Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
144/10.0TBCNT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: EMPREITADA
DEFEITOS
DIREITOS
DENÚNCIA
PRAZOS
CADUCIDADE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 05/20/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1.º JUÍZO DO TRIBUNAL JUDICIAL DE CANTANHEDE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 342.º N.º 1, 496 N.º 1, 799.º N.º E, 1220.º A 124º DO CC; ARTIGO 5.º DO DL 67/2003, DE 8 DE ABRIL.
Sumário: 1. Para no âmbito dum contrato de empreitada se pedir a eliminação dum defeito, basta provar, por um lado, a existência do defeito e, por outro lado, que o mesmo, pela sua gravidade, é de molde a afectar o uso ou a acarretar uma desvalorização da coisa. Provado o defeito e a sua gravidade, presume-se – uma vez que é contratual a responsabilidade do empreiteiro – que o mesmo é imputável ao empreiteiro, isto é, presume-se que o cumprimento defeituoso é imputável ao empreiteiro.

2. Para haver responsabilidade por cumprimento defeituoso - isto é, para o dono da obra manter o direito à eliminação dos defeitos - é necessário que seja previamente feita a denúncia do defeito (no prazo de 1 ano fixado para os imóveis) e tempestivamente exercidos os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização (igualmente no prazo de 1 ano, mas a contar da denúncia atempada dos defeitos, respeitando o limite máximo da garantia legal fixada para os imóveis de 5 anos após a entrega da obra, independentemente da data do conhecimento dos defeitos e da sua denúncia).

3. O empreiteiro pode obstar à exigência de eliminação dos defeitos se demonstrar que essa prestação lhe acarreta um sacrifício económico excessivo, ou seja, que é desproporcionada em relação ao proveito da contraparte. Para determinar essa onerosidade, a relação que se estabelece não é entre o valor da reparação e o preço acordado, mas sim entre aquele e a vantagem que o dono de obra obtém.

4. A escolha entre a reparação dos defeitos e de substituição da coisa ou de realização de obra nova cabe ao empreiteiro. O direito a exigir uma nova realização da obra só é concedido ao dono de obra se os defeitos não forem elimináveis.

5. O facto de não se poder fruir do lar em condições de normalidade, conforto, bem estar e salubridade constitui um verdadeiro prejuízo indemnizável a título de danos não patrimoniais.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

           

A... e marido, B... , residentes na Rua (...), Cantanhede, propuseram a presente acção, então, com processo ordinário contra “C... , Lda.”, sociedade comercial com sede na Travessa (...), Cantanhede, nos termos e com os fundamentos constantes da douta petição inicial (ora aqui dados por inteiramente reproduzidos), por via dos quais impetraram a condenação da Ré a proceder à correcção (no modo referido na douta petição) dos defeitos (também devidamente descritos naquele douto articulado) existentes na moradia dos demandantes, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida nos autos, e, bem assim, a indemnizar os AA. pelos prejuízos por estes sofridos, quer patrimoniais (cujo montante remeteram para incidente de liquidação) quer não patrimoniais passados e futuros, estes em montante compensatório não inferior a € 15.000, sempre acrescidos de juros à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

No essencial, e para escorarem as suas pretensões, alegaram os AA. terem contactado com a Ré, em Abril de 2004, no sentido de esta proceder ao fornecimento e à montagem de uma estrutura e cobertura em painel Sandwich 50 mm lacado, da marca “HAIRONVILLE”, na moradia que aqueles demandantes traziam então em construção.

Ainda no decorrer da obra, surgiram consequências do que aparentava serem defeitos derivados de uma má execução dos trabalhos, defeitos, esses, reparados pela Ré e que acabaram por criar nos AA. a convicção de ficar então tudo em ordem. Só que os mesmos problemas voltaram a surgir e a Ré nunca os eliminou por completo, vindo até a ser condenada em acção intentada pelos ora demandantes, em 2009, nos Julgados de Paz de Cantanhede para através da mesma pagar a quantia despendida pelos impetrantes na dita tentativa de eliminação. E, logo após tal tentativa, novos problemas surgiram.

De acordo com os elementos fornecidos pelos AA., foi elaborado a seu pedido um parecer técnico pelo Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, no qual se identificaram diversas anomalias associadas a problemas de estanquicidade da cobertura, de funcionamento hidráulico do sistema de drenagem de águas pluviais e de incorrecta execução de alguns aspectos da cobertura inclinada em chapa perfilada. E mais se apurou um conjunto de infiltrações de água por vários pontos da cobertura, assim atingindo o interior de algumas divisões da casa.

Ora, os demandantes denunciaram os defeitos em questão por carta registada enviada à Ré em 11 de Agosto de 2009, defeitos esses que a demandada aceitou depois de realizada uma visita à casa dos demandantes e assim se propondo realizar as obras necessárias, desde que identificadas por entidade credenciada.

Só que não obstante haverem recorrido os AA. a uma empresa credível para efeito de explicitação do conjunto das anomalias em questão, não procedeu a Ré, como era sua obrigação, às reparações necessárias, assim gerando diversos danos quer de natureza patrimonial quer não patrimonial.

Concluem, face ao exposto, e perante a atitude inadimplente da Ré, dever ser a mesma condenada nos termos exactamente peticionados pelos demandantes.



Citada regularmente, a Ré contestou a acção, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Excepcionando, e em síntese, começou por referir que a existirem (e não existem) defeitos de má execução na obra, teriam sido os mesmos logo visíveis aquando da aceitação da mesma pelos AA., que inclusivamente realizaram alguns testes de carga de água e entenderam que tudo se encontrava (como de facto se encontrava) em perfeitas condições de execução. E por isso mesmo procederam os demandantes ao pagamento da obra à Ré. Assim, tendo sido o trabalho aceite sem quaisquer reservas pelos AA., inexiste responsabilidade alguma por banda da demandada.

Depois, e ainda por excepção, acrescentou a Ré que a haver eventualmente existido o direito de acção dos demandantes estaria já o mesmo caducado no momento da propositura da presente causa, para além de que foram os próprios AA. a nunca permitirem à Ré uma efectiva análise das exactas características dos supostos problemas que afectam a obra, pretendendo agora, através deste pleito, locupletar-se às custas da demandada, com uma “substancial diferença das alegadas reparações face à obra contratada”.
No mais (e nos longos termos que ora se têm por reproduzidos), referiu a contestante ter terminado a obra e procedido a algumas pequenas reparações que na altura se justificaram, não havendo agora fundamento para o pretendido pelos demandantes na presente causa. Se problema algum existe terá o mesmo que ver, muito provavelmente, com a estrutura dos tectos da casa dos AA., o que estes, todavia, nunca quiseram avaliar e confirmar de modo efectivo, recusando a proposta da Ré de realização de cortes no pladur e nas chapas dos tectos, a fim de por essa via se constatar a genuína origem do problema.
Em suma, concluiu a demandada no sentido de que se as excepções não lograrem procedência sempre deverá ser absolvida dos pedidos contra si deduzidos pelos demandantes.

            Replicando, vieram os AA. pugnar pela improcedência das excepções arrimadas pela Ré, pois que, e em síntese, nem a obra foi aceite sem reservas (sempre admitindo a demandada que as “coisas estavam mal”), nem a presente causa surge minimamente afectada por qualquer suposta caducidade, uma vez que as normas legais pertinentes ao exercício do seu direito de acção foram respeitadas (tudo nos termos que ora se dão aqui por inteiramente reproduzidos no respectivo teor).



            Com dispensa de audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e controvertida, sobre que incidiu reclamação deduzida pelos autores, que veio a ser parcialmente deferida, cf. despacho de fl.s 181 a 187.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 324 a 327, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

Após o que foi proferida a sentença de fl.s 337 a 349 v.º, na qual se decidiu o seguinte:

“Pelo exposto, julga-se a presente acção parcialmente provada e procedente e, em consequência:

- Condena-se a Ré “ C..., Lda.” a, no prazo de 90 (noventa) dias após o trânsito em julgado da presente decisão, proceder, a expensas suas, à correcção definitiva, na casa de habitação dos AA. A... e marido, B... (casa essa melhor identificada supra no ponto 1 da matéria fáctica assente desta sentença), dos defeitos identificados nos pontos 33 a 37, 40 e 44 a 54 da matéria factual provada constante da presente sentença, e segundo os termos definidos no ponto 59 dos mesmos factos assentes;

- Condena-se a Ré “ C..., Lda.” a pagar aos AA. A... e marido, B..., a título indemnizatório, a quantia a liquidar em sede de execução de sentença relativa aos danos patrimoniais aos demandantes causados, e referidos nos pontos 60 da factualidade supra assente;

- E mais se condena a Ré “ C..., Lda.” a pagar aos AA. A... e marido, B..., a título compensatório por danos não patrimoniais, o montante de € 3.500 (três mil e quinhentos euros), acrescido de juros, contados desde a presente decisão até efectivo e integral pagamento, à taxa legal;

            - Absolve-se a Ré “ C..., Lda.” do demais contra si peticionado nestes autos pelos demandantes A... e marido, B....

            Custas da acção por Ré e AA. na proporção de 3/4 e 1/4, respectivamente.”

            Inconformada com a mesma, interpôs recurso a ré, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 376), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

1.º Na Douta Sentença de que ora se Recorre verificou-se uma incorrecta apreciação da Prova pelo Tribuna a quo, conforme resulta da Ponto I do presente recurso para onde se remete, para não tornar demasiado enfadonho o presente recurso;

2.º Os AA são claramente Responsáveis pelos, eventuais, defeitos que ora existam, na medida em que;

3.º ao contrário do que resulta dado como provado na Douta Sentença de que ora se Recorre das análises efectuadas pela Ré nunca se constatou qualquer problema de humidade proveniente da cobertura, apenas tendo sido realizadas deslocações a pedido dos AA, que ditaram o levantamento da chapa cobertura, bem como a análise de todos os possíveis pontos problemáticos, o que sempre ditou a reposição e reforço dos mecanismos de estanquicidade;

4.º Não se poderá ignorar a Caducidade do Direito à Reparação por parte dos AA, na medida em que por diversas vezes é referido que os alegados defeitos da obra se vêm revelando desde finais do ano de 2004 – veja-se o Ponto 7- dos factos provados da Sentença em Recurso!!;

5.º A primeira denúncia dos defeitos é realizada em 31 de Dezembro de 2007 – veja-se o Ponto 17- dos factos provados da Sentença em Recurso, sendo renovada em 11 de Agosto de 2009 – veja-se o Ponto 55- dos factos provados da Sentença em Recurso!!;

6.º Deste modo, resulta, inequivocamente provado, que os AA levaram mais de 1 ano a denunciar os defeitos, quando, já teriam conhecimento dos mesmos no dia 1 de Dezembro de 2004!!!;

7.º Deste modo, a Douta Sentença ora em Recurso violou o disposto nos art. 1224º do CC, articulado com o art. 5º do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, tendo os mesmos Caducado!! Pelo que deveria ter sido diferente a Decisão do Tribunal a quo!!;

