e venda tem ainda como efeitos, também essenciais, as obrigações de entregar a coisa e de pagar o preço – efeitos obrigacionais (als. b) e c) do mesmo art. 879º). Todos esses efeitos – real e obrigacionais – podem ocorrer simultaneamente, caso em que a transmissão da posse ou do gozo da coisa é contemporânea da transmissão da propriedade. Mas pode também suceder que a aquisição do gozo resulte do cumprimento da obrigação de entrega só tenha lugar posteriormente.

Na disciplina da venda executiva, quanto aos efeitos sujeita, como se disse, ao regime da compra e venda em geral, surgem em momentos separados e sucessivos a conclusão do contrato e a efectiva aquisição da propriedade.

No caso da venda por negociação particular, como nas restantes modalidades e venda, o legislador parece ter querido autonomizar dois momentos: o da conclusão do contrato e o da aquisição da propriedade.

Uma vez aceite a melhor - ou a única - proposta, o contrato acha-se concluído - a declaração negocial gerará efeitos de natureza obrigacional, consubstanciados no direito do transmissário à exigência da prossecução das condutas idóneas à perfeição do negócio.

Todavia, a transferência da propriedade e a entrega efectiva ficam condicionadas ao pagamento integral do preço e satisfação das obrigações fiscais inerentes à transmissão, pois que só nesse momento é lavrado o instrumento da venda - artigos 827.º e 833.º n.º 4, ambos do Código do Processo Civil.

Ora, resulta do escrito do Administrador da Insolvência - de 23.02.2023 -, além do mais e com interesse para esta decisão, o seguinte.

“1. No exercício das suas funções e nos termos previstos no artigo 164º, nº 1, do CIRE, o Administrador da Insolvência então em funções autorizou a encarregada de venda a promover a licitação presencial, realizada no dia 26/09/2018, entre os interessados que já haviam apresentado propostas para a vendas dos imóveis que à data integravam a Massa insolvente e que correspondiam às verbas 21, 39 e 40 – Cfr. Doc. 1.

2. Corresponde à verdade que na referida licitação foi a A... que apresentou as melhores propostas para estas verbas (cfr. Doc. 1 do seu requerimento).

3. Contudo, de acordo com a informação que resulta dos autos, em momento algum o anterior Administrador da Insolvência condicionou a venda pela apresentação de propostas e /ou licitações pela globalidade dos imóveis colocados à venda.

4. Nem sequer, em momento algum, a A... condicionou a apresentação das suas propostas/licitações à adjudicação, pela totalidade, destes imóveis.

5. As propostas foram, efetivamente, apresentadas verba a verba e a sua aceitação/não aceitação consideradas verba a verba.

6. Neste contexto, foi a sociedade Requerente informada, por email datado de 18/09/2019, que fora exercido o direito de preferência relativamente à verba 21 e devolvido o cheque caução entregue na licitação (emitido pela sociedade H... Unipessoal, Lda. e não pela Requerente) e, bem assim, comunicada a aceitação das suas propostas apresentadas para as verbas 39 e 40- Cfr. Doc. 2.

7. Como tal, era-lhe solicitado, designadamente, o pagamento do sinal que correspondia ao depósito de 20% do preço, na conta da MI, oferecido para a aquisição destas verbas, condição indispensável para a adjudicação por parte do AI, e liquidação dos respetivos impostos para a celebração da escritura de compra e venda”.

É ao administrador da insolvência que compete escolher a modalidade da venda dos bens apreendidos em sede de processo de insolvência e, embora a lei estabeleça, como regime preferencial, o leilão electrónico, pode o mesmo optar, justificadamente, por outra modalidade de venda, nomeadamente as previstas para o processo executivo – e nessa incumbência inclui-se não só a modalidade da venda mas como devem os bens ser vendidos – isoladamente, em lotes ou todos num único grupo.

No caso dos autos, a modalidade de venda dos imóveis apreendidos para a massa insolvente, escolhida pelo administrador da insolvência, foi o da sua venda por negociação particular, nela incluída a verba 21, sendo que as propostas foram apresentadas o foram verba a verba e a sua aceitação considerada verba a verba.

