Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
193/09.1TBCVL-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO MAGALHÃES
Descritores: EMPREITADA
DEFEITOS
INDEMNIZAÇÃO
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
CADUCIDADE
PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 05/04/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 798.º; 808.º; 1223.º; 1224.º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. O incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos confere ao lesado (dono da obra ou empreiteiro perante o subempreiteiro) o direito a ser indemnizado pelos prejuízos causados por esse incumprimento (art. 798.º do CC), correspondente ao custo das obras de eliminação dos defeitos, efectuadas ou a realizar por terceiro.

2. Nessa circunstância, não tem cabimento que se imponha que o dono da obra obtenha primeiro, em acção declarativa, uma sentença que condene o empreiteiro a cumprir uma obrigação definitivamente incumprida e só na respectiva acção executiva se permita, finalmente, que ele próprio ou terceiro procedam às obras de reparação ou construção.

3. O incumprimento definitivo só ocorre quando a prestação se torna impossível, quando deixa de interessar ao credor ou quando, subsistindo embora esse interesse, o devedor não a realiza no prazo que razoavelmente lhe é fixado pelo credor (art. 808.º do Cód. Civil).

4. Podendo o dono da obra recorrer ao trabalho de terceiros e reclamar uma indemnização correspondente ao custo da eliminação dos defeitos - indemnização que não se enquadra na previsão do art. 1223.º do CC - não estará esta, por isso, sujeita ao prazo de caducidade do art. 1224.º do CC mas antes ao prazo de prescrição ordinário.

Decisão Texto Integral:          Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

        A... veio a 19 de Junho de 2010, deduzir oposição à execução que contra ela foi instaurada por B... alegando, em suma, que é credora da exequente de quantia superior à que lhe deve pelo facto de lhe ter encomendado armários que estavam defeituosos, o que lhe causou diversos prejuízos.

A benefício da decisão a proferir, transcreve-se, no entanto, o articulado da petição inicial:

“1°- A Oponente é uma sociedade comercial que se dedica às actividades de construção civil e obras públicas, loteamentos e urbanizações, compra e venda de prédios e revenda dos adquiridos para esse fim, conforme resulta de certidão permanente com o código de acesso nº 1531-3126-7228.

2° No âmbito da sua actividade comercial, em finais de 2007, a Oponente contratou com a Exequente a execução e montagem de dezanove (19) armários em fenólico para a obra do X...., pela quantia global de € 17.522,79 (….), da qual era empreiteiro designado, conforme documento que se junta sob o n.° 1, e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido,

3º- Para tanto, e após vários contactos e reuniões, foi entregue um projecto, que posteriormente foi objecto de rectificações (medidas), em função das normais e corriqueiras alterações em obra,

4º- Apesar de inicialmente ter sido acordado o prazo de entrega para o dia 2 de Janeiro de 2008.

5º-A verdade é que, por fax de 11 de Dezembro de 2007, a Exequente comunicou à Oponente que apenas iria proceder à entrega dos armários entre os dias 14 a 20 de Janeiro de 2008, sem prejuízo de tentar antecipar o prazo (Doc. n.° 2 …)

6º- Facto que a Oponente se viu obrigada a aceitar, de forma a não prorrogar mais o prazo da empreitada. Sucede contudo que,

7º-Ao contrário do que havia ficado acordado entre as partes, apenas em finais de Janeiro de 2008 é que foram entregues 6 dos 19 armários contratados,

8°- Os quais, após “montagem” por parte da Exequente, se verificou não estarem de acordo com aquelas que eram as características da nota de encomenda, projecto apresentado e rectificações realizadas,

9°- O que de imediato levou à sua não aceitação, quer por parte da Oponente, quer por parte da Fiscalização da Obra, nomeadamente por razões ligadas às dimensões legais que os corredores em cujas paredes iriam ser encastrados os ditos armários tinham de ter para lá puderem passar cadeiras de rodas.

