Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
815/08.1TBAND-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
CÁLCULO
Data do Acordão: 02/01/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA – JUÍZO DE EXECUÇÃO DE ÁGUEDA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 22º, 29º E 32º DA LUCH; 45º CPC
Sumário: I – A revogação de cheques pós-datados pelo seu sacador, por alegado vício de vontade na relação subjacente que determinou a sua emissão, não lhes retira, em princípio, a sua natureza de títulos de crédito cambiários dotados de força executiva se tal tiver ocorrido antes da data de emissão neles aposta e os mesmos tiverem sido apresentados a pagamento dentro do prazo legal estatuído no artº 29º da LUCh.

II – A validade de um cheque enquanto título cambiário dotado de força executiva mantém-se mesmo que a sua apresentação a pagamento, ocorrida naquele prazo legal, tenha tido lugar depois de expirada a data limite de validade nele impressa pelo banco sacado.

III – Como regra, e à luz do princípio consagrado no artº 22º da LUCh, o sacador, emitente de um cheque, não pode opor ao endossatário as excepções fundadas nas relações pessoais que manteve com o endossante.

IV – Só assim não será se o referido sacador lograr demonstrar que aquele endossatário ao adquirir o cheque o fez com o conhecimento de tais excepções e com a consciência do prejuízo que essa aquisição ia causar àquele.

Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra

I- Relatório

1. A..., Lda, deduziu (em 9/4/2008) a presente oposição à execução comum, para pagamento de quantia certa, que contra si, para além de outra, moveu B....

Para o efeito, e em síntese, alegou o seguinte:

Que os 3 cheques que servem de título executivo padecem de vício da vontade na sua emissão e na celebração do negócio subjacente.

Na verdade, os referidos cheques, e na sequência das relações comerciais que há muito vinham mantendo, foram por si emitidos e entregues à ordem da co-executada, C..., Lda, com vista ao pagamento de um negócio de venda de 50.000 litros de vinho, que esta última ainda iria adquirir a uma terceira sociedade, a fornecer nas condições e termos por si melhor descritos na p.i..

Conforme o acordado, e com vista ao pagamento do preço desse vinho, a opoente entregou-lhe os referidos chegues pós-datando-os.

Acontece, porém, que a referida co-executada jamais lhe entregou o referido vinho, nem outro qualquer, e ao contrário daquilo que se havia comprometido, vindo a concluir ter sido astuciosamente induzida por aquela em erro para a celebração do dito negócio e emissão dos aludidos cheques, o que levou a que a sua vontade tivesse sido viciada.

Mais tarde, a referida co-executada veio a endossar os aludidos cheques ao aqui exequente, ao qual, após ter sido por ele contactado, a opoente veio a dar conhecimento daquelas vicissitudes relacionadas com dito negócio e que determinaram a emissão daqueles, pedindo-lhe ao mesmo tempo para lhe restituir tais cheques, ao que o mesmo se recusou (informando-a de que o dito endosso se ficou a dever ao facto daquela co-executada lhe dever dinheiro devido a um empréstimo que lhe fizera).

E foi, assim, e devido a tais vicissitudes, que a opoente, em 29/05/2008, procedeu à revogação dos referidos cheques.

Por outro lado, um dos cheques dado à execução não apresenta todos os requisitos para valer como título executivo, e desde logo por ter sido apresentado a pagamento já depois de ter expirado a data de validade do mesmo nele impressa.

Por outro lado ainda, o negócio que esteve subjacente ao referido endosso (um contrato de empréstimo) é nulo por vício de forma.

Invoca, por fim, a opoente a invalidade daquele endosso, porquanto o exequente ao receber tais cheques actuou de má fé e sempre com negligência grave, sabendo já então que as quantias neles tituladas não eram devidas à co-executadada endossante.

Pelo que, com base nos sobreditos fundamentos pediu a opoente, a extinção da execução contra si instaurada.

2. Contestou o exequente, contraditando, no essencial, quer a versão factual aduzida pela opoente, quer as conclusões jurídicas que dela pretendeu extrair, pugnando, no final, pela improcedência da oposição.

3. No despacho saneador afirmou-se a validade e a regularidade da instância, tendo-se dispensado a selecção da matéria de facto.

4. Mais tarde, realizou-se o julgamento – com a gravação da audiência -, que terminou com a decisão sobre a matéria de facto (sem que tivesse sido objecto de qualquer reclamação).

5. Seguiu-se a prolação da sentença que, a final, decidiu julgar improcedente a oposição, e determinar o prosseguimento da execução.

6. Não se tendo conformado com tal sentença, a opoente dela apelou.

7. Nas correspondentes alegações de recurso que apresentou, a opoente concluiu as mesmas nos seguintes termos:

[…]

8. O exequente contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção do julgado.

9. A srª juiz a quo pronunciou-se (fls. 181) pela inexistência da nulidade da sentença invocada pela apelante naquele seu recurso.

10. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.


***

II- Fundamentação


A) De facto.

Pelo tribunal da 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:

[…]


***

B) De direito.

1. Do objecto do recurso.

É sabido (entendimento que continua a manter-se com a actual reforma, aqui aplicável, introduzida ao CPC pelo DL nº 303/2007 de 24/8 - artºs 684, nº 3, e 685-A, nº 1) que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se fixa e delimita o seu objecto.

Ora, calcorreando as conclusões das alegações do presente recurso, verifica-se que as questões que importa aqui apreciar e decidir serão, essencialmente, as seguintes:

a) Dada nulidade da sentença.

b) Da validade, como título executivos, dos cheques dados à execução.

c) Do vício de vontade ocorrido na relação jurídica subjacente à emissão dos cheques e da sua oponibilidade ao exequente.


***

2. Quanto à 1ª questão.

Invoca a opoente/apelante a nulidade da sentença, por violação do disposto na d) do nº 1 do artº 668 do CPC.

[…]


***

3. Quanto à 2ª questão.

3.1. Da validade, como título executivos, dos cheques dados à execução.
3.1.1Como é sabido, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os seus limites (artº 45, nº 1, do CPC).
É também sabido que o título executivo e a causa de pedir, numa acção executiva, são conceitos necessariamente não coincidentes, costumando, todavia, ainda afirmar-se que, como pressuposto processual específico dessa acção, o título é, grosso modo, uma condição e suficiente da mesma.
É igualmente sabido que no campo dos títulos executivos vigora entre nós, e tal como decorre do artº 46 do CPC, o princípio da legalidade, segundo o qual só pode servir de base a um processo de execução documento a que seja legalmente atribuída força executiva.
É também sabido que, com a reforma processual de 1995, o elenco dos títulos executivos foi significativamente ampliado, passando a conferir-se força executiva aos documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável em face do título, ou a obrigação de entrega de coisas móveis ou de prestação de facto determinado (cfr. al. c) do nº 1 do artº 46 do CPC).
Conforme decorre do relatório do preâmbulo do DL nº 329-A/95 de 12/12 (pioneiro da introdução de tal reforma), subjacente a tal ampliação do elenco dos títulos executivos esteve a ideia de “contribuir significativamente para a diminuição do número de acções declaratórias de condenação propostas (…)”.
Legislador que decidiu, assim, sacrificar o valor de uma maior segurança jurídica aos valores de maior eficácia e celeridade das relações jurídicas.
É sabido que os cheques se encontram entre os documentos (extrajudiciais) que a lei reveste ali força executiva. Desde logo, na sua função natural de documentos cartulares, ou seja, enquanto títulos de crédito de natureza cambiária, e podendo agora (naquilo que constitui entendimento claramente dominante da nossa doutrina e jurisprudência, embora com alguma vozes discordantes, e cuja problemática adiante analisaremos em pormenor se tal se vier a mostrar necessário para a resolução do caso em apreço) sê-lo ainda, em determinadas condições, enquanto documento particular ou quirógrafo (cfr. artº 46, nº 1 al. c) do CPC, e, por todos, o prof. Lebre de Freitas, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, Coimbra Editora, 1999, pág. 90” e in “A Acção Executiva, 5ª ed., Coimbra Editora, pág. 59”, e o cons. Amâncio Ferreira, in “Curso de Processo de Execução, 2005, 8ª ed., Almedina, pág. 35”).
3.1.2 In casu servem de base à execução, contra a qual a co-executada/apelante deduziu oposição, três cheques, cuja validade (reconhecida na sentença de que se apelou), como títulos executivos, a última questiona, e desde logo na sua veste de títulos de crédito cambiários, negando-lhe, pois, tal natureza e força executiva, e com especial ênfase no que concerne àquele que foi junto como documento nº 2.

Apreciemos.

3.1.2.1 Numa visão funcional, mas não estritamente rigorosa, diremos que o cheque surge-nos como um meio de pagamento privilegiado (que permite dispensar directamente o recurso ao numerário).

Numa linguagem comum, pode dizer-se que o cheque configura uma ordem dada por uma pessoa (sacador) a um banco (sacado), para que pague, ao primeiro ou a terceira pessoa, determinada quantia nele inscrita, e por conta dos fundos disponíveis nesse banco.

Numa definição mais jurídica e completa, que se apresenta consensual, e que resulta de uma leitura articulada dos artigos 1º e 2º da Lei Uniforme sobre Cheques (doravante designada por LUC), pode-se dizer que o cheque é um título cambiário de crédito, à ordem ou ao portador, literal, formal, autónomo e abstracto, contendo uma ordem incondicionada dirigida a um banqueiro, no estabelecimento do qual o emitente tem fundos disponíveis, no sentido de pagar à vista a soma ou a quantia nele inscrita (cfr., por todos, F. Correia e A. Caeiro, in “RDE, 1978, pág. 457”).

