Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3486/12.7TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: DECISÃO ARBITRAL
ACÇÃO DE ANULAÇÃO
EFEITOS
Data do Acordão: 04/21/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – SECÇÃO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ANULADA
Legislação Nacional: LEI Nº 31/86, DE 29 DE DEZEMBRO, E LEI Nº 63/2011, DE 14 DE DEZEMBRO.
Sumário: a) A acção de anulação da decisão arbitral tem efeitos puramente cassatórios ou rescisórios, não atribuindo competência substitutiva ao tribunal, dado que o objecto da acção é, simplesmente, a decisão arbitral e não a situação material litigada, ela mesma.
b) Os fundamentos de anulação da decisão arbitral resolvem-se em vícios processuais equiparáveis a nulidades processuais – nulidades processuais ou procedimentais específicas do processo arbitral.

c) A violação, pela sentença arbitral, de princípios estruturantes, enquanto causa de anulação dessa decisão, está sujeita ao princípio da essencialidade - a ofensa há-de ter interferido, de forma decisiva ou determinante, na decisão do objecto da causa – cuja prova vulnera a parte que pede a anulação.

d) Para a prova dessa essencialidade, se a violação tiver consistido na omissão da produção de uma prova sujeita à livre apreciação do árbitro, não é, porém, exigível mais que um juízo de prognose, de harmonia com o qual, caso o meio de prova recusado tivesse sido produzido, se deve admitir, como plausível ou provável, a modificação da decisão da questão de facto e, correspondentemente, a alteração da decisão final da causa arbitral.

e) A independência e a imparcialidade do tribunal arbitral constituem um requisito fundamental de um processo justo ou equitativo.

f) O direito à prova constitui dimensão ineliminável do direito ao processo equitativo, que, por sua vez, constitui parte integrante do princípio material da igualdade.

g) Mesmo à luz do Código de Processo Civil de 1961 – de harmonia com uma doutrina e jurisprudência maioritárias – devia ter-se por admissível o depoimento pessoal da parte, não para o efeito de provocar confissão – mas para a obtenção de prova sujeita à livre apreciação do tribunal.

h) O processo arbitral não está submetido a qualquer princípio de tipicidade das provas admissíveis, pelo que nele podem ser usados meios de prova diversos dos admitidos pela lei de processo civil, salva disposição contrária da convenção arbitral ou do regulamente de arbitragem aplicável.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.

M... impugna, por recurso ordinário de apelação a sentença, proferida no dia 4 de Julho de 2014, pela Sra. Juíza de Direito do 2º Juízo Cível da Comarca de Leiria, que julgando improcedente a acção declarativa constitutiva, com processo comum, ordinário pelo valor, que propôs contra N..., Lda., manteve – por falta de verificação de causas de anulação - a decisão arbitral, proferida no dia 22 de Maio de 2012, no processo nº ..., no Centro de Arbitragem da Associação Comercial de Lisboa, que o condenou a pagar à última a quantia de € 449.079,78 e no pagamento da totalidade dos encargos da arbitragem devidos, nos termos do artº 46 e ss. do Regulamento de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa.

O recorrente – que pede no recurso a revogação desta sentença e a sua substituição por acórdão que proceda à anulação, com as legais consequências, da decisão arbitral – encerrou a sua alegação com esta constelação de conclusões:

...

A apelada, na resposta ao recurso, concluiu, naturalmente, pela improcedência dele.

2. Factos provados.

O Tribunal de que provém o recurso julgou provados os factos seguintes:

...

20 – Da decisão arbitral referida em 19. consta a seguinte referência quanto à prova dos factos inicialmente não admitidos por acordo (FNAA):

...

21 – É o seguinte o teor do segmento decisório da decisão arbitral referida em 19: O Demandado obrigou-se, no contrato-promessa e no contrato prometido, nomeadamente por remissão para aquele, a vender a H..., SA (de aqui em diante que também se identifica apenas por H...) a totalidade das unidades de participação do Fundo I... logo que fosse aprovado pela CML o projeto de arquitetura referente ao hotel.

A Demandante adquiriu da H..., SA os direitos que para esta resultavam do contrato-promessa e, obviamente, também do contrato prometido e, como tal, foi reconhecida a sua legitimidade para a presente ação arbitral.

O referido Fundo adquiriu do requerente original dos processos nºs ... – os respetivos direitos.

Os processos em questão visavam, respetivamente, a obtenção de licença de loteamento/emparcelamento de quatro prédios urbanos, situados na zona histórica da cidade de Lisboa, que se encontram descritos no número 23B da peça FAA, e a obtenção de licença de obra de edificação a efetuar sobre a unidade predial que resultasse da junção dos mesmos, com vista à construção de um hotel.

Isto porque, de acordo com a lei reguladora da tramitação e  provação dos referidos processos em vigor à época - Decreto- Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, na versão alterada e republicada pelo Decreto-Lei nº 177/2001, de 4 de Junho, que estabelecia o regime jurídico da urbanização e da edificação, doravante RJUE - o emparcelamento consubstanciava um loteamento (alínea i) do art.º2º do RJUE) e como tal estava sujeito às respetivas regras procedimentais e substantivas.

Daí resulta que os pedidos correspondentes aos processos antes referidos, com os nºs ..., embora tenham sido apresentados simultaneamente, visavam operações, cronológica e operacionalmente, diferentes no processo de licenciamento municipal.

O projeto de arquitetura, cuja aprovação é considerada no contrato-promessa como condição para a celebração do contrato definitivo, integrava o processo nº ... que tinha como objeto o licenciamento da obra de edificação do hotel.

No entanto, tratando-se de uma obra de edificação destinada a ser erigida sobre quatro unidades prediais distintas, de acordo com o regime jurídico então vigente e acima mencionado, a aprovação do referido projeto, conducente ao seu ulterior licenciamento, estava condicionada à prévia junção dos vários prédios urbanos em causa para constituir uma única unidade predial, o que, como se disse, ao tempo só era possível através do licenciamento de uma operação de loteamento titulado pelo respetivo alvará.

Não obstante os processos “URB” referente ao loteamento e “EDI” respeitante à edificação terem dado entrada simultaneamente, eventualmente por razões de celeridade procedimental, o que é facto é que a decisão final do segundo apenas pode ocorrer depois de decidido favoravelmente o primeiro.

E mais, para que o processo “EDI” possa ser licenciado, o processo “URB”, não só deve estar favoravelmente decidido através do ato administrativo que consubstancia a licença de loteamento, como deve ter sido obtido o correspondente alvará que o titula, uma vez que será este que possibilita, à luz do regime vigente, o registo da constituição de uma nova unidade predial por via do emparcelamento dos quatro prédios pré-existentes. Tal decorre do facto da operação de transformação fundiária resultante de loteamento ser sujeita a registo (art.º 2º, nº1, alínea d) do Código do Registo Predial (CRP), na versão vigente ao tempo dos factos, e dever estar suportada para o efeito em documento que legalmente o comprove (art.º43º, nº 1 do CRP), sendo certo que a versão então aplicável do art.º 54º do CRP estabelecia expressamente que “o registo de autorização de loteamento para construção é feito com base no alvará respectivo, com individualização dos lotes”.

E isto é compreensível e irrefutável, dado que o projeto de arquitetura respeitava e tinha por objeto um, e único, imóvel, e não quatro imóveis.

Se assim não fosse, teriam que ter sido apresentados quatro projetos de arquitetura para recuperação/transformação/ampliação de quatro edifícios distintos, logo, quatro processos de licenciamento de obra de edificação, facto que não era concebível quando se pretendia a construção de uma única edificação destinada a hotel.

Deste modo, independentemente do facto dos processos “URB” e “EDI” terem sido analisados em paralelo nos serviços camarários, o segundo estava dependente do primeiro, e a aprovação do projeto respeitante à edificação viu os seus efeitos condicionados ao licenciamento, devidamente titulado pelo alvará, referente ao loteamento/emparcelamento. De tal modo que, se, por hipótese, o loteamento não viesse a ser licenciado, o ato que aprovou a arquitetura jamais produziria qualquer efeito, já que se trata de um trâmite num processo tendente à obtenção de uma licença que tem por objeto uma operação urbanística incidente sobre um único prédio que, sem alvará de loteamento registado, não chegaria juridicamente a ser constituído. Ou seja, sem o loteamento licenciado, objeto do “URB”, o projeto de arquitetura aprovado no “EDI” não teria validade, por carecer de objeto juridicamente existente.

Daqui decorre que, para que o projeto de arquitetura pudesse produzir efeitos, conduzindo, após a apresentação dos projetos das especialidades, à licença e subsequente emissão do alvará indispensável para dar início à construção, seria necessário obter o licenciamento do loteamento/emparcelamento, sendo certo que é este que está associado à liquidação dos encargos respeitantes às compensações urbanísticas, no montante de 449.079,78 euros, tal como decorre do doc. nº 7 da Resposta.

Ora, o fundamento para a exigência de compensações urbanísticas, nos termos do art.44º, nº 4 do RJUE, tem por pressuposto a obrigatoriedade do proprietário do prédio a lotear ceder gratuitamente ao município parcelas para a implantação de espaços verdes públicos, equipamentos de utilização coletiva e infraestruturas. Diz a lei que, se o prédio a lotear (no caso, por via do emparcelamento) já estiver servido por infraestruturas e não se justificar a localização de qualquer equipamento ou espaço verde público, não há lugar a cedências, ficando o proprietário obrigado a pagar uma compensação ao município nos termos fixados em regulamento municipal respetivo.