10°- Com efeito, apesar da Exequente proceder à montagem dos referidos 6 armários, a verdade é que tal “montagem” mais não foi do que uma tentativa de “meter o Rossio na Betesga”, já que os ditos móveis pura e simplesmente não correspondiam, em termos de medidas, ao que tinha sido comprado, uma vez que eram mais profundos do que a parede onde supostamente seriam encastrados, ficando salientes à face da parede.

11°- Facto que de imediato foi relatado à Exequente, apesar desta insistir em alterar as paredes para ver se os armários lá cabiam! Não obstante,

12°- Entre o dia 31 de Janeiro de 2008 e o dia 2 de Fevereiro de 2008, e após insistência da Oponente, e através de meios desta própria, foram entregues os restantes 13 armários contratados (Doc. n.º 3…)

13º- Bem como vinte e quatro cacifos e setenta e seis portas (Doc. n.º 4 ….),

14° - Sendo que, tal como seria de esperar, também estes 13 armários não correspondiam minimamente ao que tinha sido adquirido pela Oponente, sendo impossível e inaceitável a sua montagem em obra,

15°- Sob pena do resultado final não corresponder minimamente ao que tinha sido contratado entre a Oponente e o Dono de Obra, e, portanto, jamais ser aceite pela Fiscalização, até por razões legais. Ou seja,

16°- Não só não se cumpriu o prazo acordado, corno, ademais, se entregou algo que não correspondia minimamente ao que se tinha encomendado,

17°-Basicamente os armários entregues não correspondiam ao que constava do projecto e respectivas rectificações entregues à Exequente, e que esta tinha pleno conhecimento,

18°- Sendo, assim, necessário proceder à sua rectificação para que tais armários pudessem respeitar o que tinha sido contratado entre a Oponente e o Dono de Obra e, portanto, ser aceite pela Fiscalização. Pelo que,

19°- De imediato, e solicitando urgência, a Oponente pediu a rectificação dos aludidos 19 armários, de forma que os mesmos pudessem ser colocados em obra o mais rapidamente possível.

20°- Urna vez que já se encontrava em incumprimento de prazo para com o Dono de Obra e, portanto, a incorrer em altíssimos custos perante este último. Sucede que,

21°- Apesar de saber que já estava fora do prazo contratado,

22°- Apesar de saber que a Oponente já estava em incumprimento com o Dono de Obra,

23°- Ainda assim, manifestou a Exequente a indisponibilidade para a rectificação, alteração e montagem dos armários defeituosos, conforme mais tarde e depois de interpelada pela Oponente veio a confirmar por escrito (Docs. n°s 5 e 6, …)

24°- Perante tal atitude, e porque de facto já se encontrava cm grave incumprimento para com o Dono de Obra, a Oponente não teve outra alternativa se não contratar com terceiros aquilo que havia contratado com a Exequente. Assim,

25°-Primeiro, foi obrigada a contratar uma outra sociedade comercial para proceder à reparação do estuque, incluindo picagem de fundos dos roupeiros, à picagem de pavimentos, efectuar remates em pladur e estuque, decorrente da remoção dos primeiros 6 armários que haviam sido “montados” em obra,

26°- Depois, viu-se na contingência de ter de contratar uma outra sociedade, de carpintaria, que, de forma urgente, procedesse à rectificação e posterior montagem dos 19 armários entregues pela Exequente,

27°- Contratos esses que, naturalmente, importaram para a Oponente um. custo total de € 14 606,97 (sendo de € 1 100,00 para os primeiros trabalhos e € 13 506,97, para os segundos), conforme documentos que se juntam sob os fls. 7 e 8… Mais,

28°- Urna vez que a exequente não procedeu à conclusão dos trabalhos contratados, a oponente contratou, ainda, com outra sociedade para proceder à pintura nos remates dos armários,

29°- Trabalhos que tiveram um custo de € 300,00 (trezentos euros). Sendo que,

30°- Aos custos acima identificadas, acresceram ainda os custos referentes a transportes e encargos com pessoal. num total de € 2 550,00 (dois mil, quinhentos e cinquenta euros),