Sem prejuízo de adiante o podermos vir a fazer (pelo menos quanto a algum deles) em relação em tais conceitos que compõem tal definição (e que integram o chamado direito de cheque externo ou abstracto), interessa, por ora, focalizarmo-nos sobre o chamado direito de cheque interno ou causal.

Tal como ressalta da leitura do artº 3º da LUC, na base da emissão de um cheque estão fundamentalmente duas relações jurídicas distintas: uma relação de provisão e um contrato ou convenção de cheque.

Podemos dizer que a relação de provisão se caracteriza pela disponibilização a favor do emitente de certos fundos que se conservam no banco, ou seja, essa relação pressupõe a existência, junto do banco, de fundos de que o sacador ou o emitente possa dispor, e que pode traduzir-se sob as mais diversas formas, tais como da existência de um depósito, de uma abertura de crédito, de uma conta corrente, de um desconto, etc..

O contrato ou convenção de cheque traduz-se num acordo através do qual o banco acede, comprometendo-se ao seu pagamento, a que o seu cliente (titular de um direito de crédito sobre a provisão) mobilize os fundos que estão à sua disposição, por meio da emissão de cheques.

A provisão surge, assim, não apenas como um requisito interno típico do cheque, mas também como um pressuposto do seu normal desempenho, já que, fundamentalmente, o mesmo surge funcionalmente, como já referimos, como um meio de pagamento. Na verdade, quando o apresentador do cheque se dirige ao banco para proceder à cobrança do mesmo deve existir provisão, ou seja, o banco deve assegurar o direito de crédito do sacador, disponibilizando para o efeito os fundos necessários ao pagamento do cheque.

Todavia, a falta de provisão não torna o cheque inválido (cfr. artº 3º - fine - da LUC), muito embora, como é sabido, essa irregularidade possa fazer incorrer o seu sacador em responsabilidade criminal ou/e civil (como salvaguarda, além do mais, da tutela da confiança na circulação dos títulos – cambiários -, em geral, e da protecção da boa fé do seu adquirente, em particular).

Daí que se diga que a relação de provisão surja, nuclearmente, como uma condição económica do cheque, e não mais do que isso.

Contudo, não basta a existência de uma relação de provisão, para que o cheque possa ser pago, sendo necessário algo mais para que o banco fique obrigado ao seu pagamento. E esse “algo mais” é nada mais nada menos a existência de um contrato ou convenção de cheque de que acima falámos.

Contrato esse que, como resulta da noção já acima exarada, se traduz num acordo pelo qual o banco, vinculando-se ao respectivo pagamento, acede a que o cliente (titular da provisão) mobilize os fundos à sua disposição, através da emissão de cheques.

Sem esse acordo o cheque continua também a ser válido (cfr. artº 3º - fine - da LUC), enquanto título, mas sem ele o banco não fica obrigado ao seu pagamento. E daí dizer-se que enquanto a relação de provisão aparece como uma condição económica do cheque, já o referido contrato de cheque surge, agora, como uma condição jurídica do mesmo, já que é ele que dá juridicidade àquela relação de provisão, uma vez só com ele, repete-se, o banco fica vinculado a pagar o cheque.

Trata-se, assim, de um contrato que se caracteriza, além do mais, por ser autónomo (que portanto não se confunde com a relação de provisão, pois pode estabelecer-se esta relação sem que necessariamente se convencione a utilização de cheques), que assenta também nos princípios da boa fé e da tutela da confiança, que se situa dentro do universo dos negócios bancários, que é bilateral ou sinalagmático (por estabelecer um conjunto de direitos e deveres recíprocos para as partes que o outorgam), sendo a sua celebração feita frequentemente de forma tácita, e que se consubstancia mediante a requisição pelo cliente de um ou mais livros de cheques (ou mesmo através de simples cheques avulsos) e com a entrega deles pelo banco (donde, dada a frequente ausência de negociações preliminares, haver também quem o caracterize como sendo um contrato de adesão).

Sendo, como supra deixámos exarado, um contrato bilateral/sinalagmático, do contrato de cheque emergem, assim, direitos e deveres recíprocos para as partes que o celebram.

No que concerne ao cliente/sacador, pode dizer-se que o principal direito que adquire pela celebração de tal contrato traduz-se, como naturalmente resulta do que atrás se deixou expresso, na possibilidade que passou a ter de emitir cheques sobre os fundos de que dispõe, sabendo que o banco ficou vinculado a pagá-los, ou seja, ficou com o direito de mobilizar os fundos existentes à sua disposição no banco, através da emissão de cheques.