Na mesma linha dispõem os art.º 120º e 121º do PDM de Lisboa (Resolução do Conselho de Ministros nº 94/94, de 29 de Setembro de 1994), no qual se desenvolvem os parâmetros de dimensionamento das cedências a aplicar em cada caso e que servem de base de cálculo ao apuramento das compensações respetivas. Assim, tratando-se de um loteamento por emparcelamento e não desconhecendo o proprietário que não estavam previstas cedências de terreno para os fins citados, não poderia o ora Demandado, sócio e gerente da requerente dos processos e titular das unidades de participação do Fundo, ignorar que à transformação fundiária proposta e indispensável para possibilitar a edificação subsequente estariam associados encargos referentes às citadas compensações urbanísticas por falta de cedências.

Por sua vez, o Edital nº 122/93, publicado no Boletim Municipal n.º 16754, de 15 de Novembro de 1993, que constituía, ao tempo dos factos, o Regulamento das Compensações Urbanísticas e que previa a fórmula de cálculo a aplicar aos projetos, dizia expressamente, no seu art.º 5º, que a Câmara Municipal procederá à liquidação e cobrança da compensação aquando da emissão do alvará de loteamento.

Do exposto não restam, pois, dúvidas que a compensação urbanística é um encargo da operação de loteamento/emparcelamento, consubstanciado no processo ..., sendo certo que, conforme estabelece o art.º 74º do RJUE, o alvará é condição de eficácia da respetiva licença que, por sua vez, depende do pagamento da compensação urbanística liquidada no processo administrativo respetivo.

É certo que a CML podia ter exigido, igualmente, o pagamento da TRIU que ela calculou no montante de 226.907,10 euros.

Todavia, tal não foi o caso, dado que apenas notificou o interessado no processo para o pagamento da compensação urbanística devida no processo nº ..., conforme se vê do doc. nº 21 do Requerimento Inicial, deixando para decisão posterior o momento da exigência do pagamento da TRIU. Efetivamente, a TRIU tanto pode ser exigida como condição da emissão do alvará de loteamento/emparcelamento, como da emissão do alvará de licenciamento da construção, nos termos do disposto no artigo 116º, nº 2 e 3 do RJUE e nos artº1º, nº 1 e art.º 2º do Edital nº 269/91, com as alterações introduzidas pela Deliberação 20/AM/2003, que estabelece o Regulamento da Taxa pela Realização de Infraestruturas Urbanísticas, sendo certo que, de acordo com o artº6º, nº 4 deste Regulamento, a TRIU, ao contrário da compensação urbanística, que é devida com o alvará de loteamento, pode ser exigida apenas aquando da emissão do alvará de obra de edificação.

É certo que, tal como alega o Demandado, e se vê, aliás, dos docs. nºs. 15 e 16 da Resposta, as operações de loteamento/emparcelamento e o projeto de arquitetura foram aprovados na mesma data. Simplesmente, como foi dito anteriormente, elas correspondem a processos diferentes, visando operações diversas, sendo os encargos em questão neste processo arbitral referentes àquela operação que juridicamente tem de ser previamente decidida, isto é, a operação de loteamento/emparcelamento objeto do processo ...

Como se vê da posição assumida pela CML no doc. nº 18 da Resposta, de acordo com o ponto nº 11 da deliberação nº 609/CM/2008 que aprovou o projeto de arquitetura, e é de elementar lógica como já se demonstrou, o deferimento do pedido de licenciamento a que corresponde a aprovação do projeto de arquitetura ficou condicionado à emissão do alvará de loteamento/emparcelamento objeto do processo nº ... e é a emissão deste alvará que requer o pagamento prévio do encargo urbanístico exigido pela CML no indicado montante de 449.079,78 euros, em conformidade com o disposto nas antes mencionadas normas legais e regulamentares (artº 44º, nº 4 do RJUE, art.ºs 120º e 121º do PDML e art.º 5º do Edital 122/93).

Nestes termos, o Demandado incumpriu o contrato prometido, tendo em atenção a inclusão neste, por expressa vontade das partes constante da cláusula 9ª, nº 2. do contrato-promessa, das disposições deste último contrato que, pela sua natureza, pudessem sobreviver à celebração de ambos os contratos.

O incumprimento mencionado verificou-se com a recusa do Demandado em suportar o encargo daquele montante, pois a aprovação condicional do projeto de arquitetura pela deliberação da CML nº 609/CM/2008, de 23 de Julho de 2008, não constituiu seguramente, sem mais, o objeto e o fim da obrigação a que se vinculou perante o adquirente das unidades de participação emitidas pelo Fundo.

É questionável que, à face da lei, a CML pudesse sequer ter aprovado o projeto de arquitetura, mesmo apenas de forma condicionada, sem que a condição respetiva concernente ao licenciamento do loteamento/emparcelamento se verificasse. Isto porque o licenciamento do loteamento, mais do que uma condição de eficácia, correspondia a uma condição de validade do licenciamento da obra de edificação tal como se disse, e a que o projeto de arquitetura se refere, apenas se compreendendo esta inversão prática da lógica do procedimento, provavelmente por razões de celeridade e por, estando os dois processos a ser apreciados simultaneamente, haver uma certa perceção prévia da viabilidade do licenciamento do loteamento proposto ainda antes de praticado o ato final.

No atual regime jurídico da urbanização e edificação, que sofreu as alterações introduzidas, entre outras, pela Lei nº 60/2007, de 4 de Setembro, e pelo Decreto-Lei nº 26/2010, de 30 de Março, a questão objeto dos presentes autos já não se verificaria. Isto porque foi recuperada, nesta matéria, a definição de loteamento prevista no regime anterior à versão inicial do Decreto-Lei nº 555/99, e que decorria quer do Decreto-Lei nº448/91 de 29 de Novembro, quer dos diplomas que o antecederam, deixando de se incluir o emparcelamento no conceito de loteamento.

Todavia, ao tempo dos factos a solução era outra, e sabendo o Demandado que lhe havia sido exigido um processo de licenciamento de uma operação de loteamento/emparcelamento para lhe viabilizar a promoção imobiliária correspondente ao hotel, não poderia ignorar que a esse loteamento estariam sujeitos os encargos que lhe são próprios, maxime, as compensações urbanísticas. O não pagamento dos encargos obrigatórios do loteamento acarreta dois efeitos imediatos: primeiro, a não obtenção do respetivo alvará de licença que permite o registo da transformação fundiária e, em segundo lugar, a não atribuição de efeitos à aprovação do projeto de arquitetura, por forma a possibilitar que, com a entrega dos respetivos projetos das especialidades, se possa vir a obter a licença da obra de edificação do hotel.

Acreditamos mesmo ter sido esta, aliás, a base económica dos contratos celebrados, pois de outra forma não se compreenderia que, tendo as unidades de participação um valor nominal de 5.300.000 euros – considerando que o Fundo não detinha qualquer outro ativo além dos quatro prédios -, o preço da sua aquisição acordado pelas partes tivesse sido bem superior, no montante de 9.000.000 de euros.

A este propósito é elucidativo o que se diz no penúltimo parágrafo da Letter of Agreement, ao se indicar o motivo económico do cálculo do preço de venda acordado. Certamente que o Demandado, apesar deste documento se encontrar apenas assinado pelo promitente-comprador, não ignorava a sua existência e conteúdo, dado que foi invocado nos autos pela Demandante e o Demandado não o impugnou.

Tem, assim, razão a Demandante ao fundamentar o seu pedido de condenação do Demandado a reconhecer o seu direito à restituição da importância de 449.079,78 euros com base no incumprimento do contrato prometido celebrado. Para além disso, também o Demandado, ao assumir uma posição violadora daquele contrato, afirmando a sua irresponsabilidade por aquele encargo urbanístico, colocou-se na situação, não só de o incumprir, como simultaneamente, de não assegurar o cumprimento dos deveres relativos à informação devida à adquirente sobre o montante dos encargos camarários perante a CML. Isto é, por outras palavras, o Demandado incumpriu ilicitamente a sua obrigação principal de cumprir o contrato nas condições mencionadas, mas também I... (24-02-2015 10:36:25) Página 252 de 547Tribunal a de informar atempadamente a adquirente do montante dos encargos pretendidos pela CML e, assim, o direito daquela adquirente de reduzir o montante do preço, uma vez que o Demandado se colocou liminarmente na posição de recusar suportar o encargo camarário necessário, por forma a dar objeto juridicamente relevante e validade à aprovação do projeto de arquitetura.

O Demandado, para além dos deveres de natureza contratual a que se obrigou deveria ter, igualmente, observado o disposto no artigo 762º nº 2. do Código Civil, ou seja, ao executar, parcialmente apenas, diga-se, a sua obrigação de transmitir para a adquirente as unidades de participação, após ter obtido a aprovação condicional e provisória do projeto de arquitetura, devia ter informado a adquirente, em momento anterior à Data da Conclusão, que o Fundo devia ainda efetuar o pagamento dos encargos camarários fixados pela CML, de modo a permitir à compradora a sua dedução no preço acordado.

Não o tendo feito, nem por isso, quer face às disposições contratuais acordadas, quer face às normas legais relativas à interpretação e cumprimento de obrigações contratuais, se pode considerar exonerado delas.

Alega o Demandado que a H... teve conhecimento, na reunião efetuada com o Senhor Vereador da CML e funcionários camarários, no dia 23 de Outubro de 2007 e pela participação nela do Senhor ..., que aquela autarquia pretendia exigir o pagamento de uma compensação urbanística e a TRIU. Deste modo, feneceria, segundo ele, a fundamentação dos pedidos formulados pela Demandante assente no seu desconhecimento daquela exigência.

Sucede, porém, que este argumento do Demandado não o pode eximir das suas obrigações contratuais e legais e apenas veio aos autos porque a Demandante baseou em parte a sua ação no desconhecimento desses encargos.

