Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | JORGE DIAS | ||
Descritores: | DESLIGAMENTO LIGAMENTO DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE | ||
Data do Acordão: | 04/30/2014 | ||
Votação: | DECISÃO SUMÁRIA | ||
Tribunal Recurso: | 3º JUÍZO CRIMINAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 400 Nº 1 AL. A) DO CPP | ||
Sumário: | O despacho que ordena o desligamento de cumprimento de medida de coação de prisão preventiva e ligamento a outro processo para cumprimento da pena de prisão aplicada é um despacho de mero expediente e como tal irrecorrível. | ||
Decisão Texto Integral: | =DECISÃO SUMÁRIA= * Efetuado exame preliminar dos autos afigura-se-nos que o recurso a decisão em causa não admite recurso –art. 400 nº 1 al. a), 414 nº 2, pelo que é de rejeitar, art. 420 nº 1 al. b), todos do CPP. Assim, que se profere decisão sumária nos termos do art. 417 nº 6 al. b) do mesmo diploma. * Decide-se no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal. No processo supra identificado foi proferido despacho a ordenar o desligamento do arguido/recorrente deste processo e colocado à ordem do processo 119/11.2PBTMR, do 3º Juízo do tribunal Judicial da Comarca de Tomar, para cumprimento de pena. Inconformado, o arguido A..., apresenta recurso para esta Relação. Na sua motivação, apresenta as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso: 1-O despacho de desligamento/ligamento como, pacificamente, se aceitará, não consubstancia um despacho de mero expediente. 2-O Tribunal "a quo" postergou a obrigação de comunicar ao arguido, de forma válida, regular e formal, através de notificação, o Despacho de desligamento/ligamento, ora, recorrido. 3-É certo, que o arguido tomou conhecimento de tal Despacho, porém, de forma, completamente, fortuita e informal, em data posterior à prolação do mesmo, não prescindindo, porém, da realização da notificação em termos válidos. 4-A omissão do cumprimento desta formalidade, consubstancia, no nosso modestíssimo entendimento, urna irregularidade nos termos do artigo 123 do CPP, da qual não se prescinde, e que aqui se invoca, para os devidos efeitos legais. 5-O despacho de desligamento/ligamento dum determinado arguido em reclusão, transmutando-o dum processo para outro, cremos, ser da competência do Tribunal de Execução das Penas, ao abrigo da disposição constante do artigo 138, n.º 2 do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (doravante CEP) em reprodução, aliás, da norma plasmada no artigo 91, n.º 1 da LOTJ (Lei n.º 3/99). 6-Não podemos acolher esta intromissão da Sr.ª Juiz do Tribunal “a quo" no cerne dum Processo Judicial sobre o qual não tem qualquer Jurisdição, e altere a situação processual do arguido, promovendo, e ordenando o cumprimento efetivo duma pena de prisão, no âmbito dum Processo em que se formou o título executivo da pena, e ao qual é, completamente, estranha. Essa competência, isso sim, porque faz sentido e vai ao encontro do teor literal da norma ínsita no predito artigo 138, nº 2 do CEP, está atribuída ao Tribunal de Execução das Penas. 7-O Despacho, ora, recorrido provém de Tribunal incompetente, consubstanciando uma Nulidade insanável nos precisos termos hipotizados no artigo 119, alínea e) do CPP, que para os devidos efeitos, aqui, expressamente, se invoca. 8-Mesmo que o argumento aduzido supra, não mereça acolhimento, o que sempre se admitirá na dialética da interpretação do Direito, a predita Nulidade insanável do Despacho ocorrerá de forma inelutável. 