8.º Verifica-se, ainda, a Inadmissibilidade legal da condenação da Ré na alínea a) do Pedido dos AA, pelo que a Douta Sentença peca, pelo facto de condenar a Ré, na exacta medida do pedido dos AA, EXTRAVASANDO O LEGALMENTE ADMISSÍVEL, nos termos do disposto nos art. 1221º do CC, articulado com o art. 4º do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril;

9.º Na verdade, referem os mencionados preceitos legais que existindo defeito o dono da obra/consumidor terá direito à sua eliminação;

10.º Contudo o Tribunal a quo, VIOLANDO O DISPOSTO NOS ART. 1221º DO CC, ARTICULADO COM O ART. 4º DO DECRETO-LEI Nº 67/2003, DE 8 DE ABRIL, determina que a correcção dos defeitos seja feita nos termos determinados no ponto 59- dos factos dados como provados, ignorando, mais uma vez, que os AA não encomendaram à Ré nem a entrega, nem a colocação de qualquer “contraplacado marítimo”, nem a entrega, nem a colocação de qualquer “chapa de zinco puro no sistema de junta agrafada”;

11.º Como será bom de ver, mesmo para um leigo, o que os AA peticionaram e o Tribunal a quo errada e ilegalmente aceitou, condenando a Ré nos moldes em que o fez, foi a realização de uma obra completamente diferente da contratada pelos AA!!;

12.º Na verdade, o Tribunal a quo ignorou por completo o alerta da Ré para tal inadmissibilidade legal, aquando da sua contestação, realçando a “substancial diferença das alegadas reparações face à obra contratada”, realçado pelo segundo e terceiro parágrafos da página 20 da Douta Sentença, com o qual não poderá a Ré deixar de demonstrar a sua MAIS PROFUNDA DISCORDÂNCIA!!;

13.º Com o Doc. 7 da PI os AA propõem soluções que se afastam completamente da obra realizada e do orçamento apresentado pela Ré e aceite por aqueles!!

14.º Os AA pretenderam e contrataram com a Ré uma obra, aprovando o orçamento que os próprios AA juntam como Doc. 2 da sua PI e agora vêm pedir, com o pretexto de reparação de defeitos na obra contratada, a realização de UM TIPO DE COBERTURA COMPLETAMENTE DIFERENTE, COM MATERIAIS DIFERENTES E COM CUSTOS DIFERENTES, MUITO SUPERIORES!!

15.º Considerando-se a existência de defeitos na obra realizada pela Ré, a mesma só poderá ser condenada a proceder à reparação dos mencionados defeitos, não desvirtuando a obra que foi contratada, que servirá de critério para a intervenção a realizar para a eliminação dos alegados defeitos!! EM NADA MAIS PODERÁ SER, LEGALMENTE, CONDENADA A RÉ!!;

16.º Além do mais, não se poderá ignorar a Impossibilidade da realização da Reparação no Prazo determinado pela Sentença do Tribunal a quo;

17.º Porquanto o prazo determinado para a execução da Sentença que o mesmo se revela MANIFESTAMENTE INDADEQUADO para a eliminação dos defeitos, apenas poderá decorrer em período de Verão, período em que se verificarem menos chuvas, mais precisamente dos meses de Junho a Setembro, devendo os 90 dias ser contabilizados em tal período!!

18.º No que concerne às indemnizações arbitradas, há que referir, quanto à que já é atribuída – referente aos danos Não Patrimoniais, que a mesma, claramente excessiva, em especial se tivermos em consideração parquíssima, para não dizer nula, prova que foi efectuada!!;

19.º Sendo a indemnização arbitrada para a reparação dos danos Não Patrimoniais sofridos (e não provados!!), ainda assim, manifestamente excessiva correspondendo ao salário de mais de meio ano trabalho da generalidade dos trabalhadores portugueses!!!

20.º Não devendo ser atribuída qualquer indemnização aos AA!!

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO Com O Douto Suprimento Desse Venerando Tribunal, Deverá ser Dado Provimento à presente Apelação e consequentemente ser a Sentença totalmente alterada, sendo a Contestação Julgada Procedente e a Ré absolvida.

Vªs. Exªs. farão, como sempre, a habitual JUSTIÇA

            Contra-alegando, os autores pugnam pela manutenção da decisão recorrida, para o que apresentaram as seguintes conclusões:

A) Relativamente à alteração da resposta ao ponto 9 da matéria de facto dada como provada pela douta sentença recorrida, deve ser mantida a decisão, como se alcança do depoimento de H..., depoimento gravado no sistema integrado de gravação instalado neste Tribunal (H@bilus Média Studio) da audiência de 7/5/2012.

B) O facto dado como provado corresponde à verdade, sendo certo que a testemunha invocada pela R., como se refere na fundamentação da decisão da matéria de facto, é trabalhador da R. há 28 anos, apenas tendo estado no local umas duas vezes e partiu sempre do pressuposto de que ‘o trabalho da R. se revestido de uma ‘impecabilidade’ a toda a prova …”

C) Quanto aos pontos 22 e 23 da sentença, o depoimento citado nada releva, pois como afirma a testemunha já tudo estava feito. Só que não foi capaz de confirmar a data que lhe foi indicada, nem aquela em que se deslocou ao local, que constavam de documento escrito, pelo que não deve ser alterada a resposta nestes pontos da decisão da matéria de facto.

D) Quanto aos factos dos pontos 40 e 41, a inexistência e a essencialidade dos remates metálicos de fecho, resulta do relatório técnico junto aos autos, onde se escreve na pág. 8 “Na situação em análise verificou-se a inexistência da colocação do remate metálico de fecho na parte inferior do painel, conforme se indica na Figura 10, cujo objectivo é impedir a entrada e absorção de água da chuva através do polietileno existente na chapa, o que provoca a sua deterioração e a respectiva perda de capacidade de isolante térmico (Figura 9)”.

E) Tal opinião foi confirmada pelos autores desse relatório, D...e E..., professores universitários na Universidade de Aveiro nos seus depoimentos gravados no sistema integrado de gravação instalado neste Tribunal (H@bilus Média Studio) da audiência de 7/5/2012

F) Quanto aos pontos 42 e 45, existe a prova dos depoimentos prestados pelas testemunhas D...e E..., professores universitários na Universidade de Aveiro nos seus depoimentos gravados no sistema integrado de gravação instalado neste Tribunal (H@bilus Média Studio) da audiência de 7/5/2012.

G) Não sendo possível a observação directa, aquelas testemunhas concluíram pela inexistência das juntas de recobrimento pela falta de abas exteriores que sempre as acompanham e pelas consequências que dessa inexistência resultam.

H) Devem assim manter-se as respostas dadas, por se alicerçarem numa convicção fundamentada do julgador.

I) Quanto ao ponto 58, a impugnação que é feita pela R., apenas resulta de uma versão deturpada dos documentos juntos, que o julgador interpretou, formando a sua convicção que fundamentou na decisão proferida.

J) Termos em que deve ser mantida a decisão da matéria de facto proferida nos presentes autos, pois a argumentação da R. se sustenta apenas no depoimento do seu empregado M..., o qual naturalmente e de forma que o tribunal considerou pouco credível defendeu os seus patrões.

K) Contra ele, tem o relatório dos técnicos (professores universitários) da Universidade de Aveiro, D...e E..., professores do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, o depoimento da testemunha F..., perito averiguador da empresa que presta serviço para a seguradora “ G..., S.A.” (demandada pelos ora AA. no processo que correu termos nos Julgados de Paz de Cantanhede) e os depoimentos de H... e I..., representantes legais, respectivamente, das empresas “ J..., Lda.” e “ L..., Lda.”, que trabalharam na obra de edificação da casa de habitação dos demandantes, e puderam, por experiência própria, perceber alguns aspectos relacionados com a colocação da cobertura no prédio, pelo que improcede assim a conclusão 1 da recorrente.

L) Nas suas alegações e baseando-se no depoimento do seu empregado M..., pretende ver introduzida uma nova questão no processo, sem que indique em que factos dados como provados, se alicerça o seu entendimento, sendo certo que não pode o tribunal alterar a decisão da matéria de facto, porquanto a R. não cumpre o disposto no artº. 685º.-B do anterior Cod. Proc. Civil, hoje o artº. 640º. do Cod. Proc. Civil, pelo que face à matéria provada, completamente destituída de fundamento, improcedem as conclusões 2, 3 e 4 das alegações da recorrente.

M) Como bem anota a sentença recorrida, não pode haver caducidade, porquanto não está alegado, nem provado que tenha havido “uma aceitação da obra sem reserva por banda dos demandantes”, pressuposto este da aplicação do artº. 1224º. do Cod. Civil.

N) Da matéria dada como provada resulta que a R. foi sempre aceitando a sua responsabilidade, como resulta claro dos factos 7 (primeira referência e ainda em obra a 7/12/2004), 11 (com a R. a aceitar resolver o assunto), 16 (nova deslocação da R. a casa dos AA), 17 (nova denúncia de defeitos), 18 (deslocação da R. na sequência da denúncia anterior), 19 (participação da R. à sua seguradora), 23 (a R. já nem se deslocava ao local para averiguar dos defeitos), 30 (em 22 de Dezembro de 2008, a pedido dos AA., a Ré procedeu à colocação de mástique em pontos de fixação dos painéis de cobertura), 31 (novamente aprecem os defeitos em Janeiro de 2009), altura em que os AA. se decidem a pedir um parecer externo, porque a R. não tinha capacidade para resolver o problema, conforme facto 32.

O) Na sequência desse parecer, ficaram a saber exactamente os AA. os defeitos que a construção da sua casa apresentava e que não eram nenhum dos anteriores, pois estes resolveram-se com mástique e aqui há que revolver toda a estrutura.

P) Tendo os AA. enviado à Ré, em 11 de Agosto de 2009, uma carta na qual lhe deram conhecimento dos defeitos surgidos ou manifestados em Janeiro de 2009 (facto 55 da sentença recorrida), respeitaram o ditame temporal previsto no n.° 2 do art. 5°-A D.L. n.° 67/2003, sendo a partir desse envio, ocorrido também dentro do prazo de cinco anos previsto no n.° 1 do art. 5 do mesmo D.L. n.º 67/2003, que se conta o prazo de propositura tempestiva da presente acção, a qual ocorreu em 11 de Fevereiro de 2010.

Q) A presente acção foi proposta tempestivamente e não caducou o direito dos ora AA. exigirem a reparação dos defeitos detectados, improcedendo as conclusões 4, 5, 6 e 7 das alegações da recorrente.

R) Pretende a R. que ao ordenar que a reparação se faça com recurso à solução preconizada pelos autores do relatório junto com a petição inicial consubstancia uma condenação em pedido formulado pelos AA., mas sem suporte legal, mas isso não acontece, pois a reparação dos defeitos não tem de ser feita por meio de “xanatos”, mas deve ser feita de forma global para que possa resultar efectivamente construída a obra, de modo a satisfazer as necessidades de habitação, para que foi projectada e licenciada.