31°- Para além de ter custeado os transportes, carga e descarga dos 13 armários entregues entre o dia 31 e o dia 2, já que os mesmos tiveram de ser recolhidos na sede da Exequente e transportados para o local da obra pela Oponente, ao contrário do que tinha sido contratado (Doc. n.° 9 …). Em suma,

32º- Para a conseguir cumprir com o Dono de Obra aquilo a que com ele havia contratado, e por força da actuação da Exequente, a Oponente teve os seguintes custos: Transporte de armários montagem e descarga dos mesmos € 477,50; Reparação estuque, picagem de fundos dos roupeiros, picagem de pavimentos e remates em pladur e estuque, incluindo trabalhos preparatórios de pintura € 1 100,00; Rectificação de armários € 13 506,97; Pintura e remates dos armários € 300,00; Transportes e encargos com o pessoal € 2 550,00; TOTAL € 17.934,47

33º- Ou seja, teve a Exequente um custo superior àqueles que seria o preço final a pagar à Oponente, se esta tivesse cumprido o contrato quer em termos de prazo, quer em termos de qualidades do objecto. Assim,

34°- E como é usual no comércio, a Oponente emitiu urna nota no valor de € 650,00 + IVA, no total de € 787,63 (€ 17934,47— €17 283,54).

35º-A qual foi remetida, em 22 de Abril 2008, à Exequente, que dela teve conhecimento (Doc. n.º 10 …)

36°- Ainda que, no rigor dos números, a nota em causa estivesse errada, uma vez que o diferencial devia ter sido de apenas € 411,68 correspondente ao diferencial entre € 17 934, 47 e € 17 522,79, que era o efectivo valor da nota de encomenda,

37°- Mas, ainda assim, resultava da mesma que Oponente era credora da Exequente. Sucede que,

38º- Em 29 de Maio de 2008, e corno nada fosse com ela, veio a Exequente solicitar esclarecimentos à referida nota que lhe tinha sido enviado (Doc. n.° 11 …) Assim,

39º- Em 6 de Junho de 2008, a Oponente explicou à Exequente a sua nota e a razão de ser da mesma (Doc. n.° 12, adiante junto ...).

40°- Em 12 de Junho de 2008, a Exequente remeteu à Oponente uma carta a solicitar o pagamento da factura n.° 1449, no valor de € 17.762,04 (…), referente à execução dos trabalhos agora em pleito, conforme documento que se junta sob o n.° 13 …

41°- Factura essa que, ademais, tão pouco estava em consonância como preço acordado, já que este era de € 17 522, 79, e não de 17 762, 04 (mais € 329,25).

42°-Como seria de esperar, a dita factura foi devolvida à Exequente, reiterando a comunicação de 22.04.2008 (Doc. n.° 14, adiante junto …)

43°- Pois, repete-se, se alguém deve alguma coisa, esse alguém é a Exequente à Oponente,

44°- Em suma, ao contrário do que é alegado pela Exequente, a Oponente nada lhe deve, bem pelo contrário, é esta última que lhe deve um valor, ainda que não proceda nesta sede à sua reclamação.

II- DO DIREITO

45°- Nos termos do art. 801°, do Código Civil, tornando-se a prestação impossível por causa imputável ao devedor, seja por não cumprimento, seja por cumprimento defeituoso, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação. Ora,

46°- A Exequente não só não entregou a coisa objecto do contrato nas datas agendadas, incumprido assim o programa contratual estabelecido e aceite,

47°- Como, ademais, entregou algo que não tinha os requisitos e as características contratadas, e que, portanto, não servia os objectivos de credor, Sendo que,

48°- Interpelado o devedor a proceder à eliminação dos defeitos através da rectificação da coisa objecto do contrato note-se que nem sequer lhe foi solicitada a substituição — vem este manifestar, expressamente, a impossibilidade de proceder à rectificação da coisa objecto do contrato, de forma a assegurar os interesses do credor.