Mostram ainda os autos que na licitação foi a A..., SA, ora apelada, que apresentou as melhores propostas para a verba 21 e que foi licitada pelo valor de €119.000,00. Mais, aquando da licitação foi entregue um cheque no valor de €29.020,00 correspondente à caução de 20% do valor da licitação e um cheque no valor de €8.923,65 correspondente a 5% do valor da proposta, emitido à ordem da leiloeira.

Que em 26.06.2019, a leiloeira enviou um email à A... SA com “o assunto – verbas 21,39 e 40 – proposta”, com o seguinte conteúdo: “Serve a presente para informar Vª Exª que as propostas apresentadas por v Exª na licitação efectuada a 26.09.2018, cuja cópia se anexa, foram aceites superiormente”, informando ainda que iria notificar eventuais preferentes com vista ao exercício do direito de preferência.

A 19 de Setembro de 2019, a entidade responsável pela promoção da venda, informou a Requerente que havia sido exercido o direito de preferência, na aquisição da Verba Nº 21 (Doc. 5), e confirmou a aceitação da proposta referente às verbas 39 e 40. Mais informou que iria proceder à devolução dos cheques entregues, solicitando- em sua substituição, duas transferências. Contudo, nunca os cheques entregues pela requerente foram devolvidos, não tendo esta procedido à realização da transferência.

A 15 de outubro de 2019, a sociedade C... LDA., veio intentar contra adquirente/apelado e contra a massa insolvente/apelante, acção judicial peticionando entre outros pedidos, que o prédio correspondente à Verba Nº 21, lhe fosse adjudicada, dada ser a única titular do direito de preferência (Apenso S).

Julgada a referida acção, foi proferida sentença julgando a referida acção parcialmente improcedente, e declarando a inexistência do direito de preferência dos prédios confinantes com o prédio correspondente à Verba Nº 21, e consequentemente validando o direito de a aqui Apelada (Ré no referido Apenso S), em adquirir a referida Verba, de acordo com a sua licitação realizada a 26 de setembro de 2018.

Por isso, como escreve a 1.ª instância, “a aceitação das propostas por parte do Srº Administrador, juntamente com a caução prestada pela A... aquando da licitação no valor de 20% do preço do negócio, faz com que o negócio passe a produzir efeitos obrigacionais entre as partes, apesar de a venda, isto é, o efeito translativo do direito de propriedade apenas ocorrer com a outorga da escritura pública após o pagamento integral do preço.

Na verdade, com a aceitação da proposta pelo Srº Administrador produzem-se, desde então, todos os efeitos obrigacionais da venda, designadamente, o comprador ou o adjudicante fica, desde logo, obrigado a pagar ou depositar o que for devido (artº 825º do CPC). Só o efeito real ou translativo da propriedade da coisa vendida é que fica dependente da celebração da escritura pública.

O Srº Administrador, no art. 14º do seu requerimento, refere que a venda da verba nº 21 foi suspensa a pedido da C..., SA uma das empresas que se apresentou a exercer o direito de preferência relativamente a esta verba.

Alega ainda o Srº Administrador que tomou conhecimento que a A... se encontrava a tentar negociar a venda da verba 21 com terceiros, por valores consideravelmente superiores ao valor por si oferecido (119.000,00€), quando o imóvel nunca deixou se ser propriedade da massa insolvente e que a A... já demonstrou anteriormente junto da encarregada de venda que o seu interesse no imóvel se prende exclusivamente com a sua revenda, por valor superior, pois, em duas ocasiões tentou que o contrato de compra e venda fosse formalizado com terceiros (primeiramente, com a sociedade E..., Lda e posteriormente com a sociedade D..., SA), o que indicia que de facto o imóvel tem um valor comercial superior ao da proposta de aquisição, pois a projecção do negócio com terceiros não poderá ter outro objectivo que não o lucro.

Porém, esta argumentação não pode relevar para o Srº Administrador não concluir a venda da verba nº 21 com a A... nem nunca seria fundamento ou justificação para a não realização da venda com a A....