S) Face ao estudo técnico que foi elaborado a melhor, mais eficaz e adequada forma de reparação da casa dos AA. para a reconduzir ao fim a que a mesma se destina é a sua reparação nos termos pedidos pelos AA. e objecto da condenação pelos RR., pelo que, nada tem de ilegal essa condenação, a qual só existe porque a R. foi incompetente na construção inicial, improcedendo as conclusões 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 das alegações da recorrente.

T) A sentença tem de fixar um prazo para a realização das obras em que a R. foi condenada, mas nada garante aos autores que a R., qualquer que seja o prazo ou o momento fixado pelo Tribunal, as venha a realizar, pelo que lhes é indiferente que o prazo seja de 60 ou 90 dias, sendo naturalmente desejável que as obras se realizem a partir de Abril/Maio, desde que as obras sejam realizadas.

U) Quanto às indemnizações fixadas, é evidente, desde logo, que o prédio dos AA. se desvaloriza com estas obras frequentes, deteriorando-se com as sucessivas intervenções de que tem sido alvo, pelo que se acompanha a fundamentação da sentença recorrida quanto aos danos patrimoniais e não patrimoniais, que os AA. subscrevem.

V) Chamam os ora recorridos a atenção para o facto de terem a sua casa construída há quase 10 anos e nunca a terem podido gozar em paz, por causa dos problemas objecto dos presentes autos, sendo disso prova eloquente o que consta dos factos 61, 62, 63 e 64, pelo que improcedem as conclusões 18, 19 e 20 das alegações da recorrente.

Pelo exposto, deve ser negado provimento ao presente recurso e mantendo-se na íntegra a douta e bem elaborada sentença ora recorrida, cumprir-se-á o direito e far-se-á JUSTIÇA!     

Colhidos os vistos legais, há que decidir.        

            Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado no artigo 635, n.º 4 do nCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir:

            A. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada, relativamente aos itens 9.º, 22.º e 23.º, 40.º a 42.º, 45.º e 58.º, dos factos dados como provados na sentença recorrida;

B. Se existem os alegados defeitos de construção imputáveis à ré;

            C. Caducidade do direito a que se arrogam os autores;

            D. Se é legalmente inadmissível a condenação da ré na alínea A) do pedido formulado pelos autores;

            E. Impossibilidade da realização da reparação no prazo determinado na sentença recorrida e;

            F. Se deve ser atribuída aos autores a peticionada indemnização a título de danos não patrimoniais e, assim sendo, qual o respectivo montante.

            É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida:

1 – pela “Ap. 9, de 2002/09/11” encontra-se registada, a favor dos AA., a aquisição do prédio urbano composto de casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar, sita no lugar de (...), concelho de Cantanhede, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cantanhede sob o n.º (...)/290703 (documento de fls. 14 e 16 dos presentes autos, ora dado por inteiramente reproduzido no respectivo teor);

2 – a Ré é uma sociedade comercial que se dedica a fazer portões, gradeamentos, estruturas metálicas, serviços de inox e latão, varandas e escadas em caracol e caleiras em chapa zincada;

3 – os demandantes, pretendendo aplicar na moradia referida no ponto 1 (dos presentes factos assentes) uma estrutura e cobertura em painel de tipo Sandwich 50 mm lacado, da marca “HAIRONVILLE”, dirigiram-se à Ré para solicitar um orçamento para a sua obra;

4 – em 20 de Abril de 2004 foi apresentado pela Ré à A. o orçamento com o teor de fls. 17 e 18 dos presentes autos (ora dado por inteiramente reproduzido), o qual foi aceite posteriormente pelos AA.;

5 – a obra mencionada no ponto 3 (dos presentes factos provados) foi terminada em finais de Novembro de 2004;

6 – a entrega da obra pela Ré aos demandantes ocorreu em finais de 2004;

            7 – no dia 1 de Dezembro de 2004 choveu e começaram a verificar-se as primeiras infiltrações;

8 – para testar o bom funcionamento de toda a obra efectuada pela Ré, o demandante marido canalizou, por sua iniciativa, um tubo de duas polegadas, acoplado a um motor de água, para a cobertura da sua habitação, bombeando para a mesma água em alta pressão, durante vários minutos;

9 – aquando do aludido no ponto 8 (da presente factualidade provada), verificou-se a queda de grandes quantidades de água no interior da habitação referida no ponto 1 (desta mesma matéria fáctica assente);

10 – em consequência, a empresa que aplicava o pladur não pôde iniciar o seu trabalho na data prevista e teve que aguardar que tudo secasse e que a Ré tentasse resolver o problema;

            11 – a demandada resolveu o problema de forma provisória mediante a aplicação de mástique e coliveda;

12 – os materiais ditos no ponto 11 (da presente factualidade provada) revelavam-se eficazes no Inverno mas ressequiam no Verão, e já não vedavam no Inverno seguinte;

13 – o mencionado no ponto 8 (da presente factualidade provada) ocorreu em 2 de Dezembro de 2004;

14 – a Ré foi avisada no dia 2 de Dezembro de 2004, tendo procedido a uma análise no dia 8 do mesmo mês;

15 – AA. e Ré encerraram as contas em Fevereiro de 2006, tendo o A. marido emitido um cheque, que entregou à Ré, no valor de € 1.103,60;

16 – em 20 de Outubro de 2007, a Ré deslocou-se a casa dos demandantes em virtude de ter sido alertada por estes mesmos demandantes para eventuais problemas de humidade;

17 – os AA. enviaram à Ré uma carta datada de 31 de Dezembro de 2007, a dar conta de defeitos de construção;

18 – em Fevereiro de 2008 a Ré deslocou-se a casa dos AA., constatando humidades no tecto;

19 – a demandada participou os defeitos à “ G..., S.A.”;

20 – na sequência da aludida participação, a “ G..., S.A.” procedeu à realização de peritagem, levada a cabo na moradia referida no ponto 1 (da presente factualidade assente);

21 – em finais do primeiro trimestre do ano de 2008 os demandantes procederam à substituição do pladur dos tectos da habitação identificada no ponto 1 (dos presentes factos provados);

22 – na ocasião referida no ponto 21 (da presente factualidade provada) (altura em que a obra da Ré já estava terminada), a área da casa dita no ponto 1 (destes factos assentes) ficou aberta por dois dias, para que alguém da Ré pudesse verificar o que entendesse;

23 – ninguém da Ré se deslocou à casa aludida no ponto 1 (da presente factualidade provada), pelo que foi dada continuidade aos trabalhos, com a substituição do gesso cartonado e consequente fecho do tecto;

24 – a substituição do pladur dos tectos da moradia mencionada no ponto 1 (desta factualidade assente) foi orçada na quantia de € 6.504;

25 – no dia 17 de Março de 2008 foi emitido o recibo do mencionado no ponto 24 (destes factos provados);

26 – foi transmitido ao pai da A., no dia 17 de Março de 2008, que fora emitido a favor dos demandantes um recibo no valor de € 6.504;

27 – no dia 17 de Março de 2008 os demandantes entraram em contacto com a Ré, dando-lhe a conhecer o referido no ponto 25 (da presente factualidade assente);

28 – a Ré entregou aos demandantes € 2.500 por conta do valor mencionado no ponto 24 (destes factos provados);

29 – correu termos, com o n.º 80/2009-JP, nos Julgados de Paz de Cantanhede, acção intentada pelos ora também demandantes contra a ora Ré, tendo sido proferida, em 28 de Julho de 2009, sentença que, no essencial, decidiu pela condenação da ora Ré a pagar aos ora demandantes a quantia de € 4.004 (e juros vencidos, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento), correspondente à diferença entre o valor aludido no ponto 24 e o valor mencionado no ponto 28 (ambos dos presentes factos provados) (documento de fls. 19 a 28 dos presentes autos, ora dado por inteiramente reproduzido no respectivo teor);

30 – em 22 de Dezembro de 2008, a pedido dos AA., a Ré procedeu à colocação de mástique em pontos de fixação dos painéis de cobertura;

31 – apesar do mencionado no ponto 30 (da presente factualidade provada), as infiltrações persistiram em Janeiro de 2009;

32 – em Março de 2009 foi solicitado pelos ora AA. um parecer técnico ao Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, com o teor de fls. 29 a 45 dos presentes autos (ora dado por inteiramente reproduzido);

33 – na moradia referida no ponto 1 (destes factos provados), na sequência dos trabalhos realizados pela Ré, manifestaram-se anomalias associadas a problemas de estanquicidade da cobertura e de funcionamento hidráulico do sistema de drenagem de águas pluviais, devidos à incorrecta execução de aspectos da cobertura inclinada em chapa perfilada;

34 – a moradia aludida no ponto 1 (da presente factualidade assente) sofreu sucessivas infiltrações de água pela cobertura, no quarto dos brinquedos, no quarto de hóspedes, no quarto de casal, na instalação sanitária localizada no primeiro piso, e ainda na garagem e nos arrumos do rés-do-chão;

35 – os pontos de infiltração localizam-se nas zonas das caleiras e nos tubos de queda, e também nas ligações com as platibandas e a cumeeira, que provocaram estragos no quarto principal e na zona do quarto-de-banho (cumeeira);

36 – em consequência das infiltrações verificou-se o empolamento dos tectos dos quartos de brinquedos, deteriorações do tecto falso suspenso, paredes e pavimentos, da garagem, dos quartos e da instalação sanitária superior da habitação;

37 – em consequência das infiltrações verificou-se também o aparecimento de manchas nas paredes e nos tectos;

38 – o referido nos pontos 33 a 37 (destes factos assentes) deveu-se à ausência de cuidados na execução dos trabalhos por parte da Ré;

39 – na fixação e cálculo de inclinação, a demandada não seguiu as normas e as recomendações técnicas da “HAIRONVILLE”;

40 – inexiste a colocação do remate metálico de fecho na parte interior do painel, perdendo assim toda a sua capacidade de isolante térmico;

41 – a colocação do remate metálico de fecho na parte interior do painel é essencial para que obstrua a entrada e absorção de água da chuva através do polietileno existente na chapa;

42 – a Ré não aplicou as juntas de recobrimento em toda a linha longitudinal dos painéis;

43 – as juntas impedem e minimizam as infiltrações através desta zona de emenda e sobreposição;

44 – o aludido no ponto 42 (destes factos provados) conduz ao levantamento das  chapas de revestimento da cobertura na zona de sobreposição longitudinal;

45 – a Ré não aplicou as juntas de estanquicidade e isolamento complementar da cumeeira;

46 – as juntas de estanquicidade e isolamento complementar são essenciais para evitar e diminuir a probabilidade de ocorrência de infiltrações;

47 – verificam-se incorrecções na execução das rufagens dos muretes e chaminés;

48 – as zonas de rufagem apresentam descontinuidades com ausência de protecção de elementos de sobreposição;

49 – o remate de extremidade da cobertura apresenta emendas com sobreposição inexistente (ou insuficiente), posteriormente cobertas com silicone;