49º- Não deixando, assim, à Oponente outra solução se não a de considerar definitivamente incumprido o contrato,

50°- E, do mesmo passo, contratar com terceiros, a eliminação dos defeitos da coisa de forma a cumprir com o Dono de Obra o contrato de empreitada que com este tinha sido estabelecido.

51°- Em face disto, parece ser evidente que a Exequente é responsável pelos prejuízos que causou à Oponente, nos termos do art. 798. °, do Código Civil,

52°- Os quais se consubstanciam, pelo menos, nos valores que esta teve de pagar a terceiros de forma a cumprir o contrato com o Dono de Obra, no que a este aspecto dos armários concerne. Ora,

53º- Sabendo a Exequente que não cumpriu o contrato, nem o quis cumprir quando interpelada a fazê-lo,

54º- Obrigando a Oponente a contratar terceiros,

55º- Sabendo, igualmente, que é responsável pelo pagamento dos custos que a contratação de terceiros envolveu, e que no caso são superiores ao valor que a Oponente lhe teria de pagar se o contrato tivesse sido por si cumprido nos termos em que foi estabelecido e aceite.

56°- Sabe necessariamente que nenhuma quantia lhe é devida, já que o que a Oponente tem prejuízos pelo incumprimento, compensa e supera mesmo o que alegadamente a Exequente reclama como lhe sendo devido.

Nestes termos,

Deve a presente oposição ser julgada procedente e, em consequência, e a acção executiva julgada extinta, e restituída a quantia penhorada à Oponente, com todas as demais e legais consequências daí decorrentes... (.,..) “

         Contestou a exequente alegando que não só a executada/opoente não podia ter deduzido reconvenção para fazer valer o seu direito de indemnização (pois apenas em acção declarativa podia fazê-lo) como ainda que o pudesse fazer, esse direito já teria caducado nos termos do art. 1224, nº 1 do CC.

Contestou, ainda, por impugnação.

Foi proferido despacho saneador que entendeu não proceder a objecção processual colocada pela exequente uma vez que a executada se tinha oposto por excepção e não por reconvenção; julgou, no entanto, procedente o direito de compensação alegado pela opoente e a oposição à execução improcedente.

Para melhor esclarecimento, reproduz-se a parte final da decisão:

“ (…) Ora, in casu, tendo por base a factualidade alegada, temos o seguinte:

O objecto do acordo celebrado entre a exequente e a opoente foi a execução e montagem de dezanove (19) armários em fenólico.

Em finais de Janeiro de 2008, foram entregues 6 dos 19 armários contratados, os quais, após “montagem” por parte da exequente, se verificou não estarem de acordo com aquelas que eram as características da nota de encomenda, projecto apresentado e rectificações realizadas, o que de imediato levou à sua não aceitação, quer por parte da oponente, facto que de imediato foi relatado à exequente.

Portanto, a opoente não aceitou parte da obra / do trabalho realizado pela exequente logo em finais de Janeiro de 2008.

Entre o dia 31 de Janeiro de 2008 e o dia 2 de Fevereiro de 2008, foram entregues os restantes 13 armários contratados, bem como vinte e quatro cacifos e setenta e seis portas.

Os 13 armários também não correspondiam ao que tinha sido adquirido, era impossível a sua montagem em obra, sendo necessário proceder à sua rectificação, o que, de imediato, a oponente pediu à exequente.

Portanto, logo em Fevereiro de 2008, a opoente recusou aceitar a obra ou o trabalho o trabalho realizada pela exequente.

E m conformidade, o prazo de caducidade de uma ano previsto no art. 1224º, n.º 1 do CC começa a contar desde Fevereiro de 2008.

A exequente, segundo alega a opoente, manifestou logo mesmo a indisponibilidade para a rectificação, alteração e montagem dos armários defeituosos, pelo que foi interpelada por carta de 12 de Fevereiro de 2008, a qual obteve resposta nesse mesmo sentido da exequente por carta data de 4 de Março de 2008 – vide os docs. 5 e 6 juntos com a oposição à execução.