Em primeiro lugar, porque a informação obtida dos representantes camarários naquela reunião foi transmitida, igualmente, ao Demandado e era este, e não a autarquia, quem contratualmente deveria, de forma clara, expressa e conclusiva, informar a H... da exigência daqueles encargos pela CML, o que não fez.

Preferiu, ao invés, basear-se numa aprovação, aliás cronologicamente desfasada como já se sublinhou, provisória e condicional, para exigir da H... a celebração do contrato prometido.

Em segundo lugar, porque o conhecimento ou o desconhecimento  ela H... da exigência pela CML de encargos camarários é complementar da fundamentação deste laudo dirimitório do litígio dos autos. A estrutura obrigacional essencial do Demandado reside no cumprimento da condição necessária para que o projeto de arquitetura pudesse ser válido e produzir os seus efeitos, conduzindo, a final, à emissão da licença que permitiria a construção do hotel, por via da prévia obtenção pelo Demandado do alvará de loteamento obrigatoriamente associado ao pagamento da compensação urbanística exigida pela CML, o que não sucedeu.

A data da aprovação definitiva, não precária e sem condições do projeto de arquitetura, para o efeito específico do cumprimento das cláusulas 1ª,1.18, 4ª, nº 3, 8ª, nº 2 e 9º nº 3 do contrato-promessa é assim a data da emissão do alvará de loteamento após cumpridas as condições procedimentais e pagos os encargos exigidos pela CML, pois a isso estava obrigado o Demandado, mas não cumpriu.

Se a H... e a Demandante entenderam, como efetivamente sucedeu, a notificação para a concretização da Data da Conclusão como sendo a que foi feita pelo Demandado à H... através da notificação que enviou a esta pela sua comunicação de 25 de Julho de 2008, reproduzida no doc. nº 19 do Requerimento Inicial, tal facto não significa a renúncia da H... ao ajustamento do preço, designadamente porque, essencialmente e acima de tudo, o Demandado tinha a obrigação de assegurar à Demandante a aprovação definitiva e não condicionada do projeto de arquitetura, o que não sucedeu. A este propósito, importa aliás ter presente o que as partes convencionaram na cláusula 13ª do contrato promessa.

Não são, em qualquer caso, relevantes para impedir este efeito jurídico os argumentos do Demandado de a H... pretender celebrar o contrato prometido mesmo sem a aprovação do projeto de arquitetura. Esta era uma opção da H..., de que não pode resultar a conclusão que o Demandado retira.

Acresce que, do que se trata nesta ação, pois é esse o pedido, é o ajustamento para menos do preço ou, em alternativa, de uma indemnização do mesmo montante a pagar pelo Demandado à Demandante, e não de exigir ao Demandado uma prestação de facto consistente na aprovação específica, definitiva e não condicionada do projeto de arquitetura.

Também não é pertinente o argumento do Demandado baseado na pretensa assunção, apenas pela H..., do regime do ativo/passivo do Fundo e do seu efeito na variação do preço.

Segundo o Demandado, se houvesse mais ativo na data da aprovação do processo de licenciamento referido, nos termos da cláusula 4ª, nº 3, a H... deveria reforçar o preço da compra e venda das unidades de participação. Mas, ao invés, se houvesse passivo, a H..., numa das duas versões sustentadas pelo Demandado, teria apenas direito a deduzir o passivo no valor do aumento do ativo. Mas, noutra versão também por si sustentada, baseada na alegação de que apenas a H...se vinculou, não o Demandado, ao disposto naquela cláusula e número, também não obtém ganho de causa. Nesta segunda versão, o Demandado teria direito ao aumento do preço para mais se houvesse ativo no Fundo para além dos prédios, enquanto se houvesse passivo, com ou sem a existência concomitante do ativo, a H... não teria o direito a impor ao Demandado o ajustamento do preço para menos, porque o Demandado não se obrigou aos termos desta cláusula. Algo absurdo, portanto, nesta segunda versão do Demandado.

A primeira versão, porém, também não é de acolher, dado que a solução acertada a que conduz a interpretação da cláusula 4ª nº 3. deve conduzir à equitatividade dos benefícios, para mais ou para menos. Nada no contrato-promessa, a não ser enquanto se esgrimem meras palavras, existe que possa afastar a bondade daquela solução equitativa e correspetiva.

A não ser assim, e não tendo as partes acordado expressamente a intangibilidade do preço inicial acordado de 9.000.000 de euros, como não sucedeu, seria sempre inalterável este preço mesmo que o Fundo apresentasse no momento contratualmente relevante, um passivo não revelado, quiçá de vários milhões de euros. A nada disso conduz, pois, uma interpretação racional da cláusula.

Portanto, entendemos que ela deve ser interpretada no sentido de, tanto a prova da existência de um ativo, como da existência de um passivo, à data da aprovação, definitiva e não condicionada, do processo de licenciamento, seriam de aplicar.

O Demandado, aliás, melhor do que a H... ou a ora Demandante, como titular das unidades de participação do Fundo, conhecia bem a tramitação e os encargos do processo camarário, bem como o acervo patrimonial deste.

De qualquer modo, mal se compreende a razão de ser da inclusão da cláusula 4ª nº 3., por acordo das partes, no contrato-promessa deixando de fora, como passivo do Fundo, um encargo tão significativo como as compensações camarárias ou, eventualmente, a TRIU na economia do contrato prometido e no âmbito das relações entre as partes.

Também não procede a argumentação sustentada pelo Demandado de não se ter obrigado a suportar os encargos do processo URB. Isso é, na verdade, muito estranho, porque efetivamente foi ele que o iniciou, através da C..., Lda. por ele detida e gerida.

E foi, como já se disse e aqui exaustivamente se recorda, a aprovação definitiva do projeto de arquitetura a obrigação a que ele se vinculou.

Uma última questão, que levantamos nós, poderia dizer respeito à natureza jurídica do encargo urbanístico exigido pela CML.

Admitindo que se trata, não propriamente de uma obrigação, mas sim de um ónus obrigacional, isto é, os encargos camarários só seriam devidos se o interessado nos processos respetivos os executasse, o que significaria que só seriam devidos se e quando a Demandante pretendesse obter ambos os alvarás, o certo é que nem assim o Demandado estaria eximido de suportar o encargo camarário exigido.

Na verdade, do que se trata nestes autos é do preço contratualmente pactado e do seu eventual ajustamento face à exigência pela CML de compensações camarárias no processo URB e não de qualquer outra coisa.

A H... acordou o preço de 9.000.000 de euros com o projeto de arquitetura aprovado definitiva e incondicionalmente. Se existissem encargos supervenientes para o Fundo, as partes obrigaram-se a proceder ao reajustamento do preço, a que se eximiu o Demandado.

É aquela prestação ou, na sua falta, a reparação das consequências económicas e dos efeitos jurídicos que a Demandante exige ao Demandado e nada mais do que isso.

Nestes termos, tendo em conta toda a matéria de facto provada e, em particular, além de outros, os factos constantes das alíneas F), G), I), J), L), N), O), Q), R), T), U), V), Y), W), X), Z), M’), N’), O’), S’) T’) da peça FAA e as respostas dadas aos quesitos 1º, 3º, 5º, 6º, 7º, 10º, 12º, 14º, 16º, 20º, 29º, 30º e 33º da peça FNAA e, bem assim, o convencionado pelas partes no contrato-promessa, designadamente e não apenas, nas suas cláusulas 4ª número 3., 8ª número 2. e 9ª números 2. e 3. Do contrato promessa, e atento o disposto nos artigos 762º nºs. 1 e 2 e 798º do Código Civil e demais disposições legais aplicáveis, designadamente o(s) artigo(s) 2º, alínea i) e 44º, nº 4 do Dec. Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, alterado pelo Dec. Lei nº 177/2001, de 4 de Junho, e 120º e 121º do PDM de Lisboa, os termos, condições e a oportunidade em que foi aprovado o projeto de arquitetura no processo nº 2001/EDI/2006, os artigos 1º, 2º e 5º do Edital 122/93 para o cálculo das compensações urbanísticas exigidas pela CML e, ainda, os artigos 2º, nº 1, alínea d), 43º, nº 1 e 54º do Código do Registo Predial em vigor ao tempo dos factos relevantes dos autos, decide-se que o Demandado incumpriu as obrigações contratuais e legais a que se vinculou e, consequentemente, com os fundamentos atrás explicitados, julga-se procedente e provado o pedido formulado pela Demandante na alínea B) do seu petitório constante do Requerimento Inicial, e, consequentemente, condena-se o Demandado no pagamento, a título de restituição de parte do preço, à Demandante da quantia de Euros 449.079,78 (quatrocentos e quarenta e nove mil e setenta e nove euros e setenta e oito cêntimos), julgando-se improcedente, por prejudicialidade, o pedido formulado sob a alínea C) do mesmo petitório, absolvendo-se quanto a este o Demandado do pedido.

Outrossim, julga-se procedente o pedido formulado pela Demandante na alínea E), condenando-se o Demandado no pagamento da totalidade dos encargos da arbitragem devidos, nos termos do artigo 46º e seguintes do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa.

Não são devidos pelo Demandado juros de mora, dado que a CML não os exigiu, nem nos parece que existisse fundamento para tanto relativamente às compensações urbanísticas.

Não se demonstrou existir fundamento para condenar o Demandado ou a Demandante em indemnização por litigância de má-fé.

22 – A decisão arbitral referida em 19 foi notificada às partes em 30.05.2012.

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

Além de delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 635 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

A acção e o recurso têm por objecto a anulação de decisão arbitral, proferida, no dia 22 de Maio de 2012, por árbitro único ou singular, do Centro de Arbitragem da Associação Comercial de Lisboa.