9-Esvaziando-se da palete de competências do Tribunal de Execução das Penas o poder de emitir os respetivos Despachos de desligamento/ligamento no âmbito das execuções das penas privativas de liberdade já transitadas em julgado, sempre tal competência, estaria, pelo menos reservada ao Tribunal onde se formou o título executivo da pena, à ordem do qual se pretende colocar o arguido, e que não foi respeitado, in casa, 10-Concluindo-se, assim, que o Despacho, ora, recorrido, está ferido de Nulidade insanável, por violação das regras da competência, o que para os devidos efeitos, aqui expressamente, se invoca, nos termos do artigo 119, alínea e) do CPP. 11-Violou, assim, o Despacho em análise o plasmado nos artigos 111, n .1, alínea c); 119, alínea c) e 123 todos do CPP e os artigos 138, n.º 2 do CEP e 91, n.º 1 da LOTJ. Deve dar-se provimento ao recurso e ipso facto: a) Revogar-se o Despacho recorrido, declarando a Nulidade do mesmo. b) Não se entendendo, assim, deverá Revogar-se a decisão recorrida para que, face à posição a assumir por esse Tribunal, se profira nova Decisão em conformidade. Na resposta apresentada, o Magistrado do Mº Pº conclui: 1. O despacho que ordenou o desligamento do arguido aos nossos autos e ligamento aos autos 119/11.2 PBTMR, a correr termos no Tribunal Judicial de Tomar é de mero expediente; 2. Tal despacho é irrecorrível, uma vez que não contende com nenhum dos direitos do arguido, designadamente os previstos no artigo 20, n° 1 e 32, nº 1 da CRP; 3. O facto de tal despacho não ter sido notificado ao arguido nos termos do artigo 111, nº 1, alínea c) do Código de Processo Penal não constitui qualquer irregularidade; 4. O tribunal de Leiria é competente materialmente para emitir os mandados de desligamento/ligamento a outros autos; 5. O despacho de que se recorre não violou qualquer disposição legal, pelo que deve ser mantido na íntegra. Nesta Relação, o Ex.mº P.G.A., em parecer emitido sustenta que o recurso deve ser rejeitado por irrecorribilidade do despacho recorrido. Foi cumprido o art. 417 nº 2 do CPP. Não foi apresentada resposta. *** Cumpre decidir: Questiona-se a natureza do despacho que ordena o desligamento de cumprimento de medida de coação prisão preventiva e ligamento a outro processo para cumprimento da pena de prisão aplicada; Questiona-se qual o tribunal competente para a emissão desse mandado; * Natureza do mandado de desligamento/ligamento: No caso vertente, o recorrente encontrava-se a cumprir a medida de coação imposta nestes autos, prisão preventiva. No processo 119/11.2PBTMR solicitou-se que o arguido fosse desligado destes autos e passasse a cumprir pena à ordem daquele. O mandado é só um, de desligamento e ligamento, pelo que é o tribunal competente para o desligamento que terá de emitir esse mandado. A ordem de colocação do arguido ligado ao processo onde vai cumprir pena emana desse mesmo processo, sendo que neste (nosso) processo apenas se satisfaz o solicitado. E tem de ser assim porque não pode haver hiato ou interregno entre o desligamento e o ligamento à ordem de outro. Tem de haver simultaneidade. Assim que, contrariamente ao indicado pelo recorrente, não foi o juiz deste processo que determinou, ordenou o cumprimento de pena à ordem do outro. A diligência que se fez e foi ordenada neste processo, foi a de se dar cumprimento ao ordenado e pedido naquele outro e, porque o art. 478 do CPP determina que os condenados só dão entrada no EP por mandado e é assim, para evitar a entrada de pessoas que tenham sido ilegalmente presas. Dão entrada no EP ou se mantêm presas, na dependência de mandado. Mesmo nos casos em que o arguido terminando o cumprimento de uma pena de prisão e tendo outra pena para cumprir, tem de haver o desligamento e ligamento ao novo processo e a pedido deste processo. É o juiz do processo à ordem do qual se encontra preso, quem tem competência para desligar desse e colocar à ordem de outro que assim o haja solicitado. Logo, o Juiz que ordenou o desligamento e ligamento era, o competente para satisfazer o solicitado por outro tribunal, não lhe competindo apurar e saber da legitimidade de tal pedido. E esse mandado, desligamento/ligamento apenas respeita à execução da pena aplicada e em nada afeta direitos do condenado ou lhe impossibilita ou diminui garantias de defesa. Funciona nos mesmos termos que funcionaria o mandado para iniciar o cumprimento de uma pena de prisão, de condenado que estivesse em liberdade. È despacho de mero expediente? Ou verifica-se a irregularidade de falta de notificação? O art. 400, n.