No que concerne aos deveres, o cliente/sacador ficou com tal contrato obrigado, para além de ter fundos disponíveis e suficientes para pagar os cheques emitidos, a verificar regulamente o estado da sua conta, e a zelar pela sua boa guarda, ordem e conservação da sua caderneta de cheques, e bem assim ainda, no caso do seu extravio ou perda, a avisar imediatamente o banco. Resulta, assim, de tal um especial dever de vigilância e zelo que onera o cliente, e que, no fundo, se traduz numa prestação de facto, que deverá ser cumprida pontualmente.

Quanto ao banco, e no que concerne aos seus direitos, o principal é o de lançar em conta o pagamento dos cheques.

No que concerne aos deveres, há que distinguir entre os principais e os laterais:

Entre os primeiros ressalta, desde logo, o dever do pagamento dos cheques emitidos pelo cliente sacador (especialmente daqueles que tenham provisão).

No que diz respeito aos deveres laterais ou colaterais haverá que salientar, entre muitos outros, o dever de fiscalização e de conferência da assinatura; o dever de rescindir o contrato de cheque (em caso de utilização indevida); o dever de observar a revogação do cheque; o dever de esclarecer um terceiro que reclame informações sobre essa revogação; o dever de verificar cuidadosamente os cheques que lhe são apresentados; o dever de, em regra, não pagar o cheque para levar em conta; o dever de informar o cliente sobre o destino e tratamento do cheque, e especialmente sobre a pessoa do apresentador, etc.. (Vidé, sobre a problemática que acabamos de abordar entre muitos outros, Ac. da RC de 19/12/2007, proc. 5975/04.8TBLRA.C1, disponível in “dgsi.pt/jtrc” – que foi por nós relatado e, tal como o fez a sentença recorrida, que por isso seguimos de perto -; Sofia Galvão, in “Contrato de Cheque, Lex, Lisboa 1992, págs. 20 e ss”; Paulo Olavo da Cunha, in “Cheque e Convenção de Cheque, Almedina, 2009, págs. 91/92 e 441 e ss”; José Maria Pires, in “O Direito Bancário, 2º Vol., pág. 333 e ss”; Ac. do STJ de 9/11/2000, in “CJ, Acs. do STJ, Ano VIII, T3 – 108” e Ac. da RLx de 28/4/2005, in “CJ, Ano XXX, T2 – 114”).

Importa ainda reter que o cheque, não obstante estar invariavelmente representado por um impresso normalizado fornecido pelo banco (módulo), a lei (LUC) não exige que o cheque revista forma especial, muito embora não prescinda de enumerar (no artº 1º) os requisitos essenciais que deva conter, sob pena de na falta de algum deles o título (documento) não produzir efeitos com cheque (artº 2º, e ressalvadas as excepções ali previstas), e que são os seguintes:

- Inserção da palavra cheque (expressa na língua empregue para a redacção do título);

          - Mandato puro e simples de pagar uma certa quantia determinada (ou seja, menção inequívoca da ordem de pagamento sobre a quantia certa, a pagar);

- A indicação do nome do sacado (que terá necessariamente de ser uma instituição de crédito - vg. um banco);

- Indicação da data e do lugar onde o cheque é passado; e

- Indicação de quem passa o cheque (o sacador).
Por fim, importa ainda atentar que o cheque pagável no país onde foi passado deve ser apresentado a pagamento no prazo de oito dias, devendo esse prazo contar-se do dia indicado no cheque como data da sua emissão (cfr. do artº 29, §§ 1º e 4º, da LUC). O que constitui, tal com vem sendo dominantemente entendido, uma verdadeira condição de acção cambiária, e daí que se venha considerando ser tal apresentação tempestiva do cheque a pagamento como um verdadeiro requisito de exequibilidade do mesmo.

3.1.2.2 Pois bem, tendo presentes tais considerações acabadas de expandir, avancemos, agora, decisivamente para a resposta da questão colocada.

Observando os cheques dados è execução (através das cópias solicitadas), facilmente se verifica a presença em cada um deles dos atrás referidos requisitos formais essenciais (a que alude o artº 1º da LUC), os quais, aliás, não são verdadeiramente postos em causa pela opoente/apelante.

Cheques que tem neles apostas as seguintes datas de emissão: 2008/06/15; 2008/6/20 e 2008/07/20 (correspondentes, respectivamente, aos cheques nºs 1, 2, e 3 dados à execução).

Compulsando ainda o verso dos referidos cheques verifica-se que todos eles foram apresentados a pagamento (e a compensação) dentro do referido prazo de oito dias fixado no citado artº 29º da LUC.

E sendo, assim, em princípio, estariam, reunidos os pressupostos para os referidos cheques terem a natureza de títulos de crédito cambiários e estarem dotados de força executiva.