A Lei nº 31/86, de 29 de Dezembro, com excepção do seu artº 1 nº 1, foi objecto de revogação expressa pela Lei nº 63/2011, de 14 de Dezembro, que iniciou a sua vigência no dia 15 de Março de 2012 (artºs 5 nº 1 e 6 deste último diploma legal). Como, porém, de harmonia com a norma de direito transitório de que a lei nova se fez acompanhar, ela só é aplicável aos processos arbitrais iniciados depois da sua entrada em vigor, à acção de anulação e ao recurso é aplicável, no caso, a lei revogada, que, por comodidade de exposição se designará, doravante, pelo acrónimo LAV (artº 4 nº 1 da Lei nº 63/2011, de 14 de Dezembro).

O recorrente invocou, na instância recorrida, como fundamentos da anulação da decisão arbitral, o excesso de pronúncia, a violação da autonomia privada, do critério de decisão e do princípio do processo justo, a inobservância da igualdade absoluta das partes e da imparcialidade e a falta de fundamentação.

A sentença impugnada no recurso desamparou todos estes fundamentos. Porém, na sua alegação e nas conclusões com que a rematou, o apelante limita a impugnação daquela sentença ao segmento em que negou procedência aos fundamentos, alegados como causa petendi do pedido de anulação da decisão arbitral, representados pela violação dos princípios do processo justo, por inobservância do due process, da igualdade absoluta das partes e da imparcialidade, e pela falta de fundamentação.

Maneira que as questões concretas controversas que importa resolver são as de saber se a sentença impugnada, ao concluir pela não verificação destes fundamentos de anulação da decisão arbitral incorreu ou não num error in iudicando e, na afirmativa, se deve ser revogada e logo substituída por acórdão que, com fundamento na violação dos princípios do processo justo e da falta de fundamentação, a decisão arbitral deve ou não ser anulada ou cassada, no todo ou, ao menos, em parte, respectivamente.

A resolução deste problema vincula naturalmente ao exame, leve mas minimamente estruturado, das apontadas causas de anulação da decisão do árbitro.

3.2. Violação – pela sentença arbitral – dos princípios do processo justo, por inobservância do due process, da igualdade absoluta das partes e da imparcialidade, e do dever de fundamentação.

O meio de resolução alternativa de litígios em que a arbitragem voluntária se resolve, outra coisa não é que um modo de resolução jurisdicional de controvérsias em que, com base na vontade das partes, a decisão é confiada a um terceiro[1]. O que, portanto, individualiza a arbitragem voluntária e lhe confere autonomia é, decerto, a sua natureza contratual.

A arbitragem voluntária é, realmente, contratual na sua origem, privada na sua natureza, jurisdicional na sua função e pública no seu resultado[2].

A origem contratual da arbitragem voluntária é, de todo, irrecusável, dado que assenta no exercício pelas partes da sua autonomia privada. A natureza privada da arbitragem resulta do facto de o tribunal arbitral ser criado e constituído por particulares, desprovidos de poderes de autoridade. Apesar disso, a sua função é jurisdicional, na medida em que o tribunal arbitral exerce verdadeira jurisdição, tendo competência para, de forma heterónoma e supraordenada, tomar decisões destinadas a decidir conflitos de interesses entre as partes. A arbitragem é publica no seu resultado, dado que a decisão dos árbitros é equiparável à sentença dos tribunais do Estado, tendo a mesma força executiva que a sentença proferida por tribunal estadual (artº 26 nº 2 da LAV). A natureza contratual configura a fonte dos poderes jurisdicionais; a natureza jurisdicional, o conteúdo dos poderes atribuídos pelo contrato[3].

Todavia, ao passo que a jurisdição dos tribunais do Estado se funda na lei – e no Direito - a jurisdição dos tribunais radica na convenção de arbitragem: os tribunais arbitrais são constituídos de harmonia com a convenção de arbitragem, convenção que, além de constituir a fonte dos poderes dos árbitros, define ou delimita o perímetro da sua competência decisória. Através da convenção de arbitragem – quer se trate de arbitragem ad hoc ou de arbitragem institucionalizada - é lícito às partes escolher os árbitros, as regras processuais, as provas admissíveis, a lei material aplicável, a sede do tribunal, o prazo para a decisão arbitral, etc. Indicações que tanto podem ser directas como por simples remissão para regulamentos de centro de arbitragem.

Porém, como evidente contrapartida do resultado público da arbitragem, e da consequente atribuição de eficácia jurisdicional à decisão arbitral, não se prescinde de um controlo estadual sobre a arbitragem ou, mais limitadamente, sobre a eficácia jurisdicional da decisão arbitral, controlo que se concretiza na impugnação das decisões arbitrais junto dos tribunais do Estado[4].

São dois os meios dessa impugnação – o recurso, que para o nosso caso não releva – e a acção de anulação, que, de resto, é irrenunciável, irrenunciabilidade que, precisamente, se explica ou relaciona com a função de controlo da arbitragem exercida pelos órgãos jurisdicionais estaduais (artºs 27, 28 nº 1 e 29 nº 1 da LAV).

A propositura da acção de anulação no tribunal estadual não confere a este órgão jurisdicional o poder de se pronunciar sobre o objecto do litígio. A acção de anulação tem efeitos puramente cassatórios ou rescisórios, não atribuindo competência substitutiva ao tribunal, dado que o objecto da acção é, simplesmente, a decisão arbitral e não a situação material litigada, ela mesma. Caso se verifique um fundamento de anulação, o tribunal estadual deve limitar-se a anular ou a cassar a decisão arbitral, não podendo substituí-la por outra[5]. Essa anulação pode ser meramente parcial se o fundamento da anulação se verificar só relativamente a uma parte ou um objecto da decisão que seja dissociável ou destacável do conjunto[6]. A convenção de arbitragem não caduca com o proferimento, tanto da decisão arbitral como da decisão anulatória, continuando em vigor, no caso de anulação, em relação à controvérsia que foi objecto da decisão anulada, embora pareça – em face da regra de que o poder jurisdicional dos árbitros se extingue com a notificação de depósito da decisão – que se tem de constituir um novo tribunal arbitral (artº 25 da LAV)[7].

A lei prevê, como fundamentos de anulação da decisão arbitral, designadamente, a violação, no processo, de princípios fundamentais, desde que essa ofensa tenha influenciado decisivamente a resolução do litígio, e a falta de fundamentação (artºs 16, 23 nº 3 e 27 nº 1, c) e d) da LAV). Os fundamentos de anulação são, portanto, vícios processuais equiparáveis a nulidades processuais – nulidades processuais ou procedimentais específicas do processo arbitral[8].

A lei enumera quatro princípios fundamentais aplicáveis à instância arbitral, que não podem ser afastados, tanto pelas partes como pelos árbitros: os princípios da igualdade, da citação necessária do demandado, do contraditório e, por último, da necessidade da audição das partes, prévia ao proferimento da decisão arbitral (artº 16, a) a d), da LAV). Trata-se de princípios estruturantes no sentido de que são conaturais ao processo arbitral e que, por isso, lhe são indispensáveis.

A violação, pela sentença arbitral de princípios fundamentais, enquanto causa de anulação dessa decisão, está sujeita ao princípio da essencialidade: a ofensa há-de ter interferido, de forma decisiva ou determinante, na decisão do objecto da causa.

Exige-se, pois, para a verificação deste fundamento de anulação, dois requisitos cumulativos: a violação no decurso do processo arbitral, de algum dos princípios fundamentais; que essa ofensa tenha influenciado, por forma decisiva, a resolução do conflito objecto do processo. Como é bem de ver essa essencialidade – que deixa ao juiz estadual um largo poder de apreciação - é de concretização difícil, dada, em muitos casos, a impossibilidade de determinar, objectivamente, em que medida o desrespeito de um princípio processual mínimo interferiu com a motivação e a decisão do árbitro ou árbitros.

Os actos de processo – de qualquer processo – têm uma finalidade inegável: assegurar a justa decisão da causa; e como a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida, segue-se que o fim geral dos actos de processo está satisfeito se as diligências, actos e formalidades que se praticaram garantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito: pelo contrário, o referido fim mostrar-se-á prejudicado se se praticaram – ou omitiram – actos que comprometem o conhecimento regular da causa e, portanto, designadamente, a instrução dela.

 Na impossibilidade de formulação de uma regra universalmente válida – portanto, como critério puramente orientador - pode dizer-se que a ofensa influenciou decisivamente a decisão, demonstrando-se que esta seria diferente se a violação não tivesse existido. A prova desta essencialidade incumbe à parte que invoca a anulabilidade, pois que se trata, nitidamente, de facto constitutivo do direito de anular a decisão arbitral (artº 342 nº 1 do Código Civil)[9].

É claro que a prova dessa essencialidade apresenta dificuldades de tomo para a parte onerada, sobretudo nos casos da omissão de um acto a que não se associa um valor rígido ou pré-determinado, como sucederá, por exemplo, nos casos em que o acto omitido consiste numa prova sujeita à livre apreciação do árbitro. Nesta hipótese, de harmonia com critérios de razoabilidade, não é de exigir à parte onerada a prova, na acção de anulação – que seria impossível e, em qualquer caso, impraticável – de que, caso o meio de prova tivesse sido produzido, o sentido da decisão da matéria de facto e, em última extremidade, da decisão final do árbitro seria, irrecusável ou necessariamente, inteiramente diferente. Em tal caso, deve ter-se por suficiente a prova da verosimilhança ou plausibilidade – que pode ser obtida por aplicação de uma regra de probabilidade – i.e., de que caso o meio de prova recusado tivesse sido produzido, se deve admitir, como plausível ou provável, a modificação da decisão da questão de facto e, correspondentemente, a alteração da decisão final da causa arbitral.