O destino que a A... pretende dar ao imóvel é indiferente para a massa insolvente nem é requisito para a venda.

O facto de o imóvel ter um valor superior é igualmente indiferente. O Srº Administrador aceitou a proposta da A... no valor de €119,.000,00 e é por esse valor  que tem de o vender. Se o imóvel tinha ou tem um valor superior o Srº Administrador não devia ter aceite a proposta de €119.000,00. O que não pode é depois de ter aceite a proposta pelo valor de €119.000,00, não vir a concluir a venda por, entretanto, ter concluído que o imóvel tem um valor superior e que a proponente pretende vendê-lo por um valor superior.

O Srº Administrador alega ainda que o comportamento da proponente A..., Lda indicia má fé da sua parte, pois, não só prejudicou os interesses da Massa Insolvente ao não cumprir a aquisição das verbas 39 e 40, o que conduziu a que as mesmas fossem levadas novamente ao mercado, e fossem ulteriormente vendidas por valor inferior à anterior adjudicação, mas também a que a Massa Insolvente fique eventualmente lesada na venda da verba 21, não sinalizada, e por valor inferior ao de mercado.

O Srº Administrador no art. 3º refere que a venda da verba nº 21 não foi condicionada pela apresentação de propostas e /ou licitações pela globalidade dos imóveis colocados à venda. E a correspondência trocada entre a leiloeira e a A... também não permite concluir que a venda estava condicionada à aquisição da totalidade das verbas.

Ora, se a venda da verba nº 21 não foi condicionada à aquisição da totalidade das verbas, o facto de a A... não ter, entretanto, entregue a caução para a aquisição das restante verbas não é fundamento ou justificação para o Srº Administrador não concluir a venda da verba nº 21 cuja proposta já tinha aceite. Assim, como o facto de o Srº Administrador ter sido obrigado a colocar as verbas novamente em venda e obtido valor inferior à proposta inicial é justificação para não concretizar a venda da verba nº 21.

A venda de cada uma das verbas é autónoma e o incumprimento da A... em relação à venda das verbas 39 e 40 não pode ter qualquer repercussão na venda da verba nº 21.

Acresce que o Srº Administrador, na sequência da decisão que considerou que as sociedades que se apresentaram a exercer o direito de preferência não eram titulares desse direito, devia ter notificado a sociedade A... para entregar a caução, o que não fez ou pelo menos não resulta da sua alegação.

Na verdade, tendo o Srº Administrador devolvido o valor da caução quando se apresentaram duas sociedades a exercer o direito de preferência e não tendo, na sequência da decisão proferida, notificado a A... para proceder à entrega da caução, não se pode considerar, sem que a notificação para o efeito ocorra, considerar que a proposta não se encontra sinalizada.

O Srº Administrador devolveu a caução convicto que uma das sociedades que se apresentaram a exercer o direito de preferência eram titulares desse direito e, por isso, a verba seria adjudicada a uma delas. No entanto, tal não aconteceu.

Em suma, tendo o Srº Administrador aceite a proposta de licitação da verba nº 21 pela sociedade A..., SA, terá este de dar continuidade aos actos necessários conducentes à transmissão da propriedade da verba a favor desta sociedade A..., SA, na medida em que, não existindo qualquer justificação para não concluir a venda, ter de se considerar o incumprimento do “contrato”, “acordo” existente entre a A..., SA e a massa insolvente concretizado com aceitação da proposta por esta última”.

Assim, com todo o respeito pelas razões invocadas pela Apelante, mantemos o decidido no Juízo Comercial de Leiria – Juiz ....

Resta concluir:

(…).

 

3. Decisão

Assim, na improcedência da instância recursiva, mantemos a decisão proferida pelo Juízo Comercial de Leiria – Juiz ....

Custas pela massa insolvente.

Coimbra, 24 de Outubro de 2023

(José Avelino Gonçalves - Relator)

(Catarina Gonçalves – 1.ª adjunta)

(Paulo Correia - 2.º adjunto)