Acontece que os referidos cheques foram revogados pela opoente antes daquelas suas datas de emissão e apresentação a pagamento. Revogação essa ocorrida, segundo instruções dadas à entidade sacada em 19.05.2008, por vício da formação da vontade sacadora/ora opoente (cfr. nº 22 dos factos assentes). Sendo certo, porém, que o seu não pagamento aparece certificado nos versos dos aludidos cheques com os dizeres de “cheque revogado por furto”, cheque apresentado fora de prazo” e “falta de provisão”, no concerne, respectivamente, aos cheques nºs 1, 2 e 3.

Resulta, desde logo, de tal que estamos perante cheques pós-datados (vulgarmente também designados por cheques pré-datados, embora com menor rigor técnico-jurídico), o que, como vem sendo pacificamente entendido, não obsta a que possam ser válidos no plano jurídico-cambiário, sendo que no plano jurídico-criminal a emissão de um cheque em tais circunstâncias, se se vier a verificar a sua falta ou insuficiência de provisão, não é penalmente sancionável – artº 11º, nº 3, do DL nº 454/91 de 28/12, na redacção dada pelo DL nº 316/97 de 19/11 - (cfr. a tal propósito, por todos, e para maior desenvolvimento, Paulo Olavo da Cunha, in Ob. cit., págs. 112/114 e 120/122”).

Ora, dispõe o artigo 32º da LUC que “A revogação do cheque só produz efeito depois de findo o prazo de apresentação” (§ 1º) e que “se o cheque não tiver sido revogado, o sacado pode pagá-lo mesmo depois de findo o prazo” (§ 2º). (sublinhado nosso)

Trata-se de uma norma (a do citado artº 32º §1º) especial e de carácter imperativo, tendo a ela subjacentes razões da tutela de confiança e de protecção do portador do título e, sobretudo, de credibilização do próprio cheque como meio de pagamento.

E dela resulta, assim, a proibição de os cheques serem, em princípio, revogados enquanto não decorrer o prazo legal de apresentação a pagamento previsto no citado artº 29º da LUC, e o se forem tal revogação só poderá produzir efeitos depois de decorrido tal prazo, pois que até lá essa revogação é irrelevante e é ineficaz, continuando o cheque revestido de todas as suas características de título de crédito cambiário e, portanto, dotado, só por si, de força executiva e a valer enquanto tal. Ou seja, a revogação, em tais condições, não destrói o cheque enquanto título cambiário executivo.

A propósito, e analisando tal problemática, da revogação do cheque escreve, a dado passo, Paulo Olavo da Cunha (in Ob. cit., págs. 238/239”) “(…) Caso a revogação seja irrelevante, por extemporânea, ou o título revele de qualquer modo que, tendo sido apresentado a pagamento no prazo devido, ele não foi pago, então o cheque poderá ser aproveitado como titulo executivo. (…) Assim, se o banco acatou a instrução de revogação e não pagou o cheque – não obstante se encontrar obrigado a fazê-lo, por estar dentro do prazo para a respectiva apresentação a pagamento -, nem por isso ele deixará de valer como título executivo, não podendo a recusa, se ilegítima, desqualificar a obrigação cambiária que o caracteriza e que subsiste”. Escrevendo depois, em nota de rodapé (nº 543, pág. 238), “A data da transmissão… é totalmente irrelevante. (…), o que tem relevo é a data da apresentação do cheque a pagamento. Se esta se enquadra no prazo legalmente estabelecido para o efeito, o cheque deveria ter sido pago, ainda que tivesse sido revogado (artº 32.º I da LUCh), uma vez que a revogação só produziria os seus efeitos esgotado que se encontrasse esse prazo, sendo até esse momento irrelevante. (Em continuação, e para maior desenvolvimento sobre tal problemática, e em reforço de tal ideia, vide ainda o mesmo Autor, na mesma obra, págs. 274/275; 485, 577 ss, 588/589; 594; 600 e ss, e 618/619”, e ainda, entre outros, o Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência 4/2008, publicado no DR, 1ª Série em 01.04.2008 – na parte referente à sua fundamentação, o qual foi tirado a propósito da responsabilidade civil da instituição de crédito sacada pelos danos causados em consequência da recusa do pagamento do cheque, apresentado dentro do prazo legal do artº 29º da LUC, com o fundamento em ordem de revogação dada pelo sacador; responsabilidade essa que não está aqui em causa e daí que tenhamos tratado com menor profundidade a problemática em equação – e ainda, girando em torno daquela mesma problemáticas versada por aquele acórdão uniformizador, os Acs do STJ de 12/10/2010, proc. 236707.0TBPNF.L1.S1, de 13/7/2010, proc. 5478/07.9TVLSB.L1.S1, e de 29/4/2010, proc. 4511/07.9TBLRA.C1.S1, publicados in “dgsi.pt/jstj”).