Como é axiomático, o exercício da função jurisdicional, ainda que por um tribunal não estadual, não é concebível sem um árbitro independente e imparcial: a imparcialidade do tribunal arbitral constitui um requisito fundamental de um processo justo ou equitativo[10]. Na perspectiva das partes, as garantias de imparcialidade referem-se à independência do árbitro e à sua neutralidade perante o objecto da causa. Apesar da sua raiz contratual – e seja qual for o critério de decisão - a função do árbitro é jurisdicional, na medida em que o tribunal arbitral exerce verdadeira jurisdição, tendo competência para proceder, de forma heterónoma, à composição de interesses conflituantes.

Apesar da pouca atenção que a LAV dá à questão da independência e da imparcialidade do árbitro ou árbitros – dado que se limita a remeter para o regime dos impedimentos e escusas estabelecidas no processo civil para os juízes - não é fácil negar que logo a própria realidade e as exigências da vida postulam que se pense a independência como a mais irrenunciável característica do julgar e, portanto, também da função arbitral (artº 10 nºs 1 e 2 da LAV).

Realidade e exigências da vida – acrescente-se - que só são confirmadas pelos dados jurídico-constitucionais, próprios de um Estado de Direito.

É o que decorre, desde logo, da configuração constitucional dos tribunais arbitrais como verdadeiros órgãos jurisdicionais, exigência que vincula a que, na sua constituição, sejam religiosamente respeitadas as notas essenciais que permitem identificar um tribunal, qualquer que seja a sua espécie ou tipo (artº 209 nº 2 da Constituição da República Portuguesa). E essas notas são, justamente – a independência e a imparcialidade dos juízes – de todos os juízes - que o integram. As especificidades dos tribunais arbitrais, por contraste com os tribunais estaduais, não são suficientes para se ter por excluída, quanto aos primeiros, a submissão dos juízes que os integram, aos princípios da independência e da imparcialidade. As funções jurisdicionais de uma justiça fundada na autonomia privada, impõe, irrecusavelmente, a assimilação de alguns tópicos característicos e definidores da função jurisdicional do Estado.

E, no plano adjectivo, apesar de o processo arbitral decorrer sob os signos da flexibilidade e da informalidade, a sua sujeição imperativa, designadamente, aos princípios da igualdade, da audiência e do contraditório, que constituem dimensões inelimináveis do direito de acesso aos tribunais e ao processo equitativo, traz implicada – sob pena de recusar ao árbitro ou árbitros a natureza de tribunal – a sua independência e imparcialidade[11]. A independência material – objectiva – do tribunal arbitral, reforçada pela independência pessoal – subjectiva - do árbitro ou árbitros que o integram, é condição irrenunciável de toda a verdadeira arbitragem.

Os fundamentos da dúvida sobre a imparcialidade da actuação do árbitro, não possuem, sempre, o mesmo efeito jurídico, dado que podem conduzir, algumas vezes, á impossibilidade de o árbitro funcionar em certo processo arbitral, noutras limitam-se a facultar à parte possibilidade de recusar o árbitro no feito em julgamento. Neste último caso estamos perante a suspeição do árbitro. A parte pode recusar o árbitro como tal. O princípio geral que se esconde atrás da matéria designadamente da suspeição do árbitro é, assim, este: o de que, no tribunal arbitral e relativamente a todas as partes, reine uma atmosfera de pura objectividade e de incondicional juridicidade. Pertence, pois, ao árbitro evitar, a todo o preço, quaisquer circunstâncias que possam perturbar essa atmosfera não enquanto tais circunstâncias possam fazê-lo perder a imparcialidade – mas logo enquanto possam criar nas partes, a convicção de que ele a perdeu. A independência e a imparcialidade são condições inalienáveis da verdadeira jurisprudência – entendida como o resultado do exercício da função jurisdicional - provenha ela dos tribunais do Estado ou dos tribunais arbitrais.

Não sofre a mínima dúvida a atribuição, na Constituição da República Portuguesa, de um direito à jurisdição ou de acesso à justiça, que se desdobra na garantia de acesso aos tribunais e de uma garantia de acesso ao próprio direito (artº 20 nº 1)[12]. Este direito que constitui, de resto, simples decorrência do estado social de Direito também constitucionalmente consagrado, garante, de forma universal e geral, o direito de levar a sua causa à apreciação de um tribunal (artº 2 da Constituição da República Portuguesa).

Como é evidente, não basta assegurar a qualquer interessado o acesso à justiça, sendo necessário que o processo a que se acede apresenta, quanto à sua própria estrutura, garantias de justiça. Tão indispensável como assegurar o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, é, por exemplo, garantir àquele que recorre aos tribunais – a qualquer tribunal - um julgamento por um órgão imparcial, em plena igualdade de partes, o direito ao contraditório, uma duração razoável da acção, a publicidade do processo e a efectivação de um direito à prova[13]. O direito de actuar em juízo terá, pois, de efectivar-se através de um processo justo ou equitativo.

O direito de acesso ao direito ao direito e à tutela jurisdicional efectiva e o direito ao processo equitativo estão largamente dependentes de conformação, designadamente, através da lei, e da disponibilização de processos garantidores de uma tutela judicial efectiva, dotados de uma estrutura informada pelo princípio da equitatividade.

Em qualquer caso, o direito à tutela jurisdicional efectiva – que substituiu o direito de acesso aos tribunais colocado na epígrafe do texto anterior da Constituição - vincando-se assim que se visa não apenas garantir o acesso aos tribunais mas sim e principalmente possibilitar aos cidadãos a defesa de direitos e interesses legalmente protegidos através de um acto de jurisdictio – concretiza-se fundamentalmente através de um processo jurisdicional equitativo[14].

Por processo equitativo deve entender-se não só o processo justo na sua conformação legislativa – ou, nos casos em que seja admissível, contratual – mas fundamentalmente o processo materialmente informado pelos princípios materiais de justiça, nos vários momentos processuais.

Neste plano, constitui dimensão ineliminável do princípio do processo equitativo, o direito de defesa e o direito ao contraditório - concebido como princípio ou direito de audiência, isto é, como oportunidade conferida a todo ao participante processual de influir, através da sua audição, no decurso do processo, na possibilidade de saber que contra si foi proposta uma acção ou requerida uma providência, de conhecer todas as condutas da contraparte e de tomar posição sobre elas, de invocar as razões de facto e de direito, de oferecer provas, de controlar as provas produzidas pela outra parte e de se pronunciar sobre o valor e resultado dessas provas.

A pretensão de tutela jurídica efectiva, na sua dimensão garantística, impõe a consideração processual das pessoas, não como objecto da decisão jurisdicional – mas como comparticipantes na criação dessa mesma decisão. Do que decorre que a administração da justiça – ainda que o seu esteio seja contratual - não se relaciona apenas com a protecção de situações jurídicas substantivas, mas também e directamente com a da posição processual daqueles que sejam afectados por essa decisão. Nestas condições, um processo orientado por um princípio de equitatividade deve assegurar aos respectivos sujeitos uma participação constitutiva na declaração do direito do seu caso e, através dela, na conformação da sua situação jurídica futura.

O direito à tutela jurisdicional efectiva, nas várias dimensões em que é decomponível, não se identifica com o direito a uma decisão favorável, antes se reconduz, muito simplesmente, ao direito de obter uma decisão fundada no direito sempre que se cumpram os requisitos legalmente exigidos.

Uma dimensão ineliminável do direito ao processo equitativo é, seguramente, a do direito à prova.

Simplesmente, o direito de acesso ao direito - nas múltiplas vertentes em que, por força o seu carácter poliédrico, se desdobra – não é apenas instrumento de defesa de direitos. É também integrante do princípio material da igualdade (artº 13 da Constituição da República Portuguesa)[15].

De forma deliberadamente simplificadora, bem pode dizer-se o princípio processual estruturante da igualdade das partes – que deve ser assumido como uma concretização do princípio constitucional da igualdade - significa que ambas as partes devem possuir os mesmos poderes, direito e ónus, devendo, por isso, cada uma delas situar-se numa posição de plena igualdade perante a outra e ambas devem ser iguais perante o tribunal arbitral (artº 13 da Constituição da República Portuguesa). Abstraindo dos limites à igualdade, o princípio postula, desde logo, o respeito por todas as situações de igualdade formal entre as partes, determinadas pela lei de processo aplicável à arbitragem. Negativamente, o princípio da igualdade destina-se a impedir que o árbitro crie situações de desigualdade – seja ela formal ou substancial – entre as partes.

Consabidamente, a prova resolve-se na actividade destinada à formação do tribunal sobre a realidade dos factos controvertidos, actividade que incumbe à parte onerada que, se não satisfazer o ónus correspondente, não obterá uma decisão favorável (artºs 341 e 346, in fine, do Código Civil).

Para cumprir o ónus da prova a parte tem de utilizar um dos meios de prova legal ou contratualmente admitidos ou não excluídos por convenção das partes (artº 345 do Código Civil).