Perante tal atitude, a opoente contratou com terceiros aquilo que havia contratado com a exequente.

Portanto, conforme já referimos supra, claramente a opoente denunciou no prazo aludido no art. 1220º, n.º 1 dos CC os defeitos da obra realizada pela exequente.

Contudo, em face da alegação trazida a juízo, uma vez que a exequente não eliminou os defeitos, a opoente considerou incumprida essa obrigação por culpa da exequente e solicitou a terceiros que realizassem a obra contratada com a exequente.

Em conformidade, na oposição deduzida, a opoente pretende que seja reconhecido o seu direito a uma indemnização correspondente aos encargos que teve de suportar na eliminação dos defeitos e na execução da construção não realizada pela exequente.

Ora, a opoente tem direito a ser indemnizada nos termos gerais – vide o art. 1223º do CC (que se refere aos prejuízos que não podem ser compensados pela eliminação de defeitos da obra ou com a simples redução do preço) – e, portanto, a ser ressarcida dos prejuízos decorrentes do comportamento contratual da exequente.

Sucede que o direito à indemnização, por força do art. 1224º, n.º 1 do CC, caduca se não for exercido dentro do prazo de um ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva.

Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei atribua efeito impeditivo – art. 331º, n.º 1 do CC.

O acto de recebimento na secretaria do requerimento de oposição à execução é o acto impeditivo da caducidade.

Ora, tendo presente que o direito da opoente foi exercido, por via de excepção, nesta oposição à execução, que entrou em juízo a 19 de Junho de 2009, importa concluir que o direito em causa caducou.

A caducidade é, segundo Manuel de Andrade2, [2 Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Coimbra 1992, p. 463] o instituto por via do qual os direitos potestativos se extinguem pelo facto do seu não-exercício prolongado por certo tempo.

Através da caducidade, por motivos objectivos de segurança jurídica, o legislador quer, por considerações meramente objectivas, que o direito seja exercido dentro de certo prazo (prescindido da negligência do titular)3. [3 VAZ SERRA, RLJ, 105º, p. 26 e 27.]

Na situação sub judice o direito alegado pela opoente na sua oposição à execução, enquanto fundamento da compensação requerida, extinguiu-se por caducidade. Assim sendo, não pode a opoente invocar, nestes autos, a compensação de um direito que se extinguiu.

Em conformidade, importa declarar a caducidade do direito de compensação alegado pela opoente na sua oposição à execução e, consequentemente, julgar procedente a excepção de caducidade alegado pela exequente e improcedente a presente oposição à execução.

As custas da presente oposição à execução ficarão a cargo da opoente, enquanto parte vencida nesta acção – art. 446º, n.º 1 e n.º 2 do CPC.

3. Pelo exposto, decido:

a) Julgar procedente a caducidade do direito de compensação alegado pela opoente no seu requerimento de oposição à execução; e consequentemente,

b) Julgar a presente oposição à execução improcedente e, em conformidade, ordenar o normal prosseguimento dos autos de execução apensa.

Custas a cargo da opoente.

Registe, notifique e arquive cópia em pasta própria.”

         Não se conformou a opoente que da sentença interpôs recurso, formulando, a final da alegação, as seguintes conclusões:

“a) A douta Sentença recorrida fez uma errada aplicação do Direito face aos factos existentes e ao direito invocado;

b) O direito à indemnização que foi reclamada pela ora Apelante não está sujeito ao prazo de caducidade do art. 1224.° do Código Civil;

c) A indemnização que está em causa não é a indemnização constante dos arts. 1223.° e 1224.°, do Código Civil, que é residual relativamente aos direitos que ali estão inscritos, mas sim a que decorre do incumprimento definitivo por parte da Exequente, nos termos gerais do direito, estatuída nos arts. 798.°, e seguintes do Código Civil, sendo este o regime a aplicar;

d) Perante a recusa expressa e peremptória em eliminar os defeitos da obra, e não obstante lhe ter sido dado prazo para o fazer, a ora Apelante recorreu aos serviços de um terceiro no sentido de proceder à eliminação desses defeitos;