50 – a pendente das caleiras (sistema de drenagem das águas pluviais) é nula ou varia ente os 0% e 1%, no sentido contrário ao do escoamento para o tubo de queda e, transversalmente, para o interior da cobertura;

51 – o escoamento das águas pluviais dá-se em sentido contrário, ou seja, as águas escoam para dentro da cobertura e dos vãos;

52 – a Ré colocou tubos de queda de 0,75 mm de diâmetro;

53 – os tubos de queda existentes na moradia mencionada no ponto 1 (desta factualidade provada) deveriam ter um diâmetro maior;

54 – a inclinação inversa das caleiras, conjuntamente com a insuficiência da capacidade de drenagem dos tubos de queda, levam à acumulação de água nas caleiras e ao consequente extravasamento para o interior da cobertura e dos compartimentos subjacentes;

55 – os demandantes deram conhecimento à Ré dos defeitos, por carta registada, enviada em 11 de Agosto de 2009;

56 – a Ré enviou aos AA. a carta datada de 15 de Setembro de 2009, com o teor de fls. 46 e 47 dos presentes autos (e que ora se dá por inteiramente reproduzido);

57 – a Ré, após visita à casa dos demandantes, remeteu a estes a carta, datada de 16 de Novembro de 2009, e pelos mesmos AA. recebida, cuja cópia consta de fls. 48 dos presentes autos (dando-se o respectivo teor por reproduzido);

58 – após o referido no ponto 57 (destes factos provados), a Ré informou os AA. de que assumiria os custos relativos à má reparação dos danos decorrentes da má aplicação da estrutura;

59 – pela sociedade “ O..., Lda.”, a solicitação dos AA., foram descritas as reparações a fazer, e que são as seguintes: a) aplicação, por cima do painel existente, de painéis de “contraplacado marítimo”, bem como nas caleiras, referindo que este trabalho deve ser executado por uma empresa especializada, que indique a espessura adequada, que permita que não existam deformações do referido material, e que seja capaz de aguentar o peso dos trabalhadores que executaram os trabalhos futuros, devendo ainda, nas caleiras, as pendentes correctas para uma evacuação das águas pluviais serem dadas também com a aplicação do “contraplacado marítimo”; b) devem ser removidos os rufos do cume bem como os dos muretes; c) depois da execução destes trabalhos terá de ser aplicada uma cobertura em chapa de zinco puro no sistema de junta agrafada, que permita a 100% o estanque da cobertura; d) mais se recomendou que a execução destes trabalhos seja feita em pleno Verão para não se correr o risco de estar sujeito às condições climatéricas (documento cuja cópia consta de fls. 48 dos presentes autos, dando-se o respectivo teor por reproduzido);

60 – a moradia aludida no ponto 1 (destes factos provados) está em constante desvalorização e degradação à medida que o tempo passa, sem que os defeitos e danos sejam efectivamente reparados, danificando o edifício e as suas estruturas essenciais, para além dos objectos nele existentes;

61 – os demandantes não conseguem usufruir integralmente da moradia referida no ponto 1 (da presente matéria factual assente);

62 – a humidade, as manchas e os odores em quase todas as divisões da casa causam incómodos aos AA.;

63 – os demandantes vivem em estado de agastamento psicológico, com receio pela sua saúde;

64 – os AA. não conseguem ter conforto na moradia mencionada no ponto 1 (destes factos aprovados);

65 – a presente acção foi proposta em 11 de Fevereiro de 2010.

A. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da prova gravada – relativamente aos itens 9.º, 22.º e 23.º, 40.º a 42.º, 45.º e 58.º, dos factos dados como provados na sentença recorrida.

Alega a ré que o Tribunal incorreu em erro de julgamento ao dar como provados os factos constantes dos quesitos ora em referência, devendo, na sua óptica, os mesmos serem dados como não provados, estribando-se, para tal, nos depoimentos das testemunhas M... e H... e no teor do que designa por “Parecer Técnico”, junto nos autos.

Por seu turno, os autores, pugnam pela manutenção das respostas que originaram a demonstração de tais itens, baseando-se para tal, nos depoimentos das testemunhas H..., D..., E..., F... e I..., bem como no “relatório técnico” junto aos autos.

            Posto isto, e em tese geral, convém, desde já, deixar algumas notas acerca da produção da prova e definir os contornos em que a mesma deve ser apreciada em 2.ª instância.

Toda e qualquer decisão judicial em matéria de facto, como operação de reconstituição de factos ou acontecimento delituoso imputado a uma pessoa ou entidade, esta através dos seus representantes, dependente está da prova que em audiência pública, sob os princípios da investigação oficiosa (nos limites e termos em que esta é permitida ao julgador) e da verdade material, se processa e produz, bem como do juízo apreciativo que sobre a mesma recai por parte do julgador, nos moldes definidos nos artigos 653, n.º 2 e 655, n.º 1, CPC – as já supra mencionadas regras da experiência e o princípio da livre convicção.

Submetidas ao crivo do contraditório, as provas são pois elemento determinante da decisão de facto.

Ora, o valor da prova, isto é, a sua relevância enquanto elemento reconstituinte dos factos em apreço, depende fundamentalmente da sua credibilidade, ou seja, da sua idoneidade e autenticidade.

Por outro lado, certo é que o juízo de credibilidade da prova por declarações, depende essencialmente do carácter e probidade moral de quem as presta, sendo que tais atributos e qualidades, como regra, não são apreensíveis mediante o exame e análise das peças ou textos processuais onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim através do contacto directo com as pessoas, razão pela qual o tribunal de recurso, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo formulado pelo tribunal recorrido.

Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador, mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de experiência”.

Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido, mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.

Não se pode olvidar que existe uma incomensurável diferença entre a apreciação da prova em primeira instância e a efectuada em tribunal de recurso, ainda que com base nas transcrições dos depoimentos prestados, a qual, como é óbvio, decorre de que só quem o observa se pode aperceber da forma como o testemunho é produzido, cuja sensibilidade se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e observação directa dos comportamentos objectivados no momento em que tal depoimento é prestado, o que tudo só se logra obter através do princípio da imediação considerado este como a relação de proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes de modo a que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da decisão.

As consequências concretas da aceitação de tal princípio definem o núcleo essencial do acto de julgar em que emerge o senso; a maturidade e a própria cultura daquele sobre quem recai tal responsabilidade. Estamos em crer que quando a opção do julgador se centre em elementos directamente interligados com o princípio da imediação (v. g. quando o julgador refere não foram (ou foram) convincentes num determinado sentido) o tribunal de recurso não tem grandes possibilidades de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.

Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, reacções imediatas, o contexto em que é prestado o depoimento e o ambiente gerado em torno de quem o presta, não sendo, ainda, despiciendo, o próprio modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo isso contribuindo para a convicção do julgador.

A comunicação vai muito para além das palavras e mesmo estas devem ser valoradas no contexto da mensagem em que se inserem, pois como informa Lair Ribeiro, as pesquisas neurolinguísticas numa situação de comunicação apenas 7% da capacidade de influência é exercida através da palavra sendo que o tom de voz e a fisiologia, que é a postura corporal dos interlocutores, representam, respectivamente, 38% e 55% desse poder - “Comunicação Global, Lisboa, 1998, pág. 14.

Já Enriço Altavilla, in Psicologia Judiciaria, vol. II, Coimbra, 3.ª edição, pág. 12, refere que “o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras”.

Então, perguntar-se-á, qual o papel do tribunal de recurso no controle da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento?

Este tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso, admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da imediação.

Tudo isto, sem prejuízo, como acima já referido, de o Tribunal de recurso, adquirir diferente (e própria) convicção (sendo este o papel do Tribunal da Relação, ao reapreciar a matéria de facto e não apenas o de um mero controle formal da motivação efectuada em 1.ª instância – cf. Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 2011, in CJ, STJ, ano XIX, tomo I/2011, a pág. 76 e seg.s e de 30/05/2013, Processo 253/05.7.TBBRG.G1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.

Tendo por base tais asserções, dado que se procedeu à gravação da prova produzida, passemos, então, à reapreciação da matéria de facto em causa, a fim de averiguar se a mesma é de manter ou de alterar, em conformidade com o disposto no artigo 662, do nCPC., pelo que, nos termos expostos, nos compete apurar da razoabilidade da convicção probatória do tribunal de 1.ª instância, face aos elementos de prova considerados (sem prejuízo, como acima referido de, com base neles, formarmos a nossa própria convicção).

Vejamos, então, as respostas postas em causa pela ora recorrente, nas respectivas alegações de recurso.

A matéria constante dos itens em referência, encontra-se vertida nos quesitos 46.º e 79.º (item 9.º); 89.º (item 22.º); 90.º (item 23.º); 16.º (item 40.º); 17.º (item 41.º); 18.º (item 42.º); 21.º (item 45.º) e 83.º (item 58.º).

Alteração das respostas dadas aos quesitos 46.º, 79.º, 89.º, 90.º, 16.º, 17.º, 18.º, 21.º e 83.º, da base instrutória.

           

Para melhor esclarecimento e facilitar a decisão desta questão, passa-se a transcrever o teor de tais quesitos:

“16.

Inexiste a colocação do remate metálico de fecho na parte interior do painel, perdendo assim toda a sua capacidade de isolante térmico?

17.

 A colocação do remate metálico de fecho na parte interior do painel é essencial para que obstrua a entrada e absorção de água da chuva através do polietileno existente na chapa?

18.

 A ré não aplicou as juntas de recobrimento em toda a linha longitudinal dos painéis?

21.

 A ré não aplicou as juntas de estanquidade e isolamento complementar da cumeeira?

46.

 O referido em H) permitiu aos autores verificar que tudo estava operacional?

79.

 Aquando do referido em H), verificou-se a queda de grandes quantidades de água no interior da habitação referida em A)?

83.

 Após o referido em 43. a ré informou os autores que assumiria os custos decorrentes da má reparação dos danos decorrentes da má aplicação da estrutura?

89.

 Quando terminou a obra, a área da casa referida em A) ficou aberta por dois dias para que alguém da ré pudesse verificar o que entendesse?

90.

 Ninguém se deslocou à casa referida em A) pelo que foi dada continuidade aos trabalhos, com a substituição do gesso cartonado e consequente fecho do tecto?”.

Como consta de fl.s 324 e v.º, o M.mo Juiz deu-lhes as seguintes respostas:

Quesitos 16.º a 18.º, 21.º, 79.º, 83.º, 89.º e 90.º: Provado.

Quesito 46.º: Não Provado.

Motivou tais respostas da seguinte forma (cf. fl.s 324 v.º a 327):

“O Tribunal alicerçou a sua convicção no conjunto da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, analisada crítica e conjugadamente, à luz das regras da normal experiência da vida [ou seja, das «(…) definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentes do caso concreto sub judicio, assentes na experiência comum, e por isso independentes dos casos individuais em cuja observação se alicerçam, mas para além dos quais têm validade» – Prof. Manuel Cavaleiro de Ferreira, “Curso de processo penal”, volume II, Lisboa, 1988, pág. 30, a propósito da área processual penal mas cuja homologia de razões para o processo civil parecerá, crê-se, bastante evidente].