Não é inteiramente incontroversa a questão de saber se, entre nós, existe ou não uma enumeração taxativa, exaustiva, dos meios de esclarecimento e de convicção do tribunal, o mesmo é dizer, de provas[16]. O Código Civil – em que se contém o direito probatório material - contém uma indicação de vários tipos diferenciados de prova, mas essa enumeração nem sequer é esgotante, dado que não menciona uma prova, admitida pela lei de processo: a prova por apresentação de coisas – nem uma prova de importância crescente; a prova por documento electrónico (artº 518 nº 2 do CPC de 1961 e 416 do nCPC e 1 do Decreto-Lei nº 290-D/99, de 2 de Agosto). E disposições avulsas mostram a admissibilidade de meios inominados de prova, como sucede nas acções de filiação em que se admite os exames de sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados, ou de meios de obtenção da prova, como, por exemplo, os relatórios sociais em processos tutelares cíveis (artºs 1801 do Código Civil e 147-B do Decreto-Lei 314/78, de 27 de Outubro).

Todavia, não falta quem sustente a inadmissibilidade de meios de prova não previstos na lei, e, portanto, uma proibição de produção e de valoração de provas atípicas[17]. Tais provas seriam, assim, materialmente proibidas e, portanto, ilícitas e, como tal, insusceptíveis de ser valoradas pelo tribunal, não podendo servir de fundamento a qualquer decisão desse mesmo tribunal, seja qual for a sua natureza. Uma doutrina maioritária, ainda que com reservas, concluía, no entanto, pela inexistência de um números clausus de meios de prova[18].

E o problema era debatido – no contexto do Código de Processo Civil de 1961 - a propósito, justamente, da valoração das declarações não confessórias da parte – portanto, favoráveis a essa parte - produzidas no contexto de depoimento de parte. A dúvida residia no facto de o depoimento de parte ser nitidamente instrumental no tocante à prova por confissão, o mesmo é dizer, ao reconhecimento da realidade de factos que desfavorecem o depoente e que favorecem a parte contrária (epígrafe que encabeça o artº 552 do CPC de 1961 e 352 do Código Civil). A confissão é, realmente, definida como o reconhecimento que a parte faz de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, caracterizando-se, portanto, como uma declaração de reconhecimento - uma declaração de ciência – que se contradistingue pelo seu objecto – um facto desfavorável ao depoente, que contra se pronuntiatio.

Apesar de parecer contrário de alguma doutrina, uma jurisprudência[19] – que se crê maioritária – concluía, à luz do princípio da livre apreciação das provas, pela admissibilidade da valoração do depoimento de parte, mesmo no segmento em que as respectivas declarações lhe eram favoráveis (artº 655 do CPC de 1961). Feitas todas as contas, a conclusão a tirar era, realmente, a admissibilidade da produção e da valoração das declarações de parte, mesmo que respeitassem a enunciados de facto que lhe eram favoráveis. Segundo certo entendimento do problema, com uma ressalva importante – referida não à admissibilidade do meio de prova, mas à avaliação da sua força probatória: aquela valoração era admissível, contanto que o tribunal não se baseasse exclusivamente nessas declarações para formar a sua convicção sobre a veracidade ou inveracidade dos factos controvertidos[20]. Quer dizer: a proibição de valoração deveria considerar-se afastada, desde que as declarações, mesmo referidas a enunciados de facto que fossem favoráveis, obtivessem, de outros meios de prova – ou mesmo de regras de experiência ou de critérios sociais – um grau de confirmação adequado.

De resto, eram várias as disposições quer do processo civil, quer de outras formas processuais de que constituía o processo subsidiário, em que se admitia – ou mesmo se impunha – a produção da prova por declarações da própria parte, com inteira independência das regras relativas à proposição e à admissibilidade da prova por depoimento de parte. Sem preocupação de exaustão, era o que sucedia, por exemplo, com os esclarecimentos sobre a matéria de facto que o juiz podia exigir às partes, com o interrogatório do arguido no processo especial de interdição e de inabilitação, com as declarações das partes no processo especial de suprimento do consentimento e com as declarações da criança e dos pais no processo tutelar cível de regulação das responsabilidades parentais e de promoção e protecção, etc. (artºs 266 nº 2, 950 1425 nº 3, 1ª parte do CPC de 1961, 158 nº 1 a) e 177 nº 2 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro, e 107 da LPCJ, aprovada pela Lei nº 147/99, de 1 de Setembro). Previsões que podiam ser entendidas como o afloramento de um princípio mais geral de admissibilidade da prova por declarações das partes e da sua sujeição ao princípio da liberdade da sua valoração. A circunstância de a essas declarações não poder ser atribuído o valor de confissão, não impedia a sua livre valoração, dado que se não for possível atribuir ao meio de prova qualquer dos valores que a lei lhe atribui em abstracto, é sempre possível atribuir-lhe um desses valores, o que é confirmado pela regra de que o reconhecimento de factos desfavoráveis que não possa valer como confissão, sempre vale como elemento probatório que o tribunal apreciará livremente (artº 361 do Código Civil).

Devia, portanto, julgar-se admissível, mesmo à luz do Código de Processo Civil de 1961, que o depoimento de parte fosse requerido, não para o efeito de provocar confissão – mas para a obtenção de prova sujeita à livre apreciação do tribunal, como sempre sucederá, de resto, no caso de acção relativa a direitos indisponíveis em que a confissão se tem por inadmissível (artº 354 b) do Código Civil).

Perante o tribunal arbitral pode ser produzida qualquer prova admitida pela lei de processo civil (artº 18 nº 1 da LAV). Todavia, a doutrina logo adverte que a intencionalidade desta norma não é restritiva, pelo que podem ser utilizados outros meios de prova, além dos admitidos pelo Código de Processo Civil, se o processo aplicável à arbitragem o permitir. Do que decorre, que não constitua fundamento de anulação da decisão arbitral, o uso de uma prova que não seja admitida pela lei de processo civil[21].

É essa, aliás, também – como salienta a apelante na sua alegação – a opinião do Sr. Árbitro perante o qual correu o processo arbitral e que proferiu a decisão correspondente[22].

Em qualquer caso, deve notar-se que o Regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio de Lisboa – na versão de 2008 - aplicável ao caso, por escolha das partes, ao processo arbitral, dispunha, sem qualquer restrição ou ressalva que, o tribunal arbitral podia, por sua iniciativa, ou a requerimento de uma ou de ambas as partes, recolher o depoimento pessoal das partes (artº 30 nº 2 a)). Quer dizer: ainda que se devesse concluir, no contexto do Código de Processo Civil de 1961, pela existência de uma proibição de prova por declarações da própria parte, imposta pela inadmissibilidade de provas atípicas, esse limite não valeria no plano do processo arbitral, quer por força de disposição específica da lei reguladora da arbitragem, quer por força do regulamento conformador, em concreto, do procedimento arbitral.

Maneira que todas as contas feitas, tudo vincula à conclusão de que, tanto por força da apontada disposição do Regulamente de Arbitragem, como por virtude da admissibilidade, no processo arbitral de provas atípicas, quer ainda – de harmonia com a doutrina que se tem por preferível – em consequência da admissibilidade, à luz da lei de processo de civil, da valoração das declarações ainda que favoráveis ao depoente – mesmo que, segundo certo entendimento do problema se deva exigir o seu amparado por outros meios de prova - da licitude, como meio de prova, no processo de arbitragem, das declarações da propria parte, produzidas tanto por iniciativa do tribunal, como a requerimento de ambas ou de qualquer das partes.

E a recusa que se deva ter por injustificada da produção desse meio de prova, vulnera o direito à prova e, portanto, o direito ao processo equitativo e, por essa via, o princípio estruturante da igualdade.

A lei portuguesa da arbitragem conta-se entre aquelas que prescrevem imperativamente a fundamentação da decisão arbitral (artº 23, nº 3 da LAV e 208 nº 1 da Constituição da República Portuguesa).

A falta de motivação ou fundamentação verifica-se quando o tribunal arbitral julga procedente ou improcedente um pedido - mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão.

Isto é assim, dado que uma das funções essenciais de toda e qualquer decisão – judicial ou arbitral - é convencer os interessados do seu bom fundamento. A exigência de motivação da decisão destina-se a permitir que o juiz ou juízes arbitrais convençam os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, esse juiz ou juízes devem passar de convencidos a convincentes.

Compreende-se facilmente este dever de fundamentação, pois que os fundamentos da decisão constituem um momento essencial não só para a sua interpretação – mas também para o seu controlo pelas partes da acção e, eventualmente, por outro tribunal perante o qual seja permitida a sua impugnação, seja qual a forma dessa impugnação[23].

A motivação constitui, pois, a um tempo, um instrumento de ponderação e legitimação da decisão arbitral e, nos casos em que seja admissível – como sucede na espécie sujeita - de garantia do direito à impugnação da decisão arbitral perante o tribunal estadual.

Portanto, o dever funcional de fundamentação não está orientado apenas para a garantia do controlo interno - partes e instâncias de controlo - do modo como o juiz arbitral exerceu os seus poderes. O cumprimento daquele dever é condição mesma de legitimação da decisão[24].

Na motivação da decisão o juiz arbitral deve desenvolver uma argumentação justificativa da qual devem resultar as boas razões que fazem aceitar razoavelmente a decisão, numa base objectiva, não só para as partes, mas também – num plano mais geral – para toda a comunidade jurídica. Na motivação, o juiz arbitral deve demonstrar a consistência dos vários aspectos da decisão, que vão desde a determinação da verdade dos factos na base das provas, até à correcta interpretação e aplicação da norma que se assume como critério de julgamento, caso esse critério seja normativo, i.e., extraído de normas legais. Da motivação deve resultar particularmente que a decisão foi tomada, em todos os seus aspectos, de facto e de direito, de maneira racional, seguindo critérios objectivos e controláveis de valoração, e, portanto, de forma imparcial[25]. Dito doutro modo: a decisão arbitral não deve ser só justa, legal e razoável em si mesma: o juiz arbitral está obrigado a demonstrar que o seu raciocínio é correcto e legal, o que só pode fazer-se através da exposição de opiniões racionais que revelem as premissas e inferências que podem ser aduzidas como bons e aceitáveis fundamentos da decisão[26].