Diga-se ainda, a tal propósito que, conforme entendimento dominante (cfr., por ex, os arestos atrás citados, e José Maria Pires, in “Ob. cit., págs. 107/108”), os casos de extravio, furto e outros de emissão ou apropriação fraudulenta do cheque não estão contidos na previsão do citado artº 32º do LUC, ou seja, tais situações não cabem do conceito de revogação (elas passaram a ser tratadas e a cair no âmbito do DL nº 454/91 de 28/12, na redacção dada pelo DL nº 316/97 de 19/11, vg. artº 8, nº 3).

Aliás, como resulta dos dizeres, acima referidos, apostos nos versos dos aludidos cheques, a razão para o seu pagamento ficou a dever-se a furto (no que concerne ao nº 1), a apresentação fora de prazo (no que concerne ao nº 2) e a falta de provisão (no que concerne ao nº 3), o que não corresponde, de modo algum, ao vício de formação na vontade (relacionada com a relação subjacente à sua emissão) invocado pelo opoente para revogar os mesmos, segundo as instruções dadas para o efeito ao banco sacado (sendo que da materialidade factual apurada resulta que não correu qualquer furto dos ditos cheques, e nomeadamente daquele onde foi aposto tal dizer).

No que concerne cheque nº 2 (titulando o valor de € 9.000,00 e que contém no verso, o dizer de apresentação fora de prazo), verifica-se que no canto superior direito da frente do mesmo encontra-se inserida a expressão “cheque válido até 2008-5-28”.

Ora, tal data é, como vimos, anterior àquelas que dele constam como sendo a da sua emissão e da sua apresentação a pagamento.

Significará que tal põe em causa, com defende a opoente, a validade do cheque enquanto título de crédito cambiário, e consequentemente como executivo?

A resposta afigura-se-nos que só poderá ser negativa, e pelo seguinte:

A aposição da data de validade que passaram a ser impressas nos módulos dos cheques foi resultado da carta-circular nº 6/2006/DPG do Banco de Portugal. Através dela o Banco de Portugal, num conjunto de boas práticas, recomendou a todas as instituições de créditos que passassem a inserir uma data limite de validade nos impressos que forneçam aos seus clientes, com vista reduzir o risco associado à emissão de cheques por parte dos seus clientes, nomeadamente no que concerne à utilização pelos mesmos dos cheques com garantia de pagamento e os cheques pré-datados.

A aposição de tais datas limites impressas nos cheques consubstancia, assim, uma prática bancária, na sequência da aludida carta-circular recomendativa do Banco de Portugal, que nem sequer é vinculativa paras instituições bancárias, não sendo, pois fonte imediata de direito, e como tal não pode colidir com aquilo que se encontra positivado em diplomas legais, e mais concretamente na LUC.

Por outro lado, a data limite de validade que passou a ser impressa nos cheques não se integra nos requisitos essenciais (acima deixados transcritos) que o cheque deve conter, nos termos da definição feita pelo artº 1º da LUC. Pois só esses ali enunciados são essenciais ao cheque, de tal modo que só a falta de algum deles pode colocar em causa a sua validade, levando a que o título não produza efeitos como cheque (cfr. artº 2º da LUC).

Por fim, e conforme bem se acentuou na sentença recorrida, a referida questão da validade (limite) prende-se ou tem a mais a ver com o contrato ou convenção do cheque (de que acima demos nota) e com a sua validade e não com a validade intrínseca do próprio cheque. Ao não estar o cheque dentro da referida data de validade (impressa no mesmo pela própria instituição bancária sacada), o banco pode ou não vir a pagá-lo (independentemente da responsabilidade que tal lhe possa trazer), sendo certo, todavia, que, nos termos o disposto na parte final do acima citado artigo 3º da LUC, a inobservância das prescrições referentes à relação de provisão e à convenção de cheque, não podem prejudicar a sua validade enquanto título de crédito cambiário.

Diga-se ainda, a propósito do fundamento aposto pela instituição bancária no verso do dito cheque para recusar o seu pagamento (apresentação fora de prazo), que o único critério consagrado na lei para indagar se o cheque foi ou não apresentado em tempo a pagamento é aquele acima aludido inserto no citado artº 29º da LUC.

Assim, por tudo o que se deixou exposto, é-se conduzido a concluir que os três cheques dados à execução são títulos de crédito cambiários válidos, dotados enquanto tal de força executiva.

E nessa medida improcede a pretensão da opoente/apelante no que concerne à sobredita questão.


***

4. Quanto à 3ª questão.

4.1 Do vício de vontade ocorrido na relação jurídica subjacente à emissão dos cheques e da sua oponibilidade ao exequente.