Ora, antes do mais, importa dizer que estamos perante uma causa claramente marcada por uma certa delicadeza na apreensão de parte da respectiva matéria factual, a saber, os contornos técnicos mais relevantes do modo como o telhado montado pela Ré na casa de habitação dos AA. se mostrou, ao longo dos tempos, inidóneo ao cumprimento de algumas das suas funções mais lídimas (sendo a primeira e mais evidente das quais, segundo se crê, a respectiva estanquicidade…).

Aliás, a este propósito cumprirá fazer uma pequena observação acerca da natureza própria da apreciação probatória. Assim, não se torna despicienda a ideia de que a verdade judicial não é (nem pode ser) uma verdade “absoluta”, no sentido de uma verdade “ontologicamente” indestrutível. A verdade judicial alicerça-se em factos alcançados – e alcançáveis – através da interpretação e depuração dos diversos elementos probatórios produzidos e analisados em audiência de julgamento (quando a mesma ocorra) ou relativamente aos quais as partes estão de acordo quanto à significação e valoração próprias. A convicção do julgador baseia-se, pois, em tal conjunto de elementos, mediante a produção do dito juízo de verosimilhança, a que as normais regras da experiência comum não poderão ser alheias.

Voltando então ao nosso caso, e tomando todo o acabado de expor em conta, teremos de dizer que a maior parte das respostas à questão acima focada – qual a (in)aptidão da cobertura fornecida e aplicada pela Ré na casa de habitação dos demandantes – foi dada, em termos de convicção do Tribunal, a partir de dois depoimentos que, não obstante a tecnicidade dos pontos focados, se mostraram claros, pedagógicos e em si mesmos coerentes. Referimo-nos, claramente, aos depoimentos das testemunhas D...e E..., ambos engenheiros civis e professores do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, que, a pedido dos demandantes, se deslocaram a casa destes, estudaram e analisaram a parte exterior e interior e (para o que mais releva) a respectiva cobertura e suas características (de concepção, aplicação e funcionamento), vertendo depois no “Parecer técnico” junto de fls. 227 a 243 dos presentes autos as suas ideias fundamentais sobre a matéria. Ora, pela sua clareza e pendor pedagógico, o conteúdo do dito “Parecer técnico” assumiu-se como um elemento nuclear para a percepção daquilo que se refere aos aspectos “visíveis” e técnicos da obra (a isso, aliás, se reportando igualmente as cópias de fotografias em tal “Parecer técnico” insertas). E com conclusões essenciais bastante importantes (devidamente sustentadas nas premissas técnicas e fácticas de que partiram e fizeram também constar no apontado trabalho): «das anomalias observadas conclui-se que têm origem: na deficiente drenagem de águas pluviais, decorrente da incorrecta pendente dada às caleiras o que provoca a acumulação de água da chuva para o interior da cobertura, que em situações de forte pluviosidade leva ao extravasamento da água para o interior da habitação; na colocação de tubos de queda com diâmetro insuficiente; na incorrecta execução das rufagens de pontos singulares da cobertura, especialmente em elementos emergentes; na insuficiente sobreposição de rufos e insuficiente desenvolvimento de abas de caleiras sob o painel de revestimento; na inexistência de chapas de remate no topo dos painéis sobre as caleiras e destas sob os painéis, e na possível inexistência de isolamentos complementares (…)», por forma a concluir-se «(…) pela urgente necessidade de intervenção global nas coberturas do corpo da habitação principal bem como na da garagem, dada a localização das infiltrações (nas zonas de acumulação de água devido à pendente longitudinal e transversal invertida das caleiras e junto à zona de escoamento dos tubos de queda), que deverá incidir na respectiva correcção de pendentes (0,5% no sentido do tubo de queda e no sentido transversal para fora da cobertura), e pela substituição dos tubos de queda indicados por T.Q.1 e T.Q.2 por tubos de queda de diâmetro de 90 mm. Adicionalmente, deve-se averiguar a estanquidade de todas as ligações que se encontram masticadas, nomeadamente nas zonas de rufagem com as paredes/muretes emergentes nas zonas de cumeeira e verificar a estanquidade das zonas de fixação da cumeeira com as vertentes inclinadas» (fls. 241 e 242 dos presentes autos). Já em audiência, as aludidas testemunhas foram firmes a referir que o principal problema da cobertura em questão (leia-se, “da casa de habitação dos AA.”) é o da inclinação das caleiras: em vez de se verificar tal inclinação para o exterior ocorre, antes, para o interior, faltando-lhe, depois, inclinação bastante para um eficaz e dinâmico escoamento das águas pluviais; não havendo capacidade para o extravasamento das águas, gera-se a acumulação das mesmas na cobertura e o subsequente (e decorrente) aparecimento de infiltrações (com especial incidência verificada em alguns dos quartos do primeiro andar). Apesar de não terem levantado a cobertura aquando da sua visita técnica à casa de habitação dos demandantes, as testemunhas – conforme referiram igualmente em audiência de julgamento – ficaram inteiradas da origem dos problemas de infiltrações, escorrências e falta de impermeabilização verificadas: claramente, e na sua opinião, a inobservância, aquando da montagem da cobertura, das normas técnicas adequadas postuladas pela fabricante “HAIRONVILLE”. Por seu turno, a testemunha E... foi ainda particularmente enfática a apontar a utilização excessiva de mástique, que viu no local, como suposta tentativa de resolução dos problemas entre os diversos painéis colocadas, e as juntas (ou seja, algo de bem diverso do sistema, que deveria verificar-se, de sobreposição do telhado, com um painel de remate).    

Em complemento com o que acaba de ser mencionado não podemos deixar também de referir a deslocação ao local, maxime à concreta zona do telhado do imóvel em questão (cfr. acta de audiência de fls. 266 e 267 dos autos) e o que esta diligência permitiu alcançar em termos de “confrontação” parcial com uma realidade que, de outro modo, apenas através de fotografias e descrições escritas poderia ser alcançada. Com efeito, a ida do Tribunal ao local, acompanhado das duas referidas testemunhas D...e E..., permitiu a constatação da globalidade dos trabalhos efectuados e qualidade dos mesmos (embora sempre com a consciência de que tal deslocação ocorreu em uma fase de afastamento temporal em relação ao momento da efectiva manifestação – maxime, em termos de infiltrações de água e humidades – das primeiras anomalias perceptíveis no prédio em causa; no entanto, crê-se igualmente que as fotografias obtidas na referida deslocação ao local e entretanto juntas aos autos, de fls. 268 a 299, são bons elementos de aporte quanto ao estado de coisas ali verificado).

Depois, considerou também o Tribunal o depoimento da testemunha F..., perito averiguador da empresa que presta serviço para a seguradora “ G..., S.A.” (demandada pelos ora AA. no processo que correu termos nos Julgados de Paz de Cantanhede – cfr. fls. 19 a 28 dos autos), e que, apelando à sua memória, falou da percepção que guarda da visita profissional que efectuou a casa dos ora AA., a fim de apreciar o estado da mesma em consequência das humidades por que foi sendo acometida. Recordou, pois, nesta sede, os danos ocorridos no interior do prédio (essencialmente no tecto e nas paredes), a partir (et pour cause) das águas que vinham da cobertura.

Mostraram-se também relevantes as contribuições testemunhais de H... e I..., representantes legais, respectivamente, das empresas “ J..., Lda.” e “ L..., Lda.”, que trabalharam na obra de edificação da casa de habitação dos demandantes, e puderam, por experiência própria, perceber alguns aspectos relacionados com a colocação da cobertura no prédio. A “ J..., Lda.” tratou da execução das pinturas interiores e exteriores, dos rebocos e das tijoleiras, referindo a testemunha H... ter havido a necessidade, talvez em 2005 ou 2006 – isto é, bem depois de ter já executado a sua tarefa contratada com os AA. – de se deslocarem de novo os seus homens ao local, a fim de procederem a uma nova pintura (a expensas dos AA.) de diversos quartos do primeiro andar, notoriamente afectados por várias manchas e focos de humidade (e humidade essa que, na opinião da testemunha, não poderia ser seguramente estancada pela placa de lã de rocha existente entre os tectos de pladur e a cobertura, nos casos em que a cobertura se encontra deficientemente aplicada, pois que a lã de rocha apenas atrasa as escorrências, não as impede…), tudo causando nos demandantes óbvio mal-estar e agastamento emocional. Já I... falou dos trabalhos efectuados pela “ L..., Lda.”, a saber, de aplicação do gesso inicial e dos tectos falsos no interior do prédio. Para além de prestar alguns esclarecimentos acerca da “mecânica” do pladur, essencialmente nos tectos falsos, referiu que após a fase normal do trabalho contratado com os AA. (fase essa ocorrida em 2004 ou 2005), foi uns anos mais tarde chamado a casa dos demandantes por causa das infiltrações, surgidas a partir da cobertura (tendo efectuado, em 2009, uma intervenção de alguma monta, questão que “metera” até o surgimento de uma seguradora – sem dúvida o problema tratado na acção a que acima se fez referência e correu os seus termos nos Julgados de Paz de Cantanhede), infiltrações essas que afectaram não só os tectos falsos mas também a lã de rocha inerente, e até mesmo, em alguns casos, as próprias paredes interiores.

Por fim, N... é o pai da A. e frequentador habitual da casa dos demandantes, falando essencialmente do depósito de um cheque (de € 2.500, segundo recordou) por si efectuado a pedido de sua filha, e que admitiu ter que ver com a assunção de responsabilidade em tempos operada pela ora Ré, a propósito de alguns danos ocorridos no imóvel dos AA..

Já M... é trabalhador da Ré há cerca de 28 anos e esteve em casa dos demandantes umas duas vezes. Referiu que em uma das ocasiões, em Outubro de 2007, assinou a declaração cuja cópia consta de fls. 254 dos autos, elaborada pela A., o que, todavia, e segundo a testemunha, não obnubilará um aspecto importante: a de que o trabalho efectuado pela Ré se terá revestido de uma “impecabilidade” a toda a prova…, sobretudo porque quando averiguou do estado da chapa da cobertura nunca se apercebeu de que houvesse humidade alguma, nem sequer a afectar a lã de rocha… nem os tectos de pladur (apesar de, como veio a admitir um pouco mais à frente no seu depoimento, nem haver estado no interior da casa…). Na sua tese, os problemas de infiltrações, a existirem, só poderão ser explicados por uma fissura detectada entre a tijoleira, perto da cobertura, mas que mereceu a colocação de uma membrana protectora (aliás, como na zona das chaminés)…

Ora, in casu, e como decorre de todo o exposto, frisar-se-á que não obstante as afirmações vagas e insubsistentes da testemunha acabada de aludir, importa dizer que o conspecto global da prova produzida aponta no sentido fundamental da demonstração da tese factual delineada pelos demandantes quanto aos problemas advindos da execução dos trabalhos efectuados pela demandada.

E, portanto, a resposta negativa a alguns dos quesitos decorre da total ausência de prova credível incidente sobre a respectiva matéria factual.”.