A fundamentação da decisão é, pois, essencial para o controlo da sua racionalidade. Pode mesmo dizer-se que esta racionalidade é uma função daquela fundamentação. E como a racionalidade da decisão só pode ser aferida pela sua fundamentação, esta fundamentação é constitutiva dessa mesma racionalidade. Numa palavra: a exigência de fundamentação decorre da necessidade de controlar a coerência interna e a correcção externa da decisão.

No entanto, quanto a este ponto, há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação – da motivação deficiente, medíocre ou errada. O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão[27].

Tem-se, realmente, entendido que o vício a que a lei associa a invalidade substancial da decisão é a falta absoluta de motivação[28]; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente: afecta o valor doutrinal e persuasivo da decisão arbitral – mas não produz nulidade[29]. Portanto, só a ausência total de qualquer fundamentação conduz à invalidade da decisão: se a decisão invocar algum fundamento de facto ou de direito – ainda que exasperadamente errado – está afastado aquele valor negativo, no tocante à justificação fáctica e jurídica da decisão. Assim, pelo que respeita aos fundamentos de direito, não é forçoso que o juiz arbitral cite, por exemplo, nos casos a que a decisão deve ser tomada segundo um critério normativo, os textos da lei que abonam o seu julgado: basta que aponte a doutrina legal ou os princípios jurídicos em que se baseou.

Este viaticum habilita-nos, com suficiência, à resolução da questão concreta controversa que constitui, na essência, o objecto do recurso.

3.4. Concretização.

Uma das razões de queixa da apelante no tocante à decisão arbitral radica na parcialidade, ou na violação, pelo juiz arbitral, do seu irrecusável dever de imparcialidade.

Tanto quanto transparece da argumentação da apelante, a violação, pelo Sr. Árbitro, daquele dever decorreria do indeferimento do seu requerimento de proposição da prova, no segmento em que requereu a produção do seu depoimento pessoal. Nestes condicionalismos, é patente que a recorrente identifica, ou torna equivalente, um juízo de improcedência com a ofensa do princípio da imparcialidade. A todo o passo, o juiz – qualquer juiz – é chamado a proferir decisões de procedência e de improcedência. A administração da justiça, arbitral ou não arbitral, seria, de todo impossível se cada vez que o juiz recusasse a procedência a qualquer pretensão da parte, se devesse logo ter por iudex suspectus.

Em face dos factos adquiridos para a causa não há, pois, a mínima razão para que deva ter procedente a acusação – de resto, bem grave – da subtracção do Sr. Árbitro, em qualquer momento do processo arbitral, ao princípio da imparcialidade a que está iniludivelmente vinculado.

Na espécie do recurso, como decorre da factualidade julgada provada, no decurso do processo arbitral, ficou a constar, na acta de missão, como provas admissíveis, a prova documental e pericial, bem como qualquer outra diligência probatória, incluindo o depoimento de parte.

O apelante, no requerimento de proposição da prova, requereu, entre outras provas, o seu depoimento pessoal, prova cuja produção já havia requerido em momento anterior – mas o Sr. Árbitro, por despacho de 20 de Janeiro de 2012, com fundamento em que as partes nada disseram sobre o assunto, nem na Clausula Arbitral, nem na Acta de Missão nem em qualquer outro documento e que importava aplicar as disposições da lei que regulam a matéria – concretamente o Código Civil e o Código de Processo Civil, indeferiu o requerido, dado não ter o Demandado indicado os factos específicos sobre que pretendia o seu depoimento de parte e não ser admissível “ouvi-lo sobre toda a matéria dos autos”. A ratio decidendi da decisão de indeferimento não radica no carácter dilatório ou na sua irrelevância ou desnecessidade, para o interesse superior da boa instrução da causa, da prova proposta – mas na violação das regras da proposição e da produção desse meio probatório.

O que se pergunta é se com esta decisão se violou um qualquer princípio estruturante do processo arbitral, designadamente, o da igualdade.

A sentença impugnada achou que não. E adiantou para justificar esse julgamento, estas razões: por tal indeferimento – do depoimento pessoal do apelante – derivar de forma linear e clarividente, da lei processual aplicável: da análise do artº 553 nº 3 do CPC de 2102, se retira que a parte não pode requerer o seu próprio depoimento; (este) não poderia ser requerido a toda a matéria, mas apenas à matéria alegada pela contra-parte susceptível de confissão; a pretensão do A., no sentido de que, a ter sido admitido o meio de prova em questão, teria logrado a prova da factualidade que reputa de essencial e teria conduzido à improcedência da acção, resulta, diga-se, meramente hipotética.

Quanto a este ponto não podemos acompanhar a decisão impugnada no recurso, devendo, antes, concluir-se que a razão está do lado da apelante.

Já adquirimos que no processo arbitral podem ser usados meios de prova diversos das admitidas pela lei de processo civil, desde que o processo aplicável à arbitragem o permita, ou ao menos, o não proíba. E no caso, o regulamento aplicável à arbitragem era claro na admissão – a requerimento de qualquer das partes ou mesmo por iniciativa oficiosa do tribunal – do depoimento pessoal das partes. E na chamada acta de missão fez-se constar, como provas admissíveis, as provas documental e pericial, bem como qualquer outra diligência probatória, incluindo o depoimento de parte. Maneira que, ainda que o depoimento pessoal do apelante, requerido por ele mesmo, não coubesse na previsão específica relativa ao depoimento de parte, sempre caberia na previsão genérica qualquer outra diligência probatória.

Portanto, tanto por força da lei reguladora da arbitragem, quer por virtude do processo aplicável e da convenção das partes, não existe qualquer obstáculo à admissibilidade da prova cuja produção foi recusada ao apelante.

Depois – como se procurou mostrar – mesmo face às regras substantivas relativas ao direito probatório material e às regras adjectivas reguladoras da proposição e admissão das provas, devia ter-se por admissível o depoimento de parte, ordenado, não para o efeito de provocar confissão – mas para a obtenção de prova sujeita à livre apreciação do tribunal.

Sendo isto, exacto, então é meramente consequencial, a violação, no decurso do processo arbitral, do processo equitativo, na dimensão do direito à prova e, correspondente, do princípio de que constitui parte integrante: o princípio da igualdade.

No entanto – como se notou – não basta para que a sentença arbitral se tenha por anulável, a violação de qualquer princípio processual estruturante: é sempre necessária, cumulativamente, a demonstração – que onera o impugnante – da essencialidade dessa violação. Todavia, pelas razões também já apontadas é suficiente, para a prova dessa essencialidade, um juízo de prognose[30]. Outro entendimento tornaria irrelevantes, no processo arbitral, toda e qualquer violação do direito à prova – e, correspondentemente, do direito ao processo equitativo – sempre que a ofensa respeitasse a provas sujeitas à livre apreciação do árbitro, como são a generalidade daquelas que é admissível produzir no processo arbitral.

Em absoluto remate: houve, realmente, no decurso do processo arbitral, a violação do princípio estruturante da igualdade, nulidade que se deve ter por essencial. A revogação da decisão recorrida – e a consequente anulação da decisão arbitral – são, pois, meramente consequenciais.

Esta conclusão deixa, naturalmente, prejudicado a apreciação da causa de anulabilidade daquela mesma decisão – no caso meramente parcial – assente na falta de fundamentação da decisão, no segmento relativo à responsabilidade pelos encargos da arbitragem.

Obiter dicta, não deixa de observar-se quanto a este fundamento da impugnação o seguinte.

A actividade dos tribunais arbitrais não é gratuita: os litigantes têm que pagar os respectivos encargos, devendo a sentença arbitral fixar – por decisão fundamentada - esses encargos e o modo da sua repartição pelas partes (artº 23 nº 4 da LAV).

A convenção arbitral e o regulamento da arbitragem não contêm, quanto ao problema da responsabilidade pelos encargos da arbitragem e da sua repartição pelos litigantes qualquer regra.

Consabidamente, a responsabilidade pelas despesas de um qualquer processo – judicial ou outro – pode assentar num de dois critérios: o da causalidade; o do benefício ou do proveito[31]. Essa responsabilidade é puramente objectiva, quer dizer, estranha à qualquer ideia de culpa da parte. Segundo o princípio da causalidade, entende-se que dá causa aos encargos do processo, o sucumbente – e por aplicação de um princípio de proporcionalidade, na medida em que o for - embora seja concebíveis situações nas quais aquela responsabilidade, embora determinada por aquela causalidade, é independente dessa sucumbência.

Como quer que seja – dado que não se discute a correcção intrínseca da decisão arbitral no tocante à responsabilidade pelos encargos e a sua repartição – exige-se que aquela decisão contenha os motivos, as razões pelas quais aqueles encargos, devem no caso, ser suportados pelo apelante. E a verdade é que, no caso, a sentença arbitral não elucida a respeito dos motivos daquela decisão, v.g., do critério que teve por relevante para concluir – apesar da sucumbência meramente parcial da apelante na causa arbitral - tanto pela sua responsabilidade pelos encargos, como – e maxime - pela responsabilidade da satisfação da totalidade do seu valor. Sobretudo a apelante, por ser a parte prejudicada com essa decisão, tem o direito de saber por que razão a sentença arbitral fez recair sobre ela a totalidade dos encargos; e tem mesmo a necessidade de o saber, porque, admitindo a decisão arbitral impugnação, para impugnar o fundamento ou fundamentos perante o tribunal estadual. E este carece também de conhecer as razões determinantes dessa decisão, para as poder apreciar no julgamento da impugnação.