Alegou a opoente que subjacente à emissão dos cheques a favor da co-executada C..., Lda., esteve um negócio de compra e vinho que celebrou com a última. Co-executada essa que para o efeito a induziu astuciosamente em erro, tendo, assim, a sua vontade sido viciada, quer na no que concerne à formação do dito negócio, quer, consequentemente, quanto à emissão dos referidos cheques que entregou àquela para aquisição/compra do referido vinho que a mesma, porém, não lhe veio a entregar. E daí que, base em tal vício de vontade, tenha pedido a anulação do dito contrato de compra e venda de vinhos que celebrou com a referida co-executada e bem assim da emissão dos aludidos cheques. Invalidade essa extensível ao endosso que aquela deles fez ao exequente, que considerou abusivo, sendo certo que o mesmo conhecia ou devia conhecer aqueles vicissitudes que afectaram a sua vontade.
4.1.1 É sabido que a oposição à execução, funciona como uma contra-acção do devedor contra o credor para impedir a execução ou destruir os efeitos do título executivo.

Dado o disposto no artº 816 CPC, se a execução se não baseia em sentença condenatória (e agora também em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executiva), além dos fundamentos de oposição especificados no artº 814, nº 1, na parte em que sejam aplicáveis (e não o são os fundamentos das alíneas b), d), f) e g)), pode invocar-se quaisquer outros que seria lícito deduzirem-se como defesa no processo de declaração, ou seja, o executado pode alegar na oposição tudo o que poderia alegar na contestação à acção declarativa, não só as causas impeditivas ou extintivas, como mesmo negar os factos constitutivos do direito que se invoca.

E porque a distribuição do ónus da prova se baseia em normas de direito substantivo (cf. por ex., Lebre de Freitas, in “A Acção Executiva, 5ª ed., pág. 183, nota 31”), cabe ao executado/opoente o ónus da prova dos factos impeditivos à obrigação exequenda certificada no título, designadamente sobre a invocada anulação do negócio por erro.

Pois bem, já vimos que os títulos executivos (cheques) estão revestidos de natureza cartular, consubstanciando em si verdadeiras obrigações cambiárias.

O exequente recebeu os ditos cheques por via do endosso (em branco) dos mesmos que lhe foi feito pela co-executada, C..., Lda., a favor de quem a opoente os havia originariamente emitido e entregue (o que se pode comprovar por uma simples inspecção dos referidos títulos).

É sabido que o endosso é uma forma específica e legítima de transmissão dos títulos cambiários, e no caso concreto dos cheques (artº 14º, § 1º, da LUC).

Encontra-se, assim, o exequente legitimado na posse dos referidos cheques (cfr. artºs 15º e 16º da LUC).

Através do endosso transmitem-se todos o direitos resultantes do cheque (artº 17º da LUC), compreendendo-se aí, todavia, apenas os direitos cambiários nele incorporados. A qualidade de credor, inerente à posse legítima do cheque, passa do transmitente deste para o seu adquirente, que é, assim, colocado na situação de credor originário. Através desse endosso, o endossado ou endossatário adquire um direito autónomo, e por isso não lhe podem ser, em princípio, opostas as excepções que podiam ser invocadas contra os anteriores portadores.

E isso mesmo encontra-se plasmado no artº 22º da LUC, onde se prescreve que “As pessoas accionadas em virtude de um cheque não podem opor ao portador as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador, ou com os portadores anteriores, salvo se o portador ao adquirir o cheque tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor.”

Como explica Paulo Olavo Cunha (in “Ob. cit. pág. 197/198”) esse artigo “consagra o princípio da inoponibilidade das excepções pessoais no plano das relações cartulares, excepto se tais relações forem imediatas ou se o portador do título ao adquiri-lo tiver procedido conscientemente em detrimento do devedor, ou seja, tiver tido consciência da inoponibilidade (que originava com a sua subscrição) – por saber que existia uma excepção (pessoal) que deixava de se aplicar – e do prejuízo que causava ao devedor, por fazer sair o título do domínio das relações imediatas, impedindo o devedor (sacador ou endossante) de opor ao portador as excepções causais referentes ao incumprimento da relação subjacente. É isto, - continua o autor – precisamente, que se pretende evitar. A lei quer impedir que aquele que sabe existir uma vicissitude na sua relação subjacente se possa conluiar com terceiros, para que estes, com o endosso, beneficiem da autonomia do título do título no momento da apresentação a pagamento. Por outras palavras, com a parte final do artº 22º limita-se a possibilidade de a excepção (pessoal) – oponível nas relações imediatas – ser ludibriada, através da intervenção de terceiros. Por isso, a consciência aqui relevante é a consciência da inoponibilidade e do prejuízo; a lei exige que o portador adquirente soubesse que havia uma excepção.”

3.1.2 Posto isto, analisemos agora, mais incisivamente, a questão em apreço, à luz de tais considerandos e ensinamentos e bem assim da materialidade factual apurada.

É claro que nos que in casu encontramos no domínio das relações mediatas.