Vejamos, então, se dos depoimentos invocados pela recorrente e pelos recorridos, e sem olvidar as considerações prévias, quanto a tal, já acima explanadas, existem motivos para que as supras mencionadas respostas sejam modificadas ou alteradas.

Ora, ouvidos, na íntegra, todos os depoimentos prestados pelas testemunhas que depuseram acerca desta questão, resulta que as mesmas, de relevante, referiram o seguinte:

A testemunha D..., Professora na Universidade de Aveiro, que participou na elaboração do Relatório Técnico, junto de fl.s 227 a 243, confirmou e explicitou o teor deste.

Mais concretamente, atribuiu as causas das verificadas infiltrações a “uma deficiente inclinação das caleiras na cobertura”, que impede a correcta drenagem das águas pluviais, nas suas próprias palavras “a caleira está muito na horizontal”.

Por força da incapacidade de drenagem do sistema, as águas extravasam para o interior da cobertura e provocam infiltrações, o que, no seu entender, é agravado por a secção dos tubos de queda identificados sob os n.os 1 e 3 da figura 3 (pág. 3) do Relatório, ser inferior ao aconselhável.

Como solução para o problema aponta a rectificação de toda a cobertura ou através do recurso a “uma capa por cima a implantar no total da cobertura”.

Referiu, ainda, que a solução apontada no doc. de fl.s 49 (que fundamenta a redacção dada á alínea a) do petitório dos autores) é diferente da que consta do orçamento acordado entre as ora partes.

Mais disse que “o elemento telhado tem que ser estanque” e se houver lã de rocha ou vidro “aparecem as marcas de queda de água”.

Por E..., Professor da Universidade de Aveiro e co-autor (com a anterior testemunha) do já referido Relatório, foi dito que confirma o teor do mesmo, que explicitou e justificou.

Concretamente, referiu-se à falta de estanquicidade da cobertura, que se detecta no “tecto falso”, por ser de gesso cartonado, afirmando que “no sítio onde há infiltrações nota-se bem” e que se verificam entradas de água subjacentes às caleiras internas e “como não há laje, a água cai directa”.

Relativamente ao sistema de escoamento de águas (sistema hidráulico), o principal defeito que apontou é o da inclinação deficiente das caleiras, em que se verifica “uma inclinação ao contrário”, a que se acrescenta a sobreposição da aba sobre a caleira, como se explicita na fig. 17 do citado Relatório.

O que é, ainda, agravado pela “falta de sobreposição da chapa nas caleiras” e falta de isolamento destas, bem como se verifica, nas bordas laterais, uma sobreposição deficiente da chapa e “uma utilização excessiva de mástiques e similares para unir a chapa”, como este material tem uma fraca durabilidade, tal permite a entrada de água, decorridos 3/4 anos.

Apontou, também, uma deficiente sobreposição de painéis e a falta de painel de remate nos topos, como explicitado na fig. 9 do Relatório e descontinuidades das rufagens, cf. fig. 6.

Quanto aos tubos de queda, referiu que o diâmetro aconselhado é o de 90 mm e os aplicados têm 75 mm de diâmetro.

Como solução de reparação apontou o “refazer a cobertura sobre a existente”, parecendo-lhe sustentável a indicada no doc. de fl.s 49 por evitar a saída das pessoas da casa e a formação de detritos.

F..., ex-perito avaliador de seguros, que fez uma vistoria à casa em questão, no início de 2008, aquando de uma participação de sinistro efectuada pela ré, referiu que “os tectos e as paredes estavam danificados, por infiltrações de água vindas da cobertura”.

Mais disse que foi acima da cobertura que verificou e detectou problemas nas caleiras e rufos e que já tinham sido feitas reparações nas junções das caleiras e dos rufos com silicone e reforçaram com a aplicação de parafusos.

No seu entender, havia, também, “pouca sobreposição das caleiras nas junções e sem vedantes ou borrachas nas juntas, só silicone”.

A testemunha I..., gerente da L..., empresa que aplicou o gesso inicial e o pladur dos tectos falsos, referiu que logo desde o início havia infiltrações de água, pelo que teve de parar com a obra durante 3 meses, por estar a chover e só depois disto é que colocou os tectos todos. Designadamente, viu uma infiltração de água onde tinham aparafusado chapas da cobertura, ainda antes de ter aplicado o tecto falso.

Posteriormente, há cerca de 3 anos, foi chamado à casa dos autores para fazer uma reparação e fez um corte no tecto, em 3 quartos e numa casa de banho e esperou 3 dias para ver o que acontecia e lá ir alguém da ré para ver, tendo-lhe a autora dito que ninguém lá tinha ido para ver, pelo que tornou a fechar o tecto.

No seu entender, a humidade vem da cobertura.

Pela testemunha N..., pai da autora, apenas foi dito, no que a este recurso interessa, que há infiltrações de água em vários locais da casa, o que motivou uma participação à seguradora, com vista à respectiva reparação.

H..., sócio-gerente da J..., empresa que procedeu aos acabamentos, pinturas, rebocos, tijoleiras, pedras e louças de wc, referiu que desde o início apareciam infiltrações de águas vindas da cobertura, ainda antes de ser colocado o pladur, o que chegou a ver.

Cerca de um ano depois de ter concluído os seus trabalhos fez uma reparação de pintura, por causa das infiltrações e mais tarde, também houve reparação do pladur.

Depois disto já lá foi várias vezes e viu que na parte da frente ainda existem infiltrações, nomeadamente num quarto e corredor, “mas não como antes de ser feita a reparação”.

Mais disse que quando havia infiltrações de água os autores chamavam os responsáveis da ré, que iam lá ver o que se passava e que tiveram de ser substituídas algumas placas de pladur, por estarem danificadas pela humidade.

Foi uma vez à cobertura e “viu muito mástique e rufos com muitas emendas”.

Por último, a testemunha M..., funcionário da ré há 28 anos, referiu que foi a casa dos autores, 2/3 vezes, quando estes referiam a existência de infiltrações.

Dessas vezes, levantavam as chapas em vários pontos e nunca se apercebeu que houvesse humidade, designadamente porque a lã de rocha não estava molhada. Acrescentou que nunca foi ao interior da habitação, “só viu por cima, mas por cima estava seco”.

Disse, ainda, que as uniões estavam isoladas com uma cola especial.

Foi informado pelos colegas que foi feito um teste de água à obra, a pedido do autor, a que não assistiu, e que não houve problemas.

Mais disse que “não consigo explicar os problemas havidos no pladur dos tectos”.

Quanto ao doc. de fl. 254 (documento que assinou e do qual consta a descrição de algumas reparações efectuadas), datado de 20 de Outubro de 2007, diz que só o assinou, tendo sido redigido pela autora e que “foi feito mais para descargo de consciência do que para efeito”.

Relativamente à abertura de tectos para verem o telhado, disse que a ré pediu para isso ser feito, mas uma vez que lá foi para isso já estava tudo tapado.

Analisados estes depoimentos, sufragamos a “leitura” que dos mesmos foi feita em 1.ª instância, aceitando os argumentos ali expendidos para justificar as respostas dadas aos quesitos em referência, com excepção do que consta do item 9.º dos factos dados como provados na sentença recorrida, no que se refere ao quesito 79.º.

Efectivamente, quanto à realização do teste ninguém, fundada e directamente, referiu disso ter conhecimento (sendo que a realização do mesmo foi aceite por acordo das partes e por isso, logo aquando da prolação do despacho saneador, foi levado à al. H), dos factos assentes).

No entanto, é certo e seguro, que é de manter a resposta negativa que foi dada ao quesito 46.º, dada a existência de infiltrações de água desde o início e reiteradamente, o que motivou a que a ré ali tenha feito várias reparações.

Por outro lado, se bem que não se tenha demonstrado que aquando da realização do teste se tenha verificado a queda de grandes quantidades de água no interior da habitação, pode dar-se por adquirido que logo depois de a ré ter instalado a cobertura se começaram a verificar infiltrações de água no interior da habitação dos autores, provenientes da dita cobertura.

Assim, impõe-se harmonizar a redacção do ponto 9.º dos factos dados como provados, em conformidade com a prova produzida e demais factualidade apurada, em função do que tal item passa a ter a seguinte redacção:

9 – Logo após a conclusão dos trabalhos de instalação da cobertura, efectuados pela ré, começaram a verificar-se infiltrações de água no interior da habitação dos autores, provenientes da referida cobertura.

  

Relativamente à restante matéria aqui impugnada, não vemos razões para alterar qualquer das demais respostas em causa.

Efectivamente o teor do Relatório a que acima já se fez referência, conjugado com os testemunhos dos seus autores, conduz à manutenção das respostas dadas aos quesitos 16.º a 21.º.

E ainda, por via indirecta, à resposta negativa ao quesito 46.º.

As respostas dadas aos quesitos 83.º, 89.º e 90.º, nos depoimentos das demais testemunhas indicadas pelos autores que, para além de confirmarem a existência das infiltrações, pelo facto de ali terem levado a cabo os supra descritos trabalhos, foram-se apercebendo das vicissitudes que foram surgindo, que descreveram e dos contactos havidos entre autores e a ré com vista a solucionar os problemas detectados.

Em face de todo este quadro, surge contraditório o depoimento da testemunha M..., o qual, para além do mais, não se nos afigura como razoável, nas considerações que teceu quanto ao motivo de ter assinado o doc. de fl.s 254.

Por tudo isto, mantêm-se as respostas que foram dadas em 1.ª instância aos quesitos ora em referência, com excepção do já mencionado quanto ao item 9.º dos factos dados como provados na sentença recorrida, cuja redacção se substitui pela que ora lhe é dada.

Assim, procede, parcialmente, quanto a esta questão, em conformidade com o ora decidido, o presente recurso, em função do que se mantém a factualidade que foi dada como provada (e não provada) em 1.ª instância, com excepção da sobredita alteração da redacção do item 9.º dos factos provados.

B. Se existem os alegados defeitos de construção imputáveis à ré.

Alega a recorrente que em face da matéria de facto que, no seu entender, deve ser dada como provada (respostas negativas aos quesitos que corporizam o recurso de facto) se tem de concluir que nunca se constatou qualquer problema de humidade proveniente da cobertura, mas tão só foram feitas algumas deslocações a casa dos autores, a pedido destes, que ditaram o levantamento da chapas e análise de pontos problemáticos, sem que se comprovasse a existência de infiltrações, pelo que não se podem ter os invocados defeitos como verificados, o que afasta a responsabilidade da ré.

Na sentença recorrida, ao invés, considerou-se que em virtude de a ré ter procedido à instalação da cobertura de forma incorrecta, designadamente, de molde a evitar a existência das invocadas infiltrações, existem os invocados defeitos e que os mesmos são imputáveis à conduta da ré.

É indiscutível e nem as partes o colocam em crise, que estamos em face de um contrato de empreitada, tal como considerado na sentença recorrida, pelo que passamos a tratar todas as questões inerentes a este recurso, nesta perspectiva.