e) A indemnização que se reclamou através da invocação da excepção de compensação, foi precisamente a que se consubstancia no pagamento dos custos em que a ora Apelante incorreu para eliminar os defeitos através de terceiros;

f) A jurisprudência e a doutrina são unânimes quer quanto à possibilidade de recorrer a um terceiro para eliminar os defeitos da obra, desde que se tenha interpelado o empreiteiro para o fazer e este o recuse, quer quanto à diversa natureza e regime da indemnização a pedir nesses casos;

g) O direito a ser indemnizado pelos custos com os terceiros que eliminaram os defeitos está apenas sujeito ao prazo geral de prescrição e não ao de caducidade;

h) De qualquer forma e mesmo que assim não se entendesse, o que só mesmo por mera hipótese de raciocínio se podia admitir, sem conceder, sempre se diria que a interpelação extrajudicial para eliminar os defeitos, interrompeu o prazo de caducidade previsto no art. 1224.°, do Código Civil;

i) Mas, quer os factos, quer o direito invocados pela ora Apelante são inequivocamente reveladores de que o que estava em causa era uma indemnização pelo incumprimento definitivo nos termos gerais do direito, art. 798.° e seguintes do Código Civil, e não a indemnização residual e acessória que decorre dos arts. 1123.° e 1224.° do Código Civil, essa sim sujeita a um prazo de caducidade, juntamente com os direitos à eliminação dos defeitos, redução de preço ou resolução do contrato;

j) Mal andou, pois, o Tribunal a quo ao declarar a caducidade do direito invocado pela Apelante, aplicando erradamente a norma constante do n.° 1, do art. 1224.°, do Código Civil, ao invés de aplicar o regime do art. 798.° e seguintes do Código Civil, com a legais consequências que dele decorrem em termos da repercussão do tempo na relação jurídica.”

Pede a revogação da sentença.

A exequente respondeu sustentando a improcedência do recurso.

Cumpre decidir, tendo por base a matéria alegada na petição, que atrás se deixou transcrita.

O Sr. Juiz a quo entendeu que o direito de indemnização que a opoente pretende ver reconhecido, correspondente ao custo dos encargos que teve de suportar na eliminação dos defeitos dos armários e da execução da tarefa não realizada pela exequente, caducou nos termos do art. 1224, nº 1 do CC, por ter decorrido mais de um ano entre a data em que a opoente recusou a obra, em Fevereiro de 2008, e a data em que a opoente exerceu o seu direito à indemnização através desta oposição, em 19 de Junho de 2009.

Alega, porém, a recorrente que o que estava em causa era uma indemnização pelo incumprimento definitivo nos termos gerais do direito, que decorre do disposto nos art. 798 e seg. do CC e não a indemnização residual e acessória que decorre dos arts. 1123 e 1224 do mesmo diploma, essa sim sujeita a um prazo de caducidade, juntamente com os direitos à eliminação dos defeitos, redução de preço ou resolução do contrato.

Acrescenta que, mesmo que assim não se entendesse, sempre a interpelação extrajudicial para eliminar os defeitos teria interrompido o prazo de caducidade previsto no art. 1224 do CC.

Vejamos:

É jurisprudência dominante que, na empreitada, o lesado com a defeituosa execução da obra, para se ressarcir dos respectivos prejuízos, terá de observar a prioridade dos direitos consagrados nos arts. 1221, 1222 e 1223 do Cód. Civil, sendo que o direito de indemnização do art. 1223 por prejuízos complementares não é um direito alternativo ao dos art. 1221 e 1222, mas subsidiário, que pressupõe a constituição do empreiteiro em mora (Ac. STJ de 4.12.2007, Azevedo Ramos e Ac. STJ de 8.6.2006, Fernandes Magalhães, in www.dgsi.pt; Romano Martinez, Direito das Obrigações, Contratos, 2ª edição, 490 e 491).