E sendo assim, está vedado à executada/apelante opor ao exequente as excepções pessoais (baseadas na relação causal ou subjacente à emissão dos ditos cheques, e mais concretamente do por si invocado vício de vontade) que possa ter e deduzir contra a sobredita co-executada C..., Lda., não ser que demonstre que o exequente ao adquirir os aludidos cheques procedeu conscientemente em seu detrimento (da opoente), ou seja, que o mesmo quando adquiriu, por endosso, os referidos cheques tinha conhecimento daquelas alegadas vicissitudes relativas ao negócio do vinho (consubstanciadoras do invocado vício de vontade na formação e celebração desse contrato) e que, desse modo, ao fazê-lo tinha perfeita consciência de que estava, assim, a criar um situação que impediria a ora apelante de opor ou fazer valer perante aquela as correspondentes excepções relacionadas com incumprimento do dito negócio, e mais particularmente com o invocado vício de vontade, causando-lhe, em consequência disso, um prejuízo.

Ora, será que a opoente/apelante logrou, como lhe competia, fazer prova de tal, ou seja, de o exequente ao adquirir, por endosso, os aludidos cheques o fez conscientemente em detrimento daquela?

Basta uma leitura atenta e conjugada da matéria factual apurada para concluir no sentido de uma resposta negativa. Dessa materialidade não só não resulta tal prova, como cremos que, inclusive, se poderá extrair até prova do contrário, ou seja, de que exequente só terá ficado a par dos contornos e vicissitudes que envolveram o negócio causal ou subjacente à emissão dos referidos cheques quando, já após estar no posse deles, foi falar com a opoente no sentido de lhe dar conta de estar na posse de tais títulos e com vista a saber se a mesma lhos iria pagar - note-se que se tratava de cheques pós-datados e que nessa altura a data de emissão neles aposta ainda não tinha ocorrido – (cfr. nºs 16 a 18 dos factos assentes, em conjugação com o teor dos próprios cheques).

O facto de um dos cheques ter já ultrapassado a data limite de validade nele impressa, nos termos em que supra nos referirmos, também não permite só por si concluir de forma diferente àquela a que acabamos de o fazer, pois, muito embora do cheque não conste (e nem tenha que constar) a data em que ocorreu tal endosso, extrai-se, todavia, da conjugação do factos assentes (cfr. nºs 16 e 17) que ele terá, obviamente, que ter ocorrido antes da conversa, atrás aludida, que teve lugar entre o exequente e co-executada/opoente em finais de Abril e durante o mês Maio de 2008, sendo certo que aquela data limite de validade impressa no cheque reporta-se ao dia 28/5/2008 (não esqueçamos, repetimo-lo, que, de qualquer modo, era sempre sobre a opoente que recaía o ónus de prova de que o exequente ao adquirir os ditos cheque, e particularmente aquele a que nos vimos referindo, actuou conscientemente em seu detrimento e para o prejudicar, o que, como vimos, não logrou conseguir).

E sendo assim, não podendo a apelante opor ao exequente as excepções pessoais de que estava legitimada afazer em relação à referida co-executada endossante, terá de improceder também a pretensão daquela no concerne à sobredita questão.

E não se invoque sequer, como parece ainda fazer a apelante, o artº 13º da LUC, pois o primeiro dos pressupostos da sua previsão é que tenha havido um desapossamento (ilegítimo) do cheque, o que, como vimos, não ocorreu no caso sub júdice, sendo que quanto aos demais requisitos (que obrigam à sua restituição) referentes à má fé ou falta grave do detentor na sua aquisição, é patente, pelo que resulta matéria factual apurada e daquilo que supra deixámos expresso, que também eles não se mostravam verificados.

Termos, pois, em que, por tudo o exposto, se julga improcedente o recurso, confirmando-se a, aliás, douta sentença recorrida.


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III- Decisão


Assim, em face do exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença da 1ª instância.

Custas pela apelante.


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Sumário:

I- A revogação de cheques pós-datados pelo seu sacador, por alegado vício de vontade na relação subjacente que determinou a sua emissão, não lhes retira, em princípio, a sua natureza de títulos de crédito cambiários dotados de força executiva se tal tiver ocorrido antes da data de emissão neles aposta e os mesmos tiverem sido apresentados a pagamento dentro do prazo legal estatuído no artº 29º da LUCh.

II- A validade de um cheque enquanto título cambiário dotado de força executiva mantém-se mesmo que a sua apresentação a pagamento, ocorrida naquele prazo legal, tenha tido lugar depois de expirada a data limite de validade nele impressa pelo banco sacado.

III- Como regra, e à luz do princípio consagrado no artº 22 da LUCh, o sacador, emitente de um cheque, não pode opor ao endossatário as excepções fundadas nas relações pessoais que manteve com o endossante.

IV- Só assim não será se o referido sacador lograr demonstrar que aquele endossatário ao adquirir o cheque o fez com o conhecimento de tais excepções e com a consciência do prejuízo que essa aquisição ia causar àquele.


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Isaías Pádua (Relator)
Regina Rosa
Teles Pereira