° 1, al. a) do Código de Processo Penal, refere não ser admissível o recurso de despachos de mero expediente. O Código de Processo Penal, não define o que é despacho de mero expediente. Para integrarmos esse conceito de "mero expediente", teremos de nos socorrer do que a tal propósito é referido no Código de Processo Civil, atento o disposto no art. 4, do Código de Processo Penal. Ora, nos termos do artigo 152, n° 4, primeira parte, do Código de Processo Civil, despachos de mero expediente são aqueles que se destinam a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes. Como ensina Castro Mendes, in Recursos, 1980-40, os despachos de mero expediente “são despachos de carácter meramente interno, que dizem respeito às relações hierárquicas entre o juiz e a secretaria (p. ex., o despacho que ordena a conclusão do processo ao juiz); ou em qualquer caso são despachos que dizem respeito apenas à tramitação do processo, sem tocarem nos direitos ou deveres das partes (ex: o despacho que marca dia para julgamento). Estes despachos são, em princípio irrecorríveis, só o sendo no caso de desarmonia com a lei”. Na definição de Alberto dos Reis (C.P.C. Anotado, vol. V, 240), despachos de mero expediente são "aqueles que se destinam a regular, de harmonia com a lei, os termos do processo, e que assim não são suscetíveis de ofender direitos processuais das partes ou de terceiros". São os que "dizem respeito apenas à tramitação do processo, sem tocarem nos direitos ou deveres das partes". O despacho de desligamento/ligamento não ofende qualquer direito do arguido. O arguido condenado em pena de prisão, com decisão transitada em julgado, tem de cumprir a pena (cumprir a decisão), sendo que para se dar inicio ao cumprimento, tem de haver, como se referiu um mandado a fim de o condenado poder dar entrada no EP. Assim, que o despacho que ordena a emissão de mandado é despacho que diz respeito apenas à tramitação do processo, sem tocarem nos direitos ou deveres do condenado. E o que deve ser comunicado ao arguido é o momento de execução desse despacho através do cumprimento do respetivo mandado, para o arguido saber à ordem de qual processo se encontra preso, e desde quando para o caso de se proceder à liquidação da pena. Tal despacho apenas dá início à execução da condenação já transitada e, a condenação é que interfere com os direitos do arguido, nomeadamente o da liberdade. No caso concreto, o condenado não pode interferir no modo de execução da prisão, sendo que a mesma é exercida pelo poder público. Terá de cumprir a pena. Assim que entendamos que o despacho em causa é irrecorrível, atento o disposto no art. 400 nº 1 al. a) do CPP, por se tratar de despacho de mero expediente. O art. 414 nº 2 diz que o recurso não é admitido quando a decisão for irrecorrível. E, o facto de o recurso haver sido admitido não vincula este Tribunal, conforme art. 414 nº 3 do CPP. Temos o recurso como não admissível e, não admitido, não se pode conhecer de questão alguma de fundo, das alegadas. *** Decisão: Face ao exposto decide-se, nesta Relação e Secção Criminal, em rejeitar o recurso trazido pelo recorrente A..., por se ter o mesmo como não admissível. Custas pelo recorrente com taxa de justiça de 6 Ucs, na qual se inclui a prevista no art. 420 nº 3 do CPP. Coimbra, 30 de Abril de 2014 Jorge Dias |