Quando alguém se obriga a realizar uma obra, mediante um preço, fica obrigado, não só a efectuar os trabalhos e a fornecer os materiais necessários à execução da obra, como também e fundamentalmente a que o resultado final – obra – fique concluído em conformidade com o convencionado e sem vícios; é o que claramente resulta do art. 1208.º do CC.

Daí o dizer-se que, no contrato de empreitada, o cumprimento ter-se-á por defeituoso quando a obra tenha sido realizada com deformidades ou vícios (1208.º CC); configurando “deformidades” as discordâncias relativamente ao plano convencionado e constituindo “vícios” as imperfeições que excluem ou reduzem o valor da obra ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.

Deformidades e vícios que representam os vulgarmente designados “defeitos”, podendo ser aparentes ou ocultos; e revelando quer os existentes à data da entrega da obra quer os subsequentes a tal entrega.

Significa isto que, numa empreitada de montagem/instalação de uma cobertura de uma casa de habitação, faz parte do “resultado prometido” – uso da casa para habitação – que a mesma “não meta água”, que seja estanque.

É que – é verdadeiramente ocioso referi-lo – a existência de infiltrações/escorrências de águas através de um telhado ou cobertura, independentemente do material utilizado, constituem “deficiências” que reduzem o valor da casa onde foi instalada; o mesmo é dizer, constituem vícios/defeitos, de gravidade suficiente a afectar o uso e/ou a coisa (casa de habitação), em que a sua estanquicidade e sensação de conforto e bem-estar são essenciais para o uso por parte dos respectivos proprietários.

Assim, apresentando a obra em causa todas as deficiências enumeradas nos itens 6 a 12 e 30 a 54 dos factos dados como provados na sentença recorrida, provados ficaram todos os factos constitutivos do direito – à eliminação dos defeitos (art. 1221.º, n.º 1, do CC) – invocado pelos apelados.

Com efeito, para no âmbito dum contrato de empreitada se pedir a eliminação dum defeito, basta provar (342.º, n.º 1, do CC), por um lado, a existência do defeito e, por outro lado, que o mesmo, pela sua gravidade, é de molde a afectar o uso ou a acarretar uma desvalorização da coisa.[1]

É que, provado o defeito e a sua gravidade, presume-se – uma vez que é contratual a responsabilidade do empreiteiro – que os mesmos são imputáveis ao empreiteiro (art. 799.º, n.º 1, do CC); isto é, presume-se que o cumprimento defeituoso é imputável ao empreiteiro.

Poderá, porém, deixar de ser assim se os autos espelharem uma qualquer situação que haja conduzido à extinção do direito – à eliminação dos defeitos (art. 1221.º, n.º 1, do CC) – invocado pelo dono da obra, questão que a seguir trataremos, aquando da análise da invocada excepção da caducidade.

No entanto, no que a esta questão concerne, é, nos expostos termos, por demais evidente a existência dos alegados defeitos, que se presumem (e são efectivamente) da responsabilidade da ré.

Consequentemente, no que toca a esta questão, tem o presente recurso de improceder.

C. Caducidade do direito a que se arrogam os autores.

Relativamente a esta questão, alega a recorrente que os direitos a que se arrogam os autores já caducaram, porquanto como resulta do item 7 dos factos provados, os defeitos surgiram em finais de 2004 e a primeira denúncia dos mesmos só foi feita em 31 de Dezembro de 2007 e renovada em 11 de Agosto de 2009, cf. item 17, dos mesmos factos, pelo que não foi respeitado o prazo de um ano para a denúncia dos defeitos, em conformidade com o disposto no artigo 1224.º do CC e 5.º do DL 67/2003, de 8 de Abril.

Por seu turno, na sentença recorrida considerou-se não se verificar a invocada excepção de caducidade, com o fundamento em que nem sequer se verificou a aceitação da obra sem reserva por parte dos autores, bem como que não se demonstrou que os defeitos denunciados em 2009 (o que competia à ré) fossem os mesmos que motivaram as reclamações anteriores, pelo que tendo sido denunciados em Agosto de 2009 e tendo a acção sido intentada em 11 de Fevereiro de 2010, se mostra respeitado o prazo de um ano para a respectiva denúncia, contado do seu conhecimento.

Efectivamente, para haver responsabilidade por cumprimento defeituoso - isto é, para o dono da obra manter o direito à eliminação dos defeitos - é necessário que seja previamente feita a denúncia do defeito (1220º do C. C.) e tempestivamente exercidos os direitos a que aludem os art. 1221.º a 1223.º do C. C. (cfr. art. 1224.º do C. C. e 5.º, do referido DL 67/2003).

A tal propósito, estabelece mesmo a lei 3 tipos de prazo.

O prazo de denúncia dos defeitos, o prazo para o exercício dos direitos (de eliminação dos direitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização) e o limite máximo da garantia legal.

Quanto ao primeiro, vale para o caso, não o prazo geral de 30 dias estabelecido pelo art. 1220.º, n.º 1, do C. C., mas o prazo de 1 ano fixado para os imóveis (1225.º, n.º 2, do CC).

Quanto ao 2º, está estabelecido igualmente o prazo de 1 ano, mas a contar da denúncia atempada dos defeitos (art. 1224.º, n.º 1 e também 1225.º, n.º 2 e 3, do C. C.).

Quanto ao 3º, vale para o caso, não o prazo geral de 2 anos (cfr. 1224.º, n.º 2, do CC) – após a entrega da obra, independentemente da data do conhecimento dos defeitos e da sua denúncia – mas o prazo de 5 anos fixado para os imóveis (1225º, nº 1, do C. C. e 5.º, n.º 1 do DL 67/2003).

Entende a lei que este último prazo – que configura uma presunção iuris et de iure – de 5 anos é o tempo suficiente para todos os defeitos serem conhecidos, denunciados e exercidos os respectivos direitos.

Como se refere a pág. 19 da sentença recorrida (346 dos autos) e resulta da factualidade provada (cf. item 11.º e seg.s), foram surgindo vários problemas na moradia dos autores que sempre a ré reconheceu e foi reparando, embora sem lhes pôr termo definitivamente.

Só que, como ali igualmente se refere e consta dos itens 31.º e seguintes, em Janeiro de 2209 e não obstante a reparação descrita no item 28.º, manifestaram-se as anomalias descritas naqueles itens. Sendo que só nesta data, mercê da realização de estudo acerca das condições em que fora instalada a cobertura, os autores tiveram conhecimento da real natureza e extensão das anomalias causadoras das infiltrações de água.

A denúncia destes defeitos foi dada a conhecer à ré em Agosto de 2009, pelo que se respeitou o prazo de um ano a que aludem os artigos 1224.º, n.º 1 e 1225.º, n.º 2 do CC e 5.º, n.º 3 do DL 67/2003.

De resto, ainda que assim não fosse sempre a caducidade se teria de excluir por força do reconhecimento por parte da ré da existência dos vários defeitos, em virtude de ter feito várias reparações, ter assumido a responsabilidade pela respectiva existência ao participá-los à sua seguradora, com vista a que esta suportasse os custos e ao pagar, posteriormente, parte da quantia respeitante aos custos com a substituição do pladur – cf. itens 11, 12 e 18 a 28.

Ora, tal atitude por parte da ré consubstancia um reconhecimento expresso, concreto e preciso do direito a que se arrogam os autores, o que, nos termos do disposto no artigo 331.º, n.º 2, do CC, impede a caducidade do direito.

Neste sentido, por último, veja-se o Acórdão do STJ, de 08/05/2013, Processo 1079/06.7TBMTS.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.

Para além do que, como se decidiu em Aresto do mesmo Tribunal, de 05/07/2012, Processo 2722/03.5TCSNT.L1.S1, disponível no mesmo sítio do anterior e que, como no caso em apreço, trata de um caso de infiltrações de água, não cabe ao comprador ou dono da obra o ónus de provar as causas dos defeitos, muito menos as concretas falhas técnicas de execução que originaram esses defeitos, o que, igualmente, constitui entrave a que se verifique a caducidade.

Assim, não se verifica a invocada caducidade.

Pelo que, igualmente, quanto a esta questão tem o presente recurso de improceder.

D. Se é legalmente inadmissível a condenação da ré na alínea A) do pedido formulado pelos autores.

No que a esta questão concerne, alega a recorrente que o pedido dos autores em que a reparação seja efectuada nos moldes referidos no artigo 47.º da p.i. (reproduzido no item 59 dos factos provados), não é admissível, por extravasar os direitos que lhes são reconhecidos, por a assim ser, se ordenar a realização de uma obra completamente diferente daquela que havia sido acordada.

Na sentença recorrida reconheceu-se que a ré deve proceder à eliminação dos defeitos detectados na obra que executou e a na parte decisória da mesma precisou-se que tal reparação devia ser efectuada segundo os termos definidos no ponto 59 dos factos assentes.

            Não se trata, agora, de averiguar se a ré tem de reparar os defeitos existentes na cobertura, mas sim da forma como os mesmos devem ser reparados.

            Desde já se diga que um dos fundamentos invocados pela ré para afastar a solução adiantada pelos réus e aceite na decisão recorrida – a da excessiva onerosidade por comparação com o uso dos materiais acordados – não tem qualquer relevância.

            Efectivamente, como consta dos itens 3.º e 4.º, o que foi acordado entre as partes foi a aplicação de painel tipo sandwich 50 mm lacado e do ponto 59.º consta a aplicação de “contraplacado marítimo”, por cima do existente, e em cima do referido contraplacado uma cobertura em chapa de zinco puro.

            Mas, quanto a tal, limita-se a ré a referir que estes materiais têm “custos diferentes, muito superiores”, sem os quantificar, o que, desde logo, afasta a aplicabilidade do disposto no artigo 1221.º, n.º 2, do CC, segundo o qual:

            “Cessam os direitos conferidos no número anterior, se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito.”.

            Ora, como é óbvio, só se pode concluir pela existência de tal desproporção se a ré alegasse e provasse os concretos preços de cada uma das soluções em confronto, o que, reitera-se, não fez.

            Como refere Pedro Romano Martinez, in Cumprimento Defeituoso Em Especial Na Compra E Venda E Na Empreitada, Almedina, 1994, a pág.s 384 e 385: “Trata-se da consagração de uma regra de justiça cumutativa: se as despesas do devedor, seja ele empreiteiro ou devedor, forem desproporcionadas em relação ao proveito do credor, não é justo que sobre aquele impenda a obrigação de eliminar os defeitos.

            O devedor pode assim obstar à exigência de eliminação dos defeitos se demonstrar que essa prestação lhe acarreta um sacrifício económico excessivo, ou seja, que é desproporcionada em relação ao proveito da contraparte. Para determinar essa onerosidade, a relação que se estabelece não é entre o valor da reparação e o preço acordado, mas sim entre aquele e a vantagem que o credor obtém”.         

            Nada disto a ré alegou, nem quantificou, pelo que, sob este prisma, não pode proceder esta sua pretensão.

            Mas não obstante isto, será que a ré está obrigada a reparar os defeitos pela forma apresentada pelos autores?