Maneira que, no segmento apontado, a decisão arbitral é, realmente, infundamentada, vício que sempre importaria, a sua anulação, ainda que restrita ao objecto, relativamente ao qual a motivação está, de todo, ausente.

O recurso deve, pois, proceder.

Síntese recapitulativa:

a) A acção de anulação da decisão arbitral tem efeitos puramente cassatórios ou rescisórios, não atribuindo competência substitutiva ao tribunal, dado que o objecto da acção é, simplesmente, a decisão arbitral e não a situação material litigada, ela mesma;

b) Os fundamentos de anulação da decisão arbitral resolvem-se em vícios processuais equiparáveis a nulidades processuais – nulidades processuais ou procedimentais específicas do processo arbitral;

c) A violação, pela sentença arbitral de princípios estruturantes, enquanto causa de anulação dessa decisão, está sujeita ao princípio da essencialidade - a ofensa há-de ter interferido, de forma decisiva ou determinante, na decisão do objecto da causa – cuja prova vulnera a parte que pede a anulação;

d) Para a prova dessa essencialidade, se a violação tiver consistido na omissão da produção de uma prova sujeita à livre apreciação do árbitro, não é, porém, exigível mais que um juízo de prognose, de harmonia com o qual, caso o meio de prova recusado tivesse sido produzido, se deve admitir, como plausível ou provável, a modificação da decisão da questão de facto e, correspondentemente, a alteração da decisão final da causa arbitral.

e) A independência e a imparcialidade do tribunal arbitral constituem um requisito fundamental de um processo justo ou equitativo;

f) O direito à prova constitui dimensão ineliminável do direito ao processo equitativo, que, por sua vez, constitui parte integrante do princípio material da igualdade;

g) Mesmo à luz do Código de Processo Civil de 1961 – de harmonia com uma doutrina e jurisprudência maioritárias – devia ter-se por admissível o depoimento pessoal da parte, não para o efeito de provocar confissão – mas para a obtenção de prova sujeita à livre apreciação do tribunal;

h) O processo arbitral não está submetido a qualquer princípio de tipicidade das provas admissíveis, pelo que nele podem ser usados meios de prova diversos dos admitidos pela lei de processo civil, salva disposição contrária da convenção arbitral ou do regulamente de arbitragem aplicável;

As custas do recurso deverão ser satisfeitas pela parte que nele sucumbe: a apelada (artº 527 nºs 1 e 2 do nCPC).

4. Decisão.

Pelos fundamentos expostos, julga-se o recurso procedente e, em consequência:

a) Revoga-se a decisão impugnada; 

b) Anula-se a decisão arbitral, proferida no dia 22 de Maio de 2012, no processo nº ..., no Centro de Arbitragem da Associação Comercial de Lisboa, impugnada na acção de anulação.

Custas do recurso pela apelada.

                                                                                                                             15.04.21

                                                                                                                             Henrique Antunes (Relator)

                                                                                                                             Isabel Silva

                                                                                                                             Alexandre Reis

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[1] Luís de Lima Pinheiro, Arbitragem Transnacional – a Determinação do Estatuto da Arbitragem, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 26.
[2] Francisco Cortez, “A arbitragem voluntária em Portugal: “dos ricos homens aos tribunais privados”, in O Direito, 124 (1992), Outubro/Dezembro, pág. 55; Ac. do STJ de 18.01.00, www.dgsi.pt.
[3] Carlos Ferreira de Almeida, “Convenção de arbitragem, conteúdo e efeitos”, disponível em http://laboratorial.fd.unl.pt.
[4] Luís de Lima Pinheiro, “Apontamento sobre a impugnação da decisão arbitral”, ROA, Ano 2007, Ano 67, Vol. III, Dez. 2007, disponível em http://.oa.pt.
[5] Daniela Filipa Calado Mirante, Os Efeitos da Anulação da Sentença Arbitral, Dissertação de Mestrado, FDUL, Fevereiro 2009, págs. 80 e 81, disponível em http://laboratorial.fd.unl.pt/media/files.
[6] Paula Costa e Silva, “Anulação e recursos da decisão arbitral”, ROA, Ano 52 (1992), pág, 962, e Dário Moura Vicente “Arbitragem de conflitos colectivos de trabalho”, in Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Coimbra, 2003, pág. 265; Ac. do STJ de 21.10.03, www.dgsi.pt.
[7] Luís de Lima Pinheiro, Arbitragem Transnacional, cit., pág. 172; diferentemente, no entanto, Paula Costa e Silva, “Anulação e recursos”, cit., pág. 963 e ss., e Raul Ventura, Convenção de Arbitragem, 1986, pág. 401 e ss.
[8] Rui Ferreira, “Anulação da decisão arbitral. Taxatividade dos fundamentos de anulação”, in Análise da Jurisprudência sobre Arbitragem, Coord. Mariana França Gouveia, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 203.
[9] Ac. do STJ de 22.01.04, www.dgsi.pt.
[10] Mariana França Gouveia, Curso de Resolução Alternativa de Litígios, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2012, pág. 180, e Bernardo Reis, “O Estatuto dos árbitros – alguns aspectos”, in Themis, RFDUNL, Ano 9º, nº 16, 2009, pág. 19.
[11] Ac. do TC nº 52/92 e do STJ de 12.07.11 e Lopes do Rego, “O direito fundamental de acesso aos tribunais e a reforma do processo civil” in, Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, 2001, Separata, pág. 739.
[12] Este direito à jurisdição ou de acesso à justiça é igualmente atribuído, por exemplo, pelo artº 10 da DUDH, pelo artº 14 nº 1 do PIDCP e pelo artº 6 nº 1 da CEDH.
[13] J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP, Constituição da República Portuguesa Anotada, artºs 1º a 107º, vol. I, Coimbra Editora, 2007, págs. 415 e 416.
[14] José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª edição, Almedina, Coimbra, págs. 492 a 502.
[15] J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, Anotada, cit., pág. 410 e Ac. do STJ de 29.05.12, www.dgsi.pt.
[16] Cfr., por todos, João Paulo Remédio Marques, “A aquisição e a valoração probatória de factos (des)favoráveis ao depoente ou à parte”, in Julgar, 16, Janeiro-Abril de 2012, Coimbra Editora, págs. 138 e ss.
[17] José Lebre de Freitas, A confissão no Direito Probatório, Coimbra Editora, Coimbra, 1991, pág. 256, nota 40 e Dias Marques, Noções Elementares de Direito Civil, Volume II, Lisboa, AAFDL, 1992, pág. 126.
[18] João de Castro Mendes, Direito Processual Civil, vol. II, AADFL, 1992, pág. 26, Antunes Varela/Sampaio e Nora/Miguel Bezerra, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 469, Miguel Teixeira de Sousa, As Partes, O Objecto e a Prova na Acção Declarativa, Lisboa, Lex, 1995, pág. 126 e “A livre apreciação da prova em processo civil”, in Scientia Iuridica, nºs 187-188 (1984), págs. 140 e 141, Isabel Alexandre, Provas Ilícitas em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 46 e Remédio Marques, A Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 3ª edição, 2011, Coimbra Editora, pág. 583.
[19] Acs. da RG de 19.05.11 e de 19.01.15, do STJ de 05.11.08, 21.01.09, 10.12.09, 09.05.06 e de 02.01.04, da RP de 18.01.01 e de 04.04.02 e da RC de 12.04.11, www.dgsi.pt
[20] João Paulo Remédio Marques,” A aquisição e a valoração…”, cit., cit., pág. 171. Todavia, a verdade é que, não existe qualquer obstáculo epistemológico para não reconhecer às declarações do depoente um meio válido de formação da convicção, esclarecida e racional do juiz, i.e., uma fonte válida de convencimento racional do juiz. Assim, ainda que no contexto da prova por declarações de parte, o Ac. da RE de 12.03.15, www.dgsi.pt, e Paulo Faria e Ana Loureiro, Primeiras Notas ao Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, Coimbra, 2014, pág. 364.
[21] Luís de Lima Pinheiro, Arbitragem Transnacional, cit., pág. 147.
[22] Manuel Pereira Barrocas, “A prova no processo arbitral”, in IV Congresso do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio de Lisboa, Almedina, 2011, págs. 153 e 156.
[23] Ac. do STJ de 09.12.87, BMJ nº 372, pág. 369.
[24] Patrícia Guia Pereira, “Fundamentos de anulação da decisão arbitral: perspectivas de iure condito e de iure condendo”, in O Direito, Almedina, Coimbra, nº 110, pág. 1078.
[25] Michele Tarufo, Páginas Sobre Justicia Civil, Marcial Pons, 2009, pág. 53.
[26] Michele Tarufo, cit., págs. 36 e 37.
[27] Acs. do STJ de 08.07.87, BMJ nº 369, pág. 481, da RP de 06.01.94, CJ, 94, I, pág. 197 e da RL de 03.11.94, CJ, 94, V, pág. 90.

[28] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra, 1984, pág. 140, Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, 2001, pág. 703, e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, Lex, 1997, págs. 221 e 222, e P. Costa e Silva, “Anulação e recursos”, cit., pág. 939 e 942.
[29] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, cit., pág. 139 e 140 e Acs. da RP de 06.01.94 e da RL de 03.11.94 e 17.1.91, CJ, 94, I, págs. 197, 94, V, pág. 90 e 91, I., pág. 121, respectivamente.
[30] Mariana França Gouveia, Curso de Resolução Alternativa de Litígios, cit., pág. 257 e António Sampaio Caramelo, A Impugnação da Decisão Arbitral, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 43.
[31] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume II, 3ª edição, reimpressão, Coimbra Editora, Coimbra, 1981, págs. 200 e ss.