A existência de defeitos na execução da obra não confere, pois, ao dono da mesma o direito de exigir, desde logo, o pagamento da respectiva reparação.

O dono da obra só poderá avançar para o pedido de indemnização (residual ou complementar), se houver danos que não possam ser ressarcidos através da eliminação dos defeitos ou da construção de novo da obra, ou da redução do preço ou da resolução do contrato, pois, quando os defeitos sejam compensáveis por estes meios, é deles que se deve lançar mão (Ac. STJ de 11.11.2003 in site ITIJ, relator Silva Salazar); o dono da obra só tem direito de indemnização nos termos do art. 1223 do CC relativamente aos prejuízos que não obtiverem reparação através do exercício daqueles outros direitos e que não resultarem do incumprimento das obrigações de eliminação ou reconstrução (Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro, 2004, pág. 103 e 112).

Esta indemnização está sujeita aos prazos de caducidade estabelecidos nos art. 1220 e 1224 do CC.

No entanto, tem-se entendido que o incumprimento definitivo da obrigação de eliminação dos defeitos confere ao lesado (dono da obra ou empreiteiro perante o subempreiteiro) o direito a ser indemnizado pelos prejuízos causados por esse incumprimento (art. 798 do CC), correspondente ao custo das obras de eliminação dos defeitos, efectuadas ou a realizar por terceiro; e que nessa circunstância, não tem cabimento "que se imponha que o dono da obra obtenha primeiro, em acção declarativa, uma sentença que condene o empreiteiro a cumprir uma obrigação definitivamente incumprida e só na respectiva acção executiva se permita, finalmente, que ele próprio ou terceiro procedam às obras de reparação ou construção “ (Cura Mariano, ob. cit. pág. 112, 113 e 116; ver, ainda, Ac. STJ de 18.5.2006, relator Nuno Cameira, Ac. R.P. de 3.6.2003, relator Afonso Correia, in www.dgsi.pt).

Ponto é que exista incumprimento definitivo.

Ora, o incumprimento definitivo só ocorre quando a prestação se torna impossível, quando deixa de interessar ao credor ou quando, subsistindo embora esse interesse, o devedor não a realiza no prazo que razoavelmente lhe é fixado pelo credor (cfr. art. 808 do Cód. Civil).

A interpelação admonitória prevista no art. 808 do CC importa a fixação de um prazo peremptório, com a cominação de que a obrigação se considera definitivamente incumprida, se não for cumprida nesse prazo (cfr. Acs. STJ de 12.1.99, relator Garcia Marques, de 18.3.2004, relatado por Oliveira Barros e de 2.2.2006, relatado por Araújo de Barros, todos in www.dgsi.pt).

Revertendo ao caso sub judice, a opoente alegou que interpelou a exequente para eliminar os defeitos, solicitando urgência (art. 19 da petição).

É certo que não alegou que tenha fixado qualquer prazo concreto à exequente para a eliminação dos defeitos, acompanhado da cominação de que a obrigação se considerava definitivamente incumprida, se não fosse cumprida no prazo fixado.

Porém, alegou que a exequente manifestou indisponibilidade para a rectificação, alteração e montagem dos armários defeituosos, ou seja, alegou a recusa do cumprimento, que equivale ao incumprimento definitivo (Ac. STJ de 5.6.2007, Fonseca Ramos, em www.dgsi.pt).

Podia, por conseguinte, a opoente recorrer ao trabalho de terceiros e reclamar uma indemnização correspondente ao custo da eliminação dos defeitos, indemnização que não se enquadra, portanto, na prevista no art. 1223 do CC, não estando, por isso, sujeita ao prazo de caducidade do art. 1224 do CC mas antes ao prazo de prescrição ordinário.

Não ocorre, assim, qualquer caducidade do direito de indemnização alegado pela opoente.

Pelo exposto, julga-se a apelação procedente, revoga-se o despacho saneador na parte em que julga procedente a caducidade (do direito de indemnização) e ordena-se o prosseguimento dos autos.

         Custas pela apelada.