            Cremos que não!

            Efectivamente e seguindo uma vez mais o que propugna Pedro Romano Martinez, ob. cit. a pág.s 438 e 439, no que respeita á escolha entre a reparação dos defeitos e de substituição da coisa ou de realização de obra nova (quem pode o mais pode o menos e, na prática, o que os autores pretendem é, no mínimo, a substituição de materiais que, em larga medida, equivale à realização de uma obra nova) a escolha cabe ao empreiteiro, o que radica na experiência profissional deste.

            O dono da obra apenas se pode opor à solução de reparação proposta pelo empreiteiro se provar que os defeitos não são elimináveis ou, em caso de substituição ou obra nova que esta solução lhe causa prejuízo excessivo, designadamente pelo facto de não poder usar a coisa por largo período.

            E acrescentando a pág.s 393 e 394, da mesma obra que em face da formulação adoptada para o artigo 1221, n.º 1, 2.ª parte, do CC, só se concede o direito a exigir uma nova realização (da obra) desde que os defeitos não sejam elimináveis.

            Ali concluindo que “Desta enunciação ampla da lei depreende-se que tanto pode ser exigida a nova realização de toda a obra, como só de parte, ou requerida unicamente a substituição de materiais” e sem excluir – cf. nota 1 de pág. 394 – que, em certos casos, no contrato de empreitada, a eliminação do defeito pode implicar uma nova realização parcial da obra.

            No caso em apreço, os defeitos são elimináveis (mesmo os autores assim o reconhecem, apenas pretendendo que a reparação seja efectuada da forma que preconizam), pelo que sem ser dada a oportunidade ao empreiteiro de efectuar as reparações necessárias, com recurso ao materiais contratados, não se pode sancionar a requerida substituição de materiais, só possível, como vimos, para já, se os defeitos não fossem elimináveis.

            Se no caso de a nova prestação voltar a ser defeituosa, então, aí, já será legítimo ao credor rejeitar a solução apresentada pelo devedor – neste sentido, ainda, autor e ob. cit, a pág. 394, última parte do 3.º Parágrafo.

            Só numa hipótese se poderia, desde já, conceder aos autores o direito de se proceder à substituição de materiais: quando o empreiteiro conscientemente contratou materiais que sabia por força da sua competência profissional serem inadequados para aquela função e, ainda assim, não advertiu o dono da obra dessa inadequação.

            Neste caso, sob pena de se sancionar uma situação de abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprio e violador da boa fé que deve presidir ao cumprimento das obrigações – cf. artigos 334.º e 762.º, ambos do CC – deveria permitir-se a substituição de materiais.

            Ainda assim, no caso concreto, dada a qualidade de arquitecta da autora, seria difícil conceber tal situação.

            As partes contrataram como bem aprouveram, com o recurso aos materiais previstos no contrato, que devem cumprir e que os vincula – cf. artigos 405.º e 406.º, n.º 1, ambos do CC.

            Concluindo, a ré está obrigada a reparar os defeitos existentes na cobertura, identificados na parte decisória da sentença em recurso, em conformidade com o acordado, isto é, tem de fazer bem o que contratou, com recurso aos materiais acordados.

            Pelo que, nesta parte, procede o recurso.

E. Impossibilidade da reparação no prazo determinado na sentença recorrida.

No que a esta questão respeita, alega a recorrente que os 90 dias fixados na sentença recorrida para a reparação dos defeitos, apenas deverá ocorrer em período de Verão a fim de se minimizar o risco de chuvas.

Contra-alegando, os autores aceitam que as obras de reparação se façam a partir de Abril/Maio.

Na sentença recorrida fixou-se, para tal, o prazo de 90 dias, após o trânsito em julgado da presente decisão.

Não tendo sido reparado o dano aquando da respectiva denúncia, o dono da obra tem de interpelar a contraparte para proceder à eliminação dos defeitos, cf. artigo 777.º, n.º 1, do CC.

No entanto, como refere Romano Martinez, in ob. cit., a pág.s 386/387, na fixação de tal prazo deve ter-se em conta a natureza dos defeitos a reparar.

In casu, a recorrente aceita o prazo de 90 dias que foi fixado, apenas se insurgindo contra o facto de se ter fixado o respectivo começo após o trânsito em julgado, defendendo, ao invés, que as reparações devem ser feitas no Verão, o que os autores, igualmente aceitam.

Assim, determina-se que o prazo de 90 dias fixado para a eliminação dos defeitos se inicie em fins do mês de Maio.

Pelo que, no que a esta questão concerne, procede o presente recurso.

F. Se deve ser atribuída aos autores a peticionada indemnização a título de danos não patrimoniais e, assim sendo, qual o respectivo montante.

Quanto a esta questão, alega a recorrente que em face da factualidade provada não deve ser atribuída aos autores qualquer indemnização a título de danos não patrimoniais e a sê-lo, não pode ser quantificada na medida da atribuída, a qual, no seu entender, é manifestamente excessiva, por corresponder ao salário de mais de meio ano da generalidade dos trabalhadores portugueses.

Na sentença recorrida, fixou-se, a este título, a quantia de 3.500,00€, com base nos seguintes fundamentos:

“será de atender, na opinião do Tribunal, às situações geradoras de alterações perturbadoras da normalidade existencial das pessoas, isto é, que levam a que as mesmas deixem de ter, por exemplo, a qualidade de vida e o conforto por si queridos e de que sempre beneficiariam caso não ocorresse o facto ilícito.

E – não o neguemos – o que nos nossos dias provoca diminuição de qualidade de vida das pessoas pode assumir (e assume) os foros de importância que há algumas dezenas de anos atrás certamente não atingia. Com esta afirmação não está o Tribunal a querer dizer que há-de ser o hedonismo (tantas vezes excessivo) próprio da época hodierna o critério de aferição da relevância jurídico-civil dos danos não patrimoniais: trata-se, apenas, de tentar perceber que a total dimensão e realização humana passa por muitos aspectos parcelares e não cristalizados no tempo.

Posto tudo isto, parece ao Tribunal que a situação dos autos carece de uma evidente “centragem”: quando se habita aquela que é (e vai ser) a nossa casa, o nosso reduto mais importante, espera-se que a mesma se encontre inteiramente apta a corresponder aos nossos desejos e aspirações, protegendo-nos do vento, da chuva, do frio e do barulho.

Consequentemente, crê-se estarmos perante danos ligados à frustração do gosto de utilização de uma casa qua tale em perfeitas condições (gosto que, convenhamos, não é alcançável com uma cobertura atingida pelas anomalias acima descritas). E a referida frustração gera, como gerou, desânimo e desgosto susceptíveis de ponderação compensatória. Com parcimónia, embora… (pois os danos de cariz não patrimonial agora referidos também não tocam – felizmente, e apesar de tudo – os bens jurídicos dos demandantes mais decisivos).

Sopesando todos os aspectos acabados de referir, e com base na equidade (art. 496º/n.º 1 C.C.), entende o Tribunal fixar o montante compensatório, neste domínio, em € 3.500.”.

Ora, nos termos do disposto no seu artigo 496, n.º 1,“Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.

Como se colhe do Acórdão do STJ, de 26/6/91, in BMJ 408 – 538, a gravidade do dano mede-se por um padrão objectivo, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, sem ater a personalidades de sensibilidade exacerbada e a apreciar em função da tutela do direito.

Por outro lado, como se refere, entre outros, no Acórdão do STJ, de 07/06/2011, Processo 3042/06.9TBPNF.P1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj, (que versa caso de acidente de viação, mas cujas razões são válidas para a fixação de indemnização por danos não patrimoniais em geral) importa verificar se os critérios seguidos na fixação desta indemnização, são passíveis de generalização para casos análogos, muito em particular, se os valores arbitrados se harmonizam com os critérios ou padrões que, numa jurisprudência actualista, devem ser seguidos em situações análogas ou equiparadas, nomeadamente, tendo em vista as lesões sofridas, suas consequências.

Ou, como se refere no Acórdão do mesmo Tribunal, de 26/01/2012, Processo n.º 220/2001-7.S1, disponível no mesmo sítio do anterior deve “ser tratado por igual o que merece igual tratamento”, para o que se deve atender aos valores que vêm sendo fixados como compensação pelos danos não patrimoniais e no qual se referem os que como tal foram concedidos em alguns Arestos de tal Tribunal.

Os danos a ter em conta são os descritos nos itens 60 a 64 dos factos provados, ou seja:

“60 – a moradia aludida no ponto 1 (destes factos provados) está em constante desvalorização e degradação à medida que o tempo passa, sem que os defeitos e danos sejam efectivamente reparados, danificando o edifício e as suas estruturas essenciais, para além dos objectos nele existentes;

61 – os demandantes não conseguem usufruir integralmente da moradia referida no ponto 1 (da presente matéria factual assente);

62 – a humidade, as manchas e os odores em quase todas as divisões da casa causam incómodos aos AA.;

63 – os demandantes vivem em estado de agastamento psicológico, com receio pela sua saúde;

64 – os AA. não conseguem ter conforto na moradia mencionada no ponto 1 (destes factos aprovados);”.

É indiscutível, face ao critério acima exposto, que estes danos são indemnizáveis, constituindo um verdadeiro prejuízo o facto de não se poder fruir, em condições de normalidade, a casa de cada um de nós.

O lar é visto como o “último refúgio” de uma pessoa/família, almejando-se que no mesmo se tenham condições de conforto e de bem estar que permitam o seu uso tranquilo e conferindo uma verdadeira situação de tranquilidade, o que, de todo, não se verifica se estamos em presença de uma casa que “mete água” com todas as conhecidas e notórias consequências que daí advêm.

No que se refere ao quantum indemnizatório parece-nos que a atribuída, atentos os parâmetros e critérios acima definidos é um pouco exagerada, parecendo-nos mais adequada a quantia de 2.500,00 €.

Consequentemente, nesta parte, procede, parcialmente, o recurso.

Nestes termos se decide:       

Julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação, em função do que se revoga a decisão recorrida na parte em que:

- determinou que a reparação dos defeitos nela identificados se processe segundo os termos definidos no ponto 59 dos factos assentes, devendo a mesma ser feita em conformidade com o acordado, ou seja, com recurso aos materiais contratados e;

- na parte em que condenou a ré a pagar aos autores uma indemnização por danos não patrimoniais, que se reduz para a quantia de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros).

Mantendo-a quanto ao mais nela decidido.

Custas pela apelante e apelados, em ambas as instância, na proporção de ¾ (três quartos) e ¼ (um quarto), respectivamente, atento a que, na prática, os autores apenas decaíram, parcialmente, no montante indemnizatório, o que não altera a proporção das custas já fixada na decisão recorrida.

            Coimbra, 20 de Maio de 2014.

           

Arlindo Oliveira (Relator)

Emídio Francisco Santos

Catarina Gonçalves


[1] Além, evidentemente, da pretensão eliminatória dever ser precedida de tempestiva denúncia, questão que, em boa verdade, só surge quando a excepção da “caducidade